SAM SUMMER

                                      

Em casa todos tinham nome da estação do ano, como dos pontos cardeais, erámos uma família grande, mas parecia tudo invertido, diziam que meu pai colocava esses nomes nos filhos para não pensar, mas ele mesmo tinha um nome estapafúrdio Groelândia, todo mundo o chamava de Groe, inclusive os filhos.

Minha mãe era a única que tinha um nome normal, era uma mulher diferente, se chamava Marie, era o homem da casa, meu pai, se dedicava a ajudar, mas tinha uma horta que só ele tocava a mão, depois ia a cidade vender tudo, comíamos o que sobrava.   Ela ao contrário se dedicava a cultivar as terras com auxilio dos filhos, estava sempre em cima de um trator, nunca a vi de vestido, a não ser no seu enterro.

Os que iam ficando mais velhos desapareciam, eram substituídos pelos seguintes, fomos obrigados a ir à escola, por uma assistente social, meu pai achava uma besteira, já que ele sabia assinar seu nome, foi tudo que tinha aprendido.

Minha mãe devia ter sido uma beleza, porque mesmo malcuidada o era, raramente ia a cidade, em casa cada um tinha uma lata, começavas a trabalhar, ela fazia questão de pagar como se fossemos empregados, dizia que assim podia exigir mais.

Eu talvez tenha sido o único que se apaixonou pela escola, adorava estudar, ler, escrever, desenhar, geografia era meu forte, o professor dizia que eu era curioso.

Uma vez passou um filme, um documentário, um sujeito que ia de moto pela rota 66, fiquei como louco com o documentário, pensava um dia farei isso.

Minha outra grande paixão era a mecânica, era curioso, com uns dez anos, já consertava o trator da fazenda, bem como qualquer mecanismo que me caísse nas nãos.

Depois desenhava os mesmos, era capaz de desmontar um pequeno motor, monta-lo outra vez.

A casa não tinha conforto nenhum, dormíamos todos em cima de colchões no chão, eu adorava as vezes quando colhíamos o trigo me deitar em cima dos fardos.

Animais só um cachorro que acompanhava minha mãe por todos os lados, o tinha encontrado ferido na estrada, o levou para casa o curou.

Chegou um momento que só estavam os dois, bem como meu irmão mais velho, quer dizer mais velho do que eu, um dia entrou um carro na estrada que ia até a casa, desceu uma mulher bonita, depois descobrir que era minha irmã mais velha, tirou do carro um garoto, o fez descer na marra, chorava como um condenado, North, meus pais registraram como seu filho, ela foi embora dizendo que um dia voltava para busca-lo.

Ele se agarrou a mim como uma lapa, parecia um anjo, eu tinha ido uma vez na igreja, tinha visto esculturas, achava que ele era um deles.

De noite corria para minha cama, dormia agarrado a mim.

Quando tinha 14 anos, andavam roubando a colheita dos fazendeiros, eram bandidos que vinham de noite, roubavam tudo que encontravam colhido no campo.

Minha mãe, fez ao contrário, nos botou todos a trabalhar, ela com o trator, foi levando tudo para perto da casa, no dia seguinte os compradores iriam aparecer.  Sentou-se na varanda, com uma espingarda no colo, ficou ali na escuridão, meu pai ficou sentado ao lado dela no escuro, depois foi para a sala para dormir no chão.

Despertamos com dois tiros, saímos correndo, ela estava em pé na varanda, com a espingarda, tentando trocar os cartuchos, nisso vimos como um fogo, atiravam nela, pois ela conseguiu acabar de colocar os cartuchos, atingi mais um, que resultou depois ser o filho do xerife, era o chefe da gang.  Ela foi para o hospital, mas não voltou, não resistiu aos tiros.

Tinha matado dois dos bandidos, o filho do xerife, um outro que era conhecido por não fazer nada.

Foi quando a vi no caixão com seu vestido, North demorou a entender que estava morta, pegava a mão dela, dizia que tinha fome, que ela se levantasse para fazer o café.

No dia seguinte meu irmão que acabava de fazer 17 anos, pegou sua lata, foi embora.

Só ficamos os três, foi quando descobri que a fazenda não era nossa, mas sim alugada, por isso nunca sobrava muito dinheiro para repartir.

Nos mudamos para a cidade, levando as poucas coisas que tínhamos.  Numa coisa meu pai era prático, escolheu uma casa, aonde tivesse terras atrás, ele seguiu plantando sua horta, para vender no mercado.  Eu segui estudando, trabalhava de tarde numa oficina mecânica, ao lado do posto de gasolina, North ajudava o homem do posto.

Esse dizia que tinha um trabalho duplo, pois quando os homens dos caminhões viam o North, o queriam levar, ele tinha um corpo espetacular, sem nenhum pelo. Sua cara era muito bonita, as vezes de noite tinha que me afastar dele, pois ficava de pau duro.

Eu já tinha 15 anos, ele tinha dez, no inverno o único jeito de ficar quente era esse dormir agarrados um ao outro, eu as vezes preferia passar frio, pois o bicho ficava duro, já sabia como funcionava isso, escutava na oficina mecânica, na escola.

A ele parecia não importar, segundo meu pai, eu era seu deus.  Já tinha nessa época, 1,75 m de altura, era forte, tinha uma cara bonita, máscula, um pequeno bigode que era a gozação de todos, quando perguntavam meu nome, eu nunca dizia Summer, mas sim Sam, tinha vergonha disso, mas North não, gostava do seu nome, apesar da gozação na escola, de noite sempre lhe ensinava a lição, o que ele não tinha entendido.   Meu pai dizia que ele nunca seria inteligente, sim bonito, porque lhe custava entender as coisas.

Eu sem querer era o filho querido do meu pai, dizia que o único na família que tinha saído inteligente era eu.   Mas que infelizmente, nunca poderia ir à universidade, pois não havia dinheiro, ele tinha juntado o que tinha na sua lata, com a da minha mãe.  Eu sabia aonde escondia sua lata, na horta.  A minha estava escondida no fogão a lenha, tinha um jeito especial de esconder as coisas.  As roupas íamos um armazém da cruz vermelha, escolhíamos o que podíamos, cuecas nunca, alguma meia de segunda mão, com um furo, camisetas que já tinham sido de outras pessoas, calças.

North era mais exigente, escolhia as mais bonitas, tinha um bom gosto nato, nele nem pareciam que era de segunda mão.   Eu um dia depois da natação tinha feito sexo com o professor de educação física, meus companheiros já tinham ido embora, eu era o encarregado para ganhar mais algum de limpar o vestiário, estava ali, com uma toalha na cintura quando ele apareceu, ficou me olhando, se aproximou, tirou a toalha, se ajoelhou, colocou meu sexo na sua boca, a sensação foi ótima.  Na vez seguinte, pediu que eu o penetrasse, gostei também, ficava esperando esses dias para fazer sexo com ele.

Fora dali, era bom dia professor, disso não passava, nem sabia direito o seu nome.

Agora sabia o que era sexo, por isso quando North se encostava, eu ficava como louco para lhe penetrar, mas não podia, era seu tio.

Ele ao contrário era inocente, não tinha maldade nenhuma, quando me via tomando banho frio, ria, dizia que meu piru de grande se encolhia.

Lá em casa, nada de água quente, sempre banho frio, eu gostava era de tomar banho no da piscina da escola, principalmente no inverno que era de água quente.  Como tinha a chave do vestuário, porque o limpava, levava North para tomar banho quente.  Ele adorava, enquanto eu aprontava tudo para algum jogo, ele se divertia.

Um dia vi o professor parado, alisando seu pau, olhando a bunda do North, eu cheguei de mansinho lhe disse que nem se atrevesse, porque senão contaria o que ele tinha comigo ao diretor.

Passei a dizer ao North que fosse rápido, por causa do professor, tive que lhe explicar as coisas de sexo entre homens.  Olhou na minha cara dizendo, é por isso que foges de mim de noite.

Nessa noite, quando ia me afastar, ele agarrou o meu piru, me pediu que lhe ensinasse a fazer sexo, que ele queria era comigo.

Meses depois, um belo dia apareceu sua mãe, com um homem mais velho do que ela, tinha conseguido um trouxa para se casar, esse segundo disse ao meu pai, tinha negócios em San Francisco, ia adotar o North.

Ele me disse baixinho, fique com a minha lata, na verdade o controlava, pois senão gastava o dinheiro.  Vou sentir falta de ti dentro de mim, fazíamos sexo todas as noites, ele delirava.

Para mim foi pior, o ver se afastando no carro, sentado no banco de trás, abanando a mão para mim.  Foi nesse momento, pior que a morte de minha mãe, perder outra vez uma pessoa que gostava, jurei que um dia ia encontra-lo, pois sabia que como todos os outros que tinham ido embora, nunca deixavam um endereço, tampouco apareciam de novo, se tinham conseguido melhorar na vida, não iam querer voltar a miséria.

Acabei o curso da escola, ali, não havia um depois, agora trabalhava o dia inteiro na oficina mecânica, meu prazer era pegar uma peça de alguma engrenagem, partir dela num desenho para montar um motor, ficava desenhando em papel desses de embrulho que apareciam por casa.

Agora só eu e o velho, ele dizia rindo que sobrava mais para vender no mercado.  Estava cada vez mais curvado.   Um dia escutei o dono da oficina comentando com um que perguntou quem eu era, explicando de quem era filho.

O homem soltou, nunca entendi o que ela via nele, era a garota mais bonita da redondeza, podia ter se casado com qualquer um, todos viviam babando com ela, mas escolheu justamente o mais idiota, bom tipo, mas idiota, o retrasado da escola.

Eu fiquei furioso, tinha que consertar seu carro, o deixei de proposito cheio de defeitos.

Nesse dia, perguntei ao meu pai, sobre como eles tinham se casado.  Ele riu, esses idiotas sempre se perguntaram o que eu tinha que eles não tinham, abaixou as calças, mostrou um piru como o meu, grande, porque achas que tivemos tantos filhos.  Ela sabia que só eu podia lhe dar prazer como gostava.  Depois adorava esse trabalho, estar em cima de um trator, como se fosse um homem.   Ao contrário de muitas mulheres, era ela que fazia sexo comigo, eu era o submisso, gostava de ser como o homem, me possuir, eu amava tanto que deixava.  Sinto falta dela a cada dia da minha vida.

O achei mais triste, ficava cismando, eu já tinha juntado a lata do North com a minha, a dele tinha menos dinheiro, um dia meu pai me ensinou aonde estava as suas, tinha duas, eram grandes, quando eu morra, meu filho, pegue esse dinheiro se mande daqui, mereces mais, eres inteligente, saberás criar um futuro para ti.

Pela primeira vez vi uma moto como as que tinha visto no documentário, um dia apareceram dois homens, cada um numa moto, o dono da oficina ficou com medo, eram dos Hells Angels, tinham um defeito numa delas, expliquei que não conhecia os motores direito, mas se ele me permitisse ia realizar o sonho da minha vida.

O patrão não queria que ficassem ali, ia espantar os clientes, os levei para casa, desmontei todo o motor, memorizando cada peça, o mais velho deles me observava interessado.

Comentei do documentário que tinha visto, eles saíram para comer na outra moto, quando os vi sentando um agarrado ao outro, fiquei excitado.

Consertei o motor, depois olhei o da outra moto, disse ao homem que sonhavam em ter uma, quando me abaixava, vi que ele ficava olhando a minha bunda, pois como não usava cuecas, aparecia.

Ai ninguém toca, disse para ele.  Riu muito, já vi que tens um bom volume na frente, nessa noite dormiram em cima de suas mantas.  Pois fora chovia.  No dia seguinte me pagaram muito bem, mais que um mês de salário, o mais velho me escreveu num pedaço de papel, seu nome, bem como um número de telefone, eu em retribuição, escrevi o meu. Summer Tyron, mas pode me chamar de Sam.

Os dois me abraçaram, ele o fez, mas colocou a mão em cima do meu piru. Realmente é grande.

Fiquei como louco, tive que me masturbar pensando nele.

Voltei a trabalhar na oficina, me perguntaram quanto tinham me pagado, eu menti, não ia dizer quanto, imaginei as pessoas pensando coisas, cada um tinha me dado como se fosse um mês de meu salário.

Um senhor que ia sempre, me disse que tinha uma moto encostada na sua garagem, era de meu filho que morreu na guerra do Vietnam, imagina quanto tempo esta ai jogada, minha mulher vive pedido para eu dar um sumiço nela, fui até lá olhar, além de ter ferrugens, estava coberta de pó.

Me deu de presente, ajudei a colocar em cima da sua caminhonete, a levamos até minha casa, agora esse era meu prazer, a limpei inteira, desmontei o motor, limpei, engraxei tudo, a deixei nos trinques.  O estofamento estava uma merda, mas o arrumei, costurando um cobertor velho, fazendo uma capa muito dobrada.

A primeira vez que sai com ela, fui até a casa desse senhor, vi a mulher chorando, ao escutar o ruido, pensei que era meu filho voltando para casa.

Agradeci muito.   Depois levei meu pai para dar uma volta, ele ria como uma criança que vai a um parque de diversões.   Herdaste de mim isso, sempre tive vontade de ter uma.

Um mês depois, não se levantou, morreu dormindo com um sorriso na cara, o enterrei ao lado de minha mãe, fui falar com o proprietário da casa, ele disse que meu pai sempre pagava adiantado, com medo que acontecesse o que tinha passado na fazenda.

Juntei todo o dinheiro, numa noite contei tudo, no dia seguinte fui ao banco abri uma conta, o homem ria, para quem sempre viveu na miséria, de favores da cruz vermelha, até que teu velho tinha dinheiro, depois somei os da minha lata.

Fiquei com uma boa quantidade de dinheiro para poder colocar gasolina na moto.  Me deu um cartão de crédito, que eu só tinha visto na oficina mecânica, quando alguém pagava assim.  Outros pagavam ainda com cheques, mas meu patrão me explicou com o cartão era mais efetivo, realmente o dinheiro chegava.

Fui embora, na primeira cidade grande que parei, Sacramento, fiz pela primeira vez um gasto, comprei um assento novo para a moto, era antiga, mas encontrei um que servia, uma daquelas bolsas que se colocam atrás, para guardar coisas, uma roupa de couro para mim, pela primeira vez comprei cuecas dessas que vem em pacotes, a senhora do caixa me disse que comprasse negras, que eram novidades, senão sempre ficavam marcadas pela ultima gota da mijada masculina, vai por mim que tenho três homens em casa.

Me mostrou um casaco de couro, disse que era de segunda mão, me vendia mais barato.

Quando sai da loja vi uns quantos motoqueiros ali parados olhando a minha, contei que a tinha recondicionado inteira, desmontado o motor, remontado outra vez.   Me convidaram para dar uma olhada na oficina deles, fiquei uns meses ali, consertando tudo que apareceu, me deixavam dormir num quarto em cima da garagem, com banheiro.

Um homem barbudo, forte como eu, estava sempre me olhando, consertei sua moto, disse que ele era muito relaxado, pois a mesma estava em péssimas condições.   Um dia de noite apareceu de banho tomado, cheirando a perfume, me disse na cara, quero fazer sexo contigo, estou farto de me masturbar pensando em ti.

Era a última semana que estava ali, concordei, mas venha de banho tomado, mesmo assim tinha um cheiro forte.  Fiz sexo com ele, mas não lhe disse nada, um dia de manhã, já tinha ido a uma sucursal do banco, depositei o dinheiro que tinha ganho, comprei um capacete, tomei rumo a San Francisco, não me despedi de ninguém, não queria que me pedissem para ficar.

Queria ir procurar o North.   Sentia falta dele, queria fazer sexo com ele, que tinha uma pele branca, perfeita, nada de pelos.

Cheguei em San Francisco, fui procurar aonde tinha uma oficina de motos, foi a mesma conversa, logo tinha emprego, arrumei um quarto para viver ali perto, por sorte tinha um bom banheiro com chuveiro que era o que mais gostava.   A cama era grande, as estreitas eu tinha medo de cair da cama dormindo, gostava de dormir no centro da cama, assim não caia.

Comecei a procurar o North, mas nas listas telefônicas, não existia nada, tampouco sabia o nome direito de sua mãe, ou como se chamava agora.

Saia com alguns companheiros da oficina, eles sempre depois desapareciam com alguma mulher, ou homem, achavam interessante eu nunca criticar ou tocar no assunto.

Um deles que era pelo visto descendente de italianos, me levou um dia a Castro, chamamos atenção, eu loiro, agora tinha 1,85m de altura, olhos verdes escuros, cabelos compridos, amarrados numa bandana, de roupa de couro, foi um sucesso.

Entramos num bar, eu bebia pouco, com uma cerveja me bastava, meu amigo o Guido logo estava conversando com alguns dali, eu como era mais fechado, fiquei quieto.

Um negro vestido de couro, disse que tinha gostado da minha moto, conversei com ele sobre como a tinha recuperado, quando percebi Guido tinha desaparecido.

Robert, o negro me convidou para ir para seu apartamento, fui por curiosidade, fiquei alucinado, ele era professor de mecânica quântica da universidade.  Ao tocar sua pele fiquei alucinado, era totalmente ao contrário da minha, fiquei em sua casa todo o final de semana, me convidou para no seguinte final de semana ir acampar no deserto, gostei da ideia, foi uma loucura, pela primeira vez, parecia ver como era o céu.

Um dia me perguntou o que via nele, se eu era um tipo bonito.  Além do sexo, eu gostava de conversar com ele, disse que nunca tinha tido um relacionamento a sério com ninguém.

Fomos um dia ao cinema, dei de cara com uma foto do North, aparecia no filme.  Quis ver o mesmo, lhe disse que era como se fosse meu irmão, soube depois que era seu segundo filme, ele fazia um papel pequeno, como dizia o Robert, era um pouco canastrão.

Primeiro fiquei ofendido, mas como não entendia de cinema, depois entendi, ele era bonito, comia a câmera, mas de resto parecia um corpo bonito falando, aparecia todo o tempo sem camisa.

Consegui localiza-lo em Los Angeles, fui para lá, levei um puta chasco, ele vivia com um homem mais velho, que era seu agente.   Mal nos deixou conversar, mal o homem saiu, quis fazer sexo comigo, fizemos, mas já tinha perdido seu encanto.

No dia seguinte quando lhe chamei, me disse na cara rindo que já tinha matado a saudade do que ele gostava de mim, me soltou um adeus na cara, cuide de sua vida, que cuidarei da minha.

Fui embora para San Francisco, levei o resto do ano com o Robert, queria que fosse viver com ele, senti que de alguma maneira queria me controlar, isso eu não gostava.

Tinha dinheiro suficiente para fazer a rota 66, resolvi fazer ao contrário, me lembrei do pessoal do Hells Angels, tinha ainda o número de telefone, pedi para falar com o homem, contei que trabalhava em San Francisco, que queria fazer o roteiro, mas ao contrário, acabar em NYC.

Riu muito, me disse que passasse por Santa Fé, que começasse a partir de lá, me chamas quando estiver na cidade, vivo um pouco fora.

Me despedi do Robert que lamentou não poder ir comigo, pois tinha que trabalhar, mas que estaria ali quando eu voltasse.

Fui, quando cheguei a Santa Fé, chamei o Grayson, a quem passei a chamar de Gray, fui para seu rancho, ele vivia ali sozinho, era muito mais velho do que eu, mas foi franco, quando nos conhecemos estava com meu amante, mas morreu de ciúmes de ti.  Eu contei que quando vi os dois juntos na moto, tive que me masturbar, riu muito.

Dei uma olhada na sua moto, disse que podia fazer um trecho comigo, mas teria que ir a uma convenção em Las Vegas ias gostar.  Nessa noite fizemos sexo, ele tinha mais experiencia realmente do que eu, me levou a loucura, eu queria era mais e mais.

Dormi abraçado a ele, como fazia com o North, despertei de noite com ele me olhando, sei que vais por livre, senão ia tentar te prender, tinha comentado do problema com o Robert.

Depois de uma semana, ele disse que até se sentia mais jovem, mas gostava da vida dele ali no campo, o teu no momento não é isso, talvez um dia.

Fomos para Vegas, foi uma viagem interessante, nos divertimos muito, quando encontramos seu grupo, logo perceberam que entre os dois rolava alguma coisa, ele não se escondia, me apresentou o chefe de seu grupo, um homem impressionante de dois metros de altura, cabelos queimados do sol, forte como um touro, me pediu para olhar sua moto.

Acabei consertando várias, ali no motel que estavam, logo fiz amizades com alguns, inclusive com as mulheres.   Quando souberam que a partir dali eu tomaria a rota 66 me deram conselhos, lugares para parar, eu parecia mais um deles, a maioria vivia perto da fronteira do Mexico, me convidaram quando voltasse ir aonde viviam todos, inclusive o chefe, esse parecia mais meu pai.   Um dia me perguntou por que eu estava com o Grayson, contei como o tinha conhecido, que o forte da minha experiencia era com homens.

Não tenho problemas com isso, mas alguns sim, se fosse mais jovem ia fazer um menagem contigo, além de alguma garota.

Um desses dias, estava sentado na mesa ao seu lado, todos bebiam muito, eu já tinha minha cerveja quente, nesse dia não tinha vontade de beber mais.  De repente senti sua mão na minha perna, me disse um número, entendi que era do seu quarto, fiquei curioso, fui. Abriu a porta me puxou para dentro, nunca experimentei, tem que ser hoje, eu ia embora no dia seguinte.

Quando me viu nu, ficou impressionado com meu corpo, foi algo diferente, para o homem bruto que era, era carinhoso, passamos o resto da noite fazendo sexo, o deixei me penetrar, coisa que nunca permitia, quando o penetrei, pediu calma pois nunca tinha feito, mas no final gemia de prazer.

Menos mal que vais embora amanhã cedo, pois senão ia te prender aos meus pés.  Me deu o número do seu celular, um desses antigos, o meu também era, podemos ir nos falando, tinha gostado do sujeito.

No dia seguinte, nos despedimos, me levou ao restaurante do hotel, fui me despedindo de todo mundo. Grayson queria saber se tinha feito sexo com ele.

Disse que não, que tinha estudado a ruta com ele.

Fui embora, com vontade de ficar com aquela gente, com eles, estava em casa, embora soubesse que alguns traficavam armas, bem como drogas, tinha visto alguns cheirando cocaína.

Isso não era o que eu gostava, nunca passava da maldita cerveja que acabava quente na garrafa, mas não me incomodava que os outros fizessem isso.

Comecei minha viagem, tinha feito uma pequena livreta com as recomendações, motéis para parar, aonde comer, foi divertido, só dormia num quarto se por um acaso chovesse, senão dormia num saco de dormir ao ar livre, fazia uma fogueira, comia alguma coisa que tinha comprado, primeiro ficava sonhando, ou melhor dizendo na experiencia que ia adquirindo ao conhecer as pessoas, a decepção que tinha tido com o North, alguma coisa me dizia que ali tinha gato preso numa gaiola.

No filme que tinha visto, o tinha achado normal, mas quando estive com ele, o achei afetado, quase feminino.

Mas fui me relaxando, na verdade como homem, tinha gostado do primeiro dos Hells Angels que tinha conhecido, depois o chefe, o chamava assim, nem sabia como se chamava.

Me picou a curiosidade, vi que tinha cobertura aonde estava o chamei.  Riu muito, já sentes saudade, lhe expliquei, que estava pensando nele, que nem sequer sabia seu nome direito, como via todo mundo o chamando de chefe, ficou por isso mesmo.

Espere, vou sair ao ar livre para falar contigo.   Escutei falando com os outros, depois um silencio, agora posso falar livremente, se alguma vez corto a ligação é porque tem pessoas por perto, minha vida pessoal é só minha.

Bom meu nome é o mais comum possível, Tom Andrews, mas poucos me conhecem por esse nome, talvez o FBI.

Ficou rindo, perguntou aonde ele estava, contou que estava no meio do nada, deitado em cima de uma manta, ao lado de uma fogueira, olhando o céu, sem querer estava pensando na vida, pensei nas pessoas que tinha conhecido, que tinha gostado.  Tudo para mim é mais recente.

Eu também tenho pensado em ti, nunca fiz sexo dessa maneira, as vezes saio, me fecho no meu quarto me masturbo pensando em ti.

A mulher com quem andava, se mandou, estou sozinho, mas para assumir essa parte, terei que deixar o grupo.

Qual tua próxima parada, ele disse que logo estaria no cruzamento que levava a Chicago, mas que tomaria direção a NYC.

Quanto dias, demoras para chegar a Chicago?

Creio que uns dois dias.

Então dentro de dois dias, vá ao aeroporto, vou para lá.

Foi o que ele fez, mal o reconheceu, estava sem a roupa de couro, com uma simples calças, jeans, camiseta negra, uma camisa de quadros por cima.

Sentou-se atrás dele na moto, foram para um motel, só saiam para comer, nunca tinha feito sexo assim, a um ponto que tinha dores, Tom disse o mesmo.

Não tenho mais idade para perder a cabeça por sexo, uma chamada o levou de volta a realidade, seu grupo tinha problemas, precisava dele.

Ficaram uma parte da noite abraçados, dois marmanjos, ele lhe disse ao ouvido, quando acabar tudo te espero em San Antonio.  Ele ficou nu em pé uns momentos, lhe fez uma foto, era imenso, com os cabelos largos, barba comprida, quadril estreito, na cama se movia com uma rapidez incrível.

Ah se as mulheres que andei soubesse que agora escolheria a ti, iam te matar de ódio.

De manhã cedo, ainda fizeram uma seção de sexo.

Tenho problemas lhe disse, briga entre grupos que comando, nem sempre é fácil controlar toda esta testosterona que exalamos.

Lhe disse que era melhor que não lhe vissem com ele no aeroporto.  Tomou um taxi, ele saiu em direção contraria para NYC, nesse dia parou mais cedo, a bunda lhe doía, bem como o piru.

Tinham usados os dois como loucos.

Nessa noite, sentiu desejo dele ao seu lado na cama, parecia que lhe faltava algo.

Quando chegou a NYC, tinham lhe recomendado um pequeno hotel no Brooklyn, que tinha garagem, não ande com roupas assim durante o dia, ande normal.

Foi o que ele fez, conheceu a cidade, escutou num bar dois tipos falando de motos, pediu desculpas educadamente, perguntou aonde eles consertavam motos, pois ele era mecânico, precisava de um emprego.   Lhe deram uma direção, em Long Island.

Dois dias depois, telefonou para o Tom, este disse que tinha encontrado um baita problema ao voltar, um grupo queria fazer tráfico de drogas, ele não gostava, pois os acabariam metendo em problemas com o FBI, outro queria vender armas.

Estou ficando farto disso tudo, por mim ia te encontrar.  Se pudesse mandaria tatuar teu nome no meu braço, para um do Hells Angels ele tinha pouco tatuagem, disse que era um problema de pele, por ser tão branco, cheio de sardas, ele amava isso.

Ficaram de se falar em dois dias.

Seu novo emprego era bom, a oficina mecânica, era muito conhecida, com o tempo tinha sua clientela, o dono, ria muito, sinalizou alguns que trabalhavam ali, nunca param, vão embora em seguida.  Eu devia diminuir a oficina, assim rendia mais, realmente era possível isso.  No inverno, muitos foram embora, o único com quem ele tinha feito uma certa amizade, voltava para o Canadá, pois estava ali mais para aprender, ia abrir sua oficina.

Só ficaram ele e mais dois.   Um dia apareceu um grupo do Hells Angels, nem sabia que existiam por ali, o que vinha na frente lhe disse que o tinha conhecido em Las Vegas, que tinha arrumado a moto de um do seu grupo, quando soube que trabalhavas aqui, trouxe essas motos para consertar.   O dono não gostou muito, mas aceitou, quando o convenceu que eles pagavam bem.

Agora tinha uma clientela, propôs ao dono usar a outra parte, assim os outros clientes não se sentiam ameaçados.  Ele pagava como um aluguel.  Tinha agora um apartamento novo, bem decorado, tudo da IKEA, mas não lhe importava.  Um dia escutou um deles dizendo que o grupo do Tom estava tendo problemas, brigas internas, problemas com o FBI, coisas do gênero.

Ele tinha tentado falar com ele, mas diziam que esse número não existia mais.

Um dia recebeu uma chamada de um número diferente, era ele, perguntou se seguia em NYC, disse aonde estava a oficina mecânica, bem como o endereço de sua casa.

Nessa noite chegou, ele estava sentado na escada, seu apartamento ficava no último andar.

Estava completamente diferente, tinha raspada o cabeça, tirado a barba, estava com uma cara mais jovem.   Tiveram pressa em tirar a roupa, um tinha sede do outro.

Depois ele lhe contou tudo, que apesar de tentar controlar, cada grupo exigia que ele fosse o chefe, mas me neguei, pois já sabia que o FBI estava atrás dele.

Entrou para um grupo um rapaz, que vi de cara que estava ali pelo seu pai.

Numa briga deles, a casa que usávamos como fortim, pegou fogo, eu ajudei o rapaz a escapar,

Nos escondemos, eu lhe disse para sair dessa, tinha um jeep, vamos fazer o seguinte, levas o jeep para uma lugar no campo distante, coloca fogo no mesmo, pegas o primeiro ônibus em direção contraria, assim passas desapercebido.

Ele lhe contou como tinha ficado sabendo, falou do grupo que ele atendia na oficina, não sei o que fazem aqui.

Esses traficam com drogas, eu não vou aparecer por lá, vou tentar conseguir um apartamento com nome falso, ficar na surdina.  Tenho dinheiro escondido em vários lugares, portanto posso subsistir.

Na verdade alugou num no andar de baixo do seu. Assim podia subir de noite.

Um dia estava trabalhando, viu que parava uma Van negra dessas que querem passar desapercebido, mas todo mundo sabe que é do FBI, dois homens, perguntaram por ele.

Os atendeu, queria saber do Tom, ele comentou que o tinha conhecido em Las Vegas, que depois nunca mais o tinha visto.  Sim sabia do que tinha acontecido com seu grupo, uma pena, ele conhecia algumas pessoas por ter consertado suas motos.

Fizeram mil perguntas dos clientes atuais?

Ora são qualquer cliente, o único que fazemos é atendermos ao lado, para não perder os outros clientes que tem medo dessa gente.

Se ele sabia o que faziam?

O senhor acha que ficamos perguntando o que faz cada cliente, além de que poderiam mentir sobre seu trabalho, aqui só nos interessa que nos paguem, serviço limpo, se o senhor tem uma moto, pode trazer que dou uma olhada, tampouco vou se perguntar se é do FBI.

Lhe propuseram gravar as conversas com os clientes.

Ele se matou de rir, iam morrer de aborrecimento, eu pergunto, quando muito se a moto é de segunda mão, depois a conversa morre porque entro de cabeça no trabalho.

Viram que era assim, lhe deixaram em paz.

Mas tinha avisado ao Tom, tu te proteja bem.   Não sabia se era amor o que sentia, mas adorava estar com ele, se entendiam.  Era muito mais velho do que ele, nunca lhe perguntou se tinha tido aventuras no tempo que esteve sozinho.  Poderia lhe disser que na verdade tinha tentado, mas nada era igual.

Tirando o Gray, tudo tinha sido mas do mesmo.   As vezes falava com ele, disse que em seu grupo tinha estado tudo calmo, não nos dedicamos a isso, eu agora já nem vou as reuniões, estão sempre preocupados com drogas, armas, isso não é comigo.

Estou criando sim é cavalos, por um acaso, me deixaram dois cavalos para cuidar aqui no campo, me acostumei, gosto disso.

Em momento algum lhe perguntou aonde estava, como iam as coisas, se tinha alguém.

Quando falou com o Tom, esse disse que ele sempre tinha sido discreto, nunca alardeou de sua condição gay, tampouco fazia espetáculos.  Sempre foi um homem sério.

Um belo dia, voltava para casa, viu a Van do FBI, estacionada no principio da rua.  Correu para avisar o Tom, tinha chave da casa dele, mas quando ia subindo, saíram dois tipos do FBI, comentando chegamos tarde, esta casa esta limpa, pode ser que consigamos alguma digital, mas nem vale a pena.

Quando chegou no seu apartamento, viu que ele tinha entrado.

Uma carta, a dois dias que estão vigiando a rua, portanto, hora de ir embora, te deixo duas chaves, corresponde a um banco daqui de Long Island, outra de um banco de NYC.  Sei que sonhas em estudar mecânica, creio que mereces isso, não se junte a nenhum grupo.

Ele sempre ria, porque não tinha tatuagem nenhuma em meu corpo, gostava de alisar as suas mas não queria ter.

Ao final, dizia eu trocasse de celular, ele me mandaria um número novo para mim.

Isso demorou meses.  Eu tinha feito um teste, para conseguir entrar a universidade, deixei a oficina mecânica, me dediquei exclusivamente a estudar, podia me manter com meu dinheiro, usei o dele para pagar a matricula, para mudar para um apartamento, evidentemente mais caro de aluguel, perto da universidade.   Os professores ficavam impressionado, claro eu era mais velho que o resto da turma, mas entendia de motores.

Embaixo do edifício, tinha uma loja minúscula, perguntei ao proprietário, se podia ali abrir uma pequena oficina mecânica, para motos.

Logo avisei alguns antigos clientes aonde estava.  Um dia apareceu um senhor, ri muito pelo seu humor, tinha ficado recentemente viúvo, sua moto, muito antiga, tinha ficado todos esses anos guardadas na garagem.   A trouxe numa caminhonete.  Comecei por limpa-la, mas ao examinar a mesma, havia um problema, duas peças estavam para jogar no lixo.  Não adiantava nada consertar o resto se estas se romperiam a qualquer momento.

Conversando com um professor, ele me falou da peças em 3D, se eu desenhasse, poderiam ser impressa num material mais solido. Que sabe não resolveria o problema.

Me apresentou a um conhecido, desenhei as peças, ele as preparou.

Agora era testar, falei com o proprietário, ele imediatamente pagou o faturamento da mesma,

Riu dizendo da ideia, me mostrou num laptop, o que tinha acontecido a pouco tempo, uma pessoa tinha entrado num julgamento, com uma arma feita em 3D, foi ao banheiro a montou, inclusive com balas em 3D, matou a testemunha, saiu atirou a arma no lixo, levaram meses experimentando a mesma, o desgaste era mínimo, já te irei informando a respeito.

O que ele não sabia era que o homem tinha uma coluna no NY Times, fez um artigo falando sobre isso, que se fosse outro, o teria enganado, mas esse mecânico o Sam Tyron, a arrumou como devia ser, procurou se informar, repôs a peça em 3D, agora observo a inovação, numa maquina velha que funciona a perfeição.

Isso trouxe mais clientes do que ele podia atender, mas selecionava o caso.  Apareceu um senhor que como o outro tinha uma moto antiga na sua garagem, a queria vender.

Ele a comprou a restaurou inteira, teve que fazer uma peça também em 3D, logo a vendeu por um bom preço.

Acabou o curso, lhe ofereceram empregos em muita fábricas, mas ele sabia que ali estaria preso, seria um trabalho limitado.

Sabia do Tom de vez em quando, nunca sabia aonde ele estava de verdade, depois de um tempo, lhe disse que estava com câncer, que estava fazendo um tratamento complicado, mas que as chances eram poucas.

Tempos depois um advogado o procurou, lhe entregou uma carta, disse que tinha herdado uma propriedade em San Francisco, que era aonde ele tinha estado todos esses anos.

Na carta ele dizia que tinha chegado a uma idade aonde não esperava nada de novo, tu apareceste, mudaste minha vida, creio que sempre fui um gay dentro do armário.  Foram os momentos mais felizes da minha vida, mas se ficasse junto a ti, poderia trazer-te problemas, por isso me fui, tentei com outras pessoas, mas não funcionou, esses momentos mágicos que tivemos juntos, só foram contigo.

Te deixo essa casa que comprei, tem uma garagem embaixo, creio que podes montar uma oficina nela, se não queres, venda.

Precisava de férias, tomou um avião, foi até lá olhar, no momento, estava reconstruindo duas motos que tinha comprado, para arrumar e vender.   Uma era um verdadeiro achado, pois era muito antiga.

Olhou a casa que ele tinha comprado, era antiga, estava numa das ruas que saiam de Castro, estava cheia de pequenos comércios.  Era como um sobrado, na parte de baixo, tinha uma garagem para dois carros, era perfeita para seu trabalho.

Se apaixonou ao momento, estava mobiliada como os dois gostavam modestamente, gostou da ideia, se informou com o advogado o valor do local, valia muito.

No testamento, ele tinha deixado muito dinheiro para um grupo LGBT em seu nome, para ajudar as causa do grupo.

Quando foi até lá, riu muito quando lhe contaram que sua história era interessante, tinha se descoberto tarde, amava o homem que o tinha feito mudar sua cabeça, tinham se explorado mutuamente, amava esse homem.   Ele não disse em momento algum que era ele.

Se mudou, mandou uma empresa trazer, toda sua oficina, bem como as motos que estava recuperando, até sair a licença, esteve ali consertando as duas.

Mantinha contato com seu conhecido que fazia as peças em 3D, este ria muito, preciso de uma moto assim para saber como funcionam, bem como fazer uma larga viagem, para saber se aguentam.    O convidou para vir, assim podiam fazer uma viagem juntos.

Luganis, tirou férias da Universidade, veio, foram juntos de moto até Las Vegas, andaram pelo deserto com a moto, fizeram largos percorridos por estradas desertas a boa velocidade, para saber como funcionavam as peças de reposição.

Numa delas, foram parados por um policial, ele explicou o que estavam fazendo, temos que saber se as peças responde a larga pressão, desmontaram uma parte para o homem ver ao que ele se referia.

Esses os convidou para irem a sua casa, vivo aqui perto, tenho uma moto antiga também, numa época que estive infiltrado numa gang do Hells Angels, fui um agente que depois achavam que estava metido em alguma coisa, por isso aceitei esse emprego.

Seu amigo de NYC tinha que voltar, pois as aulas da universidade começavam em seguida, comprou a moto que tinha usado, queria seguir observando, experimentando fazer cópias com outros materiais.

Ele ainda tinha uns dias, ficou na casa do Policial, James Stuart, logo descobriu o problema, o arrumou. Um dia o outro se abriu com ele, quando estava de infiltrado, tinha se apaixonado por um dos homens, nos dávamos bem, sem querer ele me deu a chave do assunto.  Quando descobriram tudo o mataram.

Me senti culpado, pois para todos os efeitos eu o tinha usado.

Tinha encontrado sua meia laranja, sem querer na pequena vila, descobriram que estavam tendo um relacionamento, James mandou todo mundo tomar no cu, a vida era sua, a vivia como queria, se não o queriam com xerife, ele iria embora.

Voltou com ele para San Francisco, logo arrumou um para trabalhar na polícia de lá.

Eram o casal perfeito aos olhos de muitos, viviam para seus trabalhos.

Nunca mais tinha visto nenhum filme ou qualquer coisa do North, na verdade ele não era de cinema, um dia alguém esqueceu uma revista de cinema na oficina, lá estava uma reportagem com ele mais velho, aparentava mais idade que ele mesmo.

Falavam de como a carreira de um homem que foi o sex símbolo, tinha acabado na merda, por drogas, escândalos, etc.  Que cumpria pena na estatal, por tráfico de drogas.

Foi até lá para visita-lo, se a foto o tinha impressionada, ver em pessoa era pior, era como uma cópia ruim de algo deteriorado.

Ficou olhando para ele, nem sabia o que falar.   North pediu desculpas de como o tinha despedido, quando o tinha visto.    Foste tudo de bom na minha vida, mas nunca soube na verdade quem eu era, minha própria mãe, nem sabia quem era meu pai, por isso me levou com vocês.  Foi uma época simples, mas aonde eu fui feliz, pois tinha a ti cuidando de mim.

Mas depois quando fui embora, me desestabilizei, ela logo perdeu interesse por mim, o marido me queria pois não tinha herdeiros.  Mas ela passou a mão em tudo desaparecendo.

Por sorte tinha começado a fazer cinema, mas nunca fui um ator importante, era sempre o bonito coadjuvante, tinha consciência disso.

Quando vi estava metido de drogas até a alma, fui caindo, sem ter aonde me apoiar.  No final, vendia drogas, traficava, quando me pegaram estava vendendo drogas para menores, por isso a pena é grande.  Aqui quando souberam que eu tinha sido ator, fui carne para todos os presos, gosto disso, me satisfazem sexualmente.

Ele estava horrorizado, ele era a decadência personalizada, perguntou se o podia ajudar?

Não, não vês a tua cara de horror, não aguentaria estar contigo.

Um ano depois soube que o tinha assassinado na prisão.

James esteve ao seu lado em todo momento.  As vezes saiam para acampar no meio do deserto, nesses lugares, na solidão, ele encontrava um certo alivio a tudo isso.

Se perguntava se North, não tivesse indo embora como seria. Mas não encontrava resposta.

James lhe consolava dizendo que as pessoas escolhiam seus caminhos.

Nesses anos todos, nunca encontrou nenhum irmão seu que tinham fugido de casa ao se tornarem maiores de idade.

Quando James se aposentou, foram viver numa pequena povoação perto do deserto, adorava estar ali, das noites de lua cheia, ou quando não poder olhar todas as estrelas da varanda da casa que tinham na saída da cidade.

Com os anos foi encontrando a paz nisso tudo.   Ele seguiu trabalhando, consertando maquinas, qualquer aparelho que caísse em suas mãos.   Juntos eram uma família.

SONHO OU PESADELO

                                    

Não sabia quando tinham começado esses sonhos ou pesadelos, se lembrava vagamente de recortes dos mesmos, ao longo dos anos, mas as figuras que sempre apareciam eram as mesmas, inclusive com um detalhe, cada vez mais se parecia a um dos homens, o outro ele já conseguia desenhar com detalhes.

Era um excelente aluno em todos os cursos, mas amava pintar, desenhar, coisa que para seu pai não fazia muita graça.  Queria que fosse como ele um advogado de respeito.

Seu avô tinha sido criado por um inglês, herói da primeira guerra mundial. Era uma história que passava de geração em geração.   Quando viu uma fotografia do mesmo, riu, seu pai perguntou por quê?

Foi até seu quarto, disse que sonhava com ele a muito tempo, contou do sonho, seu pai o levou a um psicólogo, cada vez que sonhava ou tinha como um pesadelo, ia ao psicólogo para conversar sobre o mesmo.

Este o aconselhou a escrever detalhadamente tudo que se lembrava, pois as vezes eram conversas entre duas pessoas.   Umas eram confusas, outras muito nítidas.

Assim fez, se despertava, escrevia como tinha sonhado a cena.

Inclusive, quando eram conversas intimas.

Uma delas, o homem que sabia que era seu bisavô, cobrava do outro ter coragem de assumir o romance entre eles.   O outro lhe chamava de louco, nos lincharão, estas disposto que tua família te coloque porta afora de tua casa, que te corte o grifo de dinheiro, vamos viver de que, se minha família sequer desconfia, posso me dar por morto para ela.

Um dos sonhos recorrentes, eram que estavam em dois aviões diferentes, devia ser a primeira guerra mundial, pois ele foi pesquisar sobre esses aviões.  Depois de algum tempo era capaz de desenhar os mesmos a perfeição, podia sentir a sensação de liberdade que ambos os homens sentiam, era como que todos seus problemas terminassem.

Depois de cada batalha, se sentavam a conversar sobre o que tinham sentido, eles na verdade nunca viam a morte que provocavam.

As brigas entre os dois quando estavam sozinhos, que tinham que se separar depois de fazerem sexo eram impressionantes, os dois eram diferentes em tudo, o que ele sabia que representava era moreno como ele, nariz de judeu, o outro era loiro, alto, com o corpo cheios de sardas, isso ele sabia com detalhes, pois nos sonhos, era como se visse pelos olhos do outro, sentia a sensação dele beijando a pele do outro.

Quando tinha 16 anos, um dia sonhou que penetrava o outro, teve um orgasmo, ficou confuso, o sonho era erótico demais para escrever tudo, sabia que seu pai, volta e meia dava uma olhada no que escrevia, era muito controlador.

Falou com o psicólogo, tinha medo de que o mesmo se repetisse continuamente.  Falava muito com o psicólogo do controle que seu pai fazia em tudo que ele escrevia, passou fazer outro diário, disse ao pai que os sonhos tinham parado.   Tinha que escolher aonde queria estudar, com as boas notas que tinha em todas as matérias seria fácil conseguir uma bolsa de estudos, inclusive descobriu que havia um fideicomisso, hereditário desde seu bisavô, até agora, seu pai tinha estudado com ela. Nunca poderiam tocar nesse dinheiro, a não ser que fosse para estudos.

Resolveu estudar em Oxford, se inscreveu para várias entrevistas.

O pai não queria que ele fosse, sim que ele estudasse direito na Sorbonne ou na Escola que estudavam todos os políticos do pais.

Se negou rotundamente, queria experimentar estar mais livre, seu pai fez como sempre todas as chantagens possíveis, quem lhe defendeu nisso, foi para surpresa de todos, seu avô.

Deixe esse menino viver a vida, o controlas como se estivesse em cima de algodão.

O voto decisivo foi o da sua mãe, foi com ela para a entrevistas.  Passou em todas, podia estudar o que quisesse, se expressava muito bem inglês.

Ela providenciou alojamento para ele, não queria estar dentro da universidade, acabaram achando um pequeno apartamento em cima de um restaurante de uma senhora, que lhe forneceria comida.   Era pequeno, mas estava pela primeira vez sozinho, pois em casa repartia quarto com seu irmão menor.   Esse estava contente, tinha o quarto agora só para ele.

Falou antes de partir como psicólogo, que lhe recomendou um que tinha conhecido em um simpósio.

Seu pai foi leva-lo no aeroporto, antes ele teve uma conversa com seu avô, este falou muito do homem que tinha sido como um pai para ele.  Pude estudar, ir em frente por causa dele, caiu na vila aonde estava minha mãe, de um avião bombardeado, ficou preso numa árvore, ela lhe ajudou, meu pai tinha morrido durante a guerra, ela o escondeu até terminar tudo, quando ele esteve bem, foi levado para Inglaterra, lá fez alguma coisa que sem querer provocou que voltasse para cá.   Minha mãe estava na miséria, ele cuidou de todos, comprou esse apartamento, nos trouxe para cá, se casou com ela para termos um nome diferente, nos colocou na escola, criou esse fideicomisso, para todos fazerem universidade.  Todos fizemos, tivemos oportunidade que muita gente não teve, na segunda guerra, fomos todos para Inglaterra, nos colocou nos melhores colégios de lá.  Mas nessa época estava sempre triste, escutava as noticias dos bombardeios de avião, falava muito nisso, que os que estão dentro ao contrário dos soldados rasos, que vem tudo que acontece, nunca sabem o que acontece depois com as vítimas, a maioria não sobrevivem.   Quando começaram os bombardeios em Londres, nos levou para o interior, aonde se colocou a ajudar todos os jovens que precisavam, que fugiam de Londres.   Era muito fechado nele mesmo, dizia que tinha amado só uma vez na vida, que tinha sido uma tragedia.  As vezes o via, sentado em alguma praça, chorando muito. Mas nunca dizia por que, alegava que eram as notícias que o chateavam.  Mal acabou a guerra, voltamos para cá, ele pensou em ir para Israel, chegou a ficar um tempo lá, mas desistiu, disse que não tinha estomago para ver outras guerras.

Viveu muito, morreu com 99 anos, apesar de não sermos filho dele, eres muito parecido com ele, lhe passou duas fotos, uma dele vestido como o via em sonho, outra com o homem que também aparecia em sonhos, no último dia lhe entregou dois diários, aqui encontraras a história dele, não mostre para teu pai, que não entende dessas coisas, nem está aberto para isso.

Levou com ele todos os desenhos que tinha.   Seu pai no carro, perguntou como tinha sido a conversa com seu avô, não lhe dê muita atenção, pois esta velho demais.   Olhou o pai, tinha se casado muito tarde, tinha os cabelos brancos, seu avô ao contrário, ainda tinha os bigodes completamente negros, já tinha 94 anos, mas de uma lucidez aguda, conseguia se lembrar de tudo.   Dizia ele que fazia exercícios mentais.

Mal se instalou começou a ler o diário do seu bisavô, contava primeiro de aonde tinha saído, sua mãe era a única filha de uma família mais ou menos de classe, mas completamente arruinada, a casaram com 16 anos com um homem de 60 anos, que queria um herdeiro para sua fortuna, era um judeu rico.  Ela era muito bonita, encontrou no diário uma foto dela, daquelas em sépia, realmente para os padrões da época era linda.  A exibia na alta sociedade de Londres, além da grande propriedade que ele tinha.  Quando ela ficou gravida, odiava isso, mas tinha sido comprada para isso, reproduzir.  Quando ele nasceu, viveu entregue as babas, que eram judias, falavam com ele em hebreu. Foi sua primeira língua.  A mãe vivia desfrutando da alta sociedade, seu sonho era ter um título, como tinham as amigas, quando o marido morreu, uma ano depois se casou com um conde, que precisava de uma tapadeira, era pédofilo, rico como ela, possuía uma propriedade com uma linda mansão ao lado das terras que ela tinha herdado, seus irmão pensaram que ela ia deixar que administrassem, mas nada mais longe da verdade, odiava a família por a ter vendido ao velho, mas tinha aprendido com o marido, a administrar tudo.   Quando percebeu que o conde rondava seu filho, o colocou num colégio interno, aonde ficou basicamente os primeiros anos de estudos, um dia um moço das cavalariças, matou o conde por ter abusado dele, ser apontado por todos como o garoto do Conde.  O atirou desde o andar aonde estava os quartos dos empregados, pelo vão da escadaria.

Ficou viúva de novo, trouxe o filho para casa, o colocando nas melhores escolas, foi quando conheceu o homem que seria o amor de sua vida, um Barão alemão, que vivia na Inglaterra, era aparentado com a alta nobreza do pais.   Ele ficou louco por ela, apesar da fama que tinha de viúva negra, pelos dois casamentos anteriores.  Não só se casou com ela, como adotou seu filho, visto não ter nenhum, viveram bem, ela administrava tudo, além de ser da alta sociedade de Londres.  Ele estudou nos melhores colégios, agora ostentado um título.  Seu novo pai, o queria como se realmente fosse seu filho, isso provocava ciúmes de sua mãe.

Quando foi para Oxford, ficou contente, se livrava dele.   Lá conheceu o amor de sua vida, tinham a mesma idade, o outro se dedicava ao esporte, compartiam banheiro que ficava entre os dois quartos.  Um dia entrou o outro tomava banho, o chamou para tomarem banho juntos, se sentia terrivelmente atraído pelo outro.   Faziam sexo no banho, depois, nas noites que não tinham festa, o outro vinha dormir com ele, mas voltava ao nascer do sol para seu quarto, para não pensarem que tinham alguma coisa.   Mas durante o dia, raramente se encontravam, pois Hubert tinha uma vida dedicada ao esporte, ele ao contrário, estudava os grandes filósofos, literatura.  Eram o oposto em tudo.  

Hubert, estava sempre cercado de garotas, loucas para casarem com um Lord Rico, não estudavam na universidade, mas sim numa escola de senhoritas.  Mas depois de estar com elas, dizia ao Joseph, contigo, quero ter o que não tenho com elas, se deixava penetrar, como adorava.

Quando começou a primeira guerra, o pai adotivo do Joseph morreu num atendado em Londres, porque era alemão.  Os dois entraram para a aeronáutica, uma coisa recente, aviões que aguentavam atravessar o canal da Mancha.   Adoravam essa sensação de liberdade, de voar como os pássaros, mas em terra firme a coisa era diferente Hubert, era como um macho alfa, atraia todas as garotas, Joseph ficava de lado, não se sentia atraído por elas.

Mas quando podia Hubert corria para seus braços, mas isso já não era tudo que ele queria, sim uma relação, para a época isso era impossível, mas ele não entendia.

Um dia ameaçou Hubert que queria estar mais tempo com ele, senão ia contar para todo mundo o que acontecia quando estavam juntos.   Hubert ficou uma fera, não gostou da ameaça, lhe devolveu com outra, disse que ia contar para o capitão, que normalmente ele não descarregava suas bombas, só o fazia quando já estavam voltando, as vezes em cima do mar, ou num lugar que não tinha nada a não ser campo.

Na volta de uma missão, aonde tinha tentado antes de partir, beijar Hubert a força, viu que este ficava por último, coisa rara nele, sempre era o primeiro a soltar suas bombas e voltar, ficou de sobre aviso.   Quando receberam ordens de voltar, Hubert soltou suas bombas, ele como sempre por não querer matar inocentes, deixou para soltar antes de cruzarem o mar outra vez, sabia que o outro estava atrás dele, foi quando sentiu que estava sendo metralhado, mas não via avião nenhum, entendeu então que era o amor de sua vida que o queria matar, soltou suas bombas em cima de um pasto, tentou manobrar, mas o tinha colado atrás dele, escutou sua voz pelo som, nunca ameaces alguém que é melhor do que tu.   Sentiu uma rajada, que lhe cortou a asa direita, sentiu que caia, escutou a risada do Hubert no ouvido.  Por sorte conseguiu sair do avião, caiu em cima de uma árvore muito alta, ficou ali preso, com as pernas quebradas, bem como os braços, foi socorrido por uns campesinos franceses, o esconderam na casa de uma moça viúva com dois filhos, o marido tinha morrido no avance alemão.

Ali ficou até se recuperar, era impossível manter contato com Inglaterra, apenas conseguiu avisar sua mãe que estava vivo.

Quando acabou a guerra, aprendia a andar de novo.  Agradeceu muito a ela, bem como aos dois filhos que tinham se encarinhado dele.

Voltou para Londres, descobriu que tinha sido dado como morto num ataque aéreo. Tinha morrido sem pena nem gloria, só sua mãe sabia que ele estava vivo.  Teu querido amigo Hubert, vive dizendo para todo mundo que não era de estranhar, que eras um covarde, que não soltavas as bombas.

Quando tentou falar com ele, estava fora, visitando umas propriedades da família, tinha se casado com uma rica herdeira.

Mas foi ao ministério da aeronáutica, contou toda a verdade, que tinha tido seu avião derrubado pelo que pensava que era seu amigo.  Quiseram colocar panos quentes, mas claro sua mãe era aparentada com a família real.   Ele insistiu, quando Hubert voltou, deu de cara com ele, ficou apavorado, quando foi chamado a depor num processo.  Sem papas nas línguas, Joseph contou por que ele tinha feito isso, o romance condenado dos dois, que ele se comportava como macho alfa, mas na cama era uma donzela.   Isso ficou fora do processo, mas o escândalo estava feito, o Hubert foi condenado a cinco anos de prisão.  Nesse meio tempo sua mãe morreu de um enfarte, ele se tornou herdeiro de tudo.   Vendeu a maioria das propriedades, o titulo não lhe interessava, transferiu o dinheiro para Suiça, voltou para França, procurou as pessoas que o tinham ajudado.  Sua amiga dessa época, estava na miséria, se propôs a casar com ela, não escondendo sua condição de homossexual.   Ajudou todos os outros que tinha cuidado dele, inclusive o médico, construindo uma clínica para ele.  Foi quando criou o Fideicomisso, para que os seus filhos, pois tinha adotado os filhos da amiga, bem como os filhos dos que tinham cuidado dele, quisessem ir à universidade.

Terminou seu curso na Sorbonne, se transformando em professor da mesma.  Comprou um belo apartamento para a família, os queria como seus filhos.  Nunca escondeu o que tinha acontecido com ele.

Só voltava a Londres, por negócios, pagava uma família para cuidar da mansão que era de sua mãe, agora sua.  Mas nunca mais se interessou em saber do Hubert, a magoa que tinha do homem que pensava que o amava, que tinha tentado mata-lo, ainda por cima faze-lo parecer um covarde era muita.

Nunca mais se apaixonou por ninguém, no último diário contava algumas aventuras, que tinham com pessoas famosas da literatura, mas confessava que não passava disso de uma aventura, amar nunca mais.

Sem querer, talvez porque agora sabia de tudo, deixou de ter pesadelos, um dia saia de uma aula, deu de cara com um rapaz, ficou parado de boca aberta, o outro também, institivamente estenderam as mãos.  Sonho muito contigo, disse o outro, no que foram conversar, descobriu que o outro era bisneto do Hubert.   Sabia mais ou menos da história, ficaram amigos, se sentiam atraídos um pelo outro, mas nenhum dava um passo em frente.

Saiam as vezes pela noite para jantar, Dominic, confessava que as garotas ficavam atrás dele, mas não lhe interessavam, esperava o homem que aparecia em seus sonhos.

Lhe contou a historia dos dois, lhe deixou ler o diário de seu Bisavô.   Ah, agora entendo, muita gente fala do tempo que esteve preso, mas nunca claramente o que fez para isso.

Por isso a família, deixou de frequentar a sociedade, se transformando numa família rural, sem grandes pretensões, como seguem meu pai, meus tios.  São gente bruta, até mesmo grosseiro, sou o primeiro a ir à universidade depois dessa história toda.

Quando foi a Paris, visitar o avô que estava mal, contou o que tinha acontecido, ele só lhe disse que tivesse cuidado, pelo visto não são gente de se confiar.

Esteve no enterro dele, perdia além de tudo um amigo, pois era a pessoa que mais tinha ligação.

Quando voltou, sentiu que estava sendo seguido, conversando com Dominic, este disse que tinha contado aos pais, que o tinha conhecido, armaram uma grande confusão, como se tu fosses o culpado do que aconteceu com eles, são velhos problemáticos.

Entendeu o que se passava, nunca tinham ido para a cama, nem feito sexo, algo os impedia disso.

Nas férias voltou para casa, resolveu que não queria isso na sua vida, transferiu seu curso para a École de Beaux Arts, seguiu sua vida, um dia encontrou nas ruas Dominic.  Estava de férias em Paris, o levou ao seu studio, disse que em breve ia se casar, eram suas férias antes de contrair matrimonio.  Sem querer acabaram na cama, ficaram como loucos um pelo outro. 

Mas claro, tudo tem um preço, apareceu o pai dele, exigindo que ele voltasse, para se casar, foi então que conheceu um outro Dominic, um homem submisso a família, que tinha medo de perder o dinheiro que estes lhe davam.  Foi embora sem se despedir, ainda pensou em fazer como seu bisavô, um escândalo.   Mas deixou passar, seguiu sua vida, começou a ficar famoso, tinha agora dinheiro próprio, com exposições em toda a Europa, acabou indo para os Estados Unidos, para se ver livre da família, se instalou em NYC, foi fazendo nome como tinha feito antes, não dependia de ninguém.  Conheceu gente, se apaixonou, desapaixonou, viveu, quando já tinha quase cinquenta anos, um dia fazia uma grande exposição, se encontrou de novo com o Dominic, que apareceu para ver.

Foram tomar alguma bebida, este confessou que estava tratando de negócios na América, seu casamento não tinha dado certo, não tinha filhos, tinha se divorciado, me liberei da minha família, agora tenho meu próprio negocio que comecei do zero.

O levou para sua casa de praia, em Fire Island, parecia que o tempo não tinha passado com o que sentiam um com o outro, adorava nas noites de lua fazer sexo com ele, beijando suas costas cheias de sardas.

Nunca mais se separaram, agora não tinham que ter a família no meio para impedir nada.

RAIMUNDO DOS PRAZERES

                                     

Tinha nascido num dia qualquer, do ano ninguém sabe ninguém viu, vivia encostado na casa de uma parente, junto com seus outros cinco filhos, quem não chegava na hora não comia, ele ia a escola descalço, pois nem uma havaiana tinha.  Sua camiseta só mudava se alguma senhora a quem fazia favores lhe dava uma já usada.

Fazia favores a todas a troco de moedas de notas pequenas, não lhe incomodava, escondia tudo no seu esconderijo, numa lata velha de biscoitos que tinha encontrado no lixo.

As vezes tinha que recorrer a isso.   Mas uma coisa não fazia, favores aos da droga, essa era a ladainha da madrinha como chamava a senhora que o deixava dormir em sua casa.

“nada de fazer favores aos das drogas, nada de tomar drogas grátis, se eu descubro os vou moer de pancadas”.

Ele sabia o que eram as drogas, tinha vistos os dois que eram seus pais, morrerem com a boca aberta nas escadarias da favela.  Não deviam ter mais de 16 anos, madrinha passava quando o viu chorando, o pegou nos seu cobertor sujo de vomito, todo cagado o levou para sua casa, caso contrário iria para sabe-se lá para aonde.

Aliás todos da sua casa eram assim, ela na verdade não tinha nenhum filho, trabalhava duro para dar comida aos seus filhos resgatado, era semianalfabeta, sabia ler o número dos ônibus que a levava as casas que ia limpar.   Mas a verdade era que não dava conta de cuidar dessas crianças, alguns vizinhos a ajudavam, algumas mulheres a chamavam de louca.  Como podia pegar filhos de quem ela sequer sabia quem era.

Mas alguém lhe denunciou, um dia apareceu uma mulher gorda, com uns cinco policiais da favela, levou todos, ainda estavam dormindo.  Lá foi ela para a delegacia com eles.

Reconheceu que todos os tinha encontrado abandonados, ou ao como no caso dele, os pais mortos por causa das drogas.

Ele foi parar num orfanato ali em Laranjeiras, eram muitos meninos, alguns mais claros, outros negros como a noite, raramente alguém vinha para adota-los, pois quem ia querer entrar no meio dessa papelada toda, para adotar um negrinho.

Ele era peculiar, era escuro, mas tinha os olhos verdes, nem ideia por quê.

Quando lhe perguntaram seu nome, disse que não sabia, tampouco sua idade.

Os médicos o examinaram, claro estava subnutrido, menos mal que no orfanato não faltava comida.   As freiras tinham uma lista de nomes, lhe perguntaram qual gostaria de usar, ele optou por Raimundo, mas tem que pensar num sobrenome.  Tinha escutado o padre falar na missa dos Prazeres terrenais, escolheu isso, era o que queria, assim virou Raimundo dos Prazeres, ele sempre acrescentava quando perguntam, Prazeres Terrenais.  Riam dele, mas isso ele estava acostumado.

Sempre tinha muita fome, descobriu um jeito, acabavam as aulas básicas, se metia na cozinha para aprender com a freira Gertrudes, foi aí que encontrou uma coisa que gostava, lhe parecia que o tal Deus se referia a isso, os prazeres terrenais era isso, saber fazer comida, para não passar fome.

Nessa cozinha tinham dois tipos de comida, a das freiras que eram melhor, o da garotada que era uma gororoba, mas ele foi aprendendo a colocar um pedaço de carne no meio da sopa para dar substância, ou alguma coisa de legumes no meio do arroz. Para que soubesse melhor.

Mesmo o feijão, ela fazia uma panela imensa, com carnes, quase uma feijoada, mas para os garotos servia sem elas, dizia que as freiras deviam se alimentar melhor, pois tinham que cuidar deles, ele quando a ajudava a servir, sempre metia no seu prato um pedaço de carne seca, ou linguiça.   Com os anos ele sabia fazer de tudo.   Devia estar com uns 16 anos, já que não sabia ao certo, ela arrumou para ele ir trabalhar num restaurante ali perto. Aliás era o que não faltava pelas redondezas, foi aprendendo de tudo, comida nordestina, comida árabe, italiana, o bom era que aproveitava para comer, o que sobrava de noite, levava para os amigos, este o esperavam, pois sabia que iriam compartir alguma coisa boa.

Quando fez 18 anos lhe deram uma certidão de nascimento, Raimundo dos Prazeres, pais desconhecidos, nascido no Rio de Janeiro.  Tinha duas opções, entrar para o exército, mas tinham lhe falado, lá só fazem gororoba.    Ele agora ganhava para cozinhar, foi passando de restaurante em restaurante, dormia num quarto desses de empregadas dos edifícios antigos, de uma senhora amiga da freira.   Se levantava cedo, deixava café pronto para ela, buscava o pão, se preparava para ir trabalhar, usava a cabeça raspada, fazia o mesmo com o sovaco, tomava um banho a consciência, ela lavava a roupa branca dele, assim estava sempre limpo.

Agora trabalhava num italiano em Copacabana, nas suas horas de descanso, entre o meio-dia e a noite, tomava um banho de mar.   Em pouco tempo tinha aprendido todos os pratos do restaurante, ali na Fernando Mendes.   Quando um dos sócios resolveu se separar, iria abrir outro em Ipanema, o levou com ele, como chefe, agora ganhava mais, alugou uma quitinete, no final de Copacabana, não tinha que se preocupar com a roupa de trabalho, era lavada no restaurante com as toalhas das mesas, guardanapos.   Pelo menos, ficavam sem gordura, que pareciam se grudar nas roupas.

Colocava uma camiseta, suas calças jeans ia andando para casa, tinha um tipo impressionante, tinha crescido com os anos, 1,80 metro, negro com a noite, mas os olhos verdes se destacavam.

Um dia vinha caminhando, mergulhado em seus pensamentos, um gringo passou por ele, lhe falou alguma coisa, levou um susto, perguntou se estava falando com ele.

Um mal português o homem disse que sim, que vinha caminhando, que ao passar por ele, era como ver um gato que andava, por causa dos seus olhos.

Perguntou se queria tomar uma cerveja?

Ele agradeceu, mas não bebia.

O homem riu, outras coisas fazes?

Ele demorou para entender, poucas vezes tinha feito sexo, não lhe sobravam tempo.

Examinou o outro detalhadamente, o que viu, gostou. 

Foi para o apartamento desse, um pouco maior que o seu.  O outro quando o viu nu, ficou como louco.   Disse que era americano, que dava aulas numa escola.

Foi uma noite impressionante, ele acabou ficando, dormiu ali com ele, mas se levantou cedo, tinha que ir para casa se preparar para mais um dia, contou falando devagar que era cozinheiro.

Podemos nos ver outra vez, lhe perguntou o outro.

Claro que sim, tinha adorado esse contato com sua pele branca, cheia de sardas, tinha os cabelos ruivos, disse que se chamava Tom Jones.

Ele disse o seu, o outro disse que realmente ele dava muito prazer.

O esperava todos os dias, faziam sexo, conversavam, Tom aprendeu a se manejar mais no português, trazia comida para ele, riam sentados na pequena sala, compartindo comida de madrugada.

Só não podia compartir a vida muito com ele, só tinha um dia livre, a segunda-feira que ele não trabalhava.   Este um dia lhe perguntou se não tinha mais namorados?

Nunca tive nenhum, eres o primeiro, tampouco me sobra tempo, você sabe.

Tom agora fazia uma coisa, lhe ensinava a falar inglês, contou que era de Boston, disse que lá tinha muitos emigrantes brasileiros, bem como portugueses.

Passaram a viver juntos, Tom ficava impressionado com sua limpeza, como tomava um banho, porque raspava o sovaco, o desodorante para não ter cheiro.

Dizia que gostava de fazer sexo com ele no escuro, por causa dos seus olhos.

Cinco anos depois, ele teria que voltar para os Estados Unidos, lhe perguntou por que não vinha com ele.  Tinha certeza de que conseguiria emprego por lá, além de não querer se separar dele.  

Pensou muito, falou com um companheiro, ele disse, não tens nada a perder, se o gringo te paga o bilhete, aproveite.

Não tinha muitas pessoas com quem falar, tampouco falava que fazia sexo com outro homem, mas conversou com o dono do restaurante.  Este lhe disse que não custava tentar, se não desse certo o contrataria outra vez.

Quando falou com Tom esse ficou contente, estava apaixonado por aquele homem negro que o enchia de prazer, para não dizer outra coisa.

Foi com ele tirar passaporte, depois o visto, tinha amigos no consulado americano, conseguiu um visto para ir trabalhar, uma coisa rara.

Ele nunca tinha andado de avião, quando muito de metro, ou ônibus, mas Tom lhe deu um comprimido, quando viu já estavam em Boston.

Tinham saído do Rio, com 40ºgraus, chegaram em pleno inverno, nevava inclusive, levava só um abrigo de plumas de segunda mão que Tom tinha conseguido com um companheiro.

Ficou como uma criança, olhando a neve cair, sobre sua cabeça.  Ria muito.

Mas essa alegria acabou quando chegaram na casa dos pais do Tom, esses eram preconceituosos, ficaram furiosos, como se atrevia a trazer um negro para sua casa, ainda mais se estava fornicando com ele.

O jeito foi irem para um pequeno hotel.   Dois dias depois estava já trabalhando num restaurante português, pois sabia fazer muitas das comidas.  Ali se sentia em casa, apesar da maioria serem portugueses se entendiam bem, com o salário, alugou ele mesmo um pequeno studio, Tom vinha ficar com ele, embora sofresse pressão dos pais.

Um dia o viu chorar muito, lhe contou que tinha ido para o Brasil de uma certa maneira para escapar disso tudo, desses pais tão castradores.

Um dia contou que tinha oferta para voltar, se ele queria ir junto?

Parou para pensar, estou bem aqui, já falo um bom inglês, nem tive chance de aprender outras maneiras de cozinhar, tenho uma vida boa, foi honesto, disse que não, que queria ficar.

Seu patrão conseguiu a documentação para ele.   Tom ainda lhe chantageou pois achava que o amava.

Ele não podia dizer isso, estava bem com ele, pelo sexo, era uma comodidade, não tinha que procurar ninguém para fazer.   Estas parecendo teus pais contigo.

Ele foi embora, depois de uma boa noite de despedida.

Ele ficou, seguiu trabalhando ali, uns dois anos, saia com um dos amigos, um africano de quase dois metros de altura, de Moçambique, esse adorava no sábado depois do trabalho ir dançar, o levava a um lugar aonde basicamente iam africanos.

Um dia conheceu um, nunca tinha feito sexo com outro negro, foi um embate, os dois tinham os instrumentos do mesmo tamanho, riram muito com isso, o outro lhe disse que gostava de fazer tudo, mas o queria penetrar também.   Passou os dias seguintes com o rabo doendo, mas tinha gostado.

Um dia um parente do dono, veio de NYC, disse que precisava de gente no seu restaurante em Long Island.

Lá foi ele, para uma nova aventura, nos seus dias de folga, saia para conhecer Manhattan, adorava, quando chegou o inverno, fazia o mesmo, pois ver essa cidade coberta de branco lhe encantava.    Um dia passou na frente de um restaurante, que tinha uma aparência incrível, viu um cartaz que procuravam ajudante de cozinha, embora ele tivesse registro de cozinheiro, entrou, falou com o dono que chamou um loiro altíssimo, magro, que o olhou de cima a baixo sorrindo.  Lhe disse que tinha trabalhado em todo tipo de restaurante, que desde que estava ali, trabalhava num restaurante português preparando bacalhau, e outras coisas.

O homem com um sotaque incrível, lhe perguntou se ele sabia preparar peixe como se fazia no Brasil.

Claro que sim, posso demonstrar.

Foram para a cozinha, viu que o homem tinha duas panelas de barro, se desligou, fez uma moqueca de uma das maneiras que sabia fazer, com o pouco que tinha ali, disse que faltava cebolinha, além de um bom coentro, que ele comprava no mercado em Long Island, para usar no bacalhau.

Preparou um pouco de arroz a maneira brasileira, serviu ao cozinheiro, bem como ao dono do restaurante.   Os dois acabaram com tudo, riram da cara dele.

O dono perguntou se ele sabia fazer comida francesa? 

Talvez faça com outro nome, mas não tenho problema em aprender.

O contratou com o dobro do salário que ganhava.  O problema é que na ilha os alugueis era caros, para ele podia pegar a primeira barca da manhã, assim passava no mercado, comprava condimentos para fazer o que eles pudessem querer.

Jean Pierre, ficou impressionado com ele, com a facilidade que tinha de aprender, logo era seu braço direito, lhe foi ensinando a falar em francês, os condimentos, em pouco tempo, só falava em francês com ele.

Por um período de tempo se ausentou, teve que ir ver sua mãe na Normandia, acabou passando mais de três meses, nesse tempo ele tomou conta da cozinha.   Os clientes diziam que o sabor agora era outro, claro ele fazia as coisas dando-lhe mais sabor.

Saiu inclusive uma reportagem com o dono do restaurante, com ele ao seu lado.

Quando Jean-Pierre voltou, não gostou, pois queria que tudo voltasse atrás.

Começou a colocar defeito em tudo que ele fazia, ele foi se desesperando.  O dono que era um tipo que sabia das coisas, lhe disse que ia lhe pagar uns meses de férias, que ele fosse para Paris, lhe disse aonde fazer cursos, que se ele podia se especializar em doces franceses, que lhes faltava ali.

Foi com muito medo, mas ao chegar no aeroporto, um amigo do seu patrão o esperava, era cozinheiro em seu próprio restaurante.

Disse que tinham lhe falado muito dele.

Se quiseres pode vir trabalhar comigo, eu levo a parte da noite do restaurante que tenho, ao meio-dia, temos um movimento médio, mas de noite estamos cheios de turistas.  Lhe arrumou um pequeno apartamento em Montmartre, aonde ele ficou contente.   Dois dias depois de flanar pelos lugares turísticos, começou seu primeiro curso.   O professor ficou impressionado, bastava explicar um vez para ele aprender.  Ao meio da tarde, ele chegava no restaurante de François, começava a preparar as coisas para a noite, isso era bom, pois ganhava por fora. Os clientes adoravam o arroz que ele, fazia, algumas vezes fazia arroz com brócolis e bacalhau, que acabou entrando na carta.  

François ria muito, meu amigo perdeu um cozinheiro perfeito, quando acabou os cursos, o convidou para ficar com ele ali em Paris, lhe ofereceu um bom salário, ele na verdade nem tinha gastado o dinheiro que tinha trazido.

Falou com o dono do restaurante de NYC, quem atendeu foi o Jean-Pierre, este lhe disse que o outro tinha tido um enfarte, que agora o restaurante era dele, que não o queria ali.

Isso o fez tirar um peso da consciência, falou com o François se isso era verdade?

Ele telefonou, confirmou isso com a mulher do mesmo.  Ninguém sabe como aconteceu, mas Jean-Pierre tinha se tornado uma dor de cabeça para ele, um dia perdeu a paciência, acabou tendo um enfarte.

Ele resolveu ficar, nada o segurava do outro lado.

Descobriu um mercado em Belleville, aonde podia comprar coisas que lhe faltavam, agora apresentavam uma salada de grão de bico com bacalhau, bem como peixe de outras maneiras, um dia viu folhas de palmeiras, se lembrou como a senhora que cuidava deles fazia peixe, experimentou fazer no lugar que faziam peixe na brasas.

Quando serviu ao François, esse ficou impressionado, pois o peixe basicamente não tinha temperos, lhe explicou que assim faziam os índios no Brasil.

Virou um prato da carta do restaurante, ele agora basicamente levava a cozinha, nos dias de mercado ia comprava coisas boas para fazer algum prato, conseguiu com uma das mulheres que disse que tinha uma plantação durante o verão, de mandioca, passou a trazer para ele, quando fez pela primeira vez Bobo de Camarão, François disse que estava de lamber os beiços, tinha aprendido a falar coisas em português.   Um dia se atreveu em fazer bolo de mandioca.

Foi um sucesso.  Logo estava na carta também.

Apareceram numa reportagem no Magazine do Le Monde, começou a aparecer gente importante para comer.   Um dia François o chamou no salão, estava ali o embaixador brasileiro, queria saber se ele podia fazer um jantar para uns quantos convidados do governo.

Disse que podia fazer no seu dia de folga, caso contrário não, falou baixinho com o François, cobre antecipado, pois brasileiro é sem vergonha na hora de pagar, principalmente se for do governo.

O homem pensou que ele ia fazer por amor a Pátria, nem pensar.

Fez uma moqueca, acompanhada de pirão, com arroz branco, farofa, com tudo que tinha direito, depois de sobremesa, bolo de mandioca com sorvete de maracujá.

Foi um sucesso.

Isso fez com que a clientela do restaurante agora tivesse que fazer reserva de noite.

Um sugeriu ao François que aumentasse o restaurante, ele disse que não, mais trabalho, menos tempo para nos mesmo.   Precisamos do nosso dia de folga para poder descansar, além de que quando aumentas também perdes em qualidade.

Um dia François convidou vários clientes jornalistas, ele preparou uma mistura de comida francesa, com coisas que ele tinha inventado, um quiche de mandioca com camarão, bem temperado, o famoso peixe na folha de bananeira, o bolo de mandioca com sorvete de maracujá.   Foi um sucesso.   Todos falavam dele, um chegou a convidar para que ele desse um curso.    Pediu desculpas, mas não lhe sobrava tempo.

Quando chegou o verão, François resolveu, reformar o restaurante, assim ele tinha pelo menos dois meses livre.    Queria ver o mar, que não via a muito tempo.  Com as economias que tinha, que já eram de bom tamanho, resolveu ir ao Rio de Janeiro.

Se deslumbrou ao chegar, como se fosse a primeira vez que pisava essa terra.  Os restaurante que ele tinha trabalhado nem existiam mais, fez contatos com os lugares mais finos da cidade, olhavam aquele negro de olhos verdes, riam na cara dele, mostrava as reportagens que tinham feito com ele, nada.

Riu muito, casa de ferreiro, espeto de pau.   Não teve dúvida, em pouco tempo estava farto da praia que tinha querido tanto ver, dos amigos que não acreditavam nele, já era um lugar que ele nem conhecia.  Ainda foi ao orfanato, para falar com a irmã que o tinha ensinado a cozinhar, essa foi a única que ficou feliz com ele, o abraçava, fico feliz por ti meu filho.  Quando contou da decepção que tinha tido, ela soltou uma grande gargalhada, deixar o que tens lá, com um bom salário, por isso daqui, estás é louco.

Um dia quando te aposentes, venha viver numa cidade pequena a beira mar, economizes, monte um pequeno restaurante, desfrute teu resto de vida.

No dia seguinte ele voltou para Paris, as obras estavam adiantada, a cozinha era mais moderna, começou a experimentar pratos que nunca tinha feito, que voltaram a sua memória, preparou uma carta diferente, uma funcionária ao meio-dia, em que as pessoas estavam com pressa, outra para a noite quando as pessoas vinham realmente desfrutar de uma boa comida.

François ficou encantado, inclusive lhe propôs como sócio.    Fez o que a irmã tinha falado, foi economizando, não precisava de um apartamento imenso, nada disso, para quem tinha vivido num orfanato, achava que tinha mais que o necessário.

Tinha acrescentado uma pequena lavanderia no porão do restaurante, o que ele queria era sempre ter roupa limpa.

A nova carta fez sucesso, nunca deixou de aprender nada, agora a senhora que plantava mandioca nas aforas de Paris, tinha um cliente cativo, mas isso para pratos de verão. Os cronistas falavam sempre nele.

Tinha romances esporádicos, François ria com ele, no nosso tipo de trabalho é assim Raimundo, estamos sempre em aventura, talvez o dia que nos aposentamos seja melhor.

François tinha um romance que durava alguns anos, com um personagem do mundo político, mas que nunca o apresentava a ninguém, porque não queria sair do armário.

Reclamava sempre disso, que vivia de migalhas, um dia que ele estava triste, Raimundo o convidou para sair, pois tinham o dia livre.   Ficaram conversando ali nas margens do Sena vendo o pôr do sol, por detrás da Torre Eiffel, sem querer começaram a contar suas vidas, desde infância, sempre no sacrifício. Sem se dar conta, acabaram de mãos dadas, daí para o primeiro beijo, foi um passo.

Ele estava contando ao François o que tinha falado a freira do orfanato.

Eu adoraria fazer isso contigo, quando se deram conta, já estavam vivendo juntos a mais de 15 anos.  Queriam comprar o local, os dois estavam cansado disso tudo, do desgaste, da falta de tempo.  Nesse meio tempo, foram mais de uma vez ao Brasil.  Andaram procurando o lugar que gostariam de viver.

Acabaram encontrando um lugar fantástico no sul, em Santa Catarina, uma praia pequena, que no momento tinha duas pousadas nada mais.

Compraram um terreno ali.   O mesmo arquiteto que tinha feito o projeto de reforma do restaurante, foi com eles até lá, criou uma pousada, mais puxada para as francesas.

Assim fizeram, venderam o restaurante, juntaram seu dinheiro, que no Brasil era muito, enquanto construíam a sua pousada com seu bistrô, fizeram contatos com pescadores, o pessoal quando comia a quiche de mandioca com camarão ficavam loucos.  Era uma fusão das duas maneiras de cozinhar.   Eles mesmo viviam ali, começavam o dia com um banho de mar, as pessoas riam, um muito branco o outro muito negro.  Achavam engraçado como passavam o tempo todo conversando, pois além de tudo eram amigos.

Acabaram saindo em várias reportagens, uma vez que foi ao Rio, convidou a freira para passar uma férias com eles.  Ela já uma senhora de idade, ria muito sentada com ele na cozinha, era baixa temporada, foi ela mesma se lembrando de receitas que nunca tinha feito, mas estavam guardadas na sua memória, receitas que segundo ela, era de sua avô, uma negra bem sacudida, foi então que ele descobriu que tinha genes africanos.

Aprendeu com ela a elaborar tudo, de uma outra maneira, riam os dois na cozinha, preparando algum prato, que depois o François diria, lambi os beiços.

Passou um bom tempo com eles, já que no Rio ninguém precisava mais dela.

Ia todos os dias a missa numa igreja ali perto da pousada.  Eu devia ter preparado mais garotos como tu, para serem cozinheiros, mas só mesmo tu, pois eu sabia que estavas ali, para não passar fome.

Anos depois quando soube da morte dela, foram os dois ao Rio de Janeiro.  Na época ela já estava com mais de 95 anos.

Trouxeram com eles, dois garotos, que tinham sido deixados ali de pequeno, um muito branco, outro tão negro como o Raimundo.

As pessoas quando vinham comer no restaurante diziam que o nome não podia ser mais acertado, chamava-se Prazeres.

Assim foram vivendo o resto de seus dias, olhando o mar, sentados na varanda do pequeno chalé que viviam, vendo o por do Sol.   Os meninos crescendo, com uma boa educação, as vezes os hospedes riam quando passavam pelo chalé vindo dos praia, alguns se sentavam ali com eles, para ver o pôr do sol.

A VIDA É UMA CILADA

                              

A VIDA NOS PREPARA CADA CILADA.

Meu nome é Hans Hoig, não sou filho de nenhuma família rica, todo ao contrário, de uma família disfuncional, não sei quem é meu verdadeiro pai, já passaram tantos pela casa, que nem imagino, minha mãe é uma mulher complicada.

A última vez que teve problemas fui parar num lugar para jovens sem casa, enquanto ela fazia reabilitação, quando saiu arrumou um emprego, conseguiu me recuperar, fomos viver num edifício em que viviam emigrantes, famílias com problemas, pertencem ao governo da Alemanha.

Estou falando de Berlin, aonde sempre vivi.  Ela nunca falou em outro lugar de aonde podia ter vindo, isso as senhoras da segurança social, não paravam de me perguntar.

Se surpreendiam com a minha idade, com dez anos eu parecia ter cinco, o que foi uma sorte, me colocaram na parte dos menores, assim era mais difícil sofrer abusos.

Mal voltei a viver com ela, já tinha outro homem, depois desse mais três, enquanto se mantinha fora das drogas bem, mas este último, era toda uma figura, cheio de tatuagens, uma pessoa complicada, agora eu tinha quatorze anos, mas aparentava ser uma garota, todo mundo na escola fazia gozação a respeito, inclusive as garotas perguntava que batom usava, pois tinha os lábios como que cor de rosa.   Era loiro, com os cabelos esticados para cima como um ouriço, coisa que fazia para parecer mais velho.

Um dia cheguei em casa, o sujeito estava de drogas até a alma, tinha uma força incrível, tentei lutar, mas conseguiu me colocar uma algema, que não sei de aonde tirou, ou se a usava com minha mãe, abusou um, duas, até três vezes de mim.  Tinha as pernas presas com uma fita isolante, o que me impedia inclusive de lhe dar um chute.

Quando ela chegou, estava todo coberto de sangue.

A desculpa dele, era que eu o tinha provocado, foi uma discussão, imensa, veio a polícia, ambulância, fui parar no hospital, com desgarro anal.

Pela primeira vez gostei de estar num lugar que todo mundo me cuidava, já que em casa, era quem cuidava de tudo, colocar a roupa para lavar, para secar, dobrar, passar, jamais, para que.

Esquentava minha comida no micro-ondas, semanalmente chegava uma caixa de ajuda da Cruz Vermelha, com comida congelada.   Eu me virava.

Quando voltei para casa, a assistente social, me perguntou se eu queria voltar.

Claro que sim, quem vai cuidar de minha mãe.

Eu estava preparado para a seguinte pessoa que me importunasse, roubei numa loja, uma navalha daquelas que apertas um botão, sai uma lamina imensa.

Agora trabalhava de tarde no armazém de um Turco, aonde fui pegando corpo, pois fazia de tudo, ajudar a descarregar, repor mercadorias, por último limpar todo o local, na hora de fechar.  Para um menino franzino, foi um ótimo exercício, não precisava ir a um ginásio, para ficar mais musculoso.

O tal sujeito ficou dois anos na prisão, nesse tempo ela como que tentou se regenerar, não consumia drogas, fazia o caminha de casa para o trabalho, vice-versa.

Parecia até ter crescido mais, mas minha cara de criança, acreditava que me acompanharia toda a vida.  Agora eram os machotes do edifício, que as vezes se insinuavam para mim, sabiam o que tinha acontecido, alguns chegavam a tirar o pau para fora da calça, eu simplesmente tirava minha navalha do bolso, perguntava se queria ficar sem ovos.

Ninguém me enchia o saco.

Estava no final do curso, sabia que nunca iria a uma universidade, gostava sim de escrever as coisas do meu cotidiano, inclusive as propostas que recebia na loja, o turco ficava uma fera com os clientes, esses diziam que me queria só para ele, mas nunca se insinuou.

Era um homem até bonito, mas muito sério, segundo sabia, ele tinha tido um desses casamentos arranjados, a mulher chegou de alguma vila da Turquia, odiou estar na Alemanha, aonde ela não entendia nada, ele falava muito mal o turco, pois tinha vivido desde criança em Berlin.

Finalmente ela foi embora, justo depois que eu comecei a trabalhar, quando alguém perguntava, ele dizia, não sabe do que me livrei, agora pelos menos meus pais, me deixaram em paz, dizem até que posso casar com uma alemã.

Um dia cheguei em casa, achei estranho escutar som dentro de casa, pensei minha mãe chegou mais cedo, entrei com medo, que tivesse perdido o emprego, pois era uma coisa que vivia acontecendo, reclamava sempre não ter nascido para dar o duro.

Mal abri a porta, lá estava o meu abusador, tentou me agarrar, peguei um vaso pesado que estava em cima da mesa, acertei sua cabeça.   Caiu desmaiado, rapidamente, peguei a fita isolante, tapei sua boca, bem como passei pelos pulsos, ele despertou, tentava se livrar, apontava para seu piru.

Conseguiu se soltar um pouco, disse que tinha se masturbado cada dia pensando no meu cuzinho virgem, que voltava para me levar com ele.

Lhe tapei a boca outra vez, consegui prender as pernas, ele tentava de todos os meios se livrar, não sei como se livrava da mordaça, depois entendi que devia ter passado em volta da cabeça.

Seguiu falando, se eu fosse com ele, ia me penetrar a cada dia, me levaria a loucura.

Perdi a noção das coisas, ele não ia parar de falar, tirei a navalha do bolso, fiz uma coisa que tinha visto nos filmes policiais, lhe cortei a jugular.

Nisso minha mãe chegou, ficou horrorizada, agora o que fazemos, mas sabia que não tínhamos como escapar, rompeu uma garrafa que estava por ali, cortou todo o resto do pescoço, me disse, vá para teu quarto, encha uma mochila com coisas tuas, pegue o dinheiro que está embaixo do ladrilho do teu armário, não é muito, mas te dará para se safar.

Estava aturdido, ela me ajudou, colocou inclusive na mochila um saco de dormir que tinha roubado numa loja, para usarmos no inverno tão duro, assim pelo menos tens aonde dormir.

Parecia totalmente calma, fez uma coisa me beijou, espero meu filho que consigas sobreviver melhor do que eu, mas nunca, cai, no conto das drogas, elas só nos destroem.

Não sei se pelo barulho, tinham chamado a polícia, quando sai, ela estava desfigurando o homem totalmente com a garrafa, estava cheia de sangue.  Me mandou subir para a terraça de cima do edifício, me lembrou de um lugar que tínhamos vivido antes, um velho armazém não muito longe dali, durante uns dias não vá as aulas, podem te procurar por lá, nem volte ao teu trabalho, pois será o primeiro lugar que irão, me fez sinal para subir rápido.

Lá de cima vi tirarem o sujeito num saco negro, mortinho da silva, não me arrependia, lastimava por causa dela, mas num dos seus momentos, ela tinha me dito, assim me livro da culpa que tenho de ter colocado esse homem dentro de casa.

Quando a colocavam no carro, olhou para cima, sorriu.  Não tinham me visto pois estava escondido do outro lado.

Subiram dois policiais para saberem se eu estava ali, me encontraram, no que chegou a assistente social, com um carro, me colocaram no banco detrás, minha mãe me fez um gesto, de como sair.   Armou o maior escândalo no carro que estava, se distraíram, abri a porta do outro lado, estava num beco, que sabia por aonde ir, sai correndo, quase me cai a navalha, mas escapei antes que me visse.  Ainda escutei uma vizinha dizendo aonde trabalhava, ou seja não poderia ir para lá.

Fui para o tal armazém, vi que a parte baixa estava cheia de tendas, muita gente, mas nós tínhamos vivido no último andar, que tinha uma caixa d’água em cima, por isso o banheiro tinha água.   Pelo menos podia me lavar, sabia aonde me esconder, o faziam da vez anterior.

Estava morto de fome, ela tinha colocado um pedaço de pão, na mochila, foi o que comi nessa noite.  Abaixei, fiquei escondido num vão escutando as conversas que rolavam por ali, alguns já sabiam da história, um homem que nunca tinha visto, mas parecia um tipo machão, soltou que ela merecia, quem manda se envolver com quem não deve.

Lhe mandaram calar a boca.

Falavam em ir no dia seguinte a um edifício que tinha pegado fogo, sempre se encontravam coisas que podiam aproveitar.

Dormi dentro do saco, bem escondido, ali haviam portas encostadas na parede, que faziam um oco, para alguém se esconder, como era escuro, dava jeito.

No dia seguinte passei pela loja, vi que tinha um guarda na porta, com certeza, esperando que eu aparecesse.

Fui ao tal edifício, vi que o pessoal saia com roupas, o fogo tinha sido nos últimos andares, por isso ninguém se atrevia ir até lá.

Pois eu subi, até o andar aonde tinha se originado o fogo, num dos apartamentos, o menos queimado, vi um armário fechado, quando abri a porta, tinha uma mulher morta ali, os bombeiros não tinha revistado, passei por cima dela, pedindo desculpas, mas sobreviver era o primeiro.   Vi um casaco de couro, perfeito, ela tinha o mesmo tamanho que eu, era chamativo, pois era vermelho, depois dentro de um saco, tinha um casaco novo, desses de pelo imensos, que se usavam agora, coloquei tudo dentro de uma bolsa, fui rebuscando, na parte de cima do armário, tinha uma maleta, abri, surpresa, tinha dinheiro, bastante por sinal, tinha que esperar uns dias, quem sabe conseguia alugar algum lugar.

Duas calças jeans novas, muito modernas, uma cheia de pedras na lateral, me dariam cara de um garoto gay, mas não me importou, as camisetas serviam também, enchi a maleta, saiu pela escada de incêndio, que balançava um pouco, mas já estava escuro, fui para meu esconderijo. Agora saia, comprava comida, quando o armazém estava vazio, tinha uma entrada lateral, que só usavam se a polícia aparecia, aparentemente estava protegido.

Escutei num café dois garotos mais ou menos da minha idade, discutindo aonde se prostituir, falavam das estações de metrô, dos banheiros públicos mais seguros.

No dia seguinte estavam ali no mesmo horário, comentavam como tinha ido à noite, um deles disse que o homem tinha estado pesado, mas que tinha conseguido o dominar, explicou como, tenho uma navalha o velho quando viu, ficou pálido, parado, me ofereceu sua carteira, sai pitando dali.   Riam muito com isso, por um tempo, agora terei que trocar de estação, falou em outra mais central.

Eram dois garotos bonitos, pensei se o filho da puta me fudeu grátis, porque não ganhar dinheiro com isso.  Queria guardar o que tinha encontrado por mais um tempo, o que minha mãe tinha me dado, já tinha se acabado.

Agora andava pelas ruas, procurando um lugar para morar, mas não podia ser por aonde tínhamos vivido.   Nessa noite fui a primeira estação que eles tinham comentado, justamente havia uma hora para isso, os jovens ficavam encostados pelas paredes, esperando uma oportunidade.

Um deles, o mais esperto, me reconheceu do café, me perguntou se era minha primeira vez, me sinalizou um homem com a gola do casaco levantada, aquele ali, é um padre, só vai te pedir para ficar nu na frente dele, enquanto se masturba, não tem muita graça, gema um pouco, ele te dará dinheiro.  Ficará te pedindo perdão todo o tempo.

Deixei o homem se aproximar, devia ter uns cinquenta anos, o garoto disse antes, peça 100E, nunca menos.

Foi o que fiz, queria saber como era, me levou a um hotel, feio que havia ali escondido numa ruela, me disse para ficar atrás dele, para o homem não me ver direito, pagou, lhe deram uma chave, subimos, foi exatamente o que o garoto tinha falado, pediu que eu tirasse toda a roupa, que me deitasse na cama, ficou sentado numa cadeira se masturbando.

Aproveitei depois, para tomar um banho quente, sai pitando, me deu duas notas de 100E. Quando lhe disse que era a primeira vez.

Marcou comigo, dois dias depois, me disse aonde, era nas traseiras de uma igreja.

No dia seguinte fui a cafeteria, encontrei com meu conhecido, ele se matou de rir, filho da puta, a mim só meu deu 100E.   Lhe falei do convite para ir até a traseira de uma igreja.

Ele mora lá o filho da puta, mas agora tenha cuidado.

O vi sozinho, perguntei pelo amigo, ele disse que tinha tido o azar de ligar com um policial, que caçava putos.  Vai ficar uns dois dias fora.

Nessa noite fui com ele a outra estação, que era mais limpa, os tipos eram diferentes, vais fazer sucesso, com essa tua boca, vão querer que chupes muitos caralhos.   Mas depois se lava, não passa nada.   As putas fazem isso, depois enxaguam a boca com muita água, estão pronta para outra.

Se aproximou dele, um homem, até bonito, ele disse que não podia, mas se queria me levasse a mim.   Podes ir, eu conheço o sujeito, tem um piru mínimo, se tens um grande, é o que ele vai querer.

Foi isso que aconteceu, o sujeito era até bonito, quando o viu nu, ele mesmo achava que tinha um bom tamanho, quando se masturbava, o sujeito ficou como louco, porra tenho que comprar camisinhas, mas o homem tinham, o excitou ao máximo, ele gostou, depois se sentou em cima, ficou como louco.   Dizia eres gostoso, me ensinou como devia me mexer, quando soube que era minha primeira vez, me deu quase 400E, que tinha escondido nos sapatos.

Pediu uma nova chance.  Mas marcou com ele antes, foram comer, o homem falava bem, depois foram para sua casa, agora sabia como se comportar, este o chamou para viver com ele.  Disse que ia pensar, mas agora só pagou 100E

Falou com o amigo, esse ria, ele sempre se apaixona, mas em seguida, quer é te explorar, passar para os amigos, vera são todos mais velhos, ele fica com uma parte do dinheiro, nem pensar.

Nessa noite apareceu o outro rapaz, ficaram amigos, ele disse que acabou fazendo sexo com o policial, mas que era muito violento, verdade ou não estava cheio de marcas pelo corpo.

Se ficas uns dias sem vir, é como se fosse novo na praça.

Fez isso durante meses, confiava nos dois, acabaram alugando um apartamento entre eles, por ali perto.    Quando vez 18 anos, tirou seus documentos novos, como maior de idade, mas claro aparentavam sempre muito menos.

Foi quando conheceu um Turco, magro, peludo, com barba, na primeira vez o levou para o hotel, queria um sexo total, quando viu seu corpo branco, só com pelos em volta do sexo, ficou como louco, pela primeira vez, alguém lhe fazia carinho, este soltou, que para ele o sexo tinha que vir acompanhado disso, para se sentir menos culpado de procurar sexo na rua.

Marcaram para o dia seguinte, ele disse que era professor, foi para sua casa, um apartamento simples, meus pais estão me dando uma trégua, pois ainda preciso terminar a faculdade, querem me casar de qualquer jeito com alguém que não conheço.

Gostava de estar com ele, pois quando chegavam tomavam banho juntos, ali começavam se excitar. Mas gostava mesmo era de ficar sentado em cima de seu piru.

Perguntou se estudava, foi honesto, tive que interromper, adoraria fazer universidade, escrevo o que acontece comigo.  Ele pediu para ler, foi corrigindo os erros de gramática, se encontravam duas ou três vezes por semana.   Um dia disse que os pais tinham ido a Turquia, buscar uma noiva para ele.  Vamos aproveitar, vens ficar comigo, eu te ensino tudo que sei, para que possas ir à universidade, ou acabar teus estudos.

O ajudou a saber de sua mãe, tinha sido assassinada na prisão, diziam suicídio, mas parecia outra coisa, já nada lhe ligava a nada.

Assef, era um cara legal com ele, ainda propôs o seguinte, ele se casava, mas montava um apartamento para ele, estava apaixonado.

Aprendeu tudo que podia com ele, mas não deixava de ver os amigos, esses diziam aproveita, por tudo que é bom dura pouco.

Ia era guardando dinheiro, abriu com o que tinha escondido, uma conta no banco, inclusive com o que ia ganhando, guardava seu cartão de credito no tênis, como lhe tinha ensinado.

Assef estava ficando ciumento, não queria que fosse se encontrar com seus amigos, começou a ficar violento, um dia que chegou tarde, quis lhe dar uma surra, lhe chamou de puta.

Ele simplesmente tirou a navalha, o ameaçou, o prendeu numa cadeira, sabia aonde guardava dinheiro, a vida acabava de lhe mostrar mais uma cilada.

Então me amas, verdade, queres é mandar em mim.

Menos mal que sempre que ia, colocava um gorro, óculos escuros, os poucos vizinhos, nunca o tinha visto, se fosse assim, não dava para reparar.

Levou as poucas coisas que estavam lá.

Mas o deixou preso, com a porta semiaberta, lhe disse para gritar, quando acordasse, lhe deu um murro na cara.

Os amigos, riram, aprendeste bem, sempre é assim, quando a coisa é boa demais, sempre acaba numa cilada.

Quando voltou a sair pela noite, agora usava o casaco vermelho, que chamava a atenção, mas camisetas justas negras, para evidenciar que era muito branco, aprendeu com os amigos a acentuar seus lábios. 

Não sabia ao certo quanto homens teve, mas sempre era o mesmo, quando tirava a roupa, ficavam loucos com seu piru, ele não tinha crescido muito, mas o dito cujo sim.  Então era a alegria da paroquia como ele dizia.   Mas claro quando pediam que não usasse camisinha, ele tirava o time de campo, se ficavam violento, ele se defendia.

Agora os três iam durante o dia a um ginásio fazer boxe, assim podiam se defender.

Seu melhor amigo, confiou nele suas economias, ele era mais esperto, agora aplicava o dinheiro do banco, para render, nada de ações, mas o Deutsch Bank tinha um bom rendimento.

Fez o amigo abrir uma conta, mas o autorizou a aplicar o dinheiro para ele, se acontecia alguma coisa, ele tinha direito a mesma, era um acordo deles.

O outro arrumou um velho, foi embora, o que foi bom, pois eram só os dois no pequeno apartamento, que arrumaram direito.

Seu amigo se fazia chamar Jack, mas na verdade se chamava Joachim, contou que era judeu, que seus pais eram ultra ortodoxos, agora viviam em Israel, eu fugi no próprio aeroporto, era uma vida que não queria para mim.

Se davam bem, inclusive algumas vezes faziam sexo entre eles.  Adoravam fazer isso, quando algum cliente pedia, faziam a três, mas no final pediam para ver os dois fazendo sexo.

Joachim adorava ser penetrado por ele, os homens se masturbavam vendo os dois fazerem isso.

Mas claro cobravam mais por isso.

Ele começou a ensinar durante o dia, tudo que tinha aprendido com o Assef.

Um dia Joachim estava com uma gripe fantástica, sem querer ligou com o puto policial, que tinha prendido seu amigo.

O outro se insinuou tanto, tinha um corpo fantástico, que lhe disse que sabiam quem ele era, mas se queria prendê-lo, primeiro tinham que fazer sexo.

O filho da puta, o levou para a floresta, ninguém o tinha visto entrar em seu carro, escondido numa ruela, o levou, não era um carro oficial, estendeu uma manta no chão, mas foi ele quem o penetrou, o sujeito gostava de violência, quando tentou lhe dar um murro, levou ele um, tirou sua navalha, lhe cortou a jugular.

Podia ter roubado o carro, com um pano, limpou o assento aonde tinha estado, bem como a porta, como tinha visto nos filmes.

Nos dias seguintes ficou em casa, tinha agora uma pequena televisão, saia em todos os telejornais, acabou se levantando o que o sujeito fazia. Prendia os que se prostituiam, depois, os passava para outros policiais.    A polícia estava atrás de quem tinha feito isso, mas não tinham nada.

Na rua em que se encontraram, não havia câmeras, aliás o policial, fazia de propósito isso, pois senão o veriam fazendo o que não devia.

Arrumou um emprego numa loja de um árabe, este era casado, a mulher sempre aparecia de manhã para levar o dinheiro ao banco.  Ele fazia todo o serviço, no final limpava tudo, sabia que era gravado, saia pela traseira, mas obrigou o homem a deixar sair pela frente dizendo que assim era gravado indo embora, não queria confusão.

O homem o atraia, mas tinha medo de se envolver com ele, lhe tratava muito bem, sempre lhe dava algum presente.  Uma camiseta, um tênis, alguma coisa, sempre que passava por ele no armazém, fazia uma coisa, como se não percebesse, roçava a mão pelo seu piru.

Falou com Joachim, esse se matava de rir, não parava em emprego nenhum gostava mesmo era da noite.

Um dia tinha terminado de limpar, quando passou pelo escritório Ahmed, estava nu com as calça na cadeira, lhe pediu de joelho por favor, pois estava farto de sua mulher.

Acabou fazendo sexo com ele, agora queria todos os dias, mas ele se safava, era um sujeito sem imaginação, só sabia fazer um papai, mamãe, se colocava deitado na mesa, queria que o penetrasse.

Foi lhe ensinando como devia fazer, o levava a loucura, mas dizia que para fazer isso tinha que pagar por fora.   Cada coisa que lhe ensinava, o homem ficava como louco, queria mais. Da mesa, se podia ver se alguém entrava na loja, cada vez ficava até mais tarde.

Um dia viu sua mulher entrando, tinha horror a ela, arrumou uma desculpas, disse que ia ao banheiro, saiu por detrás, passou pela caixa forte que estava aberta, pegou um maço de dinheiro, o deixou ali sem calças deitado na mesa, saiu pela porta detrás, quando ela começou a fazer escândalo, não ia escutar o ruido da porta se fechando.

Nunca mais voltou, tinha levado um bom dinheiro, no outro dia já estava no banco aumentando sua aplicação, viu que tinha um bom dinheiro, fez umas provas, podia entrar para a faculdade, como tinha dúvidas, falou com um professor, disse que o queria era aprender a escrever.

Nessa época, aconteceu uma tragédia, uma dia Joachim chegou ferido em casa, o levou para um hospital, não teve conversa, falou quem o tinha agredido, o tinha gravado no celular.

Foi operado, mas claro, o tempo que levou indo para casa, sangrando, tinha causado problemas, acabou tendo que fazer duas operações, ia todos os dias ao hospital, depois das aulas, Joachim achava que não ia superar, pediu um advogado, deixando para ele seu dinheiro oficialmente se acontecia alguma coisa.

Dias depois quando chegou, estava outra vez na sala de operações, tinha tido uma recaída em uma das operações.

Não sobreviveu, o professor que o tinha ajudado, a escolher sua carreira, era judeu, o ajudou como enterro, inclusive rezou um Kadish ao pé de seu túmulo.

Ele pagou tudo para seu melhor amigo.

Teve que contar ao professor Helmult, a quem os alunos chamavam de Muti, pois era baixinho.

Riam quando os viam juntos, tinham mais ou menos a mesma altura, quando passou o ano, ele tinha já outro professor, agora saia com Muti, para conversar sobre livros, ele lia as coisas que tinha escrito.   Escreveu uma história baseado no que Joachim lhe tinha contado.

Muti lhe perguntou se era verdade, que tinham se prostituido.

Contou para ele sua história, ficou de boca aberta.

Vê como são as coisas, eu sempre que não aguento mais vou a um banheiro público, ou algum lugar, mas deixei, pois um dia encontrei um aluno, esse me fez chantagem para passar de ano.

Nunca mais fui, tenho minha sensualidade, fechada em mim.  Me apaixonei por ti, no dia que vieste pedir conselho, gosto de ler o que escreves, infelizmente fico excitado.

Começaram a sair, acabaram na cama, Muti era como uma explosão se sexo, parecia um boneco de plástico na cama, era capaz de coisas incríveis.

Sua forma de expressar o prazer era escandalosa, levaram saindo já vários anos, ele dizia que ficava preocupado que ele fosse embora de noite.  Se quiseres meu apartamento é grande, podemos compartir, se não quiseres dormir comigo, eu entenderei, mas teria um lugar para ler, escrever.

Adorava a biblioteca que ele tinha, os livros que tinha ansiado em ler, mas não tinha dinheiro.

Muti não sabia aplicar seu dinheiro, o ensinou como fazê-lo, ele o beijava, dizendo, meu menino sabe de tudo.

Nunca demonstrava ciúmes, um dia inclusive lhe disse, se ele tinha necessidades de ir com outros ele entendia, pois não era uma pessoa interessante.

Ele ao contrário pensava ao contrário, pela primeira vez tinha medo de ser abandonado, gostava de estar com ele, conversar, de fazer sexo, as explosões dele no orgasmo, com ele fazia de tudo, se completavam.

Tampouco se escondiam, saiam para jantar, ir ao cinema, ao teatro, o levou pela primeira vez ao teatro de Brecht, ele amou, discutiam depois a representação, o texto, se interessou em aprender a escrever para o teatro.

Depois de revisar mil vezes o que tinha escrito a respeito do Joachim, Muti apresentou a um editor.  Tinha revisado tantas vezes, que nem precisou de uma revisão ortográfica.

Foi lançado, em breve era um livro de culto, entre os dos grupos LGBT.  Pois falava cruamente de jovens que se prostituiam para sobreviver, que muitos poucos chegavam a alguma coisa.

Para sua surpresa, quando foi convidado a dar uma palestra a um grupo, Muti, foi com ele, ele que se guardava tanto antes, agora, ia com ele por aí.

 Lhe dizia, me abriste um mundo novo, fiquei tantos anos com medo, que contigo, sou capaz de ir ao fim do mundo.

Nas férias foram fazer uma viagem, uma coisa que ele sonhava, ir a Paris, foram a todos os lugares possíveis.   Muti, queria saber como era o submundo, já que nunca tinha coragem, contigo vou.

Acabaram fazendo sexo a três, com outro rapaz, Muti ficou louco quando o viu penetrar o outro, mas quando foram embora, dizia, prefiro que faças isso comigo. Fiquei com ciúmes, ele teve que reconhecer, que tinha ficado também, quando Muti fez o mesmo.

Chegaram ao hotel, fizeram sexo como gostavam, começaram embaixo do chuveiro, caíram molhados na cama, levaram mais de uma hora, se explorando cada vez mais.  Desta vez os dois urraram no final.  Depois ficaram as gargalhadas, pois se escutava movimentos nos quartos aos lados.

Agora não tinham limites entre eles, Muti dizia que se sentia jovem outra vez.  Se vestia diferente, os outros professores comentavam, mas ele não se preocupava.

Ele começou a fazer um curso de escritura para a roteiros, pois o editor, com seu segundo livro, que tinha uma parte autobiográfica, das suas andanças, disse que tinha um produtor interessado.

Queira que ele escrevesse uma história sobre esses jovens que viviam no submundo de Berlin.

Muti o ajudava, discutiam os personagens, iam pela noite observando os jovens, nas entradas das discotecas, tomando drogas para se liberarem.

Muti dizia que se fizessem isso, nunca mais sairiam da cama.

Ele lhe contou que nunca tinha tomado drogas, pois imaginava que ficaria adito, por causa de sua mãe.   Se um dia descubro que o estas fazendo vou embora.

Mas não precisavam, pois os dois juntos, era um caso sério.  O sexo para eles era um jogo de descobrimentos.  Um dia ficou completamente louco, com Muti sentando no seu sexo, ao mesmo tempo se fazendo uma felação, como parecia ter o corpo elástico, podia, ele tentou mas não conseguia. 

Quando o roteiro ficou pronto, o produtor disse que era cru demais, se não podia romancear um pouco.

O senhor me desculpe mas esse mundo não existe romance, é cru mesmo, arrastou o homem para um dos lugares no metrô, viu que o mesmo ficava excitado com a quantidade de rapazes por ali.  Queria se arriscar, mas na hora ficou com medo, era casado.

Começaram a revisar com o que seria diretor como fariam.  Mas volta e meia o produtor, falava com ele, nada de besteira, nem sabia que tinha esse instinto homossexual.

Estava numa sinuca de bico, pois não sentia mais desejo pela sua mulher, com que levava casado a anos, sem filhos.  Que o sexo entre eles, era chato.

O aconselhou a ir a um psicólogo, ele tinha guardado lá no fundo de sua cabeça, uma relação na sua juventude com um colega de escola, tinham descoberto juntos a masturbação, mas nunca chegaram as vias de fato, logo o amigo arrumou uma namorada, se afastando dele.

A mulher pediu divórcio, tinha uma oferta de trabalho na américa.

Muti não tinha ciúmes, as vezes conversavam os três juntos, Berg dizia que tinha se masturbado mil vezes lendo o roteiro, mas não queria ir por esse caminho, tinha medo de se viciar no sexo.

Nessa época Muti ficou doente, mil exames, nunca descobriam o que acontecia.

Finalmente deram com um câncer em sua cabeça, pois começou a desmaiar, os médicos lhe deram pouco tempo de vida, pois não existia tratamento possível.

Eles tiveram uma conversa séria, tu segues tua vida, eu nunca tinha amado alguém, foste tudo isso para mim.   Ele tinha medo de fazer sexo com ele, pois podia lhe provocar alguma coisa, mas Muti lhe convenceu ao contrário, adoraria morrer fazendo sexo contigo.

Foi o que aconteceu, numa das noites inspiradas do Muti, fizeram de tudo que se podia imaginar, acabaram dormindo abraçados como gostavam.  De manhã, estava morto.

Para ele, foi uma perda irreparável, Berg quando soube, chorou ao seu lado, Muti era seu confidente, com ele, podia falar de tudo, tinha paciência com ele, pois tinha passado pelo mesmo.

Faltava escrever o último capítulo da série, que seria gravado dentro de um mês, como o personagem tinha muito do Joachim, lhe doía de duas maneiras, não ter o Muti ali para lhe ajudar a pensar no personagem, era seu fim, não escrevia como tinha acontecido, mas sim imaginando que ele não tivesse conseguido voltar para casa.

Berg que os tinha visto trabalhar juntos, perguntou se ele queria ajuda.

Ele aceitou, pois podia revisar com alguém o texto do personagem, contou ao Berg toda a vida que ele sabia do Joachim.

Então é verdade que conviveste com ele?

Sim, viu que Berg ficava chocado ao mesmo tempo excitado.

Um dia lhe pediu se podia o deixar explora-lo, Muti antes de morrer me contou como faziam sexo, me apaixonei por ti, ele percebeu, mas nunca tive coragem como agora de te falar, mas não quero te forçar nada, primeiro porque te respeito.

Ao contrário do Muti, Berg era um homem de quase 1,90, ruivo, cheio de pelos, que lhe davam muita vergonha, quando tirou sua roupa, só faltou ele esconder seu sexo.  Estava muito nervoso.

Com cuidado, o foi explorando, aquele homem imenso virou um adolescente que descobre os prazeres do sexo.  O deixou fazer tudo o que queria com ele, parecia um boneco em suas mãos, quando teve seu primeiro orgasmo, só faltou bater no peito.   Rindo depois dizia, me senti como o Tarzan que urrava, batendo peito.

Pensou que ele liberado iria atrás de outros mais jovens, mas nada ficou com ele, passava mais tempo na casa que tinha herdado do Muti, aonde tinha vivido os melhores momentos de sua vida.   

A série ganhou vários prêmios, sempre lembravam do Muti como um dos roteirista.

Um dia Berg lhe trouxe vários recortes de jornal, sobre o policial que tinha sido assassinado.

Um jornalista tinha descoberto mil coisa sobre ele, de aonde tinha saído, daria um bom roteiro.

O jornalista vendeu a ideia, não queria escrever para a televisão.

Os dois foram buscar nas suas fontes, quem era afinal o policial.

Foram descobrir que tinha vivido num orfanato a vida inteira, que tinha abusado dele violentamente, muitas vezes.  Por isso gostava da violência.  Nessa pesquisa também descobriram que tinha assassinado alguns dos garotos com quem tinha feito sexo, mas que a polícia tinha acobertado.

Era um personagem difícil de escrever, mas tinha se acostumado a fazerem isso juntos, Berg descobriu uma parte nele mesmo que era isso, analisar os personagens como ele tinha visto Muti fazer com Hans.

Se encaixavam a perfeição, queria que ele fosse viver no apartamento de luxo que tinha, ele se negou, se quiseres ficar aqui, tudo bem, o dia que te canses de mim, sem problemas.

O relacionamento deles era diferente em termos, que Berg era mais romântico, gostava de ficar fazendo carinho horas, abraçado, o beijando, vindo de um homem tão grande, era difícil de imaginar.

Um dia o pediu em casamento, ele olhou espantado ao Berg, queria saber por quê.

Sempre sonhei em ter ao meu lado, uma pessoa que me entendesse, com quem posso falar de tudo sem problemas, contigo consigo isso, já não tenho medo de esconder nada.

Vou pensar, ok

Começaram a filmagem da nova série, foi complicado encontrar um ator que quisesse fazer o papel, encontraram um ator turco, que tinha terminado um comédia, quando falaram com ele, riu, um papel realmente para um ator.

Começou a trabalhar todo o texto com o mesmo, esse ficou interessado.  Dizia que entendia o personagem, pois ele mesmo vivia escondido dentro dele, seu nome as vezes era motivo de burla, pois podia ser um nome de mulher, Karin.

A cilada foi que Berg se apaixonou por um dos atores, daqueles que querem subir na vida, falou com ele a parte, cuidado, esse tipo que subir a tuas custas.  O rapaz queria o papel principal, depois de fazer sexo com Berg, quando tocou no assunto, ele se sentiu usado.

Veio furioso, bem que me avisaste, agora fico sem me entender novamente.

Isso é o que a vida nos prepara, uma cilada atrás de outra.

Ele estava preocupado, pois na verdade era ele quem tinha matado o policial, agora sabia que naquela noite, se não tivesse se defendido, teria morrido.

Para salvar as aparências, pediu ao Berg já que era bem relacionado, se conseguia o lauto, bem como imaginavam que tinha acontecido a morte do mesmo.

Karin entendia a cena como ninguém.  Agora aparecia sempre por sua casa, para analisar alguma cena que ia filmar, como devia se sentir.  Berg a princípio ficou com ciúmes, mas depois de sua aventura, o relacionamento entre eles tinha morrido, ele estava confuso.

Como podia ter pedido que se casasse com ele, em seguida o teria traído com um rapaz idiota.

Falaram muito no assunto, acreditava que tinha sido porque o rapaz lhe fazia lembrar sua paixão de juventude.

Procure por ele.

Berg seguiu seu conselho, descobriu que o mesmo era professor em Hamburg, que era divorciado, se encontraram, foi colocar fogo na palha, na época o outro tinha ficado assustado com o rumo que iam as coisas entre eles, tinha tido um relacionamento durante alguns anos com outro professor.

Assim se sentiu livre para enfrentar as investidas do Karin, esse antes lhe contou que para começar a fazer cinema, tinha tido sexo com um diretor, não tinha vergonha, queria atingir meu objetivo.   Me senti uma puta, mas valeu, provei que era bom.

Um dia estavam os dois falando do personagem, ele não conseguia atingir o clímax dele a respeito da violência.

Hans lhe explicou mais uma vez, imagina, esse homem, foi vítima de muitos abusos, violentos, por isso tinha essa raiva dentro dele.

Então terei que ser violado para isso, disse rindo, vais me fazer esse favor.

Nunca fiz sexo dessa maneira, para tapear, tenho sexo com atrizes, com manequins, mas sexo assim nunca.

O provocou tanto que Karin, ficou como louco, quando o penetrou, sem que ele esperasse, ficou parado.  Lhe forçou um pouco, sem que soubesse por que Karin começou a corresponder, no final gritava de prazer.  Filho da puta, me transformaste em tua putinha.

Voltaram a fazer sexo, se explorando, Karin era uma pessoa que se podia classificar de gostoso, tinha um corpo fantástico, um membro como ele, grande, os dois se satisfaziam.

Um semana antes da estreia, Karin disse que estava pronto para assumir o relacionamento deles, não quero esconder, que encontrei a pessoa da minha vida.

Nada de bandeiras Karin, tens uma carreira, vamos seguir, mas não precisamos agitar bandeiras, olha o Berg, uma semana me pede em casamento, em seguida se envolve com um jovem que lhe fez lembrar de seu passado.   Iremos levando, se um dia realmente tivermos certeza disso, bem. Ok.

Karin concordou, mas basicamente vivia com ele.

Havia uma cena, em que o personagem se lembrava de uma violação que tinha sofrido, ele o fez a perfeição.  Depois dizia, fechei os olhos, pensei na nossa primeira vez, quase tive um orgasmo.

Uma das cenas era brutal, era o policial, sendo abusado por um homem cheio de tatuagens, imenso, Karin era mais baixo, um pouco mais alto que ele.

Quando viu o ator que fazia o papel, riu, ou me apaixono, te abandono, ou matarei o mesmo, na história, ele realmente matava o sujeito.

A cena ficou fantástica, era o encontro do policial com seu passado, o desencadeante de tudo, o ator tatuado, levava horas em maquilagem, pois não tinha tatuagem nenhuma no corpo inteiro, gozava o policial, agora te descobri sua puta de uniforme, a luta entre os dois, com a diferença de tamanho, motivo pelo qual depois se livrou do crime, alegando defesa pessoal, como se o outro o tivesse agredido, a solução foi um tiro, isso realmente tinha acontecido.

Mas a cena depois do tiro, com o personagem ali, arrasado, sem querer lançou Karin para papeis fortes.

Quando terminou a série, foi chamado para fazer um filme, um pouco similar, era um policial, com um companheiro corrupto, que abusava de seu poder, por saber que o seu companheiro tinha um amante com quem vivia.

Karin agora sabia como se mover com esse tipo de papel dubio.

Estudava o personagem com ele, analisavam o texto.  Esperou ele terminar o filme, queria ir de viagem, Karin queria ir junto de qualquer maneira.  O esperou.

Foram para bem longe, fizeram uma viagem que um dia teria feito com o Muti, de ir conhecer a Nova Zelândia, como qualquer turista, alugaram um carro, foram visitando o pais, indo à praia como qualquer turista, não eram conhecidos lá.  Foi perfeito.  Sabia que Karin estava apaixonado por ele, mas tinha medo de se entregar, ele tinha uma vida pública, que ele não queria.

Quando voltaram, sem querer tudo ficou como dizia sempre, por causa de uma cilada de uma repórter do coração, que lhe lançou uma pergunta malvada, como era fazer em seguida dois personagens com fundo gay, se isso lhe incomodava, que diriam suas namoradas.

Eu não tenho namoradas, mas sim um namorado que amo muito, espero que um dia aceite a casar comigo.   A cara da mulher foi de espanto, provocou, mas não esperava essa resposta.

Além de que minha vida pessoal, só diz respeito a mim.

Sua mãe lhe telefonou, desde Turquia para saber se era verdade, se for meu filho, lembre-se a vida é só tua, seja feliz.   Ela nunca tinha feito força nenhuma para lhe arrumar um casamento concertado como queria seu pai.  Quando este insistiu, ela pediu o divórcio.  Odiava esse tipo de casamento.

Veio para conhecer o Hans, ficou amiga dele, adorava ver os dois juntos, como conviviam, compartindo as coisas.

Hans escrevia um novo roteiro, baseado numa história que tinha lido no jornal, sobre o que acontecia, com muitos menores, abandonados pelos pais, porque se revelavam gais.

Berg assumiu prontamente a ideia de um trabalho junto.

Karin tinha um certo ciúmes de os ver trabalhando, mas se não estava fazendo nada, se sentava ao lado, Hans ria, porque sabia que ele estava ali, como para dizer, esse é meu homem.

De noite conversava com ele, afinal podia verbalizar que o amava mais do que nada.  Quando Karin foi fazer um filme na Turquia, ele ficou hospedado na casa de sua mãe, Karin reclamava das rodagens, da quantidade de jornalistas, fazendo perguntas idiotas.

Um dia estavam os três jantando num restaurante, um entrou para encher o saco, perguntou se ele tinha um romance com a atriz do filme.  Ele simplesmente, beijou o Hans na boca.

Para a Turquia foi um escândalo, mas o filme foi um sucesso, entre os jovens, que estavam fartos de tantas mordaças.

Quando os dois fizeram quase 15 anos juntos, se casaram em segredo, era só uma formalidade para satisfazer a mãe do Karin, bem como a vontade deste.

Chegava as vezes em casa furioso quando algum ator se insinuava para ele, será que não entendem que não necessito de ninguém, que tu, me faz sentir completo.

Nas noites de verão, a lua, sempre passava por diante do quarto deles, abriam as janelas, para que iluminassem o corpo dos dois fazendo sexo.    A se o cinema pornô soubesse do que somos capazes.

Hans tinha escrito dois livros que faziam sucesso, num deles analisava uma série de escritores do passado, que camuflavam a homossexualidade dos personagens que no fundo representava eles mesmos, para poderem sobreviver.  O livro era usado na universidade para analisar esses personagens, ele mesmo fazia palestra a respeito.

Tinha dinheiro, porque tinha sabido aplicar para sua sobrevivência, para que a vida não lhe fizesse nenhuma cilada nesse sentido.

Karin agora era um ator de teatro, muito requisitado, Hans ia sempre busca-lo no teatro.

Juntos caminhavam para a casa deles, conversando como sempre faziam, analisando como ele tinha se sentido na representação.

Hans seguia o ajudando a se preparar para representar, encontrar o personagem.

Berg, tinha se casado com seu amigo de infância, era feliz.

LEDO ENGANO

                                                

O sentido usual de “ledo engano” quer passar a ideia de ingenuidade; simplicidade; de um indivíduo simplório.

Meu nome é Max Luft, foi isso que senti muitas vezes da minha vida, por isso sempre tinha receio das pessoas, desde criança fui deixado pelo meu pai, junto aos meus avôs, num kibutz de ultra ortodoxos, nunca consegui me adaptar a eles, minha avó ainda me defendia, me faziam trabalhar como um escravo, diziam que era para pagar a comida miserável que serviam.

Sonhava dias atrás dias com me liberar daquilo tudo.

De meu pai, seus irmãos falavam na minha frente que era um degenerado, porque era um artista, me deixaram aprender a ler, escrever em hebraico, só para ler os livros sagrados como eles diziam.   Eu os odiava de paixão, pois não encontrava paz, nada como diziam que teria lido, tampouco explicações sobre minha vida.

Um dia quando tinha 15 anos meu pai apareceu outra vez, voltava dos Estados Unidos, com os cabelos larguíssimos, uma roupa totalmente estranha.

Foi uma briga, mas minha avó defendeu que eu fosse com ele para Tel Aviv, fui da água ao vinho, pois fomos viver numa casa que viviam artistas, compartíamos seu estúdio.  Me colocou numa escola normal, nada a ver com a do Kibutz, não tinha que ler os livros malditos como ele dizia.  Me pedia sempre desculpas, mas tinha ido a América atrás da minha mãe, mas disse que nunca a encontrou.

Se dedicava a música, tocava o clarinete, eu gostava mesmo era do homem que tinha studio ao lado, pois estava sempre pintando, pedi que me ensinasse a desenhar, me deu cadernos, lapises, me ensinou o básico, se surpreendeu que era detalhista, a cada retrato que fazia, enquanto não ficasse perfeito não deixava.  Meu pai lhe dava dinheiro, quando ia de turnê com algum grupo de jazz.

Numa dessas, ele abusou de mim, dizendo que me amava, isso durante todo o tempo que meu pai esteve fora, um dia antes que este voltasse, se mandou, acordei, fui a escola, quando voltei já não estava, errou pois meu pai levou mais de uma semana para aparecer.  Comi o que os outros com pena de mim, me deram.

Quando contei ao meu pai o que tinha me acontecido, ele me disse na cara que eu era um ingênuo, que esse anos com sua família, tinha é me estragado.  Por um momento pensou em me levar para lá outra vez, pedi pelo amor de deus que não o fizesse.

Consegui entrar para a universidade para fazer Belas Artes.  Ele agora me deixava sozinho, me dizia antes de sumir, que não acreditasse em ninguém, não queria que eu virasse um viado que vai atrás de qualquer homem.

Isso caiu forte em mim.  Me senti o coco do cavalo do bandido, como ele dizia as vezes.

Vivia sozinho, me deixava sim, dinheiro para comprar comida, as vezes as coisas apertavam, então fazia retratos das pessoas para ganhar algo de dinheiro, ou se isso não acontecia, arrumava algum emprego, seja de descarregar caminhões, limpar supermercados a troco de comida que sobrava.

Meus professores se impressionavam com meu trabalho, se fazia um retrato, na verdade fazia dois, um o fazia conversando com a pessoa para saber como ela era.  A maioria mentiam todo o tempo, isso eu percebia, era curioso, me contavam muitas balelas, eu sabia que estavam mentindo, o que não entendia era quando se tratava de mim, se me chamava de bonito, que tinha um bom corpo, eu acreditava, pois tinha espelho, meus cabelos largos, loiros, olhos azuis, pouco pelo no corpo musculado, atraia muita gente.  Mas eu tinha horror que me tocassem.

As vezes no tempo das vacas magras, posava em outro horário das aulas para os alunos de primeira.    Modelo ao vivo, não tinha vergonha de estar nu na frente dos outros, mas dai a que colocassem a mão em cima de mim, era outra conversa.

Voltando aos retratos, eu tinha uma coisa, como fazia dois, mostrava as duas versões aos clientes, sempre escolhiam a como se viam, não o que eu retratava na verdade, alguns inclusive ficavam ofendidos, passei só a mostrar a versão da balelas que falavam.

Pegava a outra versão, modificava de uma certa maneira, contava a história do mesmo em suas roupas.  Transformava o que via, como se fosse um estampado da mesma, com pequenos desenhos, isso tinha um professor que adorava.   Além disso, tinha uma série de trabalhos, que eram considerados pelos puristas, como demasiado moderno.  Distorcionava a cara da pessoa, baseado no que tinha visto, desenhado antes, a mostrando em todo seu horror.

Estava no último ano, haveria uma exposição, seriam selecionados trabalhos dos alunos promissores como eles chamavam.  Eu teria direito a duas paredes, para apresentar as duas versões do meu trabalho, os retratos crus como eu chamava, o outro que só alguns professores gostavam.   Tive que escutar a discussão da banca sobre isso.

Ao mesmo tempo a resolução da mesma, ocasionou ciúmes dos meus colegas, pois era o único que tinha dois espaços. 

Dois retratos, fiz de corpo inteiro, como eu via as pessoas, suas misérias escritas pelo corpo inteiro, ao lado expunha suas caras distorcionada.   Na inauguração, numa das melhores galerias da cidade, os meus se venderam rapidamente, um inclusive para um museu, por sinal eram os que pagavam menos.   Eu superfeliz, pois liquidava o que devia do studio que trabalhava, vivia numa das partes, viver é difícil de descrever, tinha uma cama, um banheiro caindo aos pedaços, me apanhava.   De meu pai não sabia nada a mais de dois anos, nem para o convidar para a inauguração podia.   Falei com vários conhecidos seus, fui descobrir numa delegacia de Samaria, seu instrumento, o corpo o tinha enterrado como indigente, pois tinha morrido nas drogas.   Não sabia se chorar, ou dar graças a deus, por estar livre.

Mas sabia que tinha alguma coisa ver seu desaparecimento com o fato de ter-me deixado ser abusado sexualmente.     Na verdade nunca mais voltei a ter relações com ninguém.  Tinha um medo terrível disso.

Dias depois da inauguração, fui chamado a galeria, me pagaram os quadros vendidos, mas claro como eu era um belo desconhecido, ficaram com 30% de tudo.  Quando reclamei, me disseram dê graças a deus, pois eres um belo desconhecido.

Tornaram a me chamar dias depois, pois tinham duas pessoas interessadas em mim.  Na hora não entendi, mas fui pensando que era alguém que queria um retrato.

Dei de cara com dois homens, bem-vestidos, com um jeito diferente, me explicaram que eram judeus, mas franceses, que tinham vindo atender a última vontade do pai, trazer suas cinzas para Jerusalém, de aonde tinha saído jovem.

Num primeiro momento, tive uma antipatia impressionante com os dois, eram esnobes, me olharam de cima a baixo, como examinando uma mercadoria.

Me convidaram para ir com eles a Paris, pois tinham uma galeria de arte.  Me passaram um prospecto da mesma. 

Falei com o dono da galeria, esse não os conhecia direito, me disse que era uma oportunidade que não devia perder, mas que da galeria se falava bem, pois tinha tomado informações.

Perguntaram se eu tinha mais desenhos, os levei ao meu miserável studio, mostrei os dois tipos de desenhos que tinha, olharam tudo, falavam em francês entre eles, mal sabia que eu também falava. 

Tai um tipo que podemos lançar no mercado, lucrar com ele.

Me ofereceram pagar a passagem, eu disse que tinha dinheiro para isso.

Arrumaremos um studio aonde possas trabalhar, que necessitavam de pelo menos umas cinquenta obras minhas para me lançar.

Fiquei com um pé atrás, mas aceitei a proposta, comprei um bilhete de avião para o mesmo voo deles, eu iria numa turística, eles iriam de primeira classe.

Como me viram entrar com eles no espaço vip, depois eu fui para a turística, uma aeromoça, me disse que tinha um lugar na primeira, sem querer fiquei sentado atrás deles, que não perceberam, falavam de mim.  O que iriam lucrar as minhas custas, que inclusive me apresentariam a algum velho rico, que poderia me sustentar, assim não gastavam dinheiro comigo.  Fiquei quieto, mas mentalmente os chamei de filhos da puta, ainda não tinham entendido que sabia de tudo que falavam.

Demoraram para perceber que estava sentado atrás dele, riram, menos mal que não nos entende.  Quando chegamos a Paris, me levaram para a casa deles, era um puto apartamento, cheio de obras de artes.

Ai os encarei, por isso não queria que pagassem o meu bilhete, já sabia o que pretendiam, lhes disse que quando muito pagaria inicialmente uns 20% de comissão, que de maneira nenhuma os 50% como pensavam, que tampouco queria nada deles, inclusive o velho que querem me enfiar goela a baixo para me sustentar, enfiem no cu.

Estava furioso, falando com eles em francês, que escutavam sem dizer uma palavra, o mais velho deles, me abriu a porta, me disse fora daqui.

Peguei minha mochila, com um pacote de desenhos que tinha trazido para iniciar meu trabalho, sai porta afora, sem saber muito bem aonde estava.

Quando me informei, um garçom de um restaurante, me disse, se queria procurar galerias teria que ir para o Rive Gauche, aonde estavam a maioria, me falou da Place du Tertre, aonde os artistas faziam retratos, vendiam suas obras, mas creio que necessitas de visto para trabalhar antes de mais nada.   Me ensinou como ir ao Rive Gauche, passei dois dias andando pelas galerias, a maioria nem se interessava em ver nada, diziam que já representavam demasiados artistas.

Eu tinha guardado um pouco de dinheiro, para o caso de ter que ir embora, o que não esperava era ser assaltado, me levaram todo meu dinheiro, era de noite, não tinha para aonde ir.

Fui assaltado em frente a uma galeria, o que me salvou que o homem que estava ali saiu afugentando os ladrões.   Saiu com uma arma na mão.

Me fez entrar, limpou minha ferida, era pequena, não devias ter reagido.

Como se me levaram todo meu dinheiro, bem como o meu bilhete de volta para Israel. Agora estou fudido.

Sem me dar conta, ou porque ele me inspirava confiança contei o que me tinha acontecido, ele deu um sorriso, falou o nome dos dois que se diziam galerista.

Fechou a galeria, pois já era tarde, venha comigo, me mostra o teu trabalho.

Me fez subir por uma escada, estreita, escondida atrás de uma parede.   Acendeu as luzes, era um pequeno studio. Cheio de cavaletes, era o studio de meu pai, quando alguém lhe encomendava algum retrato, os gostava de fazer ele mesmo.

Depois te mostro o trabalho.  Antes de mais nada, meu nome é André Stein, também sou descendente de judeus.

Tinha uma mesa grande, abri os rolos de desenhos, ele ia colocando nos cavaletes que estavam ali, presos, em vários painéis.  Eram os desenhos base da exposição de Tel Aviv, bem como outros retratos, elogiou os detalhes, são perfeitos.  Retirou tudo, abrimos o segundo, olhou tudo, impressionante, lhe expliquei como tinha exposto alguns, o retrato, depois o grotesco ao lado.

Gosto dos dois trabalhos, muito.

Ia começar a conversar comigo, minha barriga roncava de fome, riu.

Venha vamos comer alguma coisa.   Desta vez não saímos pela galeria, mas sim por outra porta lateral.   Podes ficar aqui, detrás da cortina, o mais próximo da janela da rua, tem uma cama que ele usava para descansar, as vezes dormia aqui, tem um banheiro simples também.

Nos sentamos num restaurante que estava aberto, vi que ele era conhecido ali, fazem um omelete de queijo fantásticos, vinha acompanhado de salada.   Para mim era perfeito.

Vou ser honesto contigo.   Recebi essa bem como outra galeria maior de meu pai, sou irmão bastardo com se diz, dos que te trouxeram, esses sempre querem se aproveitar de tudo.

Queimaram os artistas que meu pai representava.  Com ele, tinham um contrato, agora queriam explorar.    Eu a galeria grande não gosto, por isso tenho uma amiga que foi professora de história da arte, que a leva, como está aposentada, conhece todo mundo.

Creio que vai amar teu trabalho, sou honesto de dizer que gostei muito, quem devia levar as cinzas do velho para Israel, era eu, pois ele vivia comigo, a muitos anos.   Mas eles se adiantaram, achando que isso lhes daria alguma coisa a mais.

Meu velho foi esperto, fez a divisão em vida, por isso não existe testamento, só ficaram com o apartamento velho, aonde viveu com a mãe deles.  Podia reclamar alguma coisa, mas não quero, nem me interessa.   Eu sempre cuidei dessa daqui, meu pai levava a outra, a não ser quando vinha para cá pintar.

Te ofereço guarida, mas vamos tratar de montar uma exposição, podemos discutir tamanhos, eu gosto muito dos dois trabalhos, teríamos o espaço de dois meses para poderes trabalhar, o que achas.

Mas se nem me sobrou dinheiro para comprar material.

Não se preocupe, pois no studio tem muito material, depois te levo aonde ele tinha conta, depois me devolves o dinheiro.

E se não funciona?

Claro que vais funcionar, tens talento, acredite, se esses dois filhos da puta, te trouxeram é porque tinha talento, eles só queriam era te explorar.

Comemos, então realmente olhei para ele, tínhamos a mesma altura, ele devia ter pelo que eu calculava, uns 45 anos.  Cabelos largos, amarrados num rabo de cavalo, umas mãos impressionantes, um nariz como eu gostava de desenhar, fino, uma boca sensual, olhos verdes quase transparentes.

Viu que eu o observava, riu dizendo depois te mostro as fotos de meu pai, dizem que sou cuspido e escarrado a ele.  O amei como nunca, não me escondeu, me reconheceu como seu filho, ele amava minha mãe, ela foi uma modelo famosa na sua época, mas depois teve uma doença incurável, ele sempre cuidou de mim, quando montava alguma exposição fazia que eu participasse, para aprender, a analisar o trabalho dos artistas, então aprendi com ele.

Mas nunca pintei, apenas entendo de arte.  Sou na verdade escritor, por isso estava até tão tarde na galeria, aproveito que não entra ninguém, para escrever.

Lhe disse que nem tinha olhado o que estava exposto.

Não se preocupe, isso é como chamamos o fundo da galeria, normalmente compro ou negocio com o artista um quadro, no caso negociar, significa, que o que deveria me pagar de comissão fico com um dos quadros para mim.

Então entre uma exposição e outra, coloco esses quadros antigos a venda.  Assim quando entra uma nova exposição, é outra coisa diferente.

Lhe contei sem querer a história da minha vida, no final, enquanto tomávamos um chá, bateu suas mãos imensas sobre as minhas, vamos nos dar bem não se preocupe.

Me levou outra vez ao studio, mostrou aonde estava escondida a cama, o banheiro, toalhas dobradas para o banho.    Amanhã venho tomar café contigo.

Me deu a chaves, lhe perguntei se não tinha medo de que eu o roubasse.

Ele riu, tens cara de honesto, eu confio na minha intuição.

Se despediu, apertando minha mão, durma bem Max.  Creio que nesse momento, eu poderia pensar estas sendo ingênuo, ou coisa parecida, mas resolvi tentar, com seus irmãos tinha dado errado, quem sabe com ele.

Tomei um banho, coloquei uma das poucas cuecas novas que tinha na mochila, roupa só tinha mais uma muda. Me joguei na cama, apaguei.

Despertei tarde, pois senti uma pessoa me olhando, era ele.

Vamos seu preguiçoso, levante-se, vamos tomar café.

Fomos a uma padaria ali perto, depois saiu me mostrando aonde estava a École de Beaux Arts, me levou a loja que tinha falado, me apresentou.

Mas lhe disse que primeiro queria olhar o que havia de material no studio para aproveitar, depois viria comprar, um dos homens da loja era seu amigo, me deu seu cartão.

No studio novamente, me mostrou aonde seu pai tinha macacões de trabalho, assim não sujava a roupa.

Me perguntou quais dos trabalhos não tinha sido exposto em Tel Aviv?

Eu lhe disse que a maioria, mas claro que quando fosse pintar agora, teria outra maneira de olhar.

Então mãos a obra. Te deixo trabalhar, venho te interromper para irmos comer.

Isso virou uma rotina, me despertava com ele as vezes me olhando, depois ao meio da tarde para comer, as vezes de noite para jantar.

Depois de separar minhas cores, organizar pinceis, comecei a trabalhar, ora sobre papel, outras vezes sobre tela.  Sem querer via o trabalho agora diferente, como se as pessoas tivessem tomado outro significado em minha vida.

De memória, desenhei um velho rabino ultra ortodoxo que uma vez tinha ido ao Kibutz fazer uma palestra, na minha cabeça, tudo o que ele falava não passavam de fantasias absurdas, sobre deus, o homem, seus pecados, sua pele era como um filigrana, fina, por aonde se viam as veias com um sangue correndo lentamente.  Conforme o ângulo que ele se colocava, mais parecia um macaco velho.    O desenhei assim, com sua vasta barba branca suja, principalmente em volta da boca, pelo fumo dos cigarros que fumava sem parar, ao mesmo tempo que a nós dizia que isso era um dos pecados do homem, seus vícios.   Desenhei suas mãos, como se fossem garras de um símio, com o cigarro preso nas unhas.

Suas roupas eram sujas, encardidas, na minha cabeça de criança, não entendia o que esse homem pregava se ele era o exemplo vivo do que não se devia fazer.  Era como “faça o que eu mando, mas não o que eu faço”.   Me perguntava como podia ser exemplo de algo.

Me lembrei que depois da palestra os velhos o festejavam como um grande homem, eu tinha ficado além de horrorizado com ele, com asco.

Assim fiz o quadro, como se tivesse asco dele.

André quando viu, disse o mesmo, impressionante, uma pessoa asquerosa daquelas que ficam julgando os outros, conheço muitas assim.

Contou de uma época quando sua mãe morreu, que tinha sido obrigado a estudar numa escola interno, que o diretor era uma pessoa assim, julgava qualquer falta com dureza, mas ele era a imagem do próprio animal comendo.

A imagem ficou na minha cabeça, repeti mais ou mesmos a figura com suas garras sobre uma carniça.  

André ria muito, como conseguiste captar essa imagem.   As vezes a noite subia, ficava escrevendo enquanto eu trabalhava.  Todos os dois em silencio.  Já estava no final da execução dos quadros, quando uma noite se recostou em minha cama, quando vi estava dormindo, me sentei do outro lado, comecei a desenha-lo como o via, um homem ainda cheio de sonhos por realizar, livros por escrever, uma cabeça privilegiada, nesse dia estava com os cabelos soltos, assim o desenhei, com sua boca sensual, a que as vezes tinha vontade de beijar.

Quando acabei o desenho, me deu pena desperta-lo, coloquei uma manta sobre ele, me deitei do outro lado, quando despertei de manhã, estávamos abraçados, ele olhando fixo para mim.

Perdi desculpa, mas tinha me dado pena desperta-lo.

Obrigado por cobrir-me, me deu um beijo na boca, com suavidade, mas que me levou a loucura, queria mais, mas resolvi ser cauto.

Ele tampouco avançou, depois de um silencio constrangedor, se levantou excitado, foi ao banheiro, aproveitei para levantar, cobrir o esboço de seu retrato.

Depois fui ao banheiro, tomei um banho, saímos para tomar café.  Ele me pediu desculpas pelo beijo, tenho muito mais idade que você me disse, há que manter distancias, senão vais pensar que sou como meus irmãos.

Nunca pensei isso de ti, sempre foste honesto comigo.

Trabalhei seu retrato na surdina, quando ficou pronto, o cobri para que ele não visse.

Agora evitava fica até muito tarde, quando veio o fotografo para as fotos do catalogo, ele se surpreendeu olhando a sim mesmo.

Garoto sem vergonha, disse rindo, me fizeste mais bonito do que eu sou.  Agora tínhamos que decidir que galeria usaria, para a de baixo seriam muitos quadros, para a outra perfeita.

Marcou um dia, a gerente da mesma veio, ficou olhando os quadros muito séria, não sabia se ele sabia ou não da história dos irmãos do André.

Só a via balançar a cabeça como concordando com tudo, quando viu o quadro do retrato do André, soltou, ele te viu por dentro como eres.

André não queria o quadro na exposição, mas ela insistiu.

Veio um caminhão especial para os levar para colocar moldura, em seguida para a outra galeria que fechou as vitrines com papel, para não se ver dentro.   Entre os três coordenamos a mostra.

No dia da inauguração foi comigo comprar uma roupa para usar, nada demais, apenas uma roupa nova.   Como era muito branco, cheio de sardas, escolhi uma roupa negra, me disse que ficava sexi.   Me avisou, hoje teremos entre os convidados, pessoas desagradáveis, como meus irmãos, minha ex-mulher, que aparece sempre para dar um toque desagradável a tudo.

Dito e feito, quando a galeria estava a tope, as pessoas circulando entre os quadros, com uma taça de champagne nas mãos, entraram os dois, foram olhando cada quadro, com uma cara de fazer gosto, pareciam ter chupado limão azedo.   Depois apareceu uma mulher alta, que em seu tempo devia ter sido bonita, com os cabelos pintados de vermelhos, preso num coque antiquado, severo, com a professora má de uma escola.  No final parou na frente do quadro do André soltou alto, o que faz o amor, um jovem apaixonado pelo seu galerista.

Fiquei vermelho como um pimentão.   Mas André ria, como se tivesse escutado uma piada.

Depois escutei seus irmãos falando com ela, dizendo que quem tinha me descoberto eram eles, que o André me tinha roubado.

Este tinha me falado, fique quieto, não desça ao nível deles, num momento foram embora os três juntos, as pessoas pareciam aliviadas, da presença nefasta.  Vinham falar comigo elogiando o trabalho, um crítico apresentado pelo André, disse que nunca tinha visto uma representação de rabinos, como os meus, eu os ódio por infernizaram minha vida.

Ao final 80 por cento estava com uma marca de vendido.   Inclusive o do André, ele disse rindo que não queria que o seu fosse comprado, ele tinha colocado a marca, pois era capaz dos irmãos ou a ex-mulher comprarem para jogar dardos.

Eu estava feliz, nem tinha prestado atenção direito ao valor das vendas, mas sabia que os valores eram bons.

Quando todos foram embora, Lia Schumer, a gerente, fez comentários, eles sempre aparecem como pássaros agourentos, mas quando veem os sinais de venda, ficam furiosos, vão embora.

André ia me levar para o studio, me perguntou se estava feliz, lhe disse que sim, sabes que confio em ti plenamente.

Me contou no caminho, pois tinha chovido um pouco as ruas pareciam respirar, fomos conversando, lhe perguntei de sua mulher. 

Um dos erros da minha vida, ela estudava literatura comigo, quando soube que meu pai era rico, se aproximou, tivemos uma aventura, ela disse que estava gravida, sem consultar meu pai, me casei com ela.    Não passava do velho golpe, não estava gravida, a partir de então minha vida virou um inferno, queria entrar para a alta sociedade, quando descobriu que no fundo eu era o filho bastardo, ficou furiosa, como se eu a tivesse enganado.  O casamento não durou um ano, mas a batalha do divórcio, durou cinco anos.  Meu pai me mandou para os Estados Unidos, aonde tinha um amigo, lá sem querer conheci alguém por quem me apaixonei.  Era um homem muito sério, meu professor preferido.   Quando lancei meu primeiro livro, sobre a arte contemporânea Americana ele escreveu o prefácio, ele tinha um casamento acomodado, ela foi até lá, fez um escândalo, ele nunca mais quis me ver.  Voltei como rabo entre as pernas, a única coisa boa, foi uma editora que quis lançar o livro aqui.   Até hoje é usado em história da arte.

Mas ela leva a metade dos lucros, esse foi o acordo de divórcio.   Mas depois nunca perdoou o que meu pai fez, ela nunca teve direito a nada da herança dele.  Hoje escreve sobre arte para um pasquim de esquerdas, que ninguém lê, se casou com um velho rico, amigo dos meus irmãos, por isso se dão bem.   Infelizmente só aparece nestas épocas, quando lanço alguém novo. 

Sim disse para muita gente, que eu pintei o teu quadro, porque me enganaste, que estava apaixonado por ti.

Por isso não quis ir adiante contigo antes, tinha medo de que pudesses pensar que tinha segunda intenção contigo, por ser mais velho.

Eu parei, ri, lhe disse, era eu quem tinha segundas intenções, estou apaixonado por ti, por isso não saio procurando aventuras.  

Um dia tinha me falado se eu trouxesse alguém para o studio para fazer sexo, que tivesse cuidado com a porta que levava para a galeria, lhe disse que isso não me interessava.

Quando chegamos ao studio, o convidei para subir, fomos tirando nossas roupas lentamente, enquanto nos beijávamos, seus beijos me levavam a loucura. O simples contato com sua pele me fez ejacular, pedi desculpas, tinha sido o tempo da espera.  Rimos e seguimos em frente.

Dormimos agarrados um ao outro.   Neste dia me levou para conhecer sua casa, ele vivia num apartamento muito simples ali perto.

Me convidou para viver com ele, eu fiquei feliz.

Comecei uma série diferente, ia pelas praças, se encontrava dois ou três pessoas, perguntava se podia desenha-las, armava meu banco, tirava da bolsa um caderno grande, começava a desenhar.  Escutava suas conversas, ia anotando a parte o que tinham falado entre si, se estavam falando a verdade ou mentira.  Um sempre era o mais mentiroso deles, esse eu gravava bem na minha cabeça, sua postura, sua maneira de se comportar, comecei a notar, que era o que se sentia mais sozinho, por isso fantasiava o que dizia, para se sentir superior aos outros, no fundo sempre era o perdedor, o que a família ignorava.   Contava vantagens, um dos que conheci, me convidou depois para tomar vinho, eu lhe disse que não bebia nada, tomei um chá enquanto ele tomava um copo de vinho, sem querer falei algo, que o fez transbordar, me contou toda sua vida, que tinha ido de um lado a outro, nada lhe dava certo, o mais interessante que me contou que seus outros dois amigos, sabiam tudo sobre sua vida, mas faziam de conta que tudo era novidades para eles.   Os dois tem uma família grande que invejo, mas fazer o que, não soube criar a minha.   Em outras ocasiões, como os via sempre, conversei com seus amigos, cada um o via de distinta maneira.

O primeiro quadro, era um dia, em que começavam a cair as folhas amarelas pelo outono, no jardim detras de Notre Dame, as folhas nas arvores já estavam prontas para cair, o chão estava cheio dessas mesmas folhas que pareciam douradas pelo sol, os fiz ali, como se estivessem em traje de gala que cada uma imaginava, depois fiz uma versão, como eles estavam na realidade, a terceira, como se viam a si mesmos, como se fossem jovens, pedi se tinham retratos de quando eram jovens cheios de ilusão.

O do velho amigo, o que na verdade unia os três, fiz uma versão como o viam cada amigo, no meio como ele se via a si mesmo.

André colocou nas três paredes principais da galeria, os convidei para vir, riram muito, o velho disse que eu tinha descoberto finalmente quem era.

Os convidamos para jantar, foi divertido.  No dia seguinte, vieram alguns convidados do André, jornalistas, um deles se surpreendeu, um dos homens era seu pai.   Este mesmo trouxe o diretor de um museu de sua cidade natal, levaram todos os quadros, estava iniciando uma novas salas, justamente doada por um deles.

O que era mais meu amigo um dia desapareceu, os outros dois estavam ansiosos, deve ter se metido em alguma besteira, fomos até o apartamento dele, ninguém abria a porta, o jeito foi chamar a polícia, que por sua vez chamou os bombeiros, colocaram a porta abaixo, estava sentando numa poltrona, numa sala cheias de livros até o teto, com um sorriso na cara, na mesa ao lado uma carta para cada amigo, inclusive uma para mim.

Sem querer tinha me transformado no filho que ele nunca teve, pois o escutava horas seguidas falando do que tinha feito com sua vida.  Tinha sido um aventureiro, vivido em muitos lugares do mundo, procurando a felicidade, não queria estar preso a nada, queria somente descobrir o mundo, quando tinha voltado seus amigos, tinham famílias, filhos, tinham se realizado na vida, sem se mover da cidade.

Todos se surpreenderam com seu testamento, para um deles, deixava para um neto que ele comentava sempre que queria ser escritor, mas que o pai queria que fosse advogado, o dinheiro era para que pudesse ir à universidade fazer o que queria.   Para o outro deixava uma casa justamente na cidade aonde estavam os quadros, para que ele pudesse reunir a família sempre ali.  A mim que considerava seu filho, que tinha realmente sabido ver quem ele era, sua solidão, me deixava o apartamento, muito dinheiro, para que eu fosse em frente.  Que o apartamento fosse minha segurança, um dia o André pode te falhar, tens aonde ficar.

André ficou furioso quando soube desse comentário dele.   Mas eu andava notando que estava estranho, um belo dia me soltou, que nunca tinha vivido com ninguém que as vezes era difícil conviver comigo, me amava, mas ele era mais velho, tinha ideias diferentes das minhas, tinha ficado com ciúmes do meu relacionamento com os velhos.   O jornalista não tinha lhe deixado gozar direito a glória dos quadros, pois tinha insistido que ele fizesse um preço especial para o pequeno museu da cidade, eu tinha concordado, como se o dinheiro não fosse importante para sobreviver.

Agora vivia falando, da herança que eu tinha recebido, o dinheiro tinha servido para pagar a transferência do apartamento para mim.  No fundo era um edifício antigo, o apartamento era imenso, ele só usava na verdade, aonde foi encontrado, um quarto, o banho, e a cozinha o resto estava vazio, daria perfeitamente para montar meu studio ali.

Um dia fiquei chateado com o André por causa disso, não parava de falar dos velhos.  Me tinham roubado dele.   Por mais que eu demostrasse que o amava, ele sentia ciúmes.

Um dia soltou que nunca tinha vivido com ninguém por isso, sentia ciúmes, queria que a pessoa lhe pertencesse.

Lia um dia me chamou a atenção, cuidado o André está bebendo outra vez.  Eu não sabia desse detalhe dele, que tinha tido problemas com o álcool.

Me soltou na cara, que era por estar sempre comigo pegado a ele, que tinha que se esconder de mim.   Passou a dormir em outro quarto.   Tinha me enganado redondamente com ele, tive que enfrentar a situação, era eu que o fazia infeliz.  Lhe agradeci de coração o que tinha feito por mim, queria continuar ser seu amigo, mas me mudei para o apartamento, não levei nada de material que tinha no studio.

Montei um novo para mim.   Meu elo com ele passou a ser a Lia, disse que agora estava mais equilibrado, uma vez por mês me reunia com eles.   Me sentia como velho amigo, solitário, só estava bem, quando me sentava com os dois outros velhos.

Riam, pois diziam que eu perdia tempo com eles.

Lhes disse que não, eu nunca tinha tido uma família verdadeira, eles eram o mais próximo que eu tinha da ideia de uma família.

Podia falar tudo com eles, nunca me recriminaram.  Me sentia só também, por não ser capaz de levar uma vida gay, de romances de uma noite, sempre tinha querido compartir minha vida com alguém.

Um dia chovia muito, marcamos nosso encontro na minha casa, agora no salão que o tínhamos encontrado, havia 3 poltronas, um deles trouxe seu neto que vivia em NYC, que queria me conhecer, bem como catálogos para levar.

Lhe dei um de cada, mas me pediu mais de um, queria para uma cliente do escritório que trabalhava.  Quando viu o quadro, me perguntou quem era o artista, perguntou de aonde eras de Israel, pois ela tinha parentes lá.

Contei a eles meu começo, falei sobre meu pai, que de minha mãe não sabia nada, sequer o nome.

No que falava com eles, por estarem as poltronas em outra posição, eu estava sentado de frente para a estante mais alta da sala, notei que na parte superior saia para fora um livro, pensei, tenho que arrumar antes que caia.

Philip o neto de um dos homens, contou que tinha vindo passar o mês de férias que tinha, pois seu relacionamento tinha ido a merda, isso que dá gostar de homens mais velhos, são sempre muito complicados, mas viram os problemas para teu lado.  Alguns querem tua juventude, mas depois reclamam que tem vitalidade demais, que não podem te acompanhar.

Fiquei pensando nisso, porque tanto o professor que tinha abusado de mim, houve momentos, que pensei que o amava, por isso tinha deixado fazer o que queria, fazia o que queria comigo, sem que eu reclamasse.  Talvez o fato de na época ser menor de idade tenha feito com que desaparecesse.

Meu pai quando soube ficou uma fera, como eu podia ter deixado que ele fizesse isso continuamente, porque não tinha pedido socorro.

Como explicar, que eu me sentia abandonado por ele, que o outro de certa maneira cuidava de mim.

O mesmo tinha acontecido com o André, me sentia protegido por ele, me sentia terrivelmente atraído, justamente por isso ser mais velho do que eu.

O que ele reclamava, é que eu sendo jovem, quisesse sempre fazer sexo, nem eram por sair pela noite, discotecas nada disso, eu gostava mesmo era de estar em casa com ele, abraçado, ele deve ter considerado isso uma invasão de espaço.

Nunca tinha escondido dos meus amigos, o fato de ser gay, eram senhores vividos, sem preconceitos.

Quando foram embora, empurrei a escada para aonde estava o livro, pois volta e meia levantava a cabeça, era como se ele tivesse me chamando.

Na verdade era uma caderneta, grande, como se fosse um diário, escrito numa letra muito bonita.

O que me impressionou, é que a primeira data, era do dia que os tinha conhecido.

Falava do bonito que eu era, que se sentia atraído por mim, mas que seus amigos tinham falado esse rapaz, tem um relacionamento, não vá por esse caminho.

Realmente el tinha idade para ser meu avô.

Continuava falando dos nossos encontros, de que como podia falar de tudo, algumas vezes tinha tido vontade de dizer que me queria.

A partir dessa parte, falava como tinha ido tombos pela vida, se apaixonando de quem não devia, seu primeiro romance na secundária com um jovem que era filho do empregado da casa de seus pais.   Que esse o tinha enganado totalmente, queria era chantageá-lo, para conseguir dinheiro.

Já os três em Paris, depois de deixar seus amigos com as namoradas, ele saia atrás de aventuras, as merdas que tinha se metido, pois o Bas-fond da cidade luz, era impressionante, envolto nas luzes apagadas da noite.

De sua paixão por um professor, que o instigou, mas na hora que ele declarou que estava apaixonado, escapou dele, só queira uma aventura com uma pessoa mais jovem para se sentir vivo.

De como tinha abandonado os amigos, indo pelo mundo, sabia que eles se casariam com suas namoradas, fariam família, ele não tinha possibilidade nenhuma.

Tinha certos questionamentos ao meu respeito, porque dos três, ele era o único que eu me abria, a quem contava o que sentia com relação do André.

Que este tinha ciúmes, ele já sabia, que tinha tentado se afastar de mim, mas eu era o que fazia sentir vivo nesse momento, em que a solidão pesava demasiado para ele.

Relatava todas as nossas conversas, nas quais ele se abria para mim, esperando um gesto, mas que eu na minha inocência nunca percebia.

Realmente algumas vezes entendi certas insinuações, mas nunca tinha me atrevido a pensar, ou não queria perder a amizade que tinha construído com ele.

Sei que ele não ama o André, é apenas um reflexo de uma pessoa que cuida dele.

Fiquei pensando sobre isso, era uma verdade, depois do arroubo inicial, eu tinha o André como uma balsa salva vida, se alguém se aproximava, eu tinha por aonde escapar, me defender, ou me esconder.

Que ele deixaria o apartamento, dinheiro para mim, pois lhe preocupava meu futuro.  Se soubesse que ia escapar do câncer que me corroe teria tentado alguma coisa, mas o quero demasiado, queria tê-lo como minha família.

Guardei exatamente no mesmo lugar o caderno, mas comentei com seus dois amigos, o assunto da vida dele.

Ele nunca falou abertamente, naquela época não se falava nisso.    Mas claro desconfiávamos de suas escapadas.

No final estava perdido, se apaixonou por um americano, foi atrás dele para lá, foi quando começou sua odisseia pelo mundo.  Quando voltou finalmente, motivo pelo qual sempre nos encontrávamos nos bancos do jardim atrás do Notre Dame, era que todos vivemos entre la Ilê de Saint Louis, como Saint Paul.   Ele comprou o apartamento para estar perto da gente, afinal foi ele quem nos incentivou a deixar a vila.   A casa que deixou em seu testamento, era a casa de seus pais, a qual ele nunca voltou.  Esta ficou fechada todos os quase quarenta anos que esteve fora, pois ninguém sabia aonde estava.

Nosso encontro foi uma apoteose, as duas famílias reclamava, por isso passamos a nos reunir na praça.

Quando você nos conheceu, ele foi quem disse, esse é um bom rapaz, pode parecer ingênuo, mas é corajoso, sabe que não conhece o mundo, mas suas mãos podem mostrar o mundo.

Comentei com eles meu problema de sentir atração por pessoas mais velhas, me disseram já que não me entendia, que fosse a um psicólogo.

Foi o que eu fiz, pelo menos podia falar abertamente de tudo, falei da minha infância, da época do Kibutz, sem querer me lembrei que estava eternamente no meio dos homens mais velhos, que gritavam comigo, falavam mal de meu pai, a quem chamavam de tonto.

Do que senti sendo abusado, o talvez porque aceitava, pois ao mesmo tempo esse homem como que me protegia.   O que tinha sentido quando desapareceu, com o retorno de meu pai, que passou a me olhar de outra maneira.   Um pai que nunca fazia carinho, ou me dava atenção, que se sentia frustrado por eu não amar a música como ele.   Só me dizia que devia ter saído a família de minha mãe, de quem eu não me lembro de maneira nenhuma.

Do meu romance com o André, que me causou uma imensa confusão, por não saber se o amava ou sentia por ele gratidão, ou mesmo como sempre por me sentir protegido.

Me fazia bem me livrar de todos esses meus fantasma, consequentemente, passei a desenhar bem como pintar fantasmas, como eu imaginava, fazia um retrato de alguém ou quem tinha na minha memória, depois ao lado desenhava o mesmo como se fosse uma figura translúcida, mas com todos os defeitos que podia imaginar.

Lia quando viu amou o trabalho, alguns fiz de uma maneira diferente, colocava o original, com uma pequena distancia, pintada em cima de um vidro o fantasma, mas totalmente desencaixado do desenho de baixo.

Ela levou o André para ver, ele nunca gostava de ir a minha casa, mas desta vez estava diferente, olhou cada um, apertou meu braço como dizendo, está bem o teu trabalho.

Falamos muito numa exposição, foi quando me avisaram que deveria ir a Israel, que minha avó queria me ver antes de morrer.   Eu imaginava que já estivesse morta, pela idade que tinha.

Fui, tinha aprendido a dirigir, as vezes para me mover, para levar algum quadro, para emoldurar, ou comprar material.

Mal cheguei a Tel Aviv, aluguei um pequeno furgão, aonde poderia dormir se fosse o caso.

Quando cheguei ao Kibutz, claro que chamava a atenção, tinha saído de um inverno muito forte, estava muito branco, com os cabelos imensos, sempre estava com um macacão de trabalho, que achava confortável, pois isso tinha colocado um para viajar, mais parecia um obreiro.

Um dos meus tios, me levou para falar com ela, lhe trazia os catálogos de meu trabalho, inclusive desse último, que ainda nem tinha sido exposto.

Ela sorriu quando me viu, fez um gesto que sempre fazia, quando a abraçava, mexeu nos meus cabelos.  Disse baixinho, quase num sussurro, estas lindo, ao contrário dos outros netos e bisnetos que tenho.

Sei que vou morrer dentro em breve, quero de deixar algumas coisas particulares, mas que só deves abrir depois de minha morte.

Me deu uma caixa grande, tirou a chaves do pescoço.  Tudo isso é para ti.

Quando viu meu trabalho, se riu, sabe a quem saíste, ao meu pai, ele era um pintor conhecido em Cracóvia, dava aulas na universidade de belas artes.  Mas como fugimos antes da entrada do Hitler, no caminho, que foi ficando cada vez mais pesado, ele foi se fechando, como quem não encontra saída em seu futuro, quando chegamos a Grécia, a ele parecia que tinha apagado seu mundo de arte, olhava aquelas estatuas maravilhosas, como se fossem as culpadas de sua tragedia, perder seu mundo, suas referências.   Nunca mais tocou um pincel, um lápis para desenhar.  Quando chegamos aqui, se encontrou com um dos seus irmão que tinham vindo antes, que abominava o que ele tinha feito, logo morreu, ficamos presos a esse tio que era ultra ortodoxo.   Acabei casada com um homem que sequer amava, um desconhecido para mim, minhas irmãs fugiram disso tudo, meu único irmão morreu numa das muitas guerras.

Isso acabou sendo meu refúgio.  A única coisa que sempre fui indomável, foi que ao contrário das outras mulheres, numa usei uma peruca, nem segui as coisas estritas da religião.

Deixei de acreditar em qualquer deus que odeia tanto as mulheres.

Falou comigo do meu trabalho, lhe pedi que possasse para mim, riu muito alto, pois sabia que ia ser um escândalo.

Deixamos para o dia seguinte, me ofereceram uma casa para dormir, mas o fiz no furgão.  De noite apareceu um dos muitos primos que eu tinha, me perguntou se quando fosse embora o levava comigo, pois odiava estar ali.  Combinamos tudo.

No dia seguinte depois do café, me sentei com meu sistema de desenho, a fiz primeiro com seus cabelos presos, sentada como uma rainha, me contou quando era jovem, usava sempre um vestido ou negro ou azul, verás nas fotos que estão na caixa, com uma gola de gripir, como se fossem rosas, em camadas como os traje antigos da corte.  Ou uma em volta do pescoço, como uma garota, minha mãe adorava.   Fiz um desenho, ela ria, exatamente isso.

Filho querido, conseguiste fazer esse velha rir, só por isso valeu a pena te ver.  Agora que já tem os desenhos te aconselho a ir embora, conheço meus filhos, são uns idiotas, acreditam que vais pedir uma parte das terras que tenho.

Marquei com o rapaz, que deveria estar a alguma distância do Kibutz.  O levei para Tel Aviv, me disse que ali tinha conhecido um rapaz, que o amava.

Mas claro chegamos o mesmo estava com outro.  Ficou decepcionado, mas lhe dei dinheiro para que tivesse aonde viver, perguntei se queria ir comigo para Paris, ele disse que só sabia trabalhar duro.  Fui até aonde tinha alugado o furgão, comprei para ele, assim poderia se mover pela cidade, deixei meu número de celular caso ele precisasse de alguma coisa.

Só fui abrir o que ela tinha me dado em Paris, pois quando cheguei recebi o aviso de sua morte, quem me chamou foi uma nora sua, a mãe do rapaz, disse que seu marido a tinha proibido, mas agradecia ter ajudado seu filho.

Pensei ele pelo menos tem uma mãe que se preocupa por ele.

Uma noite abrir a caixa, dentro havia uma grupo de fotos, dela em criança, já na época, antes de fugirem, uma foto de seu pai pintando. Tinha me dito que se houvesse realmente reencarnação, eu devia ser a sua, mas que eu nunca fosse triste como ele.

Depois um amarrado de cartas, em árabe, pelo que deduzi ela tinha amado um homem árabe, ou melhor palestino.  O roteiro todo que tinha seguido para sair da Polonia, até chegar a Israel.

Duas bolsas, velhas, com um pedaço de papel, eu dei uma bolsa desta para cada filho meu, menos para o teu pai, bem como para meu filho menor que morreu numa guerra.

Continha diamantes, que guardei no banco.  Para alguma emergência dizia ela.

Falava que meu pai no fundo tinha saído a ela, que amava a música, mas que seu marido considerava um crime contra deus.  Teu pai viveu sobre pressão, não só do seu pai, bem como de seus irmãos mais velhos, por ser diferente.  Não estava feito para o mundo deles.

Odiava as regras, a religião, era como eu, sabia que eu odiava tudo isso, bem como não professava nada.

Fui eu quem lhe deu dinheiro para ir embora, escondida de meu marido, nunca me arrependi, pois sabia que ele seria um bom músico.   O azar dele, foi conhecer tua mãe, uma americana que veio conhecer as raízes de sua família, teve um filho com ele, desapareceu, isso o marcou, te deixou nos braços dele, um homem que não tinha maturidade para ser pai.

Por isso te trouxe, foi atrás dela nos Estados Unidos, para estudar música que ele amava o Jazz, mas claro nunca a encontrou, pois o nome que sabia dela, não era verdadeiro.

Voltou anos depois para te buscar, depois sempre me telefonava, reclamando que não sabia ser um bom pai.   Perdoe porque ele procurou ser o melhor para ti.

De uma forma isso era um consolo.

Com as fotos dela, começou a trabalhar, seguindo as fotos, pela primeira vez, fazia um retrato de uma garota, com os cabelos cacheados loiros, naquelas famosas poses de fotos antigas,

De sua adolescência, fez uns grandes com as golas como via nas fotos.  Tinha entendido que seu pai não seguia a religião que o resto da família professava.

Por último a fez, em várias versões sentada como num trono, ora com os cabelos como usava, em trança em volta da cabeça, que era como sempre a tinha visto usar.

No final, fez um imenso, da mesma maneira, mas seu vestido era azul, cheio dos sonhos que ela tinha de jovem, inclusive um montada num camelo, abraçada a um jovem árabe.

Esse era imponente, pois era como uma rainha como antigamente.

Lia quando viu o trabalho, também para lhe avisar que os catálogos finalmente estavam prontos, que tinha atrasado a inauguração, por causa da sua viagem.

A exposição foi um sucesso, Lia lhe contou que uma galeria americana tinha procurado por ela, comprado dois quadros, que depois deviam ser mandados para lá. Se lhe interessava expor por lá.

André quando veio, lhe fez milhões de perguntas, aonde ele andava, que tinha vindo várias vezes atrás dele, pensei que tinha fugido pelo mundo, como esse velho que te amava, bastava olhar para ele, para saber disso.  Por isso tinha inveja.  Eu te queria como posso, ele te amava, se fossemos te disputar, eu perderia.

Coloquei a mão sobre a dele, o tratei bem, ele nunca moveu um dedo para nada disso, só descobrir que me amava, a pouco tempo.

Nunca me disse nenhuma palavra contra ti.

Falou com ele longamente, André esse tempo todo, eu poderia ter saído, procurado aventuras, mas sabes que nunca fui dado a essas coisas.  Contou da viagem, que tinha ido visitar sua avó, como a família o tinha recebido.  Do primo, que estava enamorado, mas que como ele, no amor nada dava certo.

Nessa noite dormiram juntos, mas já não havia magia entre eles.

Lia comentou num dia que faziam acerto de contas, que as coisas não iam bem, que os dois irmãos, tinham feito uma verdadeira campanha contra o André, quando descobriram que tinha voltado a beber, talvez essa seja a última exposição aqui, pois ele precisa vender essa para manter a pequena.

Ficou com pena dela, perguntou quanto necessitava, ela disse que só tinha uma quantia, mas que nem chegava à metade do que ele queria pelo local.

Foi ao Banco, retirou uma das bolsas de diamantes, pediu que ela o acompanhasse a um taxador, assim saberemos quanto vale isso.    Na bolsa tinham dez diamantes, de tamanho regular, com cinco cobria a quantia que ela necessitava.

Ele não precisa saber que sou teu sócio, mas o tem que convencer, que é de alguém que o quer muito.

Assim ela ficou com a galeria, que levava muito bem, agora teria as mãos livres, para dirigir como queria.   André a principio ficou desconfiado.  Veio um dia falar com ele, sobre isso, pensava que seus irmãos estavam por detrás, só poderei cuidar da pequena, que sempre foi o lugar que gosto.    Para dar um empurrão, apresentei uma parte do trabalho da minha avó, lá, foi um sucesso.   De novo de NYC, a mesma galeria comprou um, agora minha cotação era alta, isso lhe levantou o humor.   Me disse que tinha se apaixonado por um homem mais velho, que tinha sido seu professor, que estavam vivendo juntos para experimentar.

O vi mais centrado.  Falei com a Lia para saber se era verdade.

De certa maneira sim, foi o amor de sua juventude, antes de ir para os Estados Unidos, para escapar de sua mulher.   Na época ele era casado, tem filhos, por isso, é mentira que vivem juntos, se encontram conversam, trocam ideias, mas creio que não vai além disso.

Lhe contei o que tinha acontecido entre nós, da última vez que tínhamos estados juntos.

Acho que ele quer que tenhas ciúmes desta história.

Eu continuava me reunindo com meus amigos velhos, seu neto, falou comigo por telefone, a galeria que me procurava ela cliente do escritório que ele trabalhava, podes vir por que são sérios.

Achei que o melhor era me afastar um tempo.  Queria fazer talvez um trabalho, olhando a vida desde lá.   O acordo era que eles conseguiriam um apartamento grande para mim, aonde pudesse trabalhar, o material, eu compraria, mas que fosse um lugar alugado, que eu pudesse pagar, odeio dever favores, lhe disse.

Fiz uma última reunião com meus amigos, me despedi da Lia, de quem era sócio agora, ela tinha tomado informações, me tranquilizou, era gente séria.

Me despedi do André, que me pediu que avisasse que ele iria à inauguração, se eu já sabia que ia pintar.   Conversei com ele a respeito almoçando no restaurante de sempre.  Creio que me viria bem, imaginar como serão os americanos, ele ria, dizendo sempre me fazes ter humor, pois começo a imaginar tu sentado em alguma praça desenhando as pessoas.

O neto do meu amigo Philip foi me buscar no aeroporto, me levou para um hotel, depois foi me mostrar um apartamento, era perto da universidade.   Perto de Washington Square, me falaste em praças, pois tinha pedido uma lista.  Me indicou o que procurar, fui conhecer os donos da galeria, era um casal de homens, mas com certa idade.   Philip riu, dizendo que os dois faziam meu tipo.  Queria me levar pela noite de NYC, lhe disse que podia ser um final de semana, mas que eu era mais de ir a um restaurante, ou lugares tranquilo, pois não bebia, nem usava drogas.

Me disse aonde podia comprar material, tinham retirado os moveis do apartamento, só deixando um lugar para descansar, bem como um quarto montado.

Comprei o material necessário, talvez depois necessitasse de mais cores, pois tinha uma ideia diferente.

O primeiro lugar, foi justamente Washington Square, cheio de personagens típicos, que se misturavam com os estudantes. Todas as raças misturadas.

Eu falava um inglês a princípio malíssimo, mas mesmo assim me virava, levava na mochila, um catalogo do meu trabalho, mostrava, a maioria concordava, principalmente se eram jovens.

Ao contrário de outros, eu pedia que continua-se falando normalmente, eu ia os observando, depois mostrava o que tinha feito, tão rapidamente, já passava para outro lugar, havia gente jogando xadrez, jovens velhos, brancos, negros, todas as raças,

Personagens que eu ia amando.  As vezes se o dia estivesse bonito, ia ao central Park, aí sim era uma delícia, pois ao mesmo tempo que tinha pessoas ali relaxadas, passava um grupo a cavalo, policia, vi uns homens interessantes de uniformes, perguntei se podiam possar para mim, o que mais gostei, me olhou, riu, não podemos estamos de uniforme.  Me pediu meu cartão depois que mostrei meu trabalho, ali anotei o celular que usava ali, bem aonde vivia.

Um dia apareceu sem uniforme, o reconheci de imediato, disse que tinha ficado interessado na minha sinceridade, ele era do interior, não é habitual, encontrar pessoas como tu.

Ficamos conversando, acabamos na cama, me disse que tinha dois dias de folga, o desenhei sem roupa nenhuma, em várias posições, o deixava falando, de como pensava a vida, como se sentia ali, aonde todos queriam uma foda de uma noite.

Seguimos nos vendo, depois do trabalho ele vinha dormir comigo, eu estava descobrindo um mundo novo, uma nova maneira de fazer sexo, de me sentir bem com alguém.

Quando viu os desenhos que tinha feito dele, riu muito, isso seria um escândalo, tinha me contado que aonde vivia, andava muito a cavalo, que gostava de ir a um lago com seu cavalo, me mostrou uma foto sua de cabelos compridos, contava que entrava na água, como cavalo, que ficava deitado nu em cima dele.

Falei com o Philip, pois se fosse em Paris, sabia aonde conseguir, um desses cavalos, usados para mostrar alguma coisa, tinha visto um numa loja do Ralph Laurent.  Eles me emprestaram um já fora de uso.  Riu muito quando chegou de noite, viu o cavalo no meio do estúdio.

Me deu um beijo na boca, tirou a roupa toda, tinha um corpo espetacular, se deitou como eu já imaginava, iluminei, mas antes fomos para cama fazer sexo, pois estava como louco.

Nesse dia entendi o que era o amor, entre dois homens realmente.

Comecei a pinta-lo como imaginava, mas fiz milhões de desenhos, dele em muitas posições, ele deitado em cima do mesmo, ou segurando a crina postiça do cavalo, estava preocupado que o reconhecessem, mas o rosto dele, era como eu o via.

Agora tínhamos encontrado a maneira de fazer sexo que passei a amar, estar sentado, encaixado um no outro, em que podíamos nos olhar, falar ao mesmo tempo.

Philip quando o conheceu, soltou, que lastima que o encontraste antes, era capaz de me apaixonar, pela primeira vez tive ciúmes.

Os donos da galeria, vinham uma vez por semana, para olhar o trabalho.  Estavam fascinado, porque era como se alguém de fora realmente visse o mundo deles.

Depois de cinco meses, tinha quadros suficientes para duas exposições.

Agora saia mais com o John, meu policial favorito como eu lhe dizia, nos dias que ele estava livre, passávamos o dia inteiro na cama, nunca tinha me acontecido isso.  Com o André nos últimos tempos, era fazer sexo, ele virar para o lado, dormir, não havia emoção.

Eu agora tinha me livrado de qualquer atadura com meu passado, ou isso pensava.

Disse ao John que o queria ao meu lado na inauguração da exposição, ficou feliz, fomos os dois juntos, pela primeira vez andava de mãos dadas com uma pessoa.

Philip riu dizendo que fazíamos um casal perfeito, eu loiro, ele moreno.

Depois ficou conversando com o Philip, enquanto eu falava com os convidados, muitos me elogiaram, me pediram entrevista para jornais, bem como

para a televisão.  Os marchantes, encantados, me apresentaram uma senhora bem-vestida, que tinha comprado o quadro do John deitado em cima do cavalo, alisando sua crina.  Me perguntou se eu poderia fazer um retrato dela, adorava meu trabalho, tinha dois na sua casa.  Mistério resolvido.  Ficou de me chamar pelo celular, para combinarmos, lá pelas tantas, a escutei falando com outras senhoras, que eu era seu filho.  Fiquei gelado, minha cara de terror deve ter chamado a atenção do John que correu para meu lado, o que se passa.

Pedi ao Philip que levasse a mulher até o escritório da Galeria.   Ficamos frente a frente, ela sorriu, já descobriste verdade?

A escutei falando com outra senhora que sou seu filho.

É uma verdade, quando vi seu nome numa foto na sala do Philip, esse era o nome do teu pai, fiquei emocionada, procurei saber de ti.  Mandei pessoas ao Kibutz que vivias, mas tua avó se negou a falar com eles, quem falou foi um tio seu.  Confirmou que eras filho do irmão músico.

Queria voar a Paris, mas meu marido ainda era vivo, não ia me permitir, nem meus dois filhos, sim tens dois irmãos, um deles está aqui.  Este sabe tudo, me apoia.

Gostaria de poder te explicar tudo para que me entendas, talvez até me perdoe.  Queria gritar, mas não conseguia que saísse nenhum som da minha boca.

A fiquei olhando tristemente, a mãe com que tinha sonhado várias vezes estava ali na minha frente, mas algo me impedia de falar, tinha sim vontade de chorar, gritar, dar murros nas paredes.

Ela percebeu, abriu a porta, chamou uma pessoa que entrou, erámos super parecidos, quis me abraçar, mas não deixei, nunca tinha suportado abraços de pessoas estranhas, tinha sempre medo, esse tinha voltado com todas as forças, só sentia as lagrimas correndo pelo meu rosto.

Philip entrou com John, pois estavam preocupados, viram meu estado, pediram desculpas, me levaram dali, sai do que seria meu dia de glória, arrasado.

Me meteram com eles num taxi, me levaram para o apartamento.  Eu só conseguia ficar agarrado ao John, sem poder mover-me.

Dormi essa noite, depois de contar tudo a ele, Philip, ficou de vir no dia seguinte para conversarmos.

Ele entendeu, tinha uma parte de sua vida, também que era uma tragédia, por isso nos dávamos bem.

Ficou me embalando suavemente.   Repetiu uma duas vezes, justo no dia de sua glória, acontece isso.

Me despertei de noite no meio de um pesadelo com meu pai, com o velho professor abusando de mim, eu querendo que ele simplesmente me abraçasse, disse que me queria.  Meu pai nunca fazia isso.

John estava ali ao meu lado me abraçando.

Mas despertei de manhã com a cabeça despejada, quando Philip chegou com pão para o café da manhã, me contou uma parte da história que ele sabia.  Começava no dia que ele estava tratando de uns papeis para ela, ele tinha na parede uma foto que seu avô tinha lhe mandado do quadro, isso atraiu sua atenção, perguntou quem era o pintor, quando eu disse teu nome, se sentou tremendo.

Foi embora sem assinar os documentos, sei que ela é uma grande cliente dos da galeria, que eles compraram quadros seus para ela.    Ficou viúva a pouco tempo, nos últimos anos, foi ela quem levou a empresa do marido, agora está nas mãos do filho mais velho, uma pessoa como seu pai intratável.    O marido dela, era um judeu alemão, que dizem que colaborou com os Nazistas, pelo que sei foi um casamento para salvar o pai dela de uma bancarrota.

Ela sempre aparecia em alguma recepção que ele ia, segundo meu chefe, era como uma prisioneira.   Agora está livre, o filho que a acompanhava, é o menor, o mais agarrado a ela.

Ele estuda para rabino, coisa que ela não aprova.

Mais tarde o mesmo chamou para irem até a casa de sua mãe para conversar.  Ele disse ao John, acho que isso tem que se resolver agora, se não tens conflito de interesse Philip, preferia que me acompanhasse, tu também John, pois eres uma pessoa que confio.

Foram os três depois do almoço.   Era um daqueles apartamentos monstruosos, cheio de quadros e mais quadros.  O seu irmão Alfred, disse que ela adorava isso, a arte, sei que nem sabes direito seu nome, Judith Mansur.

Ela entrou em seguida, vestida simplesmente, com os cabelos puxados num coque severo, pediu para falar a sos com ele.

Veja sou sempre direta, contou que tinha ido a Tel Aviv, para conhecer a terra dos antepassados, com um grupo de companheiros da sinagoga.   Lá me perdi um dia na rua, quem me ajudou foi teu pai.   Me apaixonei por ele, me levou para seu velho studio, fiquei lá com ele semanas, depois me integrei ao grupo de novo, fomos de viagem por toda Israel, aos lugares santos como se dizem.  Mas notei que algo acontecia dentro de mim, a verdade era que não tomamos cuidados.  Voltei a Tel Aviv, me levou a um médico que disse que estava gravida, ele ficou como um louco de contente, pois me amava.  Eu também o queria, mas não saberia dizer se era amor.  Era jovem, queria viver.  Quando nasceste, meu pai apareceu, como uma fera, num dia que ele não estava, me chantageou, que iria perder sua empresa, que eu era a salvação.   Teu pai estava viajando, como sempre fazia aos finais de semana para se apresentar em algum lugar.   Meu pai contratou uma enfermeira para ficar contigo até ele voltar, me arrastou com ele, tudo que seu pai sabia de mim era que me chamava Judith.

Odiei o que seria meu marido desde o primeiro dia, pois era muito mais velho do que eu, afinal salvou a empresa de meu pai, mas nunca me permitiu quando descobriu que eu tinha um filho em Israel, ir atrás de ti.  Não posso dizer que era uma prisioneira, porque podia me mover, entre sua casa, a de meus pais.  Este esperto, me fez casar com separação de bens, assim recebi como herança sua empresa, que dirijo até hoje.

A outra empresa ficou com meu filho mais velho, que é igual ao pai, este seu pai mandou estudar na Alemanha, passou mais de 10 anos lá, é um completo estranho para mim.

Alfred, sonha em ser rabino, lhe digo que o que ele quer é purgar os pecados de seus pais, que escolha outra vida, sempre viveu perto de mim, pois não era parecido com seu pai.  Este piorou, pois pensou que eu o tinha enganado, chegou a fazer um teste de ADN, antes de fazer seu testamento.  Mesmo assim lhe deixou uma pequena parte, pois nunca se deram bem.

Estava tratando desses papeis, quando vi o quadro, quando cheguei perto, vi a assinatura do mesmo, como era uma foto, perguntei quem era, quando Philip me disse teu nome, gelei, era o sobrenome de teu pai.  Como te contei, procurei saber tudo sobre ti.

Comprei quadros através da galeria.

Não estou esperando que corras para o meu braço, que me grites mamãe, sei que não esperavas isso.

Sem querer me vi contando para ela, como tinha sido minha vida, o Kibutz, um pai que nunca chegava perto de mim, dizia que eu me parecia muito a ela, o que era uma verdade, bastava ver meu irmão Alfred para saber disso, do quanto tudo isso me criou problemas emocionais, que tinha sido uma pessoa que vivia atrás das pessoas procurando afeto.  A única que me protegeu a sua maneira, foi minha avó no Kibutz, quando me deixou partir, era porque sabia que eu era infeliz lá.

Agora pela primeira vez tenho a sensação de que amo alguém o John, sou gay se não entendeu ainda, por isso pintei esses quadros em que ele é o personagem.

Se nota que existe amor no que fazes.   Não sou eu quem vai te julgar, cada um tem direito a viver sua vida como quer.

Se quiseres podemos fazer um teste de ADN, para teres certeza, digo isso principalmente por causa do meu filho mais velho, que é capaz de causar problemas.

Foi ele que fez o pai, fazer o pedido de ADN, do Alfred, por achar que era diferente dele.

Se a senhora achar necessário, posso fazer, mas não necessito do seu dinheiro, hoje tenho sociedade na galeria aonde compraste os quadros, tenho um belo apartamento que recebi de herança de uma pessoa que me quis muito, amigo do avô do Philip.

Saímos do salão todos nos esperavam fora, John depois diria que esperava que eu fizesse um escândalo.   No dia seguinte fui com os dois fazer um exame de ADN, apenas para ter certeza de tudo.

O John tinha férias, fomos de viagem a San Francisco, um sonho dele.

Foi quando me contou como tinha ido parar em NYC, vivia numa fazenda com sua família, era o filho pequeno, quando sua mãe morreu, descobriu que não era filho dela, mas sim de sua filha mais velha.  O velho me queria ver pelas costas, me deu dinheiro, pediu que eu fosse embora, eu claro louco para ir pelo mundo.

Amava um companheiro de escola, ou pensava isso, pois comparando como que sinto por ti, nem chega aos pés, fizemos sexo, dias antes de ir embora, ele contou para todos os amigos da escola.

Cheguei aqui, fui estudar direito, mas acabei na polícia, embora não goste, espero uma chance para mudar de vida.

A viagem para eles foi como uma lua de mel.

Voltaram para NYC, todos os quadros tinham sido vendidos, eu tinha deixado autorização para pegarem os que estavam no studio.   Somente não podiam pegar um do John como um homem alado.  Este estava ali, mas não estava à venda.

Um canal de televisão me fez uma entrevista ali, na frente desse quadro.  Queriam saber como tinha sido triunfar em NYC, se pensava em ficar, eu disse que o triunfo era uma coisa de 10 minutos, que depois todo mundo se esquecia, a não ser que um quadro estivesse num museu.

Me perguntou se tinha algum.  Contei dos meus amigos velhos, da história do banco de jardim. Esses quadros, 80% deles, estão numa sala especial da cidade de aonde saíram.

Essa segunda leva, tem esse homem alado, segundo me disseram é um americano.

Sim meu namorado, o homem com quem vivo, que conheci quando cheguei aqui, mas não disse seu nome.

Isso sem querer causou problemas para o John, lhe pedi desculpas, mas pensei que na américa as pessoas eram mais livres de preconceito.

Isso o fez tomar uma medida, Philip o tinha convidado para trabalhar no escritório, ele pediu demissão da polícia.

Falei com Lia, que tinha esperado por eles, me contou que André estava internado, que tinha um problema sério. 

Pedi ao John para vir comigo, mas me disse que tinha sua chance agora, estava magoado com o que eu tinha falado.   Me despedi de minha mãe, bem como do meu irmão, esse sim aceitou o convite de vir comigo, queria ter alguém para pensar, com quem conversar sobre suas dúvidas.

Quando chegamos em Paris, o instalei num dos quartos, avisei a Lia, fui para o hospital.

André ainda brincou, que eu tinha trazido uma cópia minha americana, para ele, lhe expliquei que era meu irmão, que tinha encontrado minha mãe.

Depois ele muito sério me chamou de traidor, pois tinha descoberto que tinha sido eu que tinha comprado com a Lia a galeria.

Dois dias depois morreu, segurando minha mão, antes foi honesto, me pedia perdão por não saber me amar, que eu tinha sido o melhor da vida dele.

Para minha surpresa me deixou a outra galeria, não queria que caísse nas mãos dos irmãos, estes entraram na justiça, quando descobriram que a grande que queriam, tinha sido vendida a anos, que eles tinham prioridade na venda.  Mas perderam.

De tanto ver museus, ir a galeria Alfred, resolveu deixar a história de ser rabino, para estudar História da Arte, com tudo relacionado, orientado pela Lia, agora passava muitas horas com elas. Eu me sentia perdido, procurava falar sempre com o John, pensava em voltar a NYC, quando os dois apareceram em minha casa.  Estavam vivendo juntos, se davam bem, o Philip contou que tinha se apaixonado por ele, no dia que os apresentei.

Agora nos entendemos, por isso venho falar contigo, não quero que nos queira mal.

Estive para desmoronar, mas meu irmão estava ali, dias depois apareceu Judith minha mãe, que resolveu, já que Alfred ia viver ali, que ela ficaria, procurou um apartamento, deu ordem de venderem sua parte na empresa que era do pai, para o filho mais velho, esse dinheiro ela deu para o Alfred, bem como queria dar para mim.

Lhe disse que não precisava de nada.

Mas pelo menos agora tinha família.  Levei muitos anos depois sozinho, sem encontrar ninguém.

Um dia um amigo do Alfred, que tinha estudado com ele o veio visitar, eu quase ri, pois parecia que a América, era aonde eu encontrava minha meia laranja.

O avô do Alfred morreu, bem como seu amigo, os dois um em seguida do outro.

Agora com os três cremados, fui passar um tempo na vila de aonde tinha saído, como tinha um romance com Gabriel, o amigo do Alfred, o convidei para vir comigo.

Alugamos uma casa, fora da cidade, os filhos e netos, iriam construir um local especial para os três amigos, eu pintei na parede um mosaico dos três sentados no parque como os tinha conhecido, meu querido amigo, sentado no meio, o fundo era as árvores do jardim com as folhas todas amarelas, significando o outono desses homens que foram amigos a vida inteira.

O chão, também coberto pelas folhas, os filhos adoraram, só me pediram para não divulgar isso.    As pessoas apesar disso, vinha, olhar através da porta de vidro, o que estava pintado, embaixo de cada figura, estava uma caixa com as cinzas correspondente.

Ficamos nessa casa quase dois anos, deixei para o Alfred dirigir a galeria pequena, mas Lia estava ficando maior, ele iria cuidar da grande.

Eu falei com o Gabriel, se ele queria cuidar da outra, eu reformei o studio em cima, passava mais tempo lá com ele.

As vezes ia atravessar a rua, me lembrava do André saindo da mesma, com um revolver ameaçando os ladrões, hoje eu teria que agradecer os mesmo, por terem sem querer mudado minha vida.

Quando na França saiu o casamento gay, me casei como Gabriel, afinal levávamos tanto tempo juntos que não podia imaginar minha vida sem eles.

Depois de anos, recebi uma chamada do meu primo de Tel Aviv, precisava de mim.

Fui até lá imaginando algum problema financeiro, mas nada, ele tinha se casado, tinha dois filhos, um deles queria ser pintor, se eu podia orienta-lo, ele queria ir para a França, o trouxemos, é como se fosse meu filho, o orientei, ele tem uma ideia totalmente inversa, bem como uma maneira de pintar, que sem querer me fez pensar muito como fazer minha nova exposição.   Ele já expôs na galeria pequena, pois seu trabalho é mais conceitual, fez sucesso. Mesmo assim segue vivendo conosco, é como o filho que não tivemos.

As vezes nos pega, abraçados no sofá, se senta na frente diz que tem ciúmes, ou melhor inveja, pois não vê a hora de conhecer alguém para amar.   Sempre lhe dissemos que ele tem tempo.

Passamos uma larga temporada em Israel, fui conhecer o que não conhecia, meu primo ficava abismado como dinheiro que tinha, viajar num furgão como se fosse uma Motor home.   Mas os dois gostávamos.

Depois fizemos a ruta 66, juntos como Alfred, com meu filho August, aí sim alugamos uma Motorhome, foi genial, Alfred finalmente se abriu ao August, começaram uma relação os dois com muito medo e respeito.  Quem sabe dará certo.

Judith divide apartamento com Lia, ficaram amigas, enquanto viajamos, cada uma cuida de uma galeria.

Eu finalmente encontrei minha paz, creio que essa viagem, tudo que vi, pelo deserto, nasça em mim uma nova maneira de pintar.

TREASON

                                              

Como sentir amor, por quem te atraiçoa, essa era a pergunta que se fazia, ali no hospital, depois da operação no braço.  Tinham lhe retirado uma bala que tinha ficado presa no musculo do braço, normalmente essa bala teria entrado e saído, mas ficou presa entre o osso e musculo.

Ao mesmo tempo depois dos exames rápidos para a operação, o médico veio falar com ele, fez uma série de perguntas, sobre sua saúde, como se sentia, ele ficou com a pulga atrás da orelha, principalmente quando lhe perguntou se tinha companheiro fixo.

Sua resposta foi, como, o que quer dizer com essa pergunta?

Se tens companheiro fixo.

Respondeu que sim depois de perguntar se tudo isso seria confidencial.  O que morreu no tiroteio, ele tinha levado a bala justamente, porque tinha tentado proteger seu companheiro.

Aparentemente ninguém sabia que os dois tinham um relacionamento, nunca tinham vivido juntos, Tony tinha sido casado, tinha um filho desse casamento, sua mulher tinha se mudado para outra cidade.   Então queria liberdade.

Quando disse isso, o médico mandou imediatamente, já que o corpo ainda estava no necrotério fazer uma autopsia, principalmente exame de sangue.

Quando voltou a falar com ele, ficou pasmo, antes queria ter certeza, seu companheiro Tony tinha Aids, o senhor também, nunca tomaste cuidado.

Tinha sido companheiros durante cinco anos, Tony tinha sido seu mentor, ele recém-saído da academia, depois de anos como Policia Militar, trabalhavam os dois em investigações, um dia por acaso, logo no final do primeiro ano, aconteceu entre eles algo, no principio tomava cuidado, mas como Tony jurava que não tinha ninguém em sua vida, foi relaxando.

Por aí, acontece as coisas.  Nunca notaste nada diferente nesse tempo?

Não se preocupe, que no teu caso, isso parece ser recente, faremos mais provas, mas todo cuidado é pouco, hoje em dia o tratamento é efetivo, mas se vais fazer sexo com outra pessoa, é bom avisar.

Tinha as chaves da casa do Tony, mas nunca tinha ido lá, sempre era na sua.

Estava com a pulga atrás da orelha, quando perguntou ao chefe por que ninguém tinha reclamado o corpo dele, comentou que a ex-mulher disse que não tem dinheiro para isso, que no fundo são sua única família, nem ao enterro ela vira com os filhos, faremos uma cerimônia policial, nada mais.

Isso, lhe deixou preocupado, já tinha feito os exames, realmente fazia muito pouco tempo que tinha deixado de usar camisinha.   Tony na cama as vezes podia ser frustrantes, já pareciam aqueles casais que fodem uma vez ao mês, que era mais ou menos o que acontecia, se comportava como passivo, com aquele corpo imenso que tinha, os dois tinha a mesma altura, 1,80m.   Então ele esperava outro comportamento, mas nos ultimo ano, chegava na cama, depois de uns beijos, colocava a bunda para cima, pedia que lhe entrasse profundamente.

Depois se levantava as vezes, ia embora, já não ficava mais para dormir.

Resolveu como estava de baixa, pelo ferimento, ir até a casa dele.

Como detetive, começou a olhar tudo, no armário na parte mais escura, tinha um baby doll, de tamanho grande, numa caixa guardada em cima, vários tipos de penes de goma, bem como de metal.  Numa outra, coisas de sadomasoquismo.  Ficou gelado, como era possível isso, se nas conversas que tinham ele achava isso um absurdo.

Ficou sentado no sofá da sala, olhando pela janela, uma bela vista do Rio Hudson.  Como era possível essa segunda vida.  Basicamente estavam todos os dias juntos, durante as jornadas, as vezes saiam com os amigos para uma cerveja, claro no último ano, ele andava estranho, achava que tinha a ver com seu divórcio, bem como o fato de não ter a guarda compartida do filho, ou seja teria que se deslocar até a cidade aonde vivia agora sua mulher.  Mas normalmente ela não permitia que ele visse o garoto.

Os conhecia, o garoto, era fantástico, lhe fazia mil perguntas, uma vez lhe perguntou por que não as fazia ao seu pai, lhe respondeu sério, quando está em casa, normalmente está dormindo.

Quando se divorciou, achou estranho, porque ele já tinha esse apartamento, simplesmente levou suas roupas para lá.   Quando lhe perguntou por quê?

Respondeu que vivia longe, que as vezes preferia dormir ali na cidade.

Encontrou sem querer, encaixada na almofada do sofá, uma agenda de contatos, começou a passar, todos eram nomes, exóticos, com uma anotação ao lado de um nome masculino. 

Desconfiou imediatamente que eram nomes de travestis.  Se lembrou que as vezes quando faziam turno de noite, alguns lugares que ele gostava de parar para comerem, eram lugares frequentados por travestis, que ele diziam que eram seus informantes.

Todos tinham número de celular.  Chamou o primeiro da lista, quem atendeu foi uma enfermeira, disse o nome do hospital, que a pessoa estava ingressada em contagiosos, com Aids.   Foi até lá.   Se identificou, lhe deixaram passar, como homem era bonito, moreno, forte, sorriu triste para ele, que circunstâncias nos falamos verdade?

Perguntou se conhecia Tony?

Claro que sim, sei quem eres, tinha um relacionamento contigo, comecei como seu informante de qualquer coisa suspeita que visse pelas ruas, ou tipos com os quais me cruzava. Me desculpe que te diga, cada vez que nos encontrávamos, me levava ao seu apartamento para fazer sexo, ele queria o que tinha no meio das pernas, que não é pequeno, mostrou para ele. Chegava a uivar de prazer, dizia que isso não podia fazer contigo, tampouco com sua mulher.

As vezes queria colocar minhas roupas, para fazer sexo.  Mas ultimamente queria coisas de sadomasoquismo.  Ia comprando coisas que via pela internet, queria experimentar.

Nunca falava da sua vida pessoal muito, sim de ti.   Dizia que eras um homem muito sério, que te amava, mas que não sabias satisfaze-lo realmente, que ele sempre tinha gostado de sexo pesado, coisas diferentes.

Não sei se pegou ou não Aids de mim, mas eu tomava cuidado, soube depois que fazia isso com todos que eram seus informantes.   Um dia lhe perguntei por que a maioria de seus informantes eram travestis.

Me respondeu que assim matava dois coelhos de uma vez, ao conversarem faziam sexo. Fui conhecendo alguns, todos diziam o mesmo, que ele gostava de violência, que queria ser agredido, que se aproveitavam dele para soltarem o que tinham dentro, a raiva da polícia.

Que isso vinha acontecendo a muitos anos, mas que ele levava como uma vida separada.

Lhe deu uma série de contatos, o mais recente é um rapaz que chegou do interior, andava nas drogas, mas segundo o Tony tinha um caralho imenso, que gostava também de violência, esse esteve internado aqui alguns dias, mas escapou, pelo que sei foi encontrado morto, uns dois dias antes do Tony morrer.

Creio que os dois tiros que levou, eram da arma do Tony, pois escutei dizer que o Tony estava furioso, pois lhe tinha passado aids, por causas de seringas contaminadas.

Lhe deu o nome do rapaz, ele foi até a delegacia que cuidava do caso, disse que pesquisava a pedido da família que vivia no interior.

Tudo que sabiam, era que a arma que o tinha matado, eram de policial, mas não sabiam de quem.   Esse rapaz era muito jovem, tinha uns 22 anos, se encontrou muita droga no corpo, bem como tinha aids, algumas marcas já começavam a aparecer.

Ficou de pedra, podia ser de aí, por aonde Tony tinha se contaminado, talvez ele o tivesse assassinado, pois andavam muito estranho nas últimas semanas.

Voltou ao médico, lhe contou o que tinha descoberto.   Este disse que não tinha mencionado, mas que tinha descoberto nos pés do Tony, marcas de picaduras de seringas, devia estar se injetando nos pés, para não serem visíveis.

Puta que pariu, pensou, mais essa agora.  Ou seja o Tony que ele amava, não passava de uma fachada, além de descobrir que era uma merda na cama.

Começou a fazer o tratamento, mas antes resolveu falar em particular com seu chefe, pois se o assunto vazava de outra maneira, seria pior.

Quando ia pedir para falar com ele, este o chamou.

Achou estranho, mas foi a sua sala, mandou entrar, fechar a porta, que o assunto não saísse dali.

Contou que tinham recebido o relatório da autopsia do Tony, o que tinha descoberto, bem como ao analisarem sua arma, esta matou uns dias antes um travesti.  Falou das drogas, que ainda circulavam pelo seu sangue.  O filho da puta se injetava nos pés, assim ninguém poderia ver.

Realmente, quando faziam sexo ultimamente, não tirava as meias.

Não notaste nada?

Foi franco, disse que tinham um relacionamento com ele, que este tinha transmitido Aids para ele.  Ainda não sei o que fazer, estou fazendo um tratamento, o médico disse que tenho sorte, pois as medicinas hoje, são eficazes, se o senhor quiser, pedirei transferência para outra delegacia.

Nada disso, eres um dos melhores homens que tenho, mas quero que tudo fique na surdina, não fale do assunto do Tony, se alguém te perguntar muito, melhor não comentar.

Falar nisso a ex-mulher dele, pediu a pensão para seu filho, claro já foi autorizado, mas a notei estranha, inclusive pediu teu número de celular, por isso não estranhe se te chama.

Se passaram dois meses, ele já estava na ativa outra vez, agora tinha uma companheira, se davam bem. 

Saia de serviço, quando recebeu uma chamada da ex-mulher do Tony, estava na cidade, precisava falar com ele, marcara num bar perto de sua casa.

Quando viu os dois, se balançou, o garoto era a cara dela, estava grande para sua idade, se abraçaram, ele beijou a cabeça do garoto, que o olhava com admiração.

Ele sabia que ela era uma mulher direta aos assuntos, uma das coisas que o Tony reclamava.

Você sabe que conheci o Tony no orfanato que vivíamos, por isso não tenho família, aqui só conheço a ti, o chefe de polícia, bem como Rogue Smith, um amigo do orfanato, que hoje é médico, ele é oncologo, para que entendas.

Meu problema é que não tenho seguro médico, perdi o da policia quando me divorciei do Tony, queria falar contigo para me ajudar, tenho dois tumores na cabeça, não sabem derivado de que, levaram muito tempo para descobrir, até que tive coragem de procurar o Rogue.

Seguinte problema, não tenho com quem deixar a guarda do Tony Junior, se me acontece alguma coisa.  Não posso pedir ao chefe de polícia pois ele tem uma família grande.

Nisso ele chegou, me desculpe disse ela, mas marquei com os dois, são os únicos que conheço.

O chefe já tinha feito sua sindicância, não encontrava solução, pois o sistema médico deles ultimamente era estrito.

Rogue, consegue fazer sua parte grátis, mas tem outras coisas que ficam impossíveis.

Sua cabeça explodiu nesse momento, as vezes ele era assim, entendia o Tony, porque ele tampouco tinha família.   Seus pais tinham morrido num acidente, quando ele tinha a idade do filho do Tony, foi criado por uma tia, que fez tudo por ele, apenas viu sua graduação na Polícia, pois em seguida faleceu justamente por isso, por não ter um seguro médico para pagar seu tratamento de Câncer.

Eu te ajudarei no que for possível, talvez a solução, seja um casamento fictício, eu sou solteiro, podemos fazer isso chefe?

Sim claro, inclusive fica mais fácil para teres a guarda do Junior.

Isso é claro se vocês dois quiserem.

Ficou surpreso com a maturidade do garoto, minha mãe nunca escondeu nada de mim, depois sei que o senhor foi amigo do meu pai, além de companheiro.  Sei que cuidará de mim, se acontece alguma coisa.

O chefe, disse, que conhecia um juiz, que podia agilizar tudo, falo com ele, amanhã mesmo, podem se casar, darei a entrada no sistema, assim Narciso, terá um sistema médico.

Foi o que fizeram, eles estavam num hotel daqueles que até bandido passa longe, os levou para sua casa, deixou seu quarto para eles.   Depois da morte do Tony, ele tinha trocado tudo lá, não queria nada que lembrasse dele.  Não havia nenhuma foto dos dois exposta, como antigamente.

Eu durmo no sofá, sem problemas.

Quando foram a primeira consulta com o Dr. Rogue, ele ficou de boca aberta, esse era tão alto como ele, com uns cabelos imensos, crespos, muito moreno, estenderam as mãos, apertaram forte.   Obrigado pelo que está fazendo pelos dois.

Narciso, ficou no hospital, para os exames, ele levou Junior para casa, iria arrumar sua transferência de escola, sua mãe tinha lhe entregado os papeis.  Ele como vivia relativamente perto da delegacia, sabia que por ali, havia uma escola, se informou com o porteiro do edifício, aonde era, foi com Junior até lá.   Sem querer conhecia a diretora da escola, pois a tinha ajudado num caso de venda de drogas na escola, tinha conseguido, que nos horários de máxima frequência de alunos, entradas e saídas, houvesse um carro de polícia na frente da mesma.

Tinha se esquecido completamente disso.   Ela disse que sem problemas, viu as notas do Junior, eram muito acima da média.  O colocarei na turma mais adiantada, não se preocupe.

O problema agora, era com quem ele ficava nos horários da tarde.

Ele conhecia pouca gente no edifício, mais de bom dia, boa noite, pois eram os horários que entrava e saia do mesmo.  Falou de novo com o porteiro.  Ele lhe disse que no último andar, vivia um professor, que dava aulas particulares pela tarde.  Foi falar com este, tinham cruzado várias vezes na entrada.

George Bronson, disse o outro estendendo a mão, devia ser uns dez anos mais velho do que ele.

Sim posso ficar com o garoto, mas pelas suas notas, tenho pouco que ensinar, mas assim ele me ajuda com os outros alunos.  Combinaram quanto cobrava, os horários que o Junior estaria ali.

Comprou para ele um celular, desse que ser carregavam, assim lhe podia chamar qualquer caso.

Agora que minha mãe, não está, posso dormir no sofá, lhe disse o mesmo, estavam no supermercado, ele nunca comia em casa, mas tinha que deixar coisas para o garoto se virar, para fazer algum sanduiche, coisas assim.  Leite, café, lhe ensinou a usar a cafeteira que tinha, depois compraria uma mais moderna.

Viu que suas roupas estavam curtas, aproveitou que no dia seguinte estava de folga, foram ver Narciso que ainda fazia exames, o Rogue o chamou a parte, disse, que seria uma operação muito arriscada, que talvez pudesse tirar dois tumores, mas nos exames, aparecia um que estava muito dentro, que nem sabia o que isso afetaria, se o fizessem ela poderia ficar paralitica.

Faça o que for necessário Dr. Rogue, esse menino, precisa de uma família.

Vejo que te dás bem com ele, eu no orfanato, era o menor, Narciso e Tony sempre me defenderam, mas saíram antes, graças a deus fui adotado, assim pude estudar, seguir em frente.

Foram de compras, comprou roupas novas para o Junior, que estava louco para ter calças compridas, já vi que meus companheiros na escola todos usam calças assim.  Camisetas, pois as suas estavam pequenas, minha mãe, só ganhava o suficiente para pagar o aluguel, bem como comprar comida, nunca tocava no dinheiro da pensão do meu pai, esse ia para uma conta, que ela montou, para que no futuro eu pudesse estudar.

Teria que conversar com ela a respeito.

No dia seguinte enquanto ele estivesse na escola, ele faria isso, tinham coisas para acertar.

De tarde como tinha médico, o deixou com o professor George, que sorria para ele.

O médico, lhe deu uma nova leva de medicamentos, para ele provar, terás que me fazer um relatório, se algum de dá vômitos, ou te deixa tonto.  Depois de um tempo com esses remédios, já veremos o que faremos, pode ser como tudo teu foi detectado antes de começar a dar problemas, se controle, mas se fizer sexo, tens que usar camisinha, nunca se esqueça disso, bem como o parceiro que tenhas.

Isso o deixava nervoso, quando voltou para casa, George pediu para falar um pouco com ele.

Deu as chaves do apartamento que tinha mandado fazer ao Junior, disse que já desceria.

Sentaram-se no salão, ele estava com a bolsa de medicamentos ao seu lado.

George perguntou se estava fazendo algum tratamento, disse que sim, que tinha Aids.

Não queria esconder nada para ninguém.

Perfeito, vou ser franco contigo, eu conhecia o Tony, as vezes ele saia de tua casa vinha até aqui, me dizia que precisava de mais, eu nunca entendi isso, não sei nada sobre o passado dele, queria brutalidade, depois da primeira vez, lhe disse que não viesse mais.

Mas o motivo que quero falar contigo, são as perguntas do Junior, creio que escutou alguma conversa que sua mãe teve com o chefe de polícia, sobre porque tiveram que fazer autopsia no Tony.   Ela sabia dessa parte da vida dele, por isso se divorciou, como nos últimos anos, o que ele andava fazendo.  Ou seja ele sabe isso por cima, mas creio que alguém devia esclarecer isso tudo para ele.

Veja bem, eu tive dois encontros com o Tony, depois lhe disse que não queria nada com ele, sabia que tinha um relacionamento, que tinha sido casado, mas o da brutalidade que ele queria me assustava.  Depois ele só queria ser passivo, eu achava estranho, sendo o homem que era.

Obrigado por sua sinceridade, eu passei uns tempos muito mal, primeiro por saber que não satisfazia totalmente o homem que estava comigo, mas creio que ele desconfiava que não conseguiria nada disso comigo, eu vejo o dia inteiro brutalidade, merdas em família, tiros, coisas assim, quando fazia sexo, queria paz, romance, que sempre me faltou.

O pior foi descobrir, que eu lhe era fiel, mas ele não, por isso tenho Aids.

Ok, achas que devo ser aberto com o garoto?

Sim, ele é muito inteligente para sua idade, além de saber das coisas, para ele, existe algo que ninguém quer que ele saiba.

Desceu, Junior estava vendo um filme, na velha televisão da sala.  Comentou com ele, precisamos de uma nova, eu nunca vejo televisão, prefiro ficar lendo, do que ver noticias ruins que já vejo o dia inteiro.

O que o prof. George queria contigo?

Me falou das tuas perguntas.

Sim eu escutei uma conversa da minha mãe com o chefe de polícia, fiquei com a pulga atrás da orelha.  Porque tinha tido que fazer uma autópsia em meu pai.

Posso ser honesto contigo?

Sim, eu o conhecia pouco, deixei de vê-lo quando tinha cinco anos, ele nunca foi aonde vivíamos, se limitava a mandar dinheiro, como pessoa, não o conheci.

Tiveram que fazer a autópsia, nele, por minha causa, no que fui operado, descobriram que eu tinha Aids, sabe o que é isso?

Não, te explicarei, contou para o Junior o que era, antigamente se morria por isso, hoje não, vês todos esses remédios, é por isso.

Quanto o porquê da autópsia, é que nesses últimos cinco anos, eu tinha uma relação com teu pai, ele nunca viveu comigo, sempre teve sua casa, então saia daqui, tinha relações com outras pessoas, ele contraiu a doença, sabia, mas não me disse nada, me contagiou.  Quando descobri fiquei arrasado, algo aconteceu no passado do teu pai, que ele nunca me falou, que o fez ficar assim.    Primeiro o culpei, fiquei desesperado, pois o amava.  Descobrir que não era correspondido na verdade doeu muito, mas agora estou bem.   Ao mesmo tempo, foi meu melhor amigo nesses cinco anos que trabalhamos juntos, por isso estou ajudando tua mãe, bem como a ti.

Não nos odeias?

Jamais, eu só vi tua mãe, bem como a ti, uma vez, que foi durante o processo de divórcio.

Como fica isso na tua cabeça?

Estou confuso, ou seja meu pai era gay, tinha problemas, será que terei também?

Nada disso, veja, teus pais viveram num orfanato, com tua idade, eu também perdi os meus, mas tive a sorte de ser criado pela irmã mais velha da minha mãe, ela fez tudo que pode para me criar.  Devo o que sou a ela, meus pais não tinham seguro de vida, tampouco me deixaram nada.  Então seria normal que eu também fosse para um orfanato, mas tive essa sorte.

Nos orfanatos, nem tudo são rosas, pode ter acontecido alguma coisa lá, ou quando saíram.

Tony, nunca tocava nesse assunto, por isso não sei.

Veja o Dr. Rogue teve sorte, foi adotado por uma família que lhe deu estudos, por isso é médico.

Eu, sempre quis ter um filho Junior, espero que o seja para mim.

É você esta me tratando muito bem, se preocupou com tudo, casou com minha mãe para ela poder se tratar.  Rezo para que se recupere.

Sempre que tenhas perguntas, podes falar comigo, eu sempre serei honesto contigo.

No dia seguinte antes de ir trabalhar, passou pelo o hospital, isso agora seria uma coisa que faria durante muito tempo.

Comentou com Narciso, as perguntas do filho.

Eu sabia que ele tinha um relacionamento contigo.  Na verdade, quando saímos do orfanato, eu fui trabalhar na casa de uma família, o Tony, ficou por aí, quando podíamos nós falávamos, me falou que estava se prostituindo para sobreviver, alguém o ajudou a entrar para a academia de polícia.  Mas não sei quem foi.  Quando finalmente começou a trabalhar, nos encontramos novamente, me pediu em casamento, mas isso só aconteceu, quando realmente ficou firme na polícia.  Ele sempre teve um lado escuro, as vezes desaparecia dias, nunca sabia aonde ele estava, quando Junior fez cinco anos, o achei mais violento, um dia lhe perguntei por que desaparecia.  Ficou uma fera comigo, me ameaçou, foi quando pedi o divórcio.  Eu não queria passar pelo que aconteceu com a minha família, meu pai matou a minha mãe, porque era violento, eu não queria isso para meu filho.

Foi quando no divórcio, me falou de ti, sempre falávamos quase tudo, me disse que tinha encontrado uma pessoa que o queria, que não sabia se te amava, mas que eras seu melhor amigo.   Sempre teve pesadelos, dizia que era desse tempo que esteve na ruas, que teve que suportar muitas coisas, para sobreviver, dizia que era essa a parte negra de sua vida.

Ele resolveu olhar a ficha do Tony, para saber que o tinha indicado para a polícia, quando falou com o chefe, esse deu um sorriso triste.

Fui eu.   Uma vez o prendi por estar se prostituindo pelas ruas, me contou que vivia de ocupa num edifício, que se prostituia para comer.  Que ninguém lhe ajudava.

Fiquei com pena dele, consegui que fizesse prova para a academia de polícia, quando ele terminou, consegui que viesse trabalhar aqui, não o podia levar para minha casa, pois tenho cinco filhos.  Lhe conseguia as roupas que meus filhos não queriam mais.

Ele me contou que muitas vezes tinham abusado dele, que isso o tinha transtornado muito.

Mas pensei que tinha alcançado alguma estabilidade com Narciso, quando se casou com ela, mas me enganei.  Várias vezes o vi em companhia de pessoas diferentes.

Mas quando chegaste aqui, o coloquei para trabalhar contigo, pareceu ter esse equilíbrio, vocês ficaram amigos.  Mesmo depois do seu divórcio, estava sempre contigo.

Mas vejo que me enganei, tinha outros problemas que nunca vi.

Contou que o Junior tinha perguntado para ele, esse garoto é surpreendente, gosta de honestidade, já o quero como o filho que nunca tive.

Todos os dias conseguia entrar de noite no hospital, com o Junior, para que visse a mãe, lhe contava da escola, como ia em minha casa.

Um dia a caminho soltou que nunca tinha tido um quarto só para ele.

Perguntei ao porteiro, esse me disse que no andar debaixo do professor, tinha um apartamento de dois quartos, podia olhar.

Os dois olhamos, gostamos, rindo pintamos os dois, estava muito sujo, o porteiro conseguiu uma senhora para limpar.

Ela se ofereceu para cuidar do apartamento, pela manhã cuidava de um apartamento que vivia uma senhora sozinha, de tarde estava livre, a contratei para ficar com o Junior, enquanto trabalhava.  Assim cozinhava para nós dois, de noite nos sentávamos para comer, ele comentando seu dia.

Narciso, não conseguia ficar boa, estava cada vez mais fraca, um dia Dr. Rogue me chamou, falou claramente, que as possibilidades eram poucas, ou seja cada vez menores, o tumor que não tinha podido retirar, estava causando uma série de problemas.

Um dia, não despertou, de qualquer maneira, creio que prevendo isso, eu tinha acelerado a adoção do Junior, depois de conversarmos os três, para ela, seria uma tranquilidade saber que ele estava com alguém.

No dia do seu enterro, erámos poucas pessoas, o chefe de polícia com sua mulher, Dr. Rogue, o professor George, nos dois.

Depois fomos tomar um café, nada desse enterros que depois fazem uma festa.

Dr. Rogue me entregou um cartão, segurando minha mão, me disse que gostaria de me conhecer melhor.  Devo ter ficado com a boca aberta.

Mas foi ele que me telefonou dias depois.  Marcamos para um café num horário que ele estava livre.   Me soltou em plena cara, que tinha se interessado por mim, desde o dia que tinha me visto com Narciso.  Que ela tinha lhe contado minha história com o Tony, além do que tinha acontecido comigo.   Nesse momento, eu também estava saído de um relacionamento complicado com outro médico.   Não tinha dado certo.  Agora também estou livre.

Lhe expliquei o que tinha, que estava em pleno tratamento, que estava bem, que nunca tinha efeitos colaterais com os remédios.

Começamos a sair, um verdadeiro namoro, queríamos ir com calma, embora, sempre estivéssemos excitados, fomos juntos ao meu médico, ele nos orientou.

Mas nunca imaginei o que ia acontecer na nossa primeira vez.  Fiquei alucinado quando o vi sem roupa, eram muito másculo, nos demos bem aí também, na cama.

Mas antes de seguir adiante, contei para o Junior.  Ele em breve faria 12 anos, mas parecia ter mais.  Riu, eu percebi sempre como ele te olhava.  Achava interessante isso.

Por mim, bem, tens que pensar que tens direito a tua vida.  Não só viver para me cuidar, além de que ele foi o único médico que ajudou minha mãe.

Quando passamos a viver juntos, formávamos uma família, os horários as vezes eram complicados, mas nos apanhamos.   Acabamos depois de anos, nos casando, eu tinha sido ferido novamente, fiquei com medo que se me acontecesse alguma coisa, Junior ficasse desamparado.

Hoje Junior é médico, faz prática em urgências, chama os dois de pai. Nosso único luxo é uma cabana na praia, para passar os finais de semanas que coincidimos, eu agora sou chefe de polícia.   Dizem que o primeiro assumidamente gay.  Quanto ao Aids, hoje não que esteja curado, mas tudo ficou remetido, mesmo quando nos liberaram para fazer sexo sem proteção, achamos por bem continuar.

Afinal a família há que proteger.

Junior sai com outra médica, mas diz que ela não quer nada sério, espero que um dia me dê netos.

UN VOL DE GRUES

                                             

                        

O show tinha terminado, estava ali sem sono, fechando o caixa da noite, ainda lhe restava um pouco de maquilagem na cara.

Sentiu a presença de outra pessoa, quando levantou a cabeça, sorriu, quem te viu, quem te vê, falou com o homem que estava ali, em pé, com uma gabardina aberta, mostrando seu traje impecável.

Pois é nunca me chamas, sempre sou eu que vem atrás de ti, com boas ou más notícias.

Qual é a desta vez?

Acaba de morrer num hospital em Nimes, um velho conhecido nosso.

Pelo nome do lugar, já sabia quem era, August Castanho, soltou.

Sim o mesmo, finalmente descansou, foi encontrado morto em sua casa, sozinho, isso que sabes o quanto ele odiava estar só.  Necessitava sempre de plateia, para viver.

Em sua cabeça, era como se todas as caixas de sua memoria se destapassem ao momento, abriu a boca, não conseguia fechar.

Era como se estivesse sendo sugado no tempo.  August tinha sido um amigo querido, experimentaram fazer sexo, mas ele viu que o outro precisava na verdade de um pai, isso ele não era para ninguém.   Nesta época tinha já seus trinta anos, um homem de sucesso em seu trabalho, mas insatisfeito com tudo, justamente quando deu a volta a torta como ele chamava.

Agradeceu por vir dar pessoalmente a notícia.

Isso não se pode falar por telefone, aliás o teu celular, sempre está desligado.

É verdade Paul, já nos resta poucos amigos, para conversar, quando os escutamos, na verdade são só reclamações, comigo acham que estou louco por ter a essa idade um show de Drags, em vez de estar em casa, me lamuriando.

Me nego redondamente a isso, tenho uma proposta de compra do prédio, mas de qualquer maneira não penso em vender, pois afinal a propriedade é minha, minha casa está aí em cima, vou para aonde, fazer o que?

Paul rindo disse, para uma residência de pessoas de idade, para fazer crochê, ensinar o pessoal a dançar tango, rumbas, em que eres um mestre.

Ficaram rindo, sente, te sirvo um Cointreau, assim falamos um pouco do pobre August.

Paul se sentou, antes tirou sua gabardine.

Tu como sempre como um dândi, segues te vestindo como se fosse trabalhar?

Sim essa é uma verdade, foram tantos anos usando esse tipo de roupa, que é como minha mortalha, August dizia que era meu disfarce de homem sério, mas que quando ficava nu, se via realmente quem eu era.

Sim, ele sempre nos falava dessa maneira, um dia soltou na minha cara, que o meu seria ser dono de um cabaret, que usasse uma roupa decotada, vermelha com bolas brancas, um colar de bolas imensas vermelhas, além de um salto agulha.

Até hoje faço um número assim, talvez amanhã repita, em homenagem a ele.

Serviu ao dois em pequenos copos, uma dose do licor, que no mesmo momento fez entrar calor nos ossos como diziam.

Quanto a ele, sinto sempre, que nunca foi feliz, trazia uma bagagem com ele, de ser uma pessoa que não era o que queria ser. Queria de qualquer maneira subir na vida, gostava de homens que inspirassem poder, para se sentir no alto.   Uma vez discuti com ele, se realmente tinha amado alguém, me devolveu a mesma pergunta.

Eu pelo menos fui honesto, nunca tinha amado ninguém, nem mesmo nos meus relacionamentos mais largos.

O duro dessa época, era que todos estavam dentro do armário, eu não, sempre fui eu mesmo, não era afetado ou coisa assim, mas tinha lutado todo o tempo com minha família, para ser eu mesmo, respeitado pelo que era.

Nessa época estava no mais alto de uma hierarquia, que tinha subido com dificuldade, mas tinha chegado lá em cima, foi quando mandei tudo a merda.

Herdei esse edifício dos meus pais, meus irmãos, ficaram com os de luxo, menosprezavam que só me tocasse esse lugar, eu ao contrário, adorei.

É como tu, ficaste até o final nesse emprego no Quai D’Orsay, sendo sempre de confiança dos primeiros-ministros, entrava um, saia, seguiste ao pé do canhão.

É verdade Louis, nunca me meti na parte política, assim quando pediam minha opinião, tinha a verdadeira.  Agora mesmo o novo primeiro-ministro, me chamou para voltar, o mandei tomar no cu, minha aposentadoria, nem se esfriou ainda, já me querem no matadouro.

Como vai ser o enterro do August?

Falei com seus amigos de lá, vão fazer uma coleta para pagar o enterro, neste momento devem estar esperando a autopsia, para saber a que se deve essa morte.

A dele foi uma morte lenta, desde o momento que descobriu que tinha Aids, foi duro, ele amava a vida, queria estar sempre apaixonado.  Aliás, cada vez que vinha a minha casa, era para me contar de alguma nova paixão.  As vezes eu lhe dizia que tomasse cuidado, mas ele nunca escutava.  Se metia sempre em confusões, da mesma maneira que se apaixonava, no instante seguinte, conhecia outra pessoa, esquecia o problema anterior.

Acabou pegando Aids justamente de uma pessoa que lhe avisei que tomasse cuidado, um sujeito inclusive casado, com filhos, acabou se suicidando, quando soube que estava doente.

August ficou para trás.   O escutei dias e dias, reclamando como ia fazer.

Mas o pressionei, para saber se não estava com mais alguém, pois ele fazia isso, as vezes estava com mais de uma pessoa ao mesmo tempo.  Quando comunicou a estas, apareceu aqui em casa, com um olho negro.

Ficou meses aqui.   As vezes de madrugada, vinha para minha cama, queria ser abraçado, ter afeto.

Eu quando lhe dizia que ele sempre tinha feito confusão, entre afeto e sexo, ria na minha cara, mas depois sério me perguntava como tinha conseguido isso.

Lhe expliquei que como ele, levando pauladas na cabeça.   Quando era jovem, achava que estava amando, quando não passava de sexo de dois ou três dias.

Tu sabes que levei anos com Maurice, que em paz descanse.  Claro ele era também casado, mas nunca, desde o primeiro momento me escondeu isso.  Aparecia quando podia escapar das reuniões sociais que era obrigado pela família a participar.   Mas nos momentos que estávamos juntos, era meu companheiro ideal.  Me dizia que eu era livre para fazer sexo com quem quisesse, mas eu me negava.   Pois a Maldita já estava em campo.

Me ajudou a assumir este lugar, me orientou como devia gerir tudo o que tinha.  Nesse ponto foi espetacular comigo.  Até se atreveu a vir um dia com sua mulher, seus amigos, como se fosse um lugar novo para ver um show fantástico.

Creio que foi quando sua mulher desconfiou de tudo, se aposentou, veio viver comigo, só saiu daqui, porque os filhos quando os avisei vieram buscar seu corpo, me pedir para não ir ao enterro. 

Eu não me importei, embora muita gente tenha me criticado, ele já não estava, essa era a verdade, fui feliz com ele, se eu o amei, nunca saberei, mas que ele a mim sim, tenho certeza, para fazer o que fez, era necessário muito amor.  Não sei se teria a coragem que ele teve, enfrentar aos seus para vir viver aqui, em cima de um cabaret com outro homem.

Nunca mais quis ninguém, por isso agora tenho duvidas se sigo com isso, ou vou curtir a vida no sul, como ele gostava.

August o respeitava horrores, tinham conversas homéricas, na verdade dos poucos amigos que sabiam da época que ele ainda estava casado, ele era um.

Me dizia, que se não fosse meu amigo, me roubaria o Maurice.

Este ria com está história, nas épocas que esteve muito mal, nos revezávamos em cuidar dele, eu ia durante o dia ao hospital, Maurice, passava algumas noites lá.

Foi um período difícil, perdemos muitos amigos essa era a verdade, havia finais de semana, que quando olhava a plateia, só via caras novas, me perguntava aonde estão os velhos clientes, que riam das minha piadas.

Dos novos alguns me criticavam, por me vestir de mulher, usar essa barba imensa, não usar perucas, mas sim meu cabelo naturalmente brancos, como hoje, só apresento os números nada mais.   Nada é igual, querem uma coisa mastigada, se faço uma piada política, não riem, talvez porque não saibam do que escaparam.

Acho que a maioria segue sem tomar cuidados como os que passamos a tomar.

August ria, dizia que eu não arriscava, com toda a liberdade que me dava o Maurice.

Como tu, tinhas a mesma liberdade, mas tomavas cuidado, nunca fomos desses de saunas, de trios, ou coisa parecida, drogas tudo o mais.

Ele dizia as vezes que erámos da velha guarda, mas a maioria dos jovens daquele tempo, se foram para o outro lado.

Os que se politizaram, fundaram ONGs, para defender seus direitos a medicina, ajudei a todos que me pediram ajuda, inclusive de usar o local para assembleias, hoje me olham de esquerda, porque nunca me politizei.   Não me interessava.

De uma certa maneira amigo Paul, essa notícia, me abriu minha cabeça, como uma caixa de pandora.

Em breves minutos, consegui ver todos os namorados que August me apresentou, uns dizia que fazia isso para sentir ciúmes, lhe respondia, que ele era meu amigo.

Mas ele sim tinha ciúmes, inclusive de ti, pois nessa época os dois saímos muito por aí, para dançar, relaxar do stress de trabalhar para o governo.

Se estávamos em alguma discoteca, alguém se aproximava de mim, ele se colocava ao meu lado, como dizendo é meu.

Eu deixava porque assim me poupava o trabalho de dizer não a alguma pessoa.

Depois quando já estava com Maurice, ele dizia, ele pode sair comigo, nunca deixarei que alguém se aproxime dele, podem querer te roubar esse homem imenso.

Contigo, conosco, ele virou realmente o amigo, pois fomos os únicos que o socorremos nos momentos difíceis.  Sua família que nem sei como ele fazia, ajudava, colocou sua irmã para frente, isso que era mais velha do que ele, a obrigou a fazer universidade.

Nada apareceu quando ele precisava.

Mas claro não suportou o rechaço que aconteceu depois, perdeu sua beleza, era um homem triste, se via que tinha a maldita, então ninguém queria nada com ele.   Isso para um homem que conseguia o que queria, foi como se sentir derrotado.

Eu lhe dizia que finalmente via a realidade, que tudo era efêmero, nunca nada é para sempre.

Quando estourou o escândalo do Maurice, imagine um alto funcionário da república, abandonar sua família para viver com um louco, que se vestia de mulher, para trabalhar num cabaret.

Ele ficou ao lado do Maurice, foi o filho que o entendeu, porque os seus realmente ficaram horrorizados. 

August o entendia por que tinha sentido na própria pele, o de sua família, se tornou o filho querido do Maurice.  Quando ele morreu, queria ir ao enterro, eu não, me obrigou a ir com ele, ninguém sabe disso, nem tu.  Fomos os dois, bem-vestidos, quando uma pessoa perguntou quem ele era, respondeu, sou o filho maldito do Maurice, por quê?

Eu tive que rir, pois imaginei o Maurice inchando o peito como um pombo, de orgulho.

Mas para todos os efeitos não fui.  Primeiro me imaginei indo vestido de mulher, com essa barba que tenho, ia ser um escândalo.

Depois que Maurice veio com os amigos, sua mulher, está lhe perguntou qual a graça de um homem vestido de mulher, com aquela barba imensa.  Que não entendia meu texto, que lhe parecia mais uma besteira, se queria falar mal do governo que fosse ser político.

Maurice a principio não lhe fazia graça me ver vestido assim, me dizia que gostava de me ver nu.  Dizia que a primeira vez que me viu, foi numa festa na casa de algum amigo, que eu estava na piscina conversando contigo, ficou deslumbrado, pois nos víamos sempre em reuniões de trabalho, queria tirar o resto de roupa que eu tinha, para ver como era o resto.

Ele tinha um corpo para sua idade impressionante, quando nos vimos a primeira vez fora do trabalho, foi ótimo, nos encontramos numa reunião, começamos a conversar, ele sabia da morte de meus pais, o convidei para tomar alguma coisa, conversar fora dali, pois gostava disso dele, poder falar sobre qualquer coisa.

Quando estávamos num bar, os dois ao fundo, virou-se para mim, colocou a mão no meu joelho, soltou tudo de repente, depois dizia que o tinha feito assim, por medo que eu saísse correndo.

Mas fiquei, olhando para ele, com aqueles olhos negros que tinha, pensando, deve ser brincadeira desse sujeito.   Eu o achava sempre muito interessante, gostava de o ver falar, explicar alguma situação.

Era verão, a família dele estava na praia, me perguntou que tal minha casa nova.

Estou terminando a reforma, era a velha casa da família, ainda no lugar do Cabaret, tinha a loja de meu pai, que estava alugada, veio comigo, passamos o final de semana inteiro na cama.

Telefonou para sua mulher dizendo que tinham surgido problemas.

Eu aceitei imediatamente que o teria por momentos, ou algumas horas, ou quando ele inventava uma viagem, que nunca poderíamos sair juntos para um cinema.   Mas o tempo que podíamos aproveitar era o máximo.

August, dizia que eu o devia roubar da família.  Como ele tinha feito com alguns casados do rol de relacionamento que tinha, mas o sem vergonha, quando o sujeito dava esse passo, perdia o interesse.

Quero que não seja meu, para poder conquista-lo.   Porque ele o que gostava era isso a conquista, depois perdia o interesse.

Te lembras daquele arquiteto, o sujeito tinha um relacionamento de anos, ele foi se intrometendo entre os dois, fizeram sexo a três, quando o arquiteto abandonou o namorado por ele, perdeu o interesse.   Ficou furioso, queria dar uma surra nele, claro se escondeu lá em casa.

Se matava de rir, eu lhe dizia que isso não se fazia.   Mas no fundo ele era como o Maurice dizia o filho que eu nunca tive, pois tinha idade realmente para ser meu filho.

Avise aos amigos dele lá da cidade aonde vivia, que iremos, que ajudaremos em tudo que for possível, quero que tenha um enterro digno.

Te venho buscar amanhã por volta das dez para irmos.

Me despedi do Paul, sabia que ele era pontual, por isso fui para cama, limpei bem a cara como fazia sempre.

Mas foi uma noite infernal, pois em minha cabeça, me veio tudo, desde o momento que o conheci, todas muitas conversas que tínhamos, das tentativas dele de seguir fazendo sexo comigo quando lhe desse a louca.   As largas noites quando ele não tinha com quem se desabafar das verdades de sua vida.  Talvez tenha sido o único amigo que sabia de tudo, vamos dizer assim, do buraco de aonde tinha saído, até aonde tinha chegado.

Uns pais, amorfos como ele dizia, sem ambição nenhuma na vida, que por eles, ele nunca teria ido à universidade, teria ficado trabalhando ali no negócio que tinham.  Que aprender línguas, o que ele tinha uma facilidade imensa, lhes parecia uma besteira, como dizendo para que.

Mas isso o fez subir na vida, realizar seus sonhos, conhecer países, tudo bem sempre se metia em confusão, mas fez amizades em todos os lugares.   Era uma pessoa que queria ser querida, as mulheres, o adotavam mal o viam, tinha esse jeito de rapaz desamparado.  O que não deixava de ser verdade.

Acredito que no fundo, como lhe dizia, a maioria das vezes ele não queria sexo, sim carinho, como o que eu lhe dava.

As vezes aparecia no meu antigo apartamento, me dizia na cara, venho dormir aqui, porque sei que vais me abraçar, cuidar de mim.   Não acontecia nada de sexo.

Muita vezes chorou nos meus braços, por não entender, não conseguir analisar o que sentia realmente por uma pessoa.   Pois da mesma maneira que se apaixonava, no dia seguinte já não falava da pessoa.

Quando resolveu voltar para o lugar de aonde tinha saído, perto de Nimes, lhe disse que estaria só, mas conseguiu fazer amigos, os tempos tinham mudado.   Ele tinha perdido toda a beleza que tinha.   Seu rosto estava marcado pela doença, a eterna barriga inchada o delatavam, até isso, o corpo de garoto que tinha, desapareceu.

Rolei na cama a noite inteira, me lembrando dessas conversas.

Acabei me levantando cedo, pois me era impossível dormir. Também tinha tomado uma decisão, ir viver na casa que Maurice me deixou de herança, em Aix en Provence, aonde passamos dias fantásticos.   Chega de tanta papagaiada como August dizia.

Quando desci, com uma pequena maleta, não sabia se íamos conseguir voltar no mesmo dia ou não, em último caso, iriamos depois para Aix.  Avisei o meu gerente que a vida seguia no cabaret, mas tinha surgido um imprevisto.

No carro, Paul me disse que tampouco tinha dormido muito, fiquei pensando a noite inteira, agora somos só nos dois desse grupo de amigos, era uma verdade.

Me deu uma noticia que caiu como um mal trago, mas engoli em seco para digerir, que ele na verdade tinha se suicidado, tinha tido uma recaída, estava como corpo cheio de feridas, que seu rosto estava destroçado.  Os seus amigos queriam saber se o caixão devia ser fechado.

Lhes disse que sim, para que ficar olhando os destroços de alguém, que colocássemos uma fotografia dele bonito quando era jovem.   Um deles, que foi seu namorado na sua juventude, disse que tinha uma.  Isso bastava.

Chegamos, era um enterro diferente, só havia homens, a uma presença feminina era sua irmã que tinha vindo de Marseille, sozinha.  Não trouxe os filhos, nem o marido.

Fiquei conversando um tempo com ela, me contou que ele estava na miséria, melhor era não ver como vivia na velha casa de nossos pais.

Seu dinheiro mal dava para pagar as medicinas que tinha que tomar.

Mas disse que sempre chegava o dinheiro que mandavas para ele.  Com isso ele se apanhava, porque o que recebia dava para as medicinas.  O resto, vinha de ti.

Quase soltei, que da parte dela, que ele tinha pagado a universidade, nada.  Mas para que levantar brigas nesse momento.

Maurice não gostava dela, dizia sempre ao August, a ajudas tanto, mas ela nunca estará por ti, pois tem vergonha que sejas gay.

Quando se casou com um companheiro, professor na universidade, não o convidou, ele tinha acabado de sair do hospital, estava lá em casa.  Ficou primeiro ofendido, depois machucado, pelo que tinha feito por ela.

Quando voltou para Nimes, creio que foi mais para sacanear, ela queria vender a propriedade, não podia pois ele estava lá.

Quase perguntei se era isso que tinha vindo fazer.

Os seus amigos eram uma confusão de homens de todas as idades, todos vinham falar comigo, me conheciam de nome, que ele sempre estava falando do melhor amigo que ele tinha.

Lhes gostaria de dizer, que não fui nem de longe o amigo que ele foi para mim, inclusive o filho que não tive.

Pois quem me aguentou quando Maurice morreu foi só ele.  Paul estava fora do pais, em uma missão diplomática.

Ele me aguentou semanas, sem animo de me levantar da cama, me ajudou em tudo que foi necessário.  Quando fui chamado para a leitura de testamento, achei que era uma loucura, pois achava que a família estava lá.

Por sorte, erámos só os dois.  Sua família, ele já tinha dado sua parte, quando se divorciou, me deixava a casa de Aix, além de dinheiro, para o August, dinheiro para seu tratamento.

Ele chorava como uma criança, aí tive que me fazer de forte. 

Realmente o filho da puta do governo não ajudava, o preço das medicinas era terrivelmente caro.    Muitos morriam por não poder pagar o tratamento.

Um dos amigos dele, era o padre da igreja, seu confessor, contou durante a cerimônia, que ele não se confessava, pois dizia que fosse tirar a lista de pecados que tinha feito na vida, seria uma verdadeira confusão lá em cima.

Que o convidava para tomar um café, acabava eu contando meus problemas, de fé, de segurança, me incentivou a seguir em frente.

Foi uma missa muito bonita, depois veio falar comigo, me entregou uma carta, enfiei no bolso, pois sabia se lesse alguma coisa agora que estava muito emocionado, era capaz de ter um enfarte.

No carro em direção a Aix, contei ao Paul o que ia fazer, vender tudo em Paris, vir viver ali, arrumaria alguma coisa que fazer, já que não podia ficar quieto.

Caralho, vou ter que vir contigo, ontem a única boa noticia que tinha era para te dizer que me aposentei.  Não tenho por que ficar em Paris.  Com seu natural sorriso sardônico, perguntou se aceitava hospedes.   Ele tinha sido meu hospede em Aix mil vezes.

Claro que sim amigo, afinal estamos sozinho no mundo, ri lhe dizendo, pois sabia que ele gostava de jovens, depois tem a universidade da cidade, cheia de jovens querendo explorar e corromper uns senhores velhos.   Foi a primeira risada do dia.

Esqueci completamente a carta, passamos dois dias na casa, fui falando dos planos que teria para ela.   Ele escolheu viver na parte de cima, como se fosse um apartamento a parte, compartiríamos cozinha.

Voltei para Paris, fechei o cabaret, tinha dinheiro para indenizar o pessoal que trabalhava comigo, tinha aprendido com Maurice administrar bem o que ganhava ali.

Falei com a construtora que queria o local, que falassem com meu advogado, ele negociaria o preço, lhe disse quanto queria, mas que não moveria nem um pé desse valor.

Ele foi esperto, pediu muito mais alto, assim acabei no lucro.  Tinha uma boa aposentadoria dos meus anos no governo, depois de muita luta para conseguir.

Paul no último instante, decidiu ir fazer uma viagem volta ao mundo, um cruzeiro como ele gostava, eu ao contrário odiava, ficava imaginando fechado num barco, que tinha limites, nem pensar.

Chamei uma ONG, dei tudo que não queria da casa, as roupas de show, para as meninas como eu chamava aquele bando de marmanjos, ficou como resto.   Levei alguns livros, roupas que gostava, minha foto de cabeceira, do Maurice me sorrindo, uma do August, o resto queimei no banheiro da casa.

Quando cheguei a Aix, levei uns dias para me acostumar, que agora viveria sempre ali.  Comecei a fazer largos passeios pela cidade, explorando como dizia o Maurice.

Num dos meus largos passeios, reencontrei um lugar que íamos sempre fazer compras juntos.

O dono fez uma festa imensa, a quanto anos não o vejo por aqui?

Sim desde que Maurice morreu, perdeu a graça, agora vim para ficar.

Ficou me olhando sério, me soltou em plena cara.  Eu tinha inveja dos dois, somos da mesma idade, quando os via juntos, pensava quero um relacionamento assim para mim.

Não sabia que Maurice tinha morrido.

Me deu seu telefone, quando quiser alguma coisa, é só pedir, terei o maior prazer em entregar.

Fiz uma das minhas brincadeiras preferidas, que tudo com prazer custava mais caro.

Riu, para ti eu faço tudo grátis.

Quando pedi pela primeira vez num dia de chuva no final da tarde, me disse que levava na hora que fechasse se tinha problema.

Chegou meio molhado, lhe ofereci um café, esse homem entrou na casa como um sol, foi ficando, estamos juntos até hoje, nos dias complicados, vou lhe ajudar na sua loja.

As vezes imagino o que diria o August, soltaria, eres um sem-vergonha, esse tipo é meu ideal, mas avançaste antes.

Tínhamos os dois por volta dos 65 anos, nem por isso menos vigor. Maurice tinha vinte mais do que eu, estaria agora com 80 e qualquer coisa, ou noventa, que importa isso.

Jean-Marie, ri quando falo nisso.   Me diz que mantem o local, para se ocupar, que andou muito pelo mundo, procurando uma pessoa especial, que sempre tinha se interessado por mim, mas estava o Maurice.

Agora é o momento que me abraça, diz, agora eres meu.   Talvez pela primeira vez, pode ser por causa da madures posso dizer que amo alguém.  É uma relação completa, sexo, carinho, companheirismo, tudo que alguém podia dizer perfeito.

Mas não comemos perdizes, porque algumas vezes discordamos completamente das coisas.

Paul, ah esse, conheceu no puto cruzeiro, um milionário português, vive agora numa bela mansão em Sintra.   As vezes os dois aparecem.

Paul a primeira vez que viu Jean-Marie, me disse que era um homem bruto, ri dizendo para ele, te enganas, é o carinho personificado, gosto dessas mãos duras percorrendo meu corpo.

FATHER / SAD SMILE

                                                     FATHER

Seu nome era Trevor Fustemberg, embora sempre tivesse pensado que isso era um nome que seu pai tinha inventado ao entrar nos Estados Unidos, pois lhe dava importância, anos depois descobriu que era seu nome verdadeiro, de um judeu, que nunca ia a nenhuma sinagoga, pois se sentia frustrado com a religião.  Embora seguisse todos os preceitos da mesma.

Um dia contou a ele, bem com a Helene sua irmã pequena, que seu pai era muito rico na França, mas tinha muitos filhos, com a chegada de Hitler ao poder, mandou os filhos para os quatro cantos do mundo, colocou à disposição de cada um, dinheiro para começarem a vida.  Mas ficou em Paris, com sua mulher, pois essa se negava a sair dali, estavam velhos, porque iam atrapalhar a vida dos filhos.  Claro morreram num campo de concentração nada mais ao chegar.

Seu pai o obrigou a casar-se num desses casamentos arrumados, sua mulher também era de família rica, recebeu um bom dote pelo casamento, ou seja começariam a vida em NYC, sem problemas.

Um irmão foi para a Argentina, outro para Australia, outro para Africa do Sul, mas com os anos perderam contato entre si.

Ele mesmo tinha tido seis filhos, mas seus preferidos eram Trevor e Helene, esta nasceu ao mesmo tempo que morria sua mulher, um problema derivado de uma gestação complicada, pois ela já não queria ter filhos.

Viviam num apartamento imenso, com uma governanta, bem como empregados suficientes para cuidarem deles.

Os dois cresceram a parte dos irmãos, Helene era a filha que nasceu muito mais tarde, com uma diferença dele de quase oito anos, era como seu brinquedo.  A adorava, os dois estudaram em casa com professores particulares, aprenderam a falar outras línguas antes de mais nada.

Os outros filhos, seu pai tinha suportado, nenhum era brilhante como eles, maus estudantes, o primeiro ia a universidade porque seu pai pagava.

Todos iam se casando com casamentos combinados, com outras famílias ricas, o que se casava recebia do pai um apartamento bom, de certo luxo.  Um dinheiro para começar alguma coisa, mas claro era mais fácil viver na sombra dele.

Já Trevor que tinha o mesmo nome do velho, era ao contrário, era um excelente aluno, gostava de estudar, mas ao contrário dos outros, quando descobriu que era judeu, passou a ir a sinagoga escondido, as vezes levava Helene com ele.

O pai quando descobriu não disse nada.

Trevor sempre tinha gostado da música, usava os cabelos compridos, como todos os jovens de sua geração, gostava do rock, de dançar, de fumar seus porros, ia aos concertos de rock, escondido de seu pai.

Quando esse lhe avisou que tinha que parar com isso, pois teria que ir à universidade, ao mesmo tempo se casar, lhe falou que tinha combinado seu casamento com uma rica herdeira judia.   Ele quando viu uma foto dela, a detestou ao momento, já a conhecia.  Era uma idiota segundo ele, filhinha de papai, que fazia todas suas vontades.

O pai insistia, pois era um grande negócio.  Ele fez uma coisa que ninguém imaginou, foi de visita a casa de cada irmão, para ver como viviam se eram felizes.  Sentiu como se abrisse uma geladeira, era pessoas frias, fúteis.    Pensou não quero nada disso para mim.

O velho insistia, dizia que ele tinha que se preparar para um dia assumir seu lugar, lidar com os irmãos mais velhos.

Não havia muita escapatória, já estavam quase no final da guerra do Vietnam, não teve conversa, foi a um concerto de um pré grupo que depois fariam sucesso nos anos 70, Aerosmith, no dia que se inscreveu usou esse nome, Trevor Aerosmith, em seguida sem muita preparação, embarcou, nunca deu noticia a família, era como se tivesse desaparecido da face da terra.

Voltou com a última leva de soldados, feridos, tinha perdido basicamente seu batalhão inteiro, numa guerra que já estava na final, tinha defendido já os ataques a Saigon, voltou com um ferimento na cabeça, além de um braço meio inútil.

Quando apareceu na casa de seus pais, foi um verdadeiro horror o encontro com a família, no primeiro almoço saiu da mesa, tudo o confundia.

Dois dias depois desapareceu. Ninguém sabia aonde estava.

Foi viver num acampamento de homeless que ainda não tinha esse nome, embaixo de um viaduto, conheceu uma garota que vivia ali, com seus pais, se enamorou dela, foram viver de okupas numa velha fabrica.  Quando ela ficou gravida, ele ainda pensou voltar com a família, mas sabia que seu pai jamais aceitaria isso, uma garota que basicamente tinha crescido pelas ruas, uma família que vivia nas drogas.

Seus pesadelos tinham fase, quando estava bom, trabalhava, trazia alguma coisa de dinheiro para viverem.  Deu o nome do filho de Trevor Aerosmith, que era grupo que agora fazia sucesso.  Seus pesadelos foram piorando, pois nunca tinha tratado do mesmo, com o menino nas costas, iam mudando de lugar em lugar, breve estavam nas drogas, pois era a única coisa que o fazia suportar os pesadelos.  Viviam numa barraca dentro de uma velha fabrica.

O menino crescia parecido com ele, mais moreno como sua mãe, mas o olhava, pensava, é uma cópia de mim.   Sempre dizia ao mesmo tens que ser tu mesmo sempre, defenda teus valores, o garoto o olhava como se não entendesse.   Ele achava que o menino aceitasse a vida que tinham, passaram uma larga temporada num acampamento no meio do nada, só com ex-combatentes, quando chegou o verão voltaram para NYC, pois o governador mandou destruir o acampamento.   Sempre existiria o medo dos radicais.

Sua companheira nunca entenderia, porque passava horas contando ao seu filho, tudo o que tinha sentido, lutado, para sobreviver.

As vezes repetia uma mil vezes essa palavra sobreviver. Ele tinha uns 10 anos quando drogado falou com o filho sobre essa palavra, sobreviver, os sentidos que tinha para ele, mas sabia que ia gravar isso na cabeça do seu filho, criando nele um instinto para sempre.

Sua companheira era como uma criança, apesar de viver na rua não estava preparada para isso, ele não entendia se sempre tinha vivido na rua, como buscava outra coisa.

Ali pelo menos ele se sentia livre, ficava imaginando se descobrissem que ele era na verdade o que aconteceria.

Um dia chegava a uma praça, viu de longe Helene com uma foto, mostrando para as pessoas, entendeu que ela o procurava, talvez fosse a necessidade que tinha de ir em frente, se escondeu, a escutou falando com as pessoas.  Tinha amadurecido rápido demais, mas ainda era a garota de quem ele sem lembrava nas horas baixas, gostaria de lhe dizer, livre-se do velho, faça algo, mas não podia.

Mal desconfiava que era ela que sustentava tudo, tinha estudado para levar os negócios, mas se negava a se casar como queria o velho, quando ele insistiu muito soltou na cara dele, que não podia porque era lesbiana.  Soletrou essa palavra na cara dele.

Ele achava que se casando resolveria isso, quando lhe apresentou um pretendente, um homem imensamente rico, se enfrentou ao pai, dizendo ao homem que agradecia o interesse, mas lhe perguntou se queria casar com uma mulher que gostava só de sexo com outra mulher.

Diante do escândalo, da fama que conseguiu com isso, seguiu solteira.

Nunca cessou de procurar o irmão, o único que tinha certeza de que a entenderia.

Como os outros irmãos, o pai lhe deu um apartamento, mas ela ao contrário dos outros, escolheu um mais longe possível daquele lugar, se perguntou mentalmente aonde poderia estar seu irmão, se resolvesse se esconder. Foi morar no Brooklyn.

Um dia a viu falando com sua companheira, acariciando a cabeça do seu filho.  Talvez por sorte não mostrou a sua fotografia para ela.

Em vista disso, foram morar em outro lugar, para os lados do Bronx, no meio de drogados, de pessoas complicadas.  Seus companheiros militares, que tinham caído no mais baixo da degradação humana.   Mas talvez por amar o filho, o levava para tomar banho no verão, nas fontes das praças, lavava seus cabelos compridos, com carinho, não queria que ele tivesse piolhos, como as outras crianças, roubava nas lojas, sabonete, para que tivesse um banho agradável, o acostumou, ensinou a se defender.   Não podia imaginar que seus ensinamentos o fariam ir em frente.

Agora tinha um problema derivado de sua ferida, os ruídos lhe pareciam mais fortes, uma brecada, ou um estouro, lhe faziam retornar a guerra.

Colocava seu filho para dormir o mais longe dele, pois tinha a visão muitas vezes de uma luta que tinha tido com um vietcong, que acabou matando, mas descobriu que no fundo era um garoto, isso o destroçou por dentro, pensava ele devia ter me matado, não ao contrário, não podia se perdoar por isso.  Quando tinha esse pesadelo, tinha medo de matar seu filho.

Cada vez estava mais tempo em silêncio, sua companheira estranhava, só quando estava perto do filho falava, era como se estivesse dando diretrizes para sobreviver.

As vezes drogado, repetia outra mil vezes tudo relativo a essa palavra, seus significados, seu filho lhe prestava atenção.  Se fosse outra criança, se afastaria, mas ele não ficava ali sentando segurando a mão do pai como se temesse perde-lo.

No dia que desapareceram, o deixou como sempre no acampamento tendo aula com o professor.    Estava se sentindo muito mal, foram atrás de dinheiro, drogas, o ruido da cidade o atordoavam atrás da orelha tinha um tumor, não sabia, isso diriam posteriormente os que fizeram sua autopsia, um tumor imenso no crâneo que lhe devia provocar muitos problemas.

Ninguém tinha entendido como se tinha metido no meio do tiroteio entre a polícia com os traficantes de drogas, sua companheira foi quem primeiro levou um tiro na cabeça, se sentiu outra vez em plena batalha, viu um traficante jogado no chão com uma metralhadora, se apossou dela, saiu atirando para ambos os lados, até que caiu varado por balas.

Foi enterrado como Trevor Aerosmith, porque levava presa no pescoço uma placa do exército com esse nome, número, mas não se encontrou nenhuma família com esse sobrenome. Tampouco na ficha militar constava, quando a preencheu, não colocou parentesco nenhum, como se tivesse saído de um orfanato.

Mal sabia que seu filho, seguiria seus mandamentos, sobreviver de todas as maneiras, que teria um caminho largo pela frente.

                                           SAD SMILE

Seu nome era inventado, ou melhor roubado, vivia desde criança indo de uma acampamento a outro de homeless, as vezes conseguiam ocupar algum edifício abandonado.

Tinha aprendido a ler, escrever o básico, com um professor que vivia por ali, se ocupava das crianças enquanto os pais iam conseguir algo de comer, que compartiam com ele.  Tinha tuberculose, mas não queria tratar, as vezes quando alguém argumentava com ele, dizia, que adiantava, se não tinha sonhos, nem futuro.

Mas o interessante que insuflava nas crianças a ideia de sonhos a serem realizados.

Um dia seus pais não voltaram, ficou vivendo no mesmo edifício abandonado, agora ele ia pelas ruas pedindo dinheiro, ou mesmo como lhe dava vergonha, recolhia comida jogada em algum restaurante, tinha já uns 12 anos, apesar de tudo era alto, magro, aparentava mais.

Viu um cartaz procurando um ajudante de cozinha, perguntou ao homem que estava ali fumando se ele podia se candidatar.

Procurava andar o mais limpo possível, ali tinha uma garagem, o levou até ali, com uma máquina raspou sua cabeça, embora ele explicasse que lavava a mesma, mesmo que fosse num parque.  O mandou tomar banho, lhe deu uma toalha pequena, uma muda de roupa branca, lhe explicou como amarrar um lenço na cabeça, assim começou a trabalhar para ele, era um restaurante de comida para levar, havia que estar cedo, preparar sanduiches para os que iam trabalhar, depois ajudava a fazer o café, tudo era colocado num saco para a pessoa, o chefe ficava no caixa enquanto isso.  Foi aprendendo em breve manejava muitas coisas sozinho.

Tempos depois, consegui alugar um pequeno apartamento, velho, caindo aos pedaços, mas era jovem para subir os cinco andares sem elevador.

Aprendeu uma coisa, dizer sempre bom dia, para todo mundo, mesmo que seu sorriso fosse triste, sorrir, desejar aos outros o que ele não tinha, no fundo não tinha importância, sabia que dependia dele sobreviver.

Agora afastado dos homeless, ficava com pena do pessoal que tinha desistido de lutar, mas pensava, quem sou eu para julgar, cada um escolhe o seu caminho, não sei de aonde saiu a maioria, que sonhos tinham.

Ele queria sim ter um teto seguro para viver, aonde vivia tinha o mínimo, como comia, no restaurante, trazia para casa o que sobrava, para aquele dia, pois não tinha geladeira, se deu ao luxo de comprar um edredom barato, trouxe do acampamento, um saco de dormir, que lavou, desinfetou, era nele que dormia no chão, mas tinha uma coisa, limpava o lugar muito bem, não era porque era pobre que ia viver sujo.

O patrão tinha o mesmo tamanho que ele, lhe deu uma porção de roupas que não usava mais, ele não se incomodava, estavam sempre limpa, lavava tudo na pia do pequeno banheiro, deixava secando no verão com a janela aberta, no Inverno era um problema mas se apanhava.

Não era registrado, ganhava por fora, guardava cada gorjeta que lhe davam, o dinheiro que o homem lhe pagava, escondia, num velho armário do banheiro, por detrás, num saco plástico, gastava o mínimo possível.   Quando acreditou que fazia 17 anos, procurou ajuda de uma ONG para tirar seus documentos, a muito custo, conseguiu que colocasse que tinha 18 anos.   O patrão era malandro, achava que o tinha ajudado, mas ele de tonto não tinha nem um pelo, procurou nas horas vagas algum lugar, quando conseguiu, com um salário melhor, ser registrado, foi franco com o homem, agradeceu muito a ajuda dele, não ia fechar a porta nunca se sabia do futuro.  O homem se surpreendeu, pois soltou que normalmente as pessoas nem apareciam para acertar o resto do salário.   Por isso lhe pagou o mês completo.

Agora aprendia cozinhar outro tipo de comida, era honesto no que fazia.   Aprendia corretamente, nesse trabalhou durante quase dois anos, seguiu assim, quando saiu, procurou outro diferente.

Quando avisaram que tinham que sair do edifício, pois ia ser demolido, recolheu suas poucas coisas, enfiou num saco, escondeu bem o dinheiro, arrumou outro lugar similar, um pouco melhor, pois tinha agua quente, para o inverno, além de calafetação, o caseiro lhe arrumou alguns moveis, que algum antigo morador tinha deixado, uma velha poltrona, um estrado para colocar um colchão, pelo menos tinha um elevador velho, mas que funcionava.

No verão subia para dormir na varanda que tinha em cima. Gostava de dormir olhando as estrelas pensando no que poderia fazer com seu futuro.

Seguia guardando todo o dinheiro que podia.

Escutou um dia, um dos cozinheiros falando de um curso de cozinha francesa, reclamava que era caro o curso, mas foi se informar.  Lhe atenderam bem, explicou sua situação, sobrava uma vaga, como se fosse uma bolsa de estudos.

O francês se interessou por ele, tinha um restaurante em Toronto, viu que ele se esforçava para aprender.  Um dia se insinuou para ele, demorou para entender, não tinha traquejo sexual, nem vivência no assunto, estava sempre preocupado em sobreviver, para pensar nisso.

Foi honesto com o homem, me desculpa, devo estar entendendo mal, sou honesto, não tenho nenhuma prática sexual, em nenhum âmbito, estou mais preocupado em sobreviver.

O professor ficou de boca aberta, pois viu que ele estava sendo honesto.

Perguntou se ele tinha algum dia livre, vou cozinhar no restaurante de um amigo, vejo que me entendes, se eles te veem trabalhar, pode ser que te contratem.

Pediu um dia de licença aonde trabalhava, foi com o professor.  Ele tinha razão o chefe, disse que era raro um americano se esforçar tanto.  O contratou, ganhava mais, mas nem por isso mudou de casa, seguia economizando.  Como ele dizia, não queria que o mundo o pegasse de calças curtas.

Fez tudo para seguir em frente, mesmo nesse lugar.   Agora já comprava roupas simples para ele, mas descobria aonde comprar mais barato, nada de roupas de marcas como via os outros fazendo.   Para ele o mais importante era andar limpo, por sorte a roupa que usava na cozinha, era lavada no próprio restaurante, por isso estava sempre limpo, ao começar o dia trabalhando.

Aprendeu nova maneiras de cozinhar, agora mais refinada, era intuitivo.

Um dia lhe perguntaram se cozinhava em casa, riu, disse que tudo que tinha na cozinha era uma cafeteira para o café, duas taças, um prato, que nunca cozinhava em casa.

Mantinha como desde o primeiro dia seu cabelo rasurado, pois assim não ficava com o cheiro da cozinha. O mesmo fazia com sua roupa, as colocava dentro de um saco de plástico hermético, assim não ficavam com o cheiro da cozinha.   Este lugar tinha um banheiro para tomarem banho depois de sair.

Deste foi convidado, o que para ele era como se sentir subindo na vida, num outro restaurante que só abria de noite, mas tinha que deixar a maior parte da comida elaborada, então trabalhava da tarde até as duas da manhã, quando saia deixando sua parte da cozinha limpa, brilhando, ninguém precisava dizer que o fizesse, entendia que era parte do seu trabalho.

O proprietário o observava.

Finalmente como lhe pagava o salário num banco, colocou todo seu dinheiro lá, mas quando lhe ofereceram um cartão de credito, não se interessou, fazia uma coisa, sabia mais ou menos quanto gastava por mês, isso ele tinha seu esconderijo, para o dia a dia.

Um dia que foi ao banco, um gerente lhe sugeriu que aplicasse seu dinheiro para ir rendendo, tinha já escutado muitas conversas, sobre aplicações, gente que comprava ações, que se podiam perder, aceitou um sistema, que ele nunca perderia o dinheiro que tinha.

Na parte da manhã, fazia todos os cursos possíveis, aprimorava tudo que sabia, no momento fazia um de doces, coisas delicadas francesas.

Quando o que fazia isso no restaurante saiu, ele imediatamente se ofereceu para o lugar, lhe fizeram o teste, de fazer tudo que estava na carta.  O fez, mas perguntou se podia sugerir fazer algumas mudanças, disse que analisaria no mês o que saia mais, o que saísse menos, colocariam receitas novas.

O chefe estava encantado com ele, pois chegava mais cedo, preparava tudo, depois ia fazer seu trabalho normal, não precisou pedir, nem que o próprio chefe da cozinha o fizesse, recebeu um aumento.

Os anos foram passando, ele achava engraçado em notar, que as pessoas o olhavam, mas ele nunca estava interessado nelas, seguia sendo virgem, não tinha pensado nisso ainda, nem se interessado por ninguém.

Na cozinha gozavam dele, mas não era com ele.   Escutava sim os outros falando das decepções, os romances de uma noite, o frustrados que ficavam.  Alguns reclamavam que buscavam um amor, ou alguém com quem pudessem compartir uma vida.

Um dia lhe perguntaram a respeito, num respiro, antes de começarem o serviço noturno.

Não sabia se dizer a verdade ou mentir.  Por sorte foi salvo pelo gongo, pois o chefe lhe chamou para uma reunião, o restaurante no final de semana, teria uma parte fechada para uma festa, queriam saber o que ele poderia sugerir de doces para o final.

Perguntou se era um aniversário, embora ele nunca tivesse tido nenhum, sabia como preparar.

Sim comemoram o aniversário do patriarca de uma família.

Deu uma série de sugestões de pratos, viria uma senhora experimentar tudo.

Achou estranho, que ela o olhasse muito, mas estava atendo em saber se ela gostava ou não.

Preparou tudo como ela pediu, algumas coisas com um dia de antecipação, no dia da festa, preparou o resto logo cedo.   Depois passou a ajudar o chefe da cozinha a preparar o resto, sem reclamar como alguns estava fazendo.

Se escutava claro que eram muitas pessoas.

Quando acabaram o serviço, o patriarca, pediu ao dono do restaurante, que chamassem os cozinheiros, para elogiar o trabalho.

Quando o viu ficou de boca aberta, perguntou seu nome?

Meu pai sempre me chamou de Trevor Aerosmith, mas descobri depois que esse não era seu sobrenome, que nunca soube qual era, mas mantive esse quando tirei os documentos.

Aonde anda seu pai?

Não tenho a menor ideia senhor, os dois um dia desapareceram, nunca mais os vi. Não sei portanto se morreram ou não.

O dono do restaurante não entendia, então fez um sinal de que podiam ir para a cozinha.

Nesse dia todos receberam uma boa gorjeta.  Que como sempre foi parar no banco.

Dias depois estava para entrar cedo para fazer as sobremesas, viu na porta um senhor bem-vestido.  Perguntou se ele era o Trevor Aerosmith?

Sim sou eu, algum problema?

Podemos tomar um café?

Sim, foi com o homem ao café em frente do restaurante.  Este lhe explicou que o senhor que tinha estado no restaurante, ao qual tinha sido oferecido a festa, disse que tu eres igual ao filho que desapareceu, depois de voltar da guerra.  Se podias fazer um teste de ADN.

Eu já disse ao senhor que não tenho ideia aonde estão meus pais, me deixaram num acampamento de Homeless, a partir desse momento, fui sobrevivendo, fui aprendendo a cozinhar, essas coisas.

Mas porque ele quer fazer isso, já procurou seu filho?

Nunca foi encontrado.

O homem insistiu muito, ele tem uma boa idade, gostaria como ele diz, de morrer tranquilo, sabendo ou não que eres seu descendente.

Combinou com o homem, no dia seguinte foi ao médico com ele logo de manhã.

Duas semanas depois apareceu, perguntou se ele tinha livre a manhã do dia seguinte.

Ele lhe explicou, que usava as manhãs para preparar os doces, assim ganhava um dinheiro extra.

Mas no domingo de manhã, como não abrimos, estou livre.

O advogado comentou, que outra pessoa estaria ansiosa.

Ele depois de tirarem seu sangue, seguiu como se nada tivesse acontecido, nunca tinha precisado de uma família, não ia ser agora que sairia procurando, afinal ele nem sabia o sobrenome de seu pai.

Mas no domingo, se arrumou como sempre, nenhuma roupa especial, fez a barba, rasurou a cabeça como sempre fazia, lavou sua roupa interior, depois foi até o restaurante, aonde o advogado lhe esperava.   Não tinha dado a ele o endereço da sua casa, isso era uma coisa que ele não fazia.

Foram para a parte mais fina da cidade, com edifícios residenciais de luxo.

Quando entrou, viu que a família toda estava ali.

Disse bom dia a todos, espero que todos estejam bem.

Foi levado a uma biblioteca, aonde estavam sentados o senhor, além da senhora que tinha conhecido no dia da prova do restaurante.

Ela se apresentou, bem como seu pai, lhe perguntou se o sobrenome lhe dizia alguma coisa?

Isso eu já respondi, não, se tem a ver como meu pai, eu só tinha meu nome anotado num pedaço de papel, pois o homem que nos ensinava a ler, escrever, no acampamento perguntou um dia, riu muito quando ele disse Trevor Aerosmith, só muito tempo depois fui descobrir que era o nome de um grupo musical, que aliás não gosto.

Gostas de música?

Ele ainda pensou por que tanta pergunta.   Mas respondeu nunca tive tempo para parar para ficar escutando nada.   Agarrei a primeira oportunidade que tive, aos doze anos, para aprender a cozinhar, para deixar de comer comida do lixo, me dava muita vergonha pedir dinheiro na rua para comprar comida, então comia do lixo dos restaurante.

A cara dela era impressionante.

Bom, fez um sinal ao seu pai.

Meu filho, o resultado dos teste deu positivo, fizemos em outro laboratório também, deu a mesma coisa.  Ao que parece você é filho do meu filho Trevor, que desapareceu, logo que voltou da guerra.

Ele ficou olhando serio o homem, não sabia o que dizer.

Sinto muito, eu não preciso de uma família a estas alturas da vida, vejo pelo lugar em que vivem que devem ter dinheiro, mas sou honesto de dizer que não me interessa nada de vocês.

Se levantou, disse bom dia, apertou a mão do homem que devia ser seu avô, desculpe decepciona-lo, mas meus pais, um belo dia saíram para comprar drogas, nunca voltaram, eu aprendi a viver, me defender sozinho, posso dizer que sobrevivi.

Virou as costas, saiu, atravessou o salão interior, até a porta de saída, com todo mundo olhando para ele, foi dizendo até logo, passem bem.

Desceu pelo elevador, nem sabia como ir embora dali, foi até uma entrada do metro, viu qual lhe serviria, foi embora.

Pela primeira vez, chegou em casa, se jogou na cama como estava, cruzou as mãos atrás da cabeça como sempre fazia, tinha pegado esse hábito, porque inicialmente não tinha travesseiro, depois por hábito para pensar.

Não tinha com quem falar sobre o assunto.  Mas claro era bom observador, viu a cara da família que o observava ao entrar, com certeza pensavam mais um para compartir a herança do velho.

Tomou uma decisão, tinha o telefone do dono do restaurante, sempre o tinha tratado bem, o chamou, perguntou se podia conversar com ele.

Foi até sua casa, contou o que tinha descoberto, não quero nada dessa gente, meu medo é que comecem a aparecer pelo restaurante, preferia me afastar daqui.

De uma certa maneira, lhe contou como tinha sido sua vida, não quero nada deles.

O que o senhor recomenda?

Eu não gostaria de perder meu melhor empregado, se eu fosse você enfrentaria a família, se começam a incomodar, peça uma ordem de afastamento, isso posso conseguir com o advogado da empresa.   Mas não fuja, não faça como teu pai, pois no momento que faças isso, nunca mais deixaras de fazer.

Agradeceu muito ao homem.

Esse disse que tinha uma curiosidade a respeito dele, nunca te vi perdendo tempo, falando em romances, ou discutindo futebol, ou mesmo parando o trabalho para sair para fumar um cigarro.

Nunca tive romances, o resto incluído, tinha que sobreviver, quando comecei a trabalhar no primeiro restaurante, foi porque o dono me pegou fuçando no lixo atrás de comida, tinha vergonha de pedir dinheiro, era alto, tinha 12 anos, me deu o meu primeiro trabalho, mas sem registro. Quando fiz 17 anos, ou acho que tinha essa idade, nunca soube quantos anos certos que tinha, procurei uma ONG, eles arrumaram minha documentação, foi então quando descobrir que o meu sobrenome era de uma banda de música, deixei igual, embora quando escutei os dito cujos, não gostei.  Nunca procurei pelos que seriam meus pais, pois imaginei já que andavam nas drogas, ou tinham morrido, ou desaparecido.   Eu não queria ir para um orfanato, primeiro vivi num edifício de okupas, depois quando já tinha dinheiro, fui mudando, agora vivo num lugar decente, simples mas decente.   Meu primeiro patrão me ensinou que eu devia andar sempre limpo, pois isso, coloquei na minha cabeça, que o meu espaço de casa, bem como aonde trabalho sempre devem estar limpos.

No dia seguinte quando chegou, o advogado estava lá com a senhora, que pelo que tinha entendido era sua tia.   Disse que se não o deixava em paz, pediria uma ordem de afastamento, não estou interessado no vosso dinheiro, quero somente seguir meu caminho, tinha pensado em fugir da cidade, mas meu chefe me disse que não devia fazer isso.

Não sabia, tampouco imaginei qual seria o nome do meu pai, ou da minha mãe, por isso, sempre manterei o de Aerosmith, não quero vosso sobrenome.  Financeiramente estou bem, não preciso de nada mais do que eu já tenho.

A cara da senhora era espetacular, sem saber ou não se acreditava nele.  Pediu desculpas, mas tinha que trabalhar, espero que disfrute de vir comer aqui, mas jamais me chamem. Por favor.

Entrou para trabalhar, tive que se concentrar, tinha medo de errar alguma receita.

Nunca mais os viu, tempos depois escutou o dono do restaurante falando de um curso em Paris, perguntou em particular a ele se podia fazer, tinha dinheiro guardado.

O homem lhe disse que lhe daria uma resposta no dia seguinte.

Se sentou com ele, perguntou se ele pensava em voltar?

Sim, só quero saber mais, veja as sobremesas, eu desfruto muito fazendo, mas acabam sendo repetitivas, eu gosto sempre de fazer coisas novas, descobrir como fazer.

Então tenho uma proposta, pago a metade do curso, bem como a viagem.

Agora quem tem que pensar sou eu.  Pois ficaria em divida com o senhor, nunca gostei disso, ter divida com ninguém, nunca comprei nada a prestação, ou como o senhor possa imaginar. Prefiro eu mesmo pagar tudo, tenho dinheiro economizado para isso, já olhei inclusive um voo que me saia barato, um pequeno hotel, afinal o curso são só vinte dias.  Deixarei a maioria dos doces congelados, assim cada dia, teria que retirar somente o que se fosse usar.

A cara do homem era fantástica, acabou contando que a família o tinha procurado para que ele intercedesse, mas rejeitei, depois se ofereceram para comprar o restaurante em teu nome, de novo rejeitei.

Por favor nunca ceda a eles, porque senão eu iria embora.

Preparou tudo, só comprou abrigos de segunda mão, porque seria inverno em Paris.

Conjugou fazer curso, com ir pelos lugares mencionados pelo professor que tinha tido, para comer, imaginar como se fazia isso ou aquilo.

Ao mesmo tempo conheceu os lugares emblemáticos, um belo lugar para acabar a velhice, ao mesmo tempo que pensava, que idiotice, tinha visto tanta gente morrer jovem no acampamento, nunca tinha tirado da memória, um jovem ao qual faltava uma perna, morto com a seringa ainda presa ao braço.   Por isso tinha horror a palavra drogas.

Quando voltou, os senhores do edifício, lhe fizeram uma festa imensa.  Achou estranho, mas acabou descobrindo, o caseiro lhe disse que tinham lhe oferecido dinheiro para entrar no teu apartamento, eu me neguei, nunca mencionaste essa senhora que chegou aqui com um carro com chofer.  Me soltou que queria melhorar teu apartamento.  Lhe disse que sem tua autorização nada feito.

No restaurante lhe fizeram uma festa, nesse mesmo dia, preparou uma receita nova, que o chefe da cozinha provou, bem como o dono do restaurante.  Uau disse ele.  Como pretendes fazer?

Bom aprendi muita coisa, bem como imaginei não gastar todas a ideias de uma vez.  Se mudamos radicalmente a carta, os clientes vão estranhar, então penso que o melhor seria, fazer de uma maneira simples, cada semana retiramos o menos vendido, incluímos uma coisa nova, se faz sucesso, continua na lista, senão cancelamos, incluímos outra.

Mas seguiu sua vida como se nada.

Um dia o proprietário o chamou ao escritório, lá estava a senhora, ela estendeu a mão, sou tua tia Helene, meu pai está muito mal, quer te ver antes de morrer, te peço por favor que vá visita-lo, arrumarei de uma maneira que toda a família não esteja lá para te incomodar.

Assim fez, ele ficou com pena do velho, deitado numa cama imensa, num quarto que era maior que seu apartamento.

Segurou a mão dele, ele pediu que ele se aproximasse para olhar bem seu rosto.

Pediu que abrisse a mesa de cabeceira, tens aí uma carta, minha para ti, mas só abra depois que eu morrer.   Peço desculpas por tudo.

O senhor não tem que me pedir desculpas, talvez eu tenha sido mal-educado, mas cresci me virando sozinho, uma ideia de família me aterra, não saberia como me comportar com uma família como tem o senhor.

Me fale de sua viagem a Paris?

Contou dos cursos que tinha feito, coisas que tinha aprendido.

Lhe perguntou se tinha aprendido a fazer um doce que quando ele ia, visitava esse restaurante para isso.

Ele riu pela primeira vez, meu professor daqui falava nesse doce, fui lá provar, depois aprendi a fazer no curso que fiz.

Como amanhã é domingo, mandarei alguém trazer para o senhor, ou sua filha pode ir buscar.

A filha que estava ali, sorriu, eu irei papai.

Ele segurou sua mão outra vez, disse nela podes confiar, sempre respeitara tua vontade, sua grande lastima, foi nunca ter conseguido encontrar teu pai.

Se despediu dos dois, ela queria mandar o motorista o levar, ele disse que não se incomodasse, pegaria o metro.   Só pediu que ela nunca voltasse aonde ele vivia, isso o incomodava.

Foi embora, no dia seguinte preparou o doce, pediu para o proprietário avisar sua tia.  Um carro veio buscar, no final do dia, lhe chamaram para atender um telefonema, era o velho para agradecer, foi o meu melhor presente em muitos anos, obrigado meu filho.

Ele agora uma vez por semana mandava para o seu avô o doce mas não ia até la, não tinha nada para falar com ele.

Sua tia Helene, lhe avisou da sua morte, pelo menos morreu em paz, em saber que tem um neto que é melhor que os filhos que ele criou.

Lhe avisou da cerimonia do enterro.  Foi com o proprietário do restaurante.  Assistiu a mesma, mas quando lhe convidaram para a recepção, pediu desculpas mas tinha que trabalhar.

Dois dias depois o proprietário lhe chamou, estava rindo, te livraste de uma boa.

Porque perguntou ele.

Teu avô deixou a empresa para tua tia, que não tem filho nenhum, além de deserdar todos os que nunca fizeram nada na vida, que sempre viveram pendurados nele.

Todo o dinheiro que tinha será repartido por ONGs, que cuidam dos homeless, em nome do teu pai Trevor Fustemberg.

Nem ele sabia que esse era o sobrenome de seu pai.  Ele tinha firmemente decidido que seguiria usando o seu Aerosmith.

Um dia foi ao banco para analisar suas finanças, quando lhe apresentaram, tinha um valor incrível, falou como gerente, não tenho todo esse dinheiro.

Ele foi depositado a mando do senhor Fustemberg, quando fizeram isso, disse que tinha deixado uma carta para ti.

Ele tinha se esquecido completamente da carta que tinha entregado em mãos, a tinha guardado.

Quando chegou em casa a localizou numa mesa que guardava suas coisas, tinha se esquecido completamente dela.

Apesar de ser tarde, estar cansado, leu.

Querido neto,

Me deste uma lição muito merecida, eu sempre comprei meus filhos com meu

Dinheiro, teu pai foi o único que sempre foi rebelde a isso.

Entrou para o exército, como uma maneira de fugir de meu controle.

Voltou destroçado, eu queria que fosse para um hospital particular, para que ele

Não tivesse que conviver com a gente que estava ali, que me horrorizava, mas ele

Escapou, indo viver nas ruas com os que tinha passado pelo mesmo que ele.

Nunca mais o encontrei, imagino que tenha adotado o sobrenome Aerosmith que

Era seu grupo de rock favorito.

Minha filha Helene, nunca me perdoou por isso, ela amava o irmão, o procurou como uma louca, por isso confie nela.

Os outros ao longo dos anos, desfrutaram de todo meu dinheiro, já lhes dei dinheiro suficiente a vida inteira.   No dia que apareceste aqui, me perturbaram, tinha medo de que te favorecesse.

Por isso no meu testamento, não consta para nada, mas não sou um velho tonto.  Sei que um dia iras querer realizar teu sonho, ter um belo restaurante francês, por isso te deixo um pouco de dinheiro para isso, não corresponde nem a um terço do que o resto já usufruiu.

Minha filha Helene, ira contribuir com ONGs em nome de teu pai, para ajudar aos incompreendidos que estão pelas ruas do pais inteiro.

Que eu mesmo nunca entendi.  Nem podia imaginar que meu filho vivesse assim.

Perdoe esse velho egoísta, que sempre pensou que sabia de tudo, acabou que descobri que não sei de nada.

Deus te abençoe

Trevor pai.

Ficou emocionado, a guardou bem guardada, a iria colocar num cofre do banco, bem como esse dinheiro, não queria que estivesse na sua conta.

Sem querer do envelope caiu uma corrente com um coração, ali estava uma foto de seu avô quando jovem, com sua avô,

No dia seguinte foi ao banco, alugou uma caixa forte, retirou o dinheiro da sua conta, bem com o envelope, guardou tudo ali.

Uma vez por mês sua tia Helene vinha jantar, depois esperava para comer com ele, alguma receita nova de doce.

Contava como ia as ajudadas, entendi que não posso modificar a vida de todos, mas sim colocar uma espécie de ambulatório por perto, que os ajude, bem como um albergue, para tomarem banho, cortarem cabelos, que tem um consultório médico, o primeiro a funcionar é aonde você me disse que vivia.  Já esta funcionando, ninguém reconhece o nome do teu pai, como apelido da família, por isso, optei a usar o de Trevor Aerosmith.  Que no fundo é bom, pois meus irmãos e sobrinhos não entendem.

Todos fizeram universidade, agora fora os benefícios que sempre tiveram do meu pai, cada um tem um bom apartamento, uma mesada, mas tem que trabalhar, estão tendo dificuldades, pois nunca fizeram isso.

Estou liquidando toda a empresa como ele me pediu, investindo o dinheiro nas ONGs por todo o pais, quando funcione sozinho, vou realizar o sonho de minha vida, viver um tempo em Paris, estudar história da arte que foi meu sonho.

Um detalhe, teu pai adorava ficar na cozinha vendo as senhoras que trabalhavam ali, fazerem comida, dizia que um dia seria um grande cozinheiro, achei essa foto no meio de suas coisas.

Se parecia a ele, na mesma idade, ele no meio das cozinheiras.

Agradeceu a foto, comprou um porta foto, a colocou na sua mesa que usava para estudar.

Agora fazia um curso de francês, queria saber falar direito para um próximo curso.

Tempo depois o proprietário, alegando que estava ficando velho, sem herdeiros, propôs a ele, bem como ao chefe da cozinha uma sociedade.

Foi ensinando aos dois como administrar o restaurante.

Primeiro pensou que estava apaixonado por ele, pois era a primeira pessoa que se preocupava por ele, era mais velho que ele vinte anos, um dia lhe disse isso, sei que o senhor é gay, esta sozinho, podia me ensinar a fazer sexo.

A cara dele foi ótima, Jean Paul Lausde, disse que a muito tempo se interessava por ele, mas tinha medo, pela diferença de idade.   Mas se completavam, só refutou muito ir viver com ele, mas acabou aceitando, ou melhor entraram num acordo, um outro apartamento, aonde passariam a viver, mais simplesmente.   Pela primeira vez, preparava um café da manhã para outra pessoa, Jean Paul dizia que estava vivendo uma segunda juventude.

Lhe ensinou muitas coisas, viveram juntos mais de 15 anos.   Quando ele morreu, deixou o restaurante para os dois sócios.  Mas seu chefe de cozinha, queria partir para outros voos, concordaram em vender o mesmo.

Ele iria passar uma temporada em Paris, tinha ido duas vezes com Jean Paul, nas férias quando fechavam o restaurante, tinha conhecido agora a cidade de outra maneira.  Com o patrimônio que tinha construído, nunca mexeu no dinheiro do avô poderia ter uma vida por um tempo por lá bem simples.

Procurou pela tia, para dizer o que tinha resolvido, soube que já fazia tempo que vivia em Paris, conseguiu seu endereço.

Arrumou uma bagagem, simples, alugou um apartamento, pequeno, mas como ele gostava, limpo.

Quando a procurou, deu que ela tinha uma loja de antiguidades, tinha até remoçado, pela primeira vez a deixou abraça-lo, tinha aprendido isso com Jean Paul.  Antes dele morrer tinham se casado, para ele não ter problemas com o apartamento que tinham juntos, bem como a parte do restaurante.

Agora uma vez por semana se encontravam para almoçar ou jantar.  Ele estava aproveitando para fazer pequenas viagens para conhecer melhor o pais.

Um dia sua tia lhe contou que eles eram judeus, que na verdade seu pai Trevor, tinha adotado esse nome ao entrar nos Estados Unidos.   Toda nossa cultura era de aqui.  Aqui voltei a frequentar a sinagoga, que ele odiava.

O foi apresentando para muita gente que ela tinha conhecido.  Foi quando teve uma paixão impressionante com um escritor, riu muito quando este lhe fez um comentário.

Ela lhe disse como podia ele ter impressionado a pessoa mais chata que ela conhecia, a Flaubert Jean, ele inclusive usa o nome invertido, loucura da cabeça dele.  Me pediu o número de celular.  Deve ter ficado mais surpresa ainda, quando ele disse que podia dar.

Começaram os dois a se encontrar para comer, um verdadeiro namoro.  A primeira vez que estiveram na cama, foi como uma explosão, Flaubert dizia que com ele podia falar, sem ter uma postura de intelectual, pois lhe entendia.  Agora iam a todos os lugares juntos, ele na cozinha da casa dele, preparava pratos para ele.  Ele que era muito magro dizia que ia engordar, não somos jovens assim para esse tipo de comida.

Demoraram a irem viver juntos.  Mas chegou o momento que um já não sabia viver sem o outro, os conhecidos estranhavam, estavam acostumados ao mal humor que sempre tinha, agora era agradável, sorria, quando não queria dizer nada.

Quando começavam alguma conversa sobre filosofia, ou outra coisa, ele voltava ao seu ataque de mal humor, se vocês nunca viveram, a maioria nunca trabalho, como podem querer consertar o mundo.

Trevor se matava de rir, pois ele pensava a mesma coisa.

Trouxe todas suas coisas que NYC, agora convivia mais com sua tia Helene, que sempre lhe contava alguma coisa de seu pai.  Ela não se perdoava, ter aceitado a vontade de seu pai, com relação ao irmão, ele antes de fugir para o exército, meu pai já tinha um casamento combinado para ele, bem como que assumisse suas empresas.

Quando ele desapareceu, fiquei desesperada, perdia o único irmão com quem podia falar, sonhar, compartir desejos, claro nenhum deles encaixava nos objetivos de teu avô.

Mas nunca descobri aonde poderia estar, pois usava esse novo sobrenome, aliás pelo que descobri, foi com ele ao exército.   Depois que te conheci, procurei descobrir quem era tua mãe, mas nada foi possível.  Nos acampamentos nunca estão interessados na vida das outras pessoas. Ninguém sabia nada.

Sabe as vezes penso, que com isso ele me ensinou a sobreviver, o pouco que me lembro, era que sempre dizia bom dia para todo mundo, estava sempre sorrindo, me dizia mesmo que teu sorriso seja triste, não importa, sorria.

SUBSIST

                                          

Subsistir, sobreviver a qualquer custo, não é fácil, mas isso pode fazer parte de tua vida, inclusive contar como medalhaS para quando chega na parte que é só uma rampa de descida para o final da vida.  O bom é poder olhar para trás, pensar, confesso que vivi.

Nessa fase agora, que ia anotando num bloco, as coisas que ia se lembrando do passado, ria, porque sempre tinha lhe parecido interessante isso, que depois de uma certa idade, as pessoas não se lembravam do que tinham comido, mas coisas do passado sim.

Ele com uma idade precoce, sentia que não pertencia ao mundo de sua família, não encaixava ali.  Eram descendentes de poloneses, que tinham fugido antes da guerra, imagina, judeus, poloneses, não havia maneira que não fosse essa, seu avô era professor na universidade de Varsóvia, quando viu o andar da carruagem, como ele dizia, enfiou tudo no seu velho carro, sua mulher que não queria ir embora, seus dois filhos, no teto arrumou umas maletas daquelas antigas, de papelão duro, com um pouco de roupa para cada um, escondeu embaixo dos bancos, os livros que usava para rezar, nunca ia a sinagoga, rezava em casa.

Se atreveu a fazer uma coisa, atravessar a fronteira com Alemanha, justo na fronteira, ajudado pelo meu pai, roubou umas placas de um carro estacionado numa rua deserta, como falavam todos alemão foi fácil passar por eles, era loiros, altos, olhos azuis, todos muito brancos, atravessaram o pais inteiro, entraram na Holanda, pegaram um navio para os Estados Unidos.

Entraram legalmente no pais, como se viessem de férias, logo pediram asilo, quando Hitler invadiu a Polonia.  Nessas alturas tinham atravessado o pais inteiro, com um Ford de segunda mão que comprou em NYC, não estavam fazendo turismo, procuravam sim um cidade para viver.

Foram parar em Lancaster, porque minha avó disse que dali não se movia mais, estava farta de tanto olhar cidades, meu avô colocava defeito em todas, nenhuma era parecida a sua na Polonia.   Ele conseguiu uma escola para dar aulas, ela colocou os filhos para trabalharem.

O mais interessante era que meu avô sendo professor, os filhos não gostassem de estudar. Logo comprou umas terras fora da cidade, que ela escolheu, começaram a plantar batatas, outras coisas.  Ela aprendeu a dirigir uma caminhonete, ia pelos mercados vendendo o que plantava.

Meu pai foi trabalhar de mecânico, pois ao longo da viagem num carro de segunda mão, aprendeu a mexer nele, meu tio ao contrário, logo desapareceu em direção a Las Vegas, esse adorava a aventura, aparecia de quando em quando, ora rico, ora fudido totalmente, mas nunca saiu de lá.

Meu pai se casou por um acaso com uma polaca como ele, minha mãe era diferente, não era judia, mas sim filha de um pastor protestante.

Uma bela mistura, um judeu com um pastor protestante.  Mas meu avô nunca interferiu nisso, lhe dava igual, eles nunca tinham seguido a religião.  Meu avô dizia que era ateu.

Tive quatro irmãos, todos altos como eu, loucos todos por carros, eu nem sabia distinguir a diferença de um para o outro.  Por isso era a gozação, mas era louco por livros.  Aprendi o polonês primeiro que o Inglês, pois em casa se usava essa língua.  Talvez por isso, tive facilidade em aprender outras línguas.

Era considerado o melhor aluno da escola, por isso me tornei o querido do meu avô que tinha se frustrado com os filhos.   Em casa não existia luxos, meu pai considerava que todos tinham que trabalhar, não pedia a nenhum filho dinheiro, o que ganhavam era deles.

Meus irmãos esbanjavam o que ganhavam, roupas novas, eu me contentava a usar as roupas deles de segunda mão.  Pois com uns 13 anos, comecei a trabalhar na parte da tarde numa livraria da cidade, foi o que me ajudou a seguir em frente.

Guardava todo o dinheiro que ganhava, quando me perguntavam o que queria de presente no aniversário, natal, essas coisas, dizia que queria dinheiro, para ir à universidade.  Meu pai abriu uma conta no banco para mim, assim eu ia guardando.

Dos meus irmão herdava tudo, roupas, sapatos, só me comprava cuecas, meias, os resto eram deles, usavam uma temporada, em seguida não queriam mais.

Todos tínhamos a mesma altura, acima de 1,80 metros, loiros, olhos azuis, pele muito branca, mas meus pais cuidavam que fossemos ao dentista regularmente, afinal o mesmo era seu cliente.    O filho do dentista era meu companheiro na escola, capitão do time de basquete, um tipo complicado, vivia me provocando, pois eu não gostava de nenhum esporte, não me interessava.  Mas se dava mal comigo, imagina, com quatro irmãos maiores, tinha que saber me defender.  A primeira vez que tentou fazer bullying comigo se deu mal, lhe dei um murro em pleno nariz, que fomos parar os dois no gabinete do diretor.  Enquanto esperávamos para falar com ele, o James me olhava, entre surpreso, de uma maneira diferente.

Quando o diretor me perguntou por que lhe tinha dado um murro, lhe disse que não ia aturar que me enchessem o saco, que estava lendo tranquilamente um livro da biblioteca, que este o tinha arrancado da minha mão, destroçando o livro.  Isso não se faz, afinal o livro não era meu, agora terei que comprar com minhas economias, para entregar um novo no lugar.

Nada disso, me disse o diretor, se foi ele quem destroçou, quem tem que comprar será ele.

James me olhava quieto, quando o diretor disse isso, ia reclamar, mas o outro lhe disse que estava suspenso.  Na verdade não cumpriu nenhum dia, pois estava em pleno campeonato, o professor de educação física, conseguiu libera-lo.

A partir desse dia passava por mim, me dizia, bom dia Paul, eu lhe respondia.

As vezes ia caminhando para casa, ele me alcançava, para ir conversando.  Nos tornamos amigos, de uma certa maneira, foi meu primeiro namorado, na escola a única coisa que fazia de esporte, era nadar, mas não competia, adorava a água.   Ele tinha me visto nos banheiros, adorava segurar meu sexo, foi também o primeiro que colocou na boca.   Seus pais estavam sempre fora, então na volta da escola, ele me convidava.  Mas claro eu tinha que ir trabalhar, me desculpava sempre. Mas aconteceu.

Quando chegou a famosa época dos 16 anos, que eu estudava como um louco, para poder ir à universidade com bolsa de estudos, ele arrumou uma namorada, mas me procurava.

Fomos uma vez numa excursão da escola a Bervely Hills, eu me apaixonei, depois fomos ao Píer de Santa Monica, descemos para a praia, tomamos banho de mar.  Pensei, quero viver aqui, ia fazer tudo para isso.  Depois na volta, o professor com segunda intenções, passou pela University of California.  Foi outro amor à primeira vista, ele nos deu folhetos dos cursos, afinal tinha estudado lá.

Eu já tinha definido o que queria fazer, estudar literatura.

Faltava pouco para isso, mandei meu curriculum escolar para a Universidade, para saber se seria aceito.   Quando num almoço da família, verbalizei isso, só meu avô me deu força, ele tinha me introduzido no mundo do livro, era seu único neto que lia em Polonês, inglês, francês, também o que tirava as notas mais altas da escola.

Tinha uma boa economia.  A preocupação dos meus pais, era como ia me manter.

Escapei um dia, peguei um ônibus, fui andar por ali por perto da universidade, queria saber como era, apesar de ser um domingo, tinham muitos restaurantes abertos, eu queria ver se algum procurava gente para trabalhar.  Numa esquina vi do outro lado da rua, uma livraria, fui dar uma olhada, a primeira coisa que me chamou atenção, foi um cartaz, procurando alguém para trabalhar da parte da tarde para a noite.  Tinha um adendo, trabalhar dois domingos do mês, entrei, tinha uma senhora, com uma cara gentil, cabelos brancos, que me pareciam precoces pois não aparentava muita idade.   Lhe perguntei pelo emprego, disse que tinha sido aceito na universidade, que iria fazer literatura, que trabalhava numa livraria em Lancaster.

Lhe expliquei que meu único problema era alojamento, pois imaginava que ali por perto o aluguel seria caro.

Depende do que procuras.

Me estendeu a mão Marie Floret, pelo sotaque vi que era francesa, comecei a falar com ela nessa língua, adorou, ria muito.  Contei que falava polonês, francês, claro além do inglês, que me interessava por literatura, pois queria ser escritor.

Ela primeiro me disse das condições, que queria uma pessoa que começasse a trabalhar as duas da tarde até as oito da noite, dois domingos inteiros do mês, assim eu folgo dois a pessoa outros dois, o salário era quase o triplo do que eu ganhava, mas claro a vida em Los Angeles era mais cara.

Colocou um cartaz, que já voltava, disse venha comigo, tenho um amigo que tem uma oficina mecânica aqui atrás, era um beco.

Justo virando a esquina, se entrava num beco mais largo, ali só tinha uma oficina mecânica de dois andares, em cima um pequeno apartamento.  Fui apresentado para o senhor que me olhou de cima a baixo, mas não dei atenção, falou que tinha feito esse apartamento, por causa do seu filho.   Esse agora era ator de cinema, nunca aparecia.  Subi, com ele, enquanto ela voltava a livraria.

O apartamento, era pequeno, logo na entrada um banheiro, pequeno, mas com um bom chuveiro, depois uma pequena cozinha americana, depois o resto era aberto, só tinha uma cama grande, um armário, o resto teria que comprar.

O sacana do meu filho, levou todo o resto, para aonde esta vivendo hoje em dia, em Malibu.

O homem não parava de me olhar, só faltava pedir que eu tirasse a roupa.

Acertamos o aluguel, me disse como vinha recomendado, me cobraria menos.  Me perguntou se eu queria ser ator também.

Ri muito, nada disso, vou estudar na universidade aqui perto, vou trabalhar no horário tarde noite na livraria, quero ser escritor.

Ele disse que era cliente da livraria, posso colocar umas estantes para ti, se tens livros.

Apertamos as mãos, as suas eram calosas, imaginei as mesmas passando pelo meu corpo, fiquei excitado, ele percebeu.

Voltei a livraria, com o que ela ia me pagar, podia pagar tranquilamente o aluguel, pois ia estudar com bolsas de estudo.

Me perguntou quando podia começar, era uma sexta-feira, eu lhe disse que na segunda-feira, que no sábado ia trazer minhas coisas, se no domingo ela estava podia me ensinar como gostava as coisas.

Nessa noite, isso sentou como uma bomba em casa, todos falavam ao mesmo tempo, eu esperto, tinha convidado meu avô, só tinha que transferir a conta no banco.

No dia seguinte ele apareceu logo cedo com a caminhonete de minha avô para levar o que eu queria, me ofereceu uma poltrona que tinha comprado, que afinal não era o que queria, para que eu tivesse aonde sentar para ler.

Gostou do lugar, bem com fez amizade com a dona da livraria. O Gaspar tinha pintado de noite o apartamento todo de branco como eu disse que gostava, as duas janelas, que davam para o beco, estavam abertas, para entrar ar, para tirar o cheiro.  Ele olhou tudo, foi comigo comprar roupas de cama, tudo que eu ia precisar, disse que era o presente de aniversário antecipado.

Na segunda-feira iria ao banco aonde tinha conta, pediria para transferir meu dinheiro.

Nesse dia já fiquei.  Meu avô depois que comemos juntos, ainda comprou uma série de livros que queria, na despedida me disse segurando meus ombros, o mais importante na vida meu neto, é poder voar, tu começaste a mexer as asas, o mundo é todo teu.  Vou esperar ansioso teu primeiro livro.

Trabalhou todos os dias até começar a universidade, nos domingos livres ia a praia, primeiro a Santa Monica, depois conforme as pessoas foram falando, ia mais longe, aonde tivesse ônibus para ir.

Em casa só tinha coisas para um café da manhã, depois comia num dos muitos restaurantes ali perto, nunca tinha gostado muito da ideia de cozinhar.

Com os olhos muito aberto, começou a descobrir o mundo, todas semanas tirava um dia para falar com seu avô, que lhe contava rapidamente o que acontecia com a família, depois lhe perguntava sobre sua nova vida.

Foi conhecendo os clientes, alguns compravam livros, discutiam com ele, sobre o autor que gostavam, lhe davam o número de telefone, para lhe avisar se chegava algum novo.

Um dia um desses, ao lhe dar o cartão, a Marie ria, soltou na sua cara, não captaste a mensagem verdade?

Que mensagem?

Esta te convidando para o chamar para um café, ou algo mais.

Então entendeu, era como nos livros policiais, ele era carne fresca no pedaço.  Pelas tardes estava um bom tempo sozinho.  Marie, as duas da tarde saia para ir para casa almoçar, depois ia se encontrar com suas amigas para um café, voltava umas duas horas antes de fechar, para fazer o caixa com ele, aproveitavam a lista dos livros vendidos para ver se tinham que encomendar outros.   Ela gostava de analisar, quanto tempo o livro tinha estado ali esperando para venda.

Ele fez uma sugestão, em Lancaster a proprietária, os livros que ficavam muito tempo, colocava em promoção, mas claro ali havia que separar, não se ia colocar um autor famoso assim.

Ela comentou que em sua casa tinha muitos livros que tinha levado, que não pensava tornar a ler, podíamos engordar uma mesa com isso, livros parados, livros de segunda mão.

Ele organizava isso, tinha um caderno só para isso.  Esses livros parados, ele conversava com as pessoas, para saber por que não tinham saído antes.   Descobriu que a maioria não gostava de procurar nas estantes, pois tinham que inclinar a cabeça.   

Quando comentou com a Marie, ela concordava a mesa funcionava mais.  Decidiram deixar só nas estantes livros que eram mais para os estudantes da universidade.

Quando começaram as aulas, descobriu que muitos clientes eram professores lá, inclusive uns dois que lhe tinham dado o cartão eram seus professores.

Um deles dava um curso a parte de escritura, se tornou sua aula favorita, ele tinha uma série de pequenos relatos de sua época de estudante, com esses começou a fazer uma coisa, que faria o resto de sua vida.   Escrever, revisar, revisar, revisar, até ter certeza de que estavam relativamente bons para ensinar no curso.

Esse professor, Darius Walt, riu muito, quando ele entregou um texto assim.  Comentou com ele que queria ver um desses, se ele ainda tinha o original?

Sim conservo todos, usava uma velha Remington, presente de seu avô, como sempre de segunda mão, mas isso não lhe importava o mais mínimo.   Na livraria usava uma parecida, nos momentos que tinha livre, que não entrava nenhum cliente.  Quando estava fazendo algum exercício mental, fazia uma coisa, trocava os livros da mesa de lugar, muitos pensavam que eram novos.

Os romances que tinha, não passavam de uma noite.  Ficava frustrado, esperava se apaixonar, mas descobria que a maioria das pessoas queriam sexo, nada mais que isso.

Um dia conversou justamente com o professor Darius sobre isso.  Ele queria carinho, romance, mas se esbarrava que as pessoas queria sexo nada mais.

Se sentia incompleto.

Darius riu muito, isso é assim, te vem com toda essa estampa, pensam esse é forte, aguenta qualquer coisa, é duro, quer sexo nada mais.

Experimentou fazer carinho, em vez de sexo, a pessoa se levantou foi embora.  Descobriu que a maioria era casada.  Um domingo, estranhou ver a oficina mecânica aberta, se aproximou, viu o dono falando, com um homem de uma estampa incrível, deduziu que era o seu filho.

O apresentou, teve um rechaço imediato com o mesmo, lhe pareceu um sujeito fútil, tinha estampa, nada mais.  Sabia que ele fazia esse papel tão costumas nos filmes bobos, o macho alfa.

Quando voltou de noite o senhor seguia trabalhando, parecia chateado, começaram a conversar, imagina, apareceu porque precisa que eu arrume seu carro, não foi ver sua mãe, que o criou dessa maneira, agora reclama, se acha o umbigo do mundo. Estou aqui perdendo o domingo, quando poderia estar na praia, me distraindo com meus amigos.

Começara a falar das praias, domingo que vem se o tempo estiver bom, irei, como sempre, pego um ônibus aqui na avenida, passo o dia inteiro, fazendo uma coisa que amo, nadar.

Não sabes fazer surf lhe perguntou?

Nunca fiz, fico com inveja das pessoas que fazem, mas nunca fui fazer.

Eu normalmente vou a Venice Beach, lá tenho amigos, que me avisaram muito que não me casasse, nem tivesse filhos, mas o idiota não escutou.

Queres tomar uma cerveja, perguntou ao homem, viu que estava suado. Fechou a oficina, subiu com ele, acabaram na cama, foi a melhor foda que tinha tido em muito tempo, cheia de carinho, gostou, ria com isso.

Ao final lhe comentou das aventuras, que o frustravam.

Veja sou casado, um casamento de muitos anos, ela tem sua vida própria, eu ao contrário, me sobram os amigos, eu quero é isso, calor humano que não tenho em casa, embora me sinta fantástico contigo.

No domingo seguinte, o veio buscar, ele tinha um tipo rancheira, vinha com duas pranchas em cima, vou te ensinar a surfar.

No caminho foi comentando, todos esses meus amigos, os conheci no exército, o primeiro que vão dizer, é que poderias ser meu filho, espero que isso não te importe.

Segurou sua mão, lhe disse, esta semana me senti melhor, encontrei alguém que me entende, pois tinham falado muito, contou para ele, pois os únicos com que tinha falado a respeito, tinha sido a Marie além de seu avô.  A história que tinha apresentado ao Darius, ele tinha mandado para uma revista literária que o tinha publicado.

Quero ler lhe soltou Samuel.

Passou o dia lhe ensinado como surfar, apanhou mas aprendeu, mas o que mais gostou, comentava depois, era ter ficado além da ondas, esperando uma especial, se sentiu em paz, comentou isso com ele.

Também é o lugar que mais gosto.

Na volta, ficou para dormir com ele, disse a minha mulher que ficaria para dormir na casa de um amigo da praia.

Adorava isso, os dois se entendia, se exploravam, fazia carinho, adorava passar a mão pelos cabelos crespos, cheios de fios brancos do Samuel.  Ele dizia não sei o que vês em mim, não sou bonito como meu filho, nem tenho um físico de jovem cheio de músculos.

Samuel, isso não me interessa, apesar de ser jovem, quero poder conversar, trocar ideias, isso tenho contigo. 

Ele quando leu o texto, lhe disse que o entendia, tinha se casado por isso, pensava que ia ter uma família, carinho, tudo que não tinha tido antes.

Nos domingos quando chovia, lhe ensinou a conduzir, o animava a respeito.

Acabou de escrever seu primeiro livro, mandou uma cópia para seu avô por entrega rápida, outra deu ao Samuel, a Marie, além do Darius.

Tinha construído um personagem que não encaixava no mundo de agora, com os valores tão superficiais, incluía isso, de um amor de uma noite, de não conhecer as pessoas, por isso a princípio tinha estranhado, muita gente entrava na livraria, mas conversava sobre o autor, acabavam falando de suas vidas.

Samuel agora escapava algumas noites, disse que iria pedir o divórcio de sua mulher, tinha descoberto que ela tinha uma aventura.   Por isso não reclama os dias que estou fora.

No último domingo o viu com cara de cansado, lhe perguntou o que passava.  Ela assinou o divórcio, mas ficou com quase tudo o que eu tinha a casa, terei que sair de lá.  Só me restou a oficina, meu carro, dinheiro que guardo na conta do banco aqui perto.

Menos mal que não tenho que pagar nenhuma pensão.  Vai se casar com o sujeito com quem tem aventura.

Não seja por isso, venha ficar comigo.

Mas como sempre a felicidade nunca era uma coisa que durasse muito.  Apesar dele insistir Samuel não gostava de médicos.  O via cada vez mais cansado, só estava super bem quando estava na praia.
Marie um dia lhe perguntou se ele realmente gostava do Samuel?

Perguntas isso, por que tenho idade para ser seu filho?

Sim, ele me disse que nunca imaginou ser feliz com alguém, que contigo é.

Pois não sinto essa diferença, com ele posso conversar, o que sentia falta com os outros, tenho com ele, é carinhoso, se preocupa comigo, gostamos de muitas coisas iguais.

Sei que não é só por sexo, como acontece muito agora.

Agora quando ia para casa, se encontravam iam comer ali por perto, pareciam dois namorados, não lhe importava que falassem dele.

Seu livro finalmente foi editado, ele evitou que tivesse sua foto na contracapa, para não descobrirem que trabalhava ali na livraria.

Vendia bem, quando estava já na terceira edição acabou o seguinte.  Justamente nesse dia, voltava para casa, com o pacote de cópias que tinha mandado fazer, para mandar para seu avô, para os outros lerem, fazerem comentários com ele.

Estava louco para o Samuel ler, estranhou que a porta da oficina estivesse aberta, o encontrou no chão, chamou uma ambulância, mas era tarde, tinha tido um enfarte.

Sabia que tinha o telefone de seu filho, chamou a este, lhe disse que estava filmando em NYC, que infelizmente não podia ir.  Que falasse com o advogado de seu pai.

Foi o que ele fez.  Este sabia o que tinha que fazer. Uma cerimonia simples, tinha uma lista de amigos para avisar, que fosse cremado, que levassem para além das ondas, deixassem as cinzas ali.   Tenho uma carta para ti, que ele deixou.

Estava imaginando que o filho agora podia querer o local para vender.

Depois da cerimônia que foi uma surpresa, o local estava cheio, o filho, nem a mulher apareceram.   

O advogado disse que o filho não podia sair da filmagem, mas creio mesmo que não quer perder tempo, só perguntou se tinha algo no testamento para ele.   Lhe disse que ele tinha liquidado tudo, com a mãe dele, seguindo suas ordens disse que tinha vendido o local.

Para minha surpresa deixou sua berlinda, bem como o local com o apartamento para mim, pelos últimos e maravilhosos anos de sua vida.  Bem como um pouco de dinheiro que tinha no banco.

Eu agora, despertava de noite procurando por ele na cama, em breve faria 30 anos, tinha que redefinir minha vida.

Marie, estranhava, que já tendo um livro pelo qual tinha recebido um bom dinheiro, não deixasse de trabalhar na livraria.  Lhe expliquei que não podia, não tinha nada a ver com ela, sim pelo fato de ser meu meio de conviver com outras pessoas, além de compartir ideias, tivemos uma conversa interessante, ela pensava em vender o local que era seu, ir viver com umas amigas numa residência, perguntei quanto queria pelo local.

Me disse o valor, a livraria queria pouco, pois atualmente quem levava tudo era eu. Só vinha nos domingos que me tocava livre.

Aliás, eu nunca entendia o porquê dos domingos, eram dias de turistas, que compravam guias, mapas, livros de fotografia sobre artistas, mas isso só na parte da manhã, na parte da tarde todos iam comer por ali, o movimento era nulo.

Eu na parte de baixo que era oficina, agora só tinha o carro do Samuel, que continuava usando para ir à praia para surfar com os amigos que tinha feito a partir dele.

Dois deles que eram seus amigos de sempre, me perguntavam por que não tinha ninguém, lhes contei que Samuel tinha preenchido minha vida, era o que eu tinha sonhado.

Não estava para voltar outra vez as famosas fodas de uma noite.

Riam quando ele falava nisso, mostraram alguns dos que eu conhecia, esses são famosos por isso, não querem nada, eu sempre digo que é melhor uma punheta bem-feita que isso.

Concordo contigo, o pior é que ele foi durante esses anos o melhor da minha vida, então o patamar é alto.

Riam comigo, diziam que ao largo desses aos eu tinha mudado, agora usava cabelos compridos, com alguns fios brancos, mas minha pele era mais morena.

Quando ia visitar meu avô, ele ria, dizia que adorava minha aparência, já meu pai, meus irmãos, suas famílias criticavam.   Nenhum tinha se interessado pelos meus livros, me achavam um idiota por seguir na livraria.   Segundo meu avô, pensavam que escrever livros não devia dar muito dinheiro.

Um dia fui visitar meu avô, ele me entregou uma caixa, estava bem embrulhada, me disse na hora de me despedir, só abra depois que eu morrer.  Olhei para ele, o via bem fisicamente.

Mas morreu semanas depois, sentado embaixo de um pé de maça que era aonde ele gostava de se sentar para ler.   Segundo descobrimos mais tarde, tinha um câncer, tinha resolvido que já tinha vivido demais, tomou todos os comprimidos de uma medicina, morreu ali sentado com um livro nos joelhos.

Tinha pedido que o cremasse, que deixassem suas cinzas ali ao pé daquela árvore.

Minha avó comentou que tinha sido a primeira que ele tinha plantado, tinha trazido as sementes da Polônia, de um uma árvore que tinham nos fundos da casa.

Sempre que ia vê-los, ele me dava maças dali, ela compotas que tinha feito com as mesmas.

Ela me contou que com os anos, ele tinha vindo se afastando dos filhos, não tinham nada a ver com ele, tu foste o único que realizaste seus sonhos.

Seus filhos queriam vender o campo, mas a minha avó se negou.  Sabia que um ia gastar tudo nas mesas de jogo em Las Vegas, que o outro usaria em besteiras.

Ela tinha aprendido a se mover no meio que vivia, o comercio, fez uma coisa que ninguém esperava, vendeu para um homem que comprava o que ela produzia, dividiu o dinheiro para cada um dos netos, assim nenhum filho podia brigar.

Meus irmão usaram a cabeça, guardaram para seus filhos irem à universidade.  Embora eu olhasse aqueles garotos, não via futuro neles, estavam sempre metidos na oficina mecânica.

A mim não me deixou nada, pois sabia que eu não precisava.

Quando abri finalmente o pacote que ele tinha me dado, tive que rir.  Eram dois cadernos escrito a mão, com a letra maravilhosa que ele tinha, contando sua história, sua juventude, junto tinha um saquinho com três diamantes, que deviam valer uma fortuna.

Fui lendo nas minhas largas noite solitárias, o que ele escrevia.  Começava dizendo que tinha inveja de mim, por conseguir colocar para fora tudo, falando honestamente o que eu sentia, eu ao largo desses anos com o Samuel, ele tinha sido a única pessoa que eu tinha apresentado.  Os dois se deram bem, inclusive veio a cerimônia quando ele morreu.

No que estava escrito, me contava um romance que tinha tido antes de se casar, seu casamento como todos de muitos judeus, tinha sido combinado entre duas famílias.  Tive sorte dizia, tua avó foi uma grande companheira, mas o amor de minha juventude foi um homem que soube anos depois, foi um carrasco com os judeus.

Falava dessa época, de sua juventude, descrevendo conforme ia se lembrando, desse tempo, citava nome das pessoas, a maioria ele achava que estava morta. 

Podia descrever lugares que frequentava em Varsóvia com detalhes, praças aonde se sentava com esses amigos, falavam de seus sonhos, já nessa época ele pensava ir para os Estados Unidos, falava de sua experiencia sexual com esse seu amigo, que tinha medo de tudo, comentava que não entendia como depois tinha se transformado em carrasco.

Ele nunca mais tinha sequer tido vontade de voltar a Varsóvia, principalmente na etapa comunista.

De uma certa maneira, falava da solidão, pois era muito diferente de minha avô, dos seus filhos, apesar da grande aventura que tinham feito, atravessar quase que os Estados Unidos inteiro, os filhos nunca falavam nisso, ele ao contrário tinha realizado um sonho, falava de cada lugar o que tinha significado os dias que tinha estado em cada cidade, o que tinha observado, porque não a tinha escolhido.  Realmente nunca ouvi meu pai mencionar nada a respeito.

Da solidão, até que descobriu que tinha um neto que amava as mesmas coisas que ele, porque sempre tinha me ajudado, não desprezando os outros, serão meros reprodutores de crianças, se deles sair alguma que seja como tu, a ajude por favor.

Um dia estava na livraria, recebeu a visita de um advogado, representava uma grande empresa, estavam interessados no espaço da livraria, bem com aonde ele vivia, queria fazer uma grande construção, um edifício que metade seriam apartamento a parte de baixo um grande estacionamento.

Escutou a proposta, ficou de analisar. Conversou com os vizinhos, 80% já tinha concordado com a venda, só ele basicamente não tinha se resolvido.

Estava tão acomodado ali, que pensou, caralho, talvez seja a hora de mudar tudo, embora gostasse da ideia do trabalho que tinha.

Como demorou, acabou vendendo mais caro, mas pediu tempo, queria encontrar outro lugar para se mudar com sua livraria.

Conversando com esses dois amigos da praia, lhe perguntaram por que não abria ali em Venice, o levaram para ver um local, um deles lhe disse o sujeito está enforcado, cheio de dividas, porque se meteu com quem não devia.    Ficou com pena do homem, o lugar lhe interessava.   Podia se aproveitar da informação, mas pagou o preço justo. Com isso ganhou um novo amigo.

Reformou tudo, o andar de cima dava um apartamento como o que ele tinha, o problema seria o carro, mas acabou resolvendo alugando uma garagem.   Montou uma livraria com uma cara mais moderna, já não teria livros técnicos como os procurados pelo pessoal da universidade.

Separou tudo o que tinha, levou para a biblioteca da mesma.  Estes agradeceram.

Agora levava um outro tipo de vida, se levantava cedo, ia fazer surf, depois voltava, tomava um bom café, banho, descia para trabalhar, usava um balcão moderno aonde podia trabalhar, agora usava um laptop para isso, a velha maquina Remington, agora ficava na mesa grande que tinha em cima.

Convidou a família inteira para a inauguração, mas só apareceu o irmão que era um ano mais velho do que ele, tinha os cabelos todos brancos.   Tinha três filhos, uma mulher complicada, perguntou se podia vir falar com ele.

Ficava pasmo, por viverem tão perto do mar, nunca irem à praia.

Ele desceu no domingo, acompanhado de um de seus filhos, Saul, muito tímido, quase se escondia atrás do pai.  Este conversou com ele, sentados na praia, enquanto o filho estava sentado na beira do mar, olhando para a frente.

Ele está sempre assim, ou grudado com um livro, é o melhor aluno de sua escola, como você, outro dia tentei falar com ele, meu jeito de entrar em contato com ele, foi falar de ti, que era diferente de nós.   Pela primeira vez em alguns anos, vi meu filho sorrir, quando contei como aprendeste a te defender de nós, ele riu.

Minha mulher diz sempre com desprezo que ele saiu como tu, que é gay, que não quer um filho assim.   Pensei muito, desde garoto sempre foste agarrado ao nosso avô, que em paz descanse, mas não encaixava nem com seus filhos, as vezes no meio daquela bagunça do almoço, ele estava em outro lugar, quando te descobriu, parecia que tinha voltado a viver.

Queria que conversasses com meu filho, se queres cuidar dele, eu te dou a guarda dele, não quero que sofra por ser diferente.  Me lembro quando eras jovem, parecias andar com cuidado conosco, para não sabermos como pensava.    Outro dia encontrei o James, aquele teu amigo, um pobre infeliz, se casou, não deu certo, é alcoólatra hoje em dia.

Vou dar uma volta nesse paraíso aonde vives, se ele fica contigo, virei mais vezes desfrutar desse lugar.

Sentou-se com o Saul, começou a falar de um livro que estava escrevendo, sobre ser diferente do resto.    Este lhe contou que um dia tinha ido a casa do bisavô, viu dois livros dele, escondi, comecei a ler, fui anotado as palavras que não sabia o que queriam dizer.  Duas delas, não encontrei o significado, a professora me viu buscando num dicionário, mas mesmo assim eu não entendia, me perguntou aonde eu tinha visto essas palavras, reclamou com minha mãe, que eu estava lendo livros que ela não recomendava para jovens.    Esse escritor, fala muito diretamente as coisas, não respeita as convenções da sociedade.

Lhe perguntou quais eram as palavras, explicou o que as mesmas queria dizer, no conceito que ele tinha usado.   Falou justamente isso, quando eres diferente, as convenções da sociedade, são limitadas, as pessoas normalmente têm problemas a aceitarem isso.

Seus amigos se aproximaram, os apresentou ao seu sobrinho, me ensinaram a fazer surf, quando se afastaram, ele disse que adoraria, mas nem sabia nadar.  Eu te ensino, queres?

Eles tem uma amizade especial, verdade?

Sim estiveram juntos no exército, eram os melhores amigos do Samuel, com quem vivi muitos anos.

Que o senhor quer dizer com vivi?

Isso que estas imaginando, foi o homem que amei muito, demorei muito para descobrir o que significa essa palavra.  Veja hoje em dia, todo mundo diz “eu te amo”, em muitas conjecturas, mas realmente o uso tão grande dela a tornou uma coisa vulgar.  Uns usam a palavra para dizer que fizeram sexo.    Mas fazer sexo, não significa que amas.  Falou abertamente com ele do sexo de uma noite, no fundo são duas pessoas que necessitam de outra coisa, mas poucas tem coragem de enfrentarem, muitas confundem precisar de carinho, um simples gesto, como esse, mexeu nos cabelos crespos dele, isso é um carinho, um afago vamos dizer assim.

Não tem nada a ver com o sexo, algumas vezes na nossa solidão necessitamos disso, não fazer sexo.

Caramba, o senhor fala de uma maneira muito simples tudo.  Quando perguntei na escola sobre isso, sobre dois homens fazendo sexo, foi um escândalo, lá foi a professora chamar outra vez minha mãe, que ficou escandalizada.

Não me chame de senhor, para ti, sou Paul.

Quando seu irmão voltou, os levou até seu apartamento, na livraria estava o homem que tinha perdido o local para ele.  Contou ao irmão que tinha perdido tudo que tinha, pois sua mulher tinha câncer, perdeu o emprego, este local, ficou inclusive a princípio sem lugar para viver.  Agora vive com uns amigos, que o ajudaram, é muito boa gente, conseguiu pagar toda sua dívida, dá a vida para ter um tempo pela manhã, ou no final da tarde pegar umas ondas.

O irmão perguntou ao Saul, sei que já conversaste com teu tio, que em casas andas agoniado com tua mãe, minha pergunta como agora vais entrar em férias, gostaria de viver com ele?

Os olhos do garoto brilharam, claro que sim, me disse que ira me ensinar a nadar, bem como surfar.    Mas adoraria que o senhor viesse me ver sempre, num sinceridade absoluta, disse ao pai, agradeço o que o senhor está fazendo, mas saiba que o amo.

Seu pai foi até o carro, trouxe uma maleta, lhe deu dinheiro, entregou uma caixa com um celular, me chame sempre que queiras.   No domingo, desço com teus irmãos, eles nunca viram como tu o mar.

Tinha um sofá-cama, arrumou para ele dormir.   Aqui tudo é simples, não tenho empregadas, a única coisa que não faço é cozinhar, odeio.

Acho que minha mãe também, a comida dela é horrível, ficamos todos esperando o dia que vamos a casa dos avôs para comermos bem.

Como tinha algumas lojas abertas, foram comprar roupa de praia para ele, bem como umas sandálias, andar na praia de tênis, é um horror.  Comprou todas as camisetas que ele gostou, claro com estampas de surf.

Disse todas as manias que tinha, mas não se preocupe, eu normalmente não vou trazer nenhum homem para casa.

Brian o homem que o ajudava na livraria, ficou encantado com ele, sempre quis ter um filho, talvez por isso me casei, voltei da guerra meio perdido, não tinha madures quando fui, nem quando voltei, minha mulher me ajudou a colocar os pés no chão, mas entre nós as coisas nunca foram 100%, pois tínhamos sonhos diferentes, não queria filhos, embora fosse professora da escola aqui do bairro.  Nunca entendi isso, ela cuidava, educava os filhos dos outros, mas não queria ter os seus.   Um dia lhe perguntei por que, me respondeu furiosa, porque tinha insistido muito, me disse que sabia que eu era gay, não queria filhos assim, que talvez minha genética fosse a responsável.

Ele não sabia que Brian era gay, de uma certa maneira, faziam um grupo da praia, apesar de serem homens fortes, duros na queda vamos dizer assim, eram todos gays, tinha pensado que ele tinha ido a guerra juntos, embora nenhum deles falava no assunto.

Brian lhe contou que ela tinha descoberto sobre ele, porque em seus pesadelos, gritava o nome do homem que tinha amado, o vi morrer num ataque inimigo, fiquei ali sustentando sua cabeça meio destroçada, chorando.

As vezes quando estou nervoso, tenho esse pesadelo.

Soube que o vizinho, vendia o prédio ao lado, com um dos diamantes, comprou o mesmo, aumento seu apartamento, fazendo um quarto com banho para o Saul, outro para ele, assim tinha privacidade.  Muito lentamente, começou a namorar o Brian, sentiam-se atraído um pelo outro, não eram jovens, antes lhe perguntou se ele tinha pensado bem, poderia querer recuperar o tempo perdido.

O que está perdido, já está passado Paul, seria hoje uma besteira, essa garotada, faz sexo como se estivesse espirrando, não quero isso.  Podem até me atrair, mas não, prefiro passar meu tempo fazendo surf com os amigos, trocando ideias.

Seu irmão tinha cumprido com sua promessa, vinha agora aos domingos com seus outros filhos, além de algum outro sobrinho.  Saul agora era quem ensinava os irmãos a nadarem, a fazer surf.

Estava feliz, se abraçava ao pai, quando esse chegava, dizendo, agora sei quem sou.

Na primeira infância, Paul tinha esse seu irmão como ídolo, pois era mais velho do que ele, nunca tinha entendido por que não tinha estudado.

Este acabou um dia lhe confessando, que se sentia protegido pelos seus irmãos maiores, eu era como o cachorro deles, acabou que não fiz amizades na escola, meus amigos eram seus amigos, nunca fiz nada por mim.

Um dia lhe chamou, dizendo que queria falar com ele em particular, se podia?

Claro que sim, marcaram na praia, sabia que Saul estaria ajudando na livraria.  Deu uma desculpa qualquer, tipo tinha que ir ao Banco.

Seu irmão lhe disse que estava se divorciando, que viver com sua mulher, que o acusava todo o tempo de ter sido culpa dele, Saul sair dessa maneira, ela se tornou ultra ortodoxa, eu nem sabia que tinha alguma sinagoga assim.   Deixa os meninos jogados, não sei o que fazer, os conselhos dos nossos irmãos, são horríveis.

Converse com teus filhos, se for o caso, venha viver aqui, essa outra loja que está vazia é minha, porque não a usas fazendo alguma coisa que goste.

Eu adoro consertar motos, achas que poderia?

Claro que sim, eu te ajudo, mas antes fale com teus outros dois filhos, eles são mais velhos que o Saul, vamos ver se te entendem.

Eles adoraram estar aqui, se ela concordar, eles sei que não querem viver com ela.

Vive alardeando coisas, que ninguém a entende, mistura religião, com o fato de ser mãe, faz anos que não me deixa a tocar.  Na verdade nem a procuro, depois que Saul nasceu, ela ficou com problemas, odiou ser mãe outra vez.

Falou com o Brian, esse riu, tens certeza de que queres seguir com o nosso relacionamento.

Mais do que nunca, gostava de conversar com ele, na cama se entendiam bem.  

Na verdade, ele acabou se apaixonando pelo seu irmão, começou a trabalhar junto com ele na loja de motos, quando viram estavam apaixonados.  Ele entendeu, isso talvez era uma coisa que faltava entre eles, se davam bem, mas não eram apaixonados, talvez tivesse sido as circunstâncias, tinha ensinado Josias a surfar, bem como aos garotos.

Fez uma coisa, procurou, tinha dinheiro para isso, quase nunca tinha gastado dinheiro dos livros, estavam todos aplicados, encontrou uma casa no canal, foi olhar com o Saul, que lhe perguntou se podia seguir vivendo com ele.

Claro, eres o filho que eu não tive.

Não estás aborrecido com meu pai, por ter roubado teu namorado?

Imagina, explicou para ele o que tinha acontecido, uma coisa é você ter amizade com uma pessoa, mas é necessário a paixão, como tem os dois, ficaram tanto tempo fechados em si mesmo, que precisam disso.

Isso eu tinham com o Samuel, ele era mais velho do que eu, mas em compensação tinha um coração imenso, nos gostamos desde a primeira vez que nos vimos, mas levamos tempo para chegar a algo.

Encontram uma casa grande, mas ele vinha pensando muito tempo numa coisa, seus livros eram cada vez mais complicados dentro de seu processo de escrever, Saul daqui a algum tempo teria que se preparar para a universidade.

Tentava não influir em nada.

Seu irmão se preocupava que tinha invadido sua casa, ele disse que nem pensar, fez uma coisa que depois iria gerar uma briga com os outros, colocou os dois edifícios, no nome dos filhos do irmão, com usufruto do mesmo.  Liquidou a livraria, iria sentir falta, mas queria viver a vida, nunca tinha viajado.   Pela primeira vez aceitou fazer a divulgação do seu novo livro, foi a NYC com Saul num final de semana, depois viajou pelas principais cidades do pais para isso.

A coisa funcionava melhor.  Desta vez Saul ficou com o pai.

Ele e seus irmão iam a mesma escola, ali no bairro, mas o interessante ele algumas coisas ensinava aos irmãos.

Essas viagens fizeram bem a ele, contacto com outros escritores, sair pelo mundo. Nas férias antes da universidade, foi com Saul, embora tenha convidado seus outros dois sobrinhos, mas estes estavam trabalhando com o pai na oficina mecânica.  Tampouco interessavam-se por estes viagens.

Foram os dois a Paris, percorreu lugares que tinha lido em livros, tinha passado os mesmos para o Saul, os dois se divertiam imaginando como era na época.  Foi um mês superdivertido.

Seu editor lhe colocou em contacto com um editor interessado em publicar seus livros em francês, foi falar com o homem, este se surpreendeu que ele falasse sua língua.

Era sobre os dois primeiros, disse claramente que podia, mas que ele primeiro revisaria os mesmo ou melhor os atualizaria, pois seria interessante, falou do processo que usava de revisar muitas vezes, mas podemos fazer o seguinte, posso fazer isso em francês, assim vocês só teriam que revisar a ortografia.

Lhe ofereceram uma casa, mas ele apesar de gostar de Paris, preferia fazer isso no seu canto, voltaram para casa, de uma certa maneira, se abria em sua frente uma nova oportunidade.

Antes de voltarem, tiveram um jantar num desses restaurantes famosos da cidade, riram muito depois.

Na volta tio e sobrinho fizeram um desafio, tinha os dois feito anotações, iriam escrever um livro, mas sem um olhar o do outro, sobre o que tinham vivido.

Ele agora se dedicava parte do dia, em revisar, atualizar, traduzir para o francês.  Gostava desses desafios.

Quanto ao livro, os dois tinham lido basicamente tudo do Patrick Modiano, um escritor que descrevia Paris de várias épocas.  Quando terminaram, mandaram para a França primeiro, o editor se decantou por publicar os dois juntos, pois tinha feito uma coisa, conforme o capitulo, a visão dos dois do mesmo lugar era diferente.

Quando voltaram a Paris, levava seus dois livros revisados, traduzidos embaixo do braço, desta vez resolveram ficar um tempo, alugaram um apartamento, com dois quartos assim cada um tinha um lugar para escrever.

Quando os livros foram lançados, foram a uma feira de livros em Frankfurt, sabia que ali se negociavam os títulos.   Aproveitou para ir com o caderno do avô a Polônia que nesse momento começava a dar seus passos largos em direção a democracia.

Fez a mesma coisa, ia pelos lugares que seu avô descrevia, foi outra experiência diferente.

Quando voltaram a Paris, Saul, resolveu fazer um curso na Sorbonne, mantinham o contato com seu pai, além dos irmãos.

Ele era convidado para falar nas universidades, sobre essa sua maneira de escrever, foi um tempo novamente que as pessoas se aproximavam dele, para uma aventura de uma noite, mas ele se negava a isso.  Se sentia sozinho, porque lhe faltava uma pessoa de sua idade para conversar, a falta que isso lhe fazia as vezes lhe provocava mal humor.

Quando foi a Tel Aviv, fazer a mesma coisa, lançar seus livros em hebreu, bem como falar na universidade.   Muita gente não sabia que ele era descendente de judeus, quando isso saiu no jornal, o público pareceu aumentar, já não era só o americano.

Quando lhe perguntavam se frequentava a sinagoga, disse que nunca tinha ido, que seu avô tinha cortado esses laços, ao emigrar para os Estados Unidos.

Conheceu muita gente, um dia em Tel Aviv, jantando sozinho num restaurante, se aproximou um tipo, mais ou menos da sua idade, se apresentou como um professor, que tinha assistido sua conferência, o convidou para sentar, pois tinha se sentido atraído pelo outro.

Tiveram uma conversa interessante, quando lhe perguntou se era casado, esse riu.

Fui criado numa colônia ultra ortodoxa, quiseram me casar quando tinha 17 anos, mas eu não queria seguir a vida deles, me sentia diferente, não acreditava em nada daquilo.

Fugi, aqui, existia um grupos de conhecidos, que tinham passado pelo mesmo, o jeito foi cortar os laços de família, entrar para o exército, que eles não aceitam, assim fui literalmente banido, mas era o que eu queria.  Era uma família grande, mas fria, todos voltados sempre para essa coisa do pecado, nada estava permitido, tudo era restrito.

Começou a rir, soltando que ele adorava o pecado.  Acabaram no seu apartamento, dois dias depois se mudou com ele, tinha ao parecer encontrado sua meia laranja, falavam de tudo, contou tudo o que tinha vivido, as suas poucas paixões, quanto odiava esses encontros só para sexo.

Heron, ria muito, eu também, durante um tempo sim, mas depois me cansei, além de que aqui era proibido.  Tudo tinha que ser muito sutil, nada a ver com o que acontece hoje.

Ele estaria de férias durante uns dias, o convidou para ir com ele a Venice Beach, lhe contou o que tinha acontecido, com o seu romance, que agora era o do seu irmão, foi interessante, era um homem sofrido, os dois encaixam perfeitamente.  O resto da família não aceitou, mas ele é feliz, isso é o mais importante.

Heron que tinha um humor impressionante, lhe perguntou se tinha mais irmãos, assim quem sabe ele também amava mais alguém da família.

Passaram por Paris, Saul tinha um romance, com um professor da universidade, estava feliz, escrevendo um livro de como enfrentar uma outra ideia de escrever uma história.

Um dia de manhã, quando chegaram a Venice Beach, despertou sem encontrar o Heron, na cama, se assustou, quando se levantou, ele entrava pela porta, viu sua cara, riu dizendo que não tinha fugido, tinha ido comprar pão para o café.   Ele adorava isso, sentar-se a mesa para tomar o café da manhã, conversando.

O que sentiste quando não me viu?

Foi honesto em lhe dizer que tinha ficado chateado, que estava aprendendo a gostar dele.

Então volte comigo para Israel, eu adoro a praia tudo isso, mas também temos lá, tu estas livre, mas ainda tenho dois anos pela frente antes de me aposentar.  Depois podemos dividir temporadas lá e cá.

Ele se deu bem com seu irmão, com Brian, conversavam muito os quatro.

Um dos sobrinhos ia ficar tomando conta da sua casa.  Assim ele se despreocupava, Saul, voltaria quando acabasse o livro, com seu namorado.

Desta vez ele não tinha apoio de nenhum amigo, era como começar do zero, para se ocupar, aprendeu a escrever em hebreu, ao mesmo tempo que escrevia um novo livro, um personagem que começa uma nova vida, em um lugar totalmente diferente dele.

Conheceu vários amigos do Heron, que tinha passado o mesmo que ele, passou a observar os ultra ortodoxos, que em Los Angeles, basicamente não existiam.

Entrevistou vários deles, para entender o que passava.

Durante esses dois anos, escreveu dois livros, baseados nos sentimentos dos jovens que eram obrigado, ou doutrinados a viverem fora da possibilidade de construírem uma vida fora dessa sociedade, no fundo eram como um gueto dentro de Israel.

Saul pediu socorro pois estava passando uma fase difícil, justo quando Heron se aposentou, foram lhe dar uma força.  Mas ele se repunha sozinho, tinha se enganado com o rapaz que era seu namorado.

Depois foram para Venice Beach, mas tinha se acostumado a viver com Heron, quando esse disse que tinha problemas para se adaptar, resolveu voltar com ele.

Viveram juntos mais de 15 anos, quando ele morreu, Saul veio visita-lo, também foi ficando, arrumou sua vida por lá.

Fazia tempo que tinha vendido sua casa, comprado outra em Tel Aviv, não pensava em voltar.

Quando morreu, foi enterrado ao lado do Heron, que tinha sido o amor de sua vida madura.

PUNK MACTOSH

                                             SEQUÊNCIA DE OBERON MACTOSH

Voltava do enterro do meu pai, Oberon Mactosh, cantor, ator, um grande pianista de jazz, morreu como queria, em cima de um palco, tocando as músicas que amava.

O conheci no orfanato, para aonde me levaram, meus pais tinham morrido nas drogas, uma coisa comum em Los Angeles, tinham saindo sabe-se lá de donde, em busca da fama, fortuna, eu era pequeno, Oberon me adotou.

Descobriu que meus pais estavam no necrotério, os mandou enterrar, fui com ele ao enterro, segurando sua mão, estava deslumbrado com aquele homem alto, bonito, nessa época começavam a ter cabelos brancos, junto estava Donald, um grande amigo dele, bem como companheiro no restos de seus dias.

Me colocou numa escola, perto de casa, vivíamos em Venice Beach, Donald foi quem me ensinou a fazer surf, mas toda semana eles iam ao Orfanato, dar aulas, meu pai de música, ele de artes.

Os dois ainda ajudavam no que podiam o orfanato, me levavam junto, um dia Donald discutiu com ele sobre isso, porque me levava.

Foi quando ele contou sua história, se não tivesse sido adotado ao nascer, pela quem considerou toda vida sua mãe, teria acabado num orfanato como eu.  Nunca devemos esquecer de aonde saímos.

Ele tinha sido cantor desde criança, aprendeu com a mãe, na universidade estudando música, aprendeu a compor, o que fez muito mais tarde.

Me descobriu cantando, me sentei ao lado dele, com seu piano portátil, que levava sempre ao orfanato, cantava “Over de Rainbow”, uma música que minha mãe, quando não estava colocada cantava para que eu dormisse.

Eu sabia a letra inteira, seguiu sendo uma música que me acompanharia a vida inteira, pois sempre a cantava nos seus shows.

Fazia música incidental para o cinema, mas gostava mesmo era de fazer pequenos shows, em boates de jazz.

Tinha uma voz impressionante, quando cheguei aquela idade que trocamos de voz, tive que fazer um tratamento, pois tinha um problema na garganta.

Passei um bom tempo no hospital, tinha um câncer de faringe, mal podia comer, ele estava lá todos os dias comigo, não saiu do meu lado.

Donald se preocupava, pois não trabalhava, ele ria dizendo que tinha dinheiro suficiente para viver várias vidas.

Graças a Deus tinham descoberto cedo o câncer, assim o tratamento funcionou, fiquei sem cabelos um bom tempo, o mais divertido, foi que ele, bem como o Donald, raspavam a cabeça para ficar igual.

Quando meu cabelo voltou, de loiro que era quando garoto, nasceu escuro, um castanho, como o dele.

Quando voltei para casa, estava louco para fazer surf, mas agora íamos ao final do dia, quando o sol não era muito forte.

Adorava os dois, Donald era mais prático, me ensinou a ler e escrever antes do tempo, quando fui para a escola, já sabia fazer isso, gostava de desenhar, um dia sonhei com meus pais de verdade, me levantei de madrugada, os desenhei, tinha medo de esquecer como eram, no meu sonho, pareciam como jovens que eram, loucos para ganhar o mundo.

Quando Donald levantou, eu estava sentado na mesa da cozinha, terminando o desenho, ele reconheceu os dois, falou seus nomes, ficou na minha cabeça.

Oberon quando viu, chorou, disse que de sua mãe verdadeira, nem tinha ideia, tudo que sabia era que era menor de idade, que vinha fugindo de algum lugar, que tinha chocado uma caminhonete contra uma árvore, pelo visto não sabia dirigir, a tinha roubado num posto de gasolina.

Quando sua mãe lhe contava, dizia que essa caminhonete, estava cheia de engradados de galinhas, que voavam penas para todos os lados, um dia ele compôs uma música sobre isso, a fuga, fazia uma parte em bebop, um gênero de jazz, em que fazia a música sem cantar, somente com sons na boca, eu me matava de rir, pois ele imaginava as galinhas saltando, fazendo ruídos.

Eu tinha verdadeira adoração pelos dois, cada um a sua maneira me amavam.

Depois do câncer, minha voz ficou horrível, eu me chateava com isso, pois queria cantar com ele, me consolou dizendo que eu encontraria outra maneira de fazer arte, me disse tens o desenho, escreves bem.

Era uma verdade, as histórias que Donald me contava, eu transformava em desenho, as escrevia ao mesmo tempo, transformando numa coisa que adorava, história em quadrinhos.

Ele me contava sempre uma que tinha inventado, sobre Punk, o personagem de “Sonhos de uma Noite de Verão” de Shakespeare, as histórias que ele inventava, era melhores que a original, depois me mostrou nos filmes, mas para mim, o que me contava de noite eram mais impressionantes.

Mostrei para ele, quando terminei, ele levou para a escola, mostrou a professora de artes, de teatro, essa resolveu montar a história como eu tinha feito.

A de arte conhecia alguém no Pixar Studios em Emeryville, mandou uma cópia do que eu tinha feito.  Veio uma pessoa falar comigo, quando viu que era uma criança, riu muito, me incentivou a trabalhar sempre, me trouxe de presente um computador, bem como um convite para ir ao studio aonde trabalhavam.

Numa semana de férias fomos até lá, alucinei. Sonhei com isso muito tempo, mas Donald como sempre me colocava os pés no chão.   Lá dentro serás um prisioneiro, tens que fazer o que te dizem, deves sim aprender a trabalhar no computador, para conseguir ser como eles, se possível faça um estagio lá quando fores maior.

Procurou, ele sempre era assim, uma pessoa para me ensinar, conseguiu justamente um que tinha trabalhado lá, dizia que era uma jaula de ouro, te elogiavam, mas no final aparecias nos letreiros no final, a gloria sempre era de quem tinha a ideia.

Fiz um curto, a historia de meu pai Oberon, as galinhas voando, usei sua música como fundo, ele ria horrores, levei quase um ano para terminar, com uma fotografia de sua mãe, a inclui na história, ele amou, Donald conseguiu com seu amigo que subisse no Youtube, que nessa época começava, fez sucesso.   Quando me convidaram para participar de um festival de curtas metragem, riram muito quando descobriram que eu tinha na época 14 anos.

Depois não parei mais, fiz como o Donald tinha sugerido, um estagio em Pixar Studios, para saber como era, realmente não encaixava, estava acostumado a trabalhar sozinho, minhas ideias, ali eram ideias de outros, trabalho de grupo, não fiquei contente.

Seu amigo me convidou para trabalhar com ele, num longa que estava fazendo, foi genial, eu com uma cabeça diferente da dele, que tinha mais experiencia, dizia que eu era como um vampiro, o que ele me dizia, ficava, que tinha a criatividade a flor da pele.

Meu pai Oberon fez a música para o filme, que passou em vários festivais, ganhou vários prêmios com isso, cada vez se especializava mais em fazer música.

Quando fiz 19 anos, percebi coisas diferentes no Donald, se esquecia das coisas, estava no meio da rua, de repente não sabia para aonde ia, entrava no supermercado, depois não sabia sair.

O médico disse que tinha Alzheimer, foi uma porrada a toda regra, ele que era uma pessoa independente, de repente mudou, se fechou em si mesmo, pois sabia por aonde iam os tiros, nos dois o ajudávamos, mas infelizmente acabou numa residência de pessoas com o mesmo problema, eu ia quase todos os dias até lá, meu pai Oberon, tirava uma parte da manhã para estar com ele.   Reclamava que era a única hora que ele estava mais desperto, mas dizia sempre que essa doença era como uma maldição, ver uma pessoa como ele desaparecendo nas sombras.

Quando ainda tinha cabeça, um dia me pediu para contar a sua história, foi o que fiz, o meu primeiro largo metragem, em desenho, falando justamente disso, até ele desaparecer.

Seu enterro foi super concorrido, ai descobrimos uma quantidade enorme de gente que de alguma maneira ele tinha ajudado.

A mim me balançou, Oberon entendeu, eu perdia mais uma vez uma pessoa que adorava, ninguém de sua família apareceu, só um irmão que veio depois saber se tinha algum dinheiro de herança.

Mas no testamento dele, tudo que ele tinha, sua casa, o dinheiro de ex-militar, era tudo para o orfanato aonde ele ajudava.  Deixou sim uma carta para nós dois.

A minha dizia que eu tinha sido o filho que ele tinha sonhado em ter na vida.  Oberon nunca me mostrou a sua, sei sim que chorou muito.

O pior que estava tão acostumado a compartir coisas com ele, que fiquei meio perdido.

Passei a fazer isso com o amigo dele, Jackson, com quem trabalhava, esse um dia muito sério me contou como tinham se conhecido.

Jackson tinha chegado a Venice Beach, vindo do interior, precisamente de sacramento, tinha loucura pelo mar, Donald, tinha deixado o exército, com um ferimento na perna, da qual nunca se recuperou, mancava um pouco por isso.   Tiveram um breve romance, mas quando Oberon entrou em cena, viu que Donald só tinha olhos para ele.  Foi quando fui trabalhar na Pixar, quando voltei, ele me ajudou a retomar minha vida, me incentivou a seguir fazendo meus filmes, sempre falávamos, me contava que agora tinha um filho, que me amava, me mandou teus desenhos, para que eu desse uma olhada.

Ficava contente quando vinha te buscar para alguma coisa, mas realmente nunca deixei de ama-lo, Jackson tinha nos ajudado a cuidar dele.

Fizemos os dois um filme, levamos mais de dois anos, desenhando, passando pelo computador, agora entre os dois tínhamos um studio.

Meu pai sempre aparecia, pois adorava fazer a música do filme, ficou conhecido cada vez mais por isso, teve uma época que me preocupei muito, pois fazia para dois filmes diferentes, quando falei com ele, me olhou sério, isso é como um desafio, quero saber se tenho a capacidade de fazer duas coisas diferentes ao mesmo tempo.

Acabou exausto, rimos muito no final, pois as duas músicas concorriam ao Oscar, vieram entrevista-lo por isso, ele como sempre tinha aprendido com sua mãe ser educado, falou dos dois trabalhos em conjunto, como tinha ficado exausto no final.

Depois durante anos, recusou fazer qualquer trabalho nesse gênero, fazia para nós, acompanhava o nosso trabalho, percebi que Jackson tinha transferido o que sentia pelo Donald para ele.

Mas ele ria, dizendo ao Jackson, que se juntasse com sua turma, pois era muito jovem para ele.

O mais interessante, era que nossos filmes participavam de festivais, alguns realmente chegavam ao cinema, mas claro, não eram desenhos animados para crianças, eram assuntos sérios, coisas da vida.

Nunca tinha me sentido interessado nessa coisa de fazer desenhos para crianças, tinha bastado meu primeiro trabalho, o tempo que tinha estagiado na Pixar, para me tirar a ilusão disso.

Gostava do que fazia.

Como dizia meu pai, tens casa, comida, roupa lavada, que mais queres, com o tempo foi me ensinando a saber administrar o dinheiro que ganhava, como sua mãe tinha feito com ele.

Nossas conversas agora era largas, pois nunca me via com ninguém, o que era uma verdade, não me apaixonava, talvez procurasse uma pessoa como ele, Donald, que eram sérios, nada de aventuras de uma noite.

Esperava encontrar alguém para amar, realmente.

Fiquei surpreso quando num festival que fomos, o Jackson conheceu alguém, ficou como louco, pelo homem, mas percebi logo que o mesmo era um tanto excêntrico, adorava drogas, outros bichos, voltei sozinho para casa, ele ficou o esse homem.

Voltou quase um ano depois, um trapo, tinha caído na rede das drogas, foi duro ajuda-lo, mas ele tinha um instinto de conservação, esteve meses internado, fazendo terapia, desintoxicação, coisas impressionantes.  Oberon, ia comigo nas visitas, o escutávamos.

Um dia disse que devíamos fazer um filme sobre isso.

Eu sabia que não devia, de maneira nenhuma provar drogas, por causa de meus pais, ninguém sabia se na época que minha mãe tinha me gestado, consumia drogas, então era um perigo.

Quando voltou, fizemos essa história, que no fundo foi como uma catarse para ele, ganhamos inclusive prêmios, o filme passava em festivais, no Youtube bombava, pois era um ponto de referência.

Alguns diziam que era como um aviso, de como era fácil se perder nas drogas.

Num dos festivais, em Londres, um médico veio falar comigo, pensou que se baseava a história em mim, sorri, mas não disse nada.

Me contou sua história, que tinha tido uma vida tumultuada, que para se manter, conseguir acabar a universidade, tinha roubado drogas dos hospitais que fazia práticas, acabou se viciando, tinha sido um largo caminho para se livrar de tudo que tinha acontecido com ele, que no fundo na época procurava uma maneira de seguir em frente.

Acho que pensou que nos interessava a história para fazer um filme, mas Jackson, soltou, esse sujeito tem cara de embusteiro, com os seus conhecimentos, se informou a respeito do mesmo, o tipo tinha inventado a história toda, queria cinco minutos de fama.

Nem era médico coisa nenhuma, um dia vi um filme na televisão, chamei o Jackson, rapidamente, que olhasse nesse canal, aí estava a história que o sujeito tinha contando, era um filme inglês, baseado num fato real, descobrimos depois que o personagem tinha morrido de overdose, quem contava a mesma era um irmão dele.

Tinha tudo para ser alguém, mas tinha se perdido.

Sempre acontecia isso, alguém se aproximar, eu aprendi a tirar o meu da reta, como dizia o Oberon, as pessoas adoram inventar histórias.

Ele e o Jackson, riam muito comigo, pois sentia que algumas pessoas se aproximavam pelos cinco minutos de fama, eu descartava em seguida.

Em Paris, conheci um cineasta como nós dois, que era Africano, tinha vindo jovem para Paris, tinha feito um trabalho em cima das histórias que contava seu avô na sua infância.

Tivemos um papo genial, saiu comigo para conhecer a cidade, me contou sua vida, tinha tido um relacionamento que tinha arrasado com ele.

Por isso tinha medo de começar qualquer coisa, iria para a Africa em breve, não para o pais de origem, lá tinha sua entrada proibida, pois tinha contado a história de seu avô, o governo militar não gostou.

Eu e Jackson, fomos com ele, nos disse, levem muitos blocos de desenho, pois vamos necessitar.

Passamos um mês viajando em um jeep velho, um homem que tinha sido militar, nos levava a todas as aldeias bem para o interior, a mim me traduzia o que os velhos contavam.

Um deles, foi como um encontro com o passado, começou a falar dos meus pais, falou que não se tinha encontrado nada, pois os dois tinham saído de um orfanato.

Sonhavam em ser grandes cantores, falou da minha vida, com Oberon e Donald, fiquei admirado como sabia, foi aonde ficamos mais tempo, começo a me contar do Orixá que me acompanhava sempre, ele te protege, essa gente que se aproxima de ti, quando apresentas teu trabalho, desconfias sempre, pois ele te diz em tua cabeça, que esse não é o caminho.

Começou a descrever o mesmo, contar sua história, não só como Orixá, mas em sua vida terrenal, dizia que ele era justamente daquela região, falou com o guia para nos levar até uma pequena aldeia as margens de um rio, completamente poluído, pelas explorações mineiras, que faziam os chineses.

Quase nada restava da aldeia, sem saber muito por que, chorei muito, em minha cabeça se começou a formar uma história.

Quando voltamos, passamos de novo para falar e despedir do velho, ele me disse que o que tinha imaginado, daria frutos, que deixasse minha intuição me dirigir.

Quando voltamos, Jackson resolveu ficar um tempo, em Paris, com seu novo romance, iriam trabalhar junto num projeto.

Me disse que usasse sem problemas o studio.

Lhe disse que desta vez, iria trabalhar desde casa, tinha algum dinheiro, comprei o material que necessitava em termos de computadores, programas que usava.

Ainda ganhei mais, pois a empresa que os desenvolvia me contratou para ensinar jovens a usar o mesmo, fiz um programa que procurei que fosse o mais simples possível de ensinar.

Deu certo, agora me pagavam para ir pelo mundo fazendo palestra sobre isso.

Quase dei a volta ao mundo, conheci muita gente, mas no final estava era louco para voltar para casa, não gostava muito de ficar afastado de meu pai.

Oberon já estava com oitenta anos, dizia que era duro na queda, se espantei galinhas para nascer, ainda compunha músicas, que depois me mostrava, tinha medo de se repetir, tu sabes com a idade ficamos repetitivos.

Mas nada, levou uns quatro anos, fazendo um trabalho completamente diferente, uma sinfonia dedicada à sua mãe, nunca tinha esquecido o que ela tinha significado para ele.

Mas me cobrava sempre que eu iria ficar velho e sozinho.

Nessa época conheci na praia, fazendo surf um homem diferente, era muito sério, lhe faltava uma perna que tinha perdido na guerra, tinha um equilíbrio impressionante em cima de sua prancha, tínhamos a mesma idade.

A primeira vez que dormi com ele, me disse, que era melhor eu ir embora, vivia na encosta, numa casa que tinha herdado do homem que tinha amado muito.  Um coronel, que o tinha protegido desde o princípio, mas tenho pesadelos de noite.

Me despertei com ele suando horrores, gritando, cuidado, cuidado, me abracei a ele, se relaxou.

Com o tempo foi me contando sua vida, de garoto que viveu a vida inteira num orfanato, quando teve idade para sair, tinha poucas opções, ir para o exército, se prostituir, vender drogas.

Preferiu o primeiro, pelo menos pode estudar mais, adorava um livro, escrevia histórias que tinham ficado na sua cabeça.

Mostrei para ele meu trabalho, o que fazia no momento, sobre o Orixá, ele ria, dizia que sonhava as vezes com esse homem, que muitas vezes o tinha salvado de morrer.

Foi me contando tudo, eu sabia que era verdade, perguntei se podia incluir na minha história.

Agora me acompanhava durante o dia, fizemos uma rotina, íamos de manhã, fazer surf, depois íamos para a casa de Oberon, que reclamava todos os dias, que se sentia sozinho, depois se sentava conosco para escutar a parte da história que estávamos trabalhando, fui ensinando a John Brother a trabalhar, ele se matava de rir, dizia que eu tinha demorado, mas tinha encontrado alguém que ele via que me amava.

Já posso morrer em paz, soltava, as vezes chegávamos, me contava alguma história que tinha sonhado, entendo o que minha mãe dizia, que com a idade vamos nos lembrando de coisas e pessoas do passado.

Ela falava muito do tempo que vivia com sua família, que eles achavam que ela queria ser puta, por querer ser cantora de musicais.

Um dia me contou toda a história sobre o único homem que tinha amado, como ficou frustrada quando descobriu que ele tinha feito uma operação de vasectomia, que lhe impedia ter mais filhos.  Talvez me dizia por isso o filho que ela desejava, chegou por outro caminho, desde o primeiro momento me dizia, eras o filho que eu esperava.   Me ensinou a amar a música.

Seu pai não sabia, mas gravava todas as conversas que tinham.

As vezes eles chegavam estava escutando alguma música que os dois tinham gravado, me dizia, olhe como eu erro a nota tal. Podia ter feito melhor.  Escutem como ela canta, a força que tinha quando amava uma música.

Um dia chegamos, tinha morrido dormindo, já estava a beira dos noventas, estava com a mobilidade reduzida, pois tinha artrose, o que mais lhe incomodava era a artrose nos dedos, que lhe impedia de tocar piano, então ficava sentado num cadeirão, cantando baixinho as músicas que tinha cantado a vida inteira, as vezes dormia, despertava cantando outra música, dizia que tinha sonhado que estava cantando essa música no palco de algum casino em Las Vegas.

Era duro ver um homem como ele, perder primeiro a mobilidade, segundo, viver do passado.

Só nos deixava entrar em casa, porque sabia quem éramos, estranhos ele não atendia.

Um dia me disse quase num sussurro que tinha sonhado com sua mãe, que lhe apresentava a verdadeira, uma menina.      Chorou muito nesse dia, uma lastima que não a conheci, só irei vê-la do outro lado.

Seu enterro passou quase desapercebido, ele a muitos anos já não fazia shows, com a idade apareceu o medo cênico, achava que ia esquecer a letra da música, um acorde de piano, coisas do gênero, lhe disse que não necessitava de dinheiro, tinha suficiente.

Voltávamos do enterro, ele iria ficar ao lado dos seus amores, o advogado me disse que nem precisava fazer leitura de testamento, que tudo ia para mim, o que ele tinha deixado para o orfanato de aonde tinha me tirado, já tinha entregue pessoalmente.

Contou como tinha sido, fomos ao banco, ele pediu um cheque num valor altíssimo, depois o levei ao orfanato, como sempre as crianças corriam para ele, para escutar alguma música, ou que ele tocasse piano, pediu desculpa, mas suas mãos não permitiam mais, ainda fez uma brincadeira com os meninos, dizendo se algum tocasse piano, ele cantava.

Entregou o cheque a freira que comanda tudo, se despediu de criança por criança, me disse que esperava o dia que fosses ali, buscar um neto para ele.

Era estranho ele nunca tinha falado a respeito.

Voltei a frequentar o orfanato, agora dava aulas lá uma vez por semana de desenho para os meninos, não sei como John, passou ensinar os meninos a tocar piano.  Disse que tinha aprendido um básico com meu pai.

Acabamos nos casando, adotando um casal, dois irmãos que chegaram juntos, mal cuidados, num estado lastimável, iam separa-los, a freira conseguiu que pudéssemos adota-los.

Foi fantástico, John é um pai fantástico, os leva a escola todos os dias, mas ao médico, vamos os dois, três vezes por semana vem uma senhora, com uma enfermeira, para dar uma olhada neles, tem que comer comida balanceada, pois estavam muito subnutridos.

Não tinha conseguido encontrar nenhum parente dos dois, o Orixá disse que os tinha guiado até o orfanato.

Tempos depois tivemos que nos mudar para uma casa maior, adotamos mais dois irmãos, a mãe tinha morrido na rua, eu fiquei louco quando vi os meninos, um era branco outro negro, com a diferença de um ano cada um, quando os vi, estavam de mãos dadas, inclusive dormiam assim.

Dois anos depois adotamos duas meninas, a freira dizia que tínhamos madeira para ser pais.

Talvez tivéssemos realizando o sonho do Oberon de ter netos, sempre dizia que sua mãe com certeza teria me adorado como neto.

O tempo passa muito rápido, agora basicamente todos são quase adultos, estão na época de irem à universidade, cada um quer uma coisa diferente, mas querem estudar em Los Angeles mesmo, para não se afastarem um dos outros, se dão muito bem entre eles.

John os teve sempre quase num regime militar, ao mesmo tempo, é para ele que correm para contar alguma coisa, sabem que quando estou mergulhado num desenho ou criando um personagem, fico como numa casca fechada, ele ao contrário é aberto.

Fazemos no fundo um casal perfeito, pois o que falta a um o outro tem de sobra.

Talvez também por termos saído de orfanatos, entendemos os garotos.

Tenho que trabalhar mais, para ganhar dinheiro, menos mal que Oberon me ensinou a aplicar o dinheiro para render, pois mandar todos a universidade, custa muito, mas não me importo.

Nenhum deles é cantor ou desenhista, mas não me importo.

Outro dia fazendo as contas, já fazem quase trinta anos que estamos juntos, amo o John, sigo o que me dizia o Donald para manter a família unida, sinto falta dos meus pais, sempre, as vezes me pego falando com o Oberon, se posso usar música tal dele, para fazer um fundo a história que estou contando.

OBERON MACTOSH

                                             

A primeira parte de minha vida, só fui descobrir com uns 12 anos, quando uns garotos começaram a querer fazer bullying comigo.   Primeiro dizia que minha mãe era uma puta, depois diziam mil coisas.   Meti a mão na cara deles sem remordimento algum.

Claro a chamaram na escola.

Nesse dia me contou sem problema algum, minha história, porque diziam isso, os dois sentados na mesa da cozinha grande lá de casa, tomando café com leite, pequenas madalenas que ela fazia.  Sempre sentirei o cheiro delas em minha vida, porque tinham sempre canela.

A história começava em Montana, aonde ela era uma garota que vivia com uma família imensa, que se escapava para ir ao cinema ver musicais, na verdade em casa a música era uma coisa permanente.   Um dia se escapou com suas economias de caixeira de um supermercado, para NYC, queria tentar fazer musicais na Broadway.   Era bonita, sabia cantar, tinha uma boa voz.

Mas claro como ela tinha muitas, loiras, morenas, altas, baixas, ou seja, ela era uma das muitas candidatas.   Mas para ganhar a vida enquanto não surgiam oportunidade, trabalhava num restaurante de luxo, tinha um aspecto excelente, bem como educação.  Loira, de quase 1,80 de altura, olhos verdes fortes, um corpo de fazer gosto.

Nas horas vagas estudava música, para aperfeiçoar sua voz.

No restaurante sempre cheio de personalidades de todos os tipos, levava muita cantadas, algumas companheiras, cediam a troco de algum dinheiro a mais, ou mesmo a possibilidade se serem amantes de alguém.   Mas ela se negava, era virgem, não ia por aí dizendo isso, mas não estava para aventuras.

Um dos homens que era sempre educado com ela, normalmente vinha a algum almoço de negócios, ou de política.  Pedia sempre um reservado, que fosse ela a atender, pois sabia que se escutasse alguma coisa, nunca falaria nada.   Dizia isso, porque sabia que ela tinha escutado conversas comprometedoras, mas nunca tinha vazado nada aos jornais.

Nesse dia estava discutindo com um advogado seu divórcio, se via que para ele era algo doloroso.  O escutou dizendo ao mesmo, sei que tenho culpa, minha família aqui, eu vivendo em Washington, mas descobrir que me coloca cornos, isso não, vivem num senhor apartamento, as melhores escolas para os garotos, ainda me quer colocar de culpado em tudo, para me tirar dinheiro.  Nem pensar, pagarei quando muito a pensão dos garotos, desde que seja administrada por outra pessoa, não por ela, pois sei que passara a mão em tudo.

Depois que o advogado foi embora, ele ainda pediu uma sobremesa, era um tipo de 1,90 metros de altura, senador, metade de sua cabeça estava branca.  Mas não era tão velho assim, beirava os 55 anos.

Ficou com pena dele, lhe disse honestamente que sentia muito.

O pior Trichie, não é perder teu casamento, é a solidão que sinto a muito tempo, uns filhos que estão contra mim, são uns adolescente mimados, nunca serão nada na vida, pois a mãe os educa para gastar dinheiro como ela, superficiais, outro dia mencionei um escritor para meu filho mais velho, me perguntou diretamente, quem é esse idiota.  Não me contive, lhe disse que idiota era ele, pois era o escritor mais importante dos Estados Unidos.  Walt Whitman.

Ela recitou de cabeça uma frase dele.  Estudei quando jovem, adoro ler, me sobra pouco tempo, pois faço aulas de canto, bem como de música, assim se não consigo ser cantora, posso pelo menos dar aulas.

Ele lhe perguntou seu sobrenome, no dia seguinte, recebeu uma das primeiras edições do Walt.   Ficou como boba, dentro tinha uma dedicatória dele, dizendo que pelo menos nem tudo estava perdido no mundo.

Agora ele ia mais ao restaurante, a negócios ou não.   Uma das últimas vezes, com o advogado para comemorar seu divórcio.

Ela se despediu dele, pois deixava de trabalhar, ia fazer um pequeno papel numa obra de teatro, um musical em cima de uma obra se Shakespeare, “sonho de uma noite de verão.

Ela fazia o papel pequeno, bem como cantava no coro.

Se admirou no dia da estreia, receber um ramo de rosas vermelhas, suas preferidas.  Era do Senador.    A obra não foi muito bem, entendeu então que não adiantava, ela era uma das muitas, como tinha acabado a universidade, estava procurando uma colocação de professora de música.

Vivia num pequeno apartamento, enquanto isso tinha voltado a trabalhar no restaurante, não se incomodava, pelo menos era um trabalho honesto.  Meses depois o senador apareceu outra vez, estava discutindo com uns companheiros, que ele se retirava da carreira política, tenho minha fazenda para cuidar, ele tinha deixado o apartamento de NYC para sua mulher e filhos, a fazenda nunca tinha feito parte de nada disso, a herdou de seu pai, depois que se divorciou.

Os outros foram embora, ele ficou, sozinho, comendo um das sobremesas que era sua preferida, ela lhe trouxe café.

Ele começou a conversar com ela, sinto que não tenha sido um sucesso seu trabalho, mas não se deve desistir.  Ela contou que estava tentando algum lugar para dar aula de música, mas que era difícil.

Sem querer soltou para ele, que os castings as vezes eram complicados, pois algum produtor sempre queria se aproveitar das jovens que sonhavam com o estrelado.

Ainda soltou no seu entusiasmo de falar com ele, que se mantinha virgem, não era para pagar nada disso, imagina, depois nunca mais poderia me respeitar.  Contou que um deles, lhe tinha dito que ninguém saberia.    Mas eu saberia o que tinha feito, vendido meu corpo por uma oportunidade.  Não condeno ninguém que o faça, por isso fiz universidade, estudei, dei um duro aqui.  Quantas garotas daqui saíram pelo mesmo, uma oportunidade de serem amantes de alguém.

Quando deixou seu trabalho nesse dia, ele a estava esperando, saíram conversando como se fosse a coisa mais natural do mundo.  Ele não avanço nenhuma vez com ela, foram ao teatro, ao cinema, ele disse que não fazia isso a muito tempo.

Depois a avisou que iria para Albany, a capital do estado, perto de onde tinha sua fazenda.

Voltou tempo depois rindo, graças a deus não sou tonto, meu pai tinha deixado nas mãos de seus empregados, tudo estava mal organizado.

Nesse dia, comentou que não poderia estar sempre por lá, sentaram-se numa praça, a pediu em casamento.    Ela se espantou, pois o tinha como um amigo com quem partilhar coisas, nunca tinha tido nenhum.    Lhe disse que teriam ir com cuidado, pois iriam pensar que ela estava dando o golpe do baú.

Ele agora vinha pelo menos uma vez por mês, para corteja-la, até que ela aceitou.  Perguntou como ela queria o casamento.  Esperando que ela quisesse alguma coisa toda por alto.

Sejamos práticos, lhe soltou, eu quando muito convidaria duas amigas para uma festa, tu não sei, eres conhecido, eu não tenho ninguém.

Concordaram se casaram num registro civil, ele concordou com tudo que ela quis.  Com suas economias, comprou uma traje branco, num saldos, não escondeu isso para ele.  A muito tempo tinha aprendido a administrar suas economias.

Foram viver na fazenda.  Ela o ajudava a administrar, afinal tinha crescido em uma, a casa era imensa. Foram segundo ela os dez anos mais felizes de sua vida, mas não entendia por que nunca ficava gravida.   Fez milhões de exames, nada.   Quando ele teve pela primeira vez câncer, ficou furiosa com ele, pois acabou sabendo a verdade, ele tinha feito uma operação de vasectomia, na época que era político, quando via os políticos tendo filhos fora do casamento.

Com os dois que tinha de seu matrimonio, já tinha o bastante.   Ela ficou furiosa, nunca tinha falado para ela.   Mas mesmo assim não saiu do lado dele.   Tempos depois ficou pior, o câncer tinha resistido a todos os tratamentos.

No dia que eu nasci, segundo ela, voltava de NYC, depois da leitura de testamento dele, deixava para ela a fazenda, bem como dinheiro da conta conjunta que tinha no banco, tudo que estava na fazenda era dela.   Ela sabia que no cofre do mesmo, tinha muito dinheiro.

Seus filhos fizeram um escândalo, pois para eles deixava pouca coisa, teve que se conter na leitura, pois mandava um recado para os mesmo, paguei as melhores universidade, que eles fossem à luta com o dinheiro que tinha deixado para eles.

Estava com todos os papeis que o advogado tinha entregado em suas mãos, agora teria que decidir sua vida, sabia que os filhos iriam entrar com algum processo, para lhe retirar tudo.

Era de noite, chovia muito, ela voltava para casa, como chamava a fazenda.

Na estrava, não vinha rápido, escutava uma música baixinho, para não se distrair, quando um carro lhe cortou pela frente atravessando a estrada, indo se chocar com uma árvore.  Vi que era uma garota que conduzia a caminhonete, carregada de engradados de galinhas, pois disse que viu pelo retrovisor, as galinhas voando por todos os lados.

Parou o carro ao lado da estrada, saiu correndo, até a caminhonete, a menina tinha a cara cheia de vidro, mas respirava, viu que tinha uma barriga de gestante, um caminhão que parou atrás dela, desceram dois homens.   Um a ajudou a tirar a garota que sangrava muito, o senhor nos leva até Albani, disse o hospital que ela tinha sua conta de seguro.

Foram embora, o caminhão os seguia. No hospital, a conheciam pelo tempo que seu marido esteve lá, pediu para avisarem a polícia.  Enquanto atendiam a garota, esta não tinha nenhum documento, nada que comprovasse quem era.  Estava vestida com um vestido que se via pequeno para ela, com a barriga dilatada, o médico veio falar com ela, está em coma, não creio que escape, teríamos que fazer uma cirurgia, retirar a criança, deve estar de sete meses.

Fizeram uma cesárea, as enfermeiras diziam que criança feia, diziam que era muito moreno, que talvez fosse filho de algum emigrante.

A policia já tinha recebido a queixa do proprietário da caminhonete, disse que estava num posto de gasolina, que foi pagar, quando a roubaram.   Ali perto tinha um prostibulo, mas claro, ninguém reconheceu a garota, pelo que dizia o médico era menor de idade.

Ela foi até sua casa, mas voltava todos os dias, segundo ela, me apaixonei por ti nesses dias, ficava comigo no berçário, fazendo com que me alimentasse.

Tua mãe verdadeira, durou uma semana em coma, mas morreu.  Ela ajudada pela enfermeira chefe, bem como pelo chefe de polícia, conseguiu me adotar.   Me registrou com seu nome de solteira que voltava a usar, Oberon Mactosh.  Quando tinha uns meses, resolveu voltar a NYC, o sonho da fazenda era do marido, não dela.  Queria voltar a trabalhar com música.

Vendeu a fazenda, guardou tudo que estava no cofre numa boa maleta, só levou seus objetos pessoais.  Transferiu todo seu dinheiro para a NYC, alugou um pequeno apartamento, saiu procurando um para comprar, claro não podia comprar em Manhattan, pois seria perder muito dinheiro.   Encontrou um num edifício antigo, tinha sido de um músico, tinha inclusive um piano, se vendia com tudo que estava dentro, era um segundo andar, de frente para a Rua, com muito sol como ela gostava, o edifício tinha cinco andares, mas sem elevador.

O da imobiliária disse que o único problema era que o administrador, não era muito de fiar.

Ela mandou retirar todo o papel de parede velho, repintar tudo de branco, os móveis que não queria, deu para uma ONG, o resto adaptou, a parte que mais gostava era a cozinha do mesmo que era grande, bem como o salão, aonde pensava dar aulas.

Montou um quarto para mim, ao lado do seu, embora nos primeiros anos, dormia no seu.  Gostava também porque havia uma pequena praça perto, aonde podia passear comigo.  Sempre escutava um comentário que respondia de mal humor, como uma mulher tão bonita podia ter um filho tão feio.  Mandava tocar conta da vida delas, que a deixassem em paz.

Logo descobriu o que o da imobiliária tinha falado, o administrador, engava o resto dos vizinhos, ela começou a brigar com eles, exigindo a apresentação de gastos como devia ser, teve apoio de todos.  Acabaram pedindo que ela administrasse o edifício, com isso deixava de pagar o condomínio.   Dois anos depois tinham dinheiro para pagar a colocação de um elevador pequeno, no espaço entre a escada que subia até o último andar.   Os velhos adoravam, assim não sofriam tanto, bem como valorizavam os apartamentos.

Ela mandou arrumar a parte elétrica dos corredores, bem como pintar tudo, uma vez por ano, para que fosse mais claro possível.

O último andar, era uma maravilha, pois eram como dois apartamentos em um só, quando os velhos que viviam ali, foram para uma residência, ela o comprou, reformou transformando em dois apartamentos melhores, para alugar.  Assim engordava suas economias.

Eu de feio, fui me transformando, ela dizia que parecia que saia de um casulo, uma coisa seja verdade era a melhor mãe do mundo.   Começou a dar aulas numa academia de música ali perto, as vezes dava aulas em casa, me ensinou a tocar piano, a cantar desde garoto.

Só não fazia uma coisa, ir à igreja, seja qual fosse, não era com ela.  Lhe perguntei um dia, por isso, pois meus companheiros de escola, a maioria eram católicos, iam fazer primeira comunhão.   Me explicou que não era católica, mas porque eu queria fazer essa parte, como toda criança, pensava na festa, nos presentes que diziam que ia receber.  Riu muito, para isso é necessário uma família imensa, nossa família somos nós dois.   Mas no meu aniversário, ela sempre convidava todos do edifício, para fazer um lanche em casa.  Todos me davam presentes, mas exigia que fossem úteis, livros, jogos que podiam se jogar a duas pessoas, nada do que ganhavam meus companheiros de classe.

Se candidatou ao cargo de professora de música na escola, conseguiu. Montou um coro com os alunos, mas a maioria queria era jogar futebol, basquete, eu não gostava de nada disso.  Fazia parte do coro.

Nossa casa era um exemplo de democracia como ela dizia, eu tinha direito a pedir as coisas, argumentar, mas ela sempre ganhava, pois me obrigava a pensar.  Se pedia alguma coisa tonta porque os outros tinham, me perguntava por quê?

Se meus argumentos vencessem, ganhava, me dizia tens que saber argumentar.

Fui me transformando cada vez mais, era mais moreno que ela, cabelos lisos, olhos escuros, mas fui crescendo, ficando bonito.    As velhas do edifício me adoravam, pois nos momentos livres, me chamava para comprar alguma coisa para elas, me davam um dinheiro por isso.

Sabia o que cada uma gostava, a marca tudo isso, ia ao supermercado perto, com a lista, o dinheiro que me dava, minha mãe me ensinou a administrar, quando tive um bom dinheiro comprei uma das muitas besteiras que os garotos que conhecia tinham, mas logo me desencantei do mesmo, pois surgia outro modelo mais caro, mais moderno.  Se eu nem gostava desse, ela tinha deixado que eu comprasse, pois o dinheiro era meu.

Tens que usar a cabeça, me fez sentar como sempre na nossa mesa da cozinha, pegou a propaganda do que eu tinha, ali dizia que era o mais moderno do mundo, essa baboseiras todas, depois a propagando do novo, era a mesma coisa, agora o mais importante, vamos olhar a parte técnica, me mostrava, na verdade tinha mudado um pouco algumas coisas, mas no fundo era igual ao anterior, me explicou o que era isso, um engana tonto.

Nunca mais gastei dinheiro em besteira.   Houve um concurso de corais entre os colégios, o nosso ganhou.   Eu fazia dois solos, logo vinham me dizer que tinha uma voz muito bonita.

Eu agora estuda num conservatório, depois iria a faculdade como ela tinha feito, tocava piano, bem como sabia ler, escrever músicas.

Mas gostava mesmo era de me sentar ao piano, cantar junto.  No último ano de escola, no show final, sem que ela soubesse, me apresentei, sentado ao piano, cantando sua música preferida, “Over de Rainbow”, os aplausos foram muitos.   Depois toquei minha preferida Moon River, mas a minha maneira.    As pessoas diziam, filho de peixe, peixinho é, pois todo mundo pensava que realmente era filho dela.   Mas claro tinha escutado música a vida inteira, em casa a rádio só se desligava na hora de ir dormir, meu despertador não fazia aquele barulho costumeiro, estava conectado a uma rádio de jazz, me despertava sempre alguma música bonita.

Na universidade, vários caçadores de talento, se apresentaram, mas ela dizia, tenhas cuidado, desconfie sempre de tantos louvores, propostas, analise cada uma.

Acabei formando com uns companheiros um grupo, tocávamos as músicas do momento, era a época dos Beatles, do The Rolling Stones, Elton John, mas me faltava algo, fizemos uma música que foi um sucesso, nos convidaram para ir a um programa de televisão sobre música.

Me perguntaram, como era o cantor do grupo, o que me gostava na realidade, vocês tocam as músicas do momento, mas todos tem formação musical.

Cada um falou a sua, a mim me disseram, cante alguma coisa, eu sabia que ela estava em casa vendo pela televisão.  Falei que a música estava presente na minha casa, desde que abria os olhos, até a hora de ir dormir, que minha mãe era professora de música, 80% do que sabia tinha aprendido dela.

Me pediram para cantar alguma coisa que gostasse, eu nunca poderia depois que sabia da minha história agradecer a ela, pois poderia ter ido a um orfanato, ser abandonado, ou coisa assim.

Por isso, me sentei ao piano, como sempre cantei duas músicas suas preferidas.  O pequeno público aplaudiu de pé.  Houve um intervalo, os outros disseram que tinha sido o máximo, um dos companheiros soltou, estamos no caminho errado.

O mesmo disse o apresentador depois, tens timbre, bem como formação para cantar Jazz.

Eu ri, ela vive me dizendo isso, mas temos que viver nossa juventude, eu nunca parei de cantar nenhuma música que escuto.

Me pediram para cantar outra, ri muito.  Comentei vão dizer que essa música foi feita para uma mulher, mas eu a adoro, podia mudar o contexto da mesma, mas gosto como está, cantei “My Man”, o publico ficou alucinado, pois abaixei o tom da minha voz, cantando quase num sussurro.   O apresentador, riu muito, disse, encontramos no meio de tanto rock, descobrimos um futuro cantor de jazz.  Logo choviam chamadas telefônicas.

Alguém importante me viu cantando, procuravam um cantor para um musical, sobre Jazz, o resto dos cantores eram negros, queriam alguém diferente no meio.

Ela conhecia o musical, tinha feito muito sucesso anos atrás.  Me incentivou a ir fazer o casting, sabia duas músicas do mesmo que tinham feito sucesso, fora do espetáculo.

Ensaiamos os dois em casa, eu cantando ao piano, depois no centro da sala, me dizia, mova-se dentro do ritmo.

Fomos os dois, disse que por nada do mundo ia perder isso.  Se sentou ao fundo do teatro, depois durante anos, fui a gozação das pessoas por isso, o rapaz que vai com sua mãe, ao casting.  Nunca me desculpei, ou consertei isso, tinha orgulho dela.

Fiz como tínhamos ensaiado, fui aprovado de primeira, me disseram que somente teria que fazer aulas de dança para me mover melhor no palco.

Acabou que o espetáculo, era metade de negros, o resto de todas as raças.  Tinha uma música que eu cantava juntos com os outros, o principal deste grupo era um negro com uma voz impressionante.   O rapaz se deslumbrou com a fama, foi encontrado drogado num beco, com uma facada no coração.   Me perguntaram se podia cantar no tom que ele fazia. Ensaiei duas vezes os outros não gostaram porque era a chance deles, o diretor deu oportunidade a todos, mas quem se saia melhor era eu.   A temporada também estava acabando, fiz até o final, emendei com um outro musical da Broadway, sem querer estava realizando o sonho dela.

Se fosse outro, seria o momento de voar do ninho, mas estava tão acostumado a viver com ela, que não tinha por quê.  Tinha aprendido a administrar meu dinheiro, gastava somente o necessário.   Se ia algum programa de televisão, usava uma das roupas do show.

Era para ficar um ano em cartaz, seis meses depois, lhe disse para ela um dia, tomando café da manhã, creio que isso não é para mim, fico chateado de cantar a mesma música todos os dias, ontem me peguei cantando como quem está no chuveiro, com a cabeça em outro lugar, ninguém percebeu, mas eu sim.

Ela sem querer tinha voltado ao meio, montamos um show, os dois cantando, um pequeno grupo, eu ou ela no piano, um contrabaixo, um saxofone, um baterista.  Todos tinham sido alunos dela, nos apresentamos para uma das melhores casa noturna, fomos contratados, para fazer o show, nos dias de semana com menos público, para começar estava bem.

Meses depois fazíamos todos os dias, descansávamos, segunda e terça, mas assinamos o contrato com uma condição, podíamos mudar as músicas sempre que tivéssemos vontade.

As que ficavam melhor, ficavam no show, outras trocávamos, como ela dizia num sistema democrático, todos opinavam.  Logo nos convidavam para apresentar na televisão, a casa estava sempre cheia.   Um dia cantamos os dois nossas músicas preferidos, nos chamaram para gravar nosso primeiro CD, os lucros repartíamos entre todos.

Me chamaram para fazer um filme, era o papel de um cantor de orquestra de jazz.  A principio não queria muito, mas lá fomos para Hollywood, alugamos os dois uma casa em Venice Beach, era longe, mas tinha me apaixonado pelo mar, pelo clima.

O filme fez um sucesso incrível, o que eu não gostava muito eram das músicas, eram boas, mas exigi que fosse com a minha voz natural, nada de imitar o cantor.

Fomos ficando, algumas vezes fazíamos temporada em Las Vegas, outras nas casas noturnas de Los Angeles, nunca parávamos.   Meus dias livres eram para a praia, aprendi a muito custo a fazer surf.  Me apaixonei pela primeira vez, por um homem que também o fazia, tinha um problema no braço, tinha sido militar, ficamos primeiros amigos.  Depois ele aparecia em casa para me escutar cantando.

Minha mãe ao contrário de mim sentia falta de NYC, quando acabamos a última temporada que fazíamos em Los Angeles, me disse, agora tens que seguir sozinho o teu caminho, tinha percebido que eu estava apaixonado, mas não me atrevia a dar um passo em frente, sempre tinha tido namoradas de uma noite, nada mais.  Se acabava também a licença que ela tinha na escola aonde trabalhava.   Sentia falta da sua casa, a tinha tão a sua maneira que lhe fazia falta.

Comecei a me apresentar sozinho, tocando piano, cantando minhas músicas preferidas, nem tinha uma sequência, cantava o que me saia no momento.

Finalmente Brown tomou conta da ação, um dia me disse na cara, como é, vamos ficar nesse lenga, lenga, estou apaixonado por ti, tu também, vamos ficar nesse jogo.  Nesse dia acabamos na cama.   Nunca tinha podido imaginar o que seria algo tão forte.

Fui para uma casa noturna de Las Vegas, ele foi comigo, enquanto cantava, ele fazia a contabilidade do local.  Um dia me disse, esse sujeito é um tonto, se não tomar cuidado vai perder o local.  O dono todos os dias, saia depois de fechar, gastava metade do dinheiro nas mesas de jogo.  Um dia perguntou se não queríamos comprar.   Nos sentamos os dois, tínhamos economias, mas estava longe do mar.   Arrumamos uma casa, nas aforas, numa urbanização, não era grande, mas tinha um bom jardim, bem como piscina.  Nos apanhávamos, minha mãe veio para a remodelação, a convenci de tocar em dias alternados comigo.  Se acostumou a viver com os dois.  Dizia que eu tinha sorte, basta ver como o Brown te olha, te ama muito.

Eu também a ele, essa era a verdade, estava com 35 anos, me sentia completo com ele, volta e meia um casino pedia que eu cantasse com sua orquestra, pois os cantores nunca paravam.

Como o show, tinha um horário concreto, aceitei, não por dinheiro, mas sim pela orquestra, democraticamente como ela dizia, com a sua orientação, fizemos o reportório, eu cantava no nosso local, ela tomava meu relevo, a elogiavam sempre, estava perfeita, seus cabelos bem penteados, uma maquilagem suave, roupas de bom gosto.

Fiz sucesso, Brown ficou com um pouco de ciúmes, pois levava muitas cantadas, mas não me interessavam, acabava o show, ia para o nosso local.

Quando acabou a temporada, estávamos exaustos, vendemos o local, a casa não era problema, fomos passar uma temporada em NYC, chegamos em plena canícula de verão, adorava andar de bermudas, camiseta pela cidade.  Um dia numa praça, encontrei o meu saxofonista tocando ali, estava mal, me parei ao seu lado, ele tocava uma das nossas músicas, comecei a cantar, primeiro ficou espantado, depois se animou, ficamos ali quase uma hora, tocando todo o reportório que fazíamos antes, ele ria, porque a caixa de seu instrumento não parava de cair moedas, notas de cinco.

Quando paramos, Brown, ria, deviam ter aqui um cd para vender, os dois juntos nem precisam trabalhar muito.

Soube que estava vivendo um abrigo, tinha perdido tudo, pelas drogas, mas estava recuperado, nesse dia, comprei um piano elétrico, desses fáceis de levar, aluguei um pequeno apartamento perto de casa para ele, ia comer conosco todos os dias.

Nos dias de verão, nos apresentávamos em vários lugares, até que um dia um repórter nos viu, ficou espantado, porque eu fazia isso.  Tomamos um café, contei a história.

Estou me divertindo, ele ganhando dinheiro, pois lhe dava toda a arrecadação.  Brown descobriu os cds numa loja em saldos, comprou todos, colocava ali para vender.

O puto reporte trouxe gente da televisão para nos gravar, logo choveram convites para nos apresentar.  Voltamos ao mesmo club de aonde saímos, Simba era negro como um carvão um dia soltou quando estávamos ensaiando uma música que sempre tinha sido apaixonado por mim, mas não tinha tido coragem de se aproximar, agora que tenho, tens o Brown.

Brown fazia toda a parte administrativa, aplicava nosso dinheiro, ia aos bancos, os dois vivíamos num dos apartamentos do último andar, minha mãe continuava no seu. Quando do outro lado ficou livre, Simba veio viver nele, as vezes me dizia que lhe doía nos ver juntos, mas Brown o tratava de maneira especial, como se soubesse de alguma coisa, eu nunca falei nada.

Estava ele um dia num banco, depositando nosso dinheiro, quando o mesmo foi assaltado, ele com seu tipo de militar, se mexeu quando não devia, pensaram que tinha uma arma, atiraram na cabeça dele.   Morreu no ato, quando a policia apareceu, não sabia o que fazer, quem me ajudou foi minha mãe, bem como o Simba.

Fiquei no fundo muitos dias, não era capaz de cantar, tocar, de fazer nada.  A casa rescindiu nosso contrato, me vi de novo cantando com Simba pelas ruas, como para me recuperar.

Gostava de fazer isso, ninguém nunca ia imaginar que precisasse de dinheiro, era pelo prazer.

Nos convidaram para participar numa cidade costeira, de um festival de Jazz, ao ar livres.

Era o fim do verão, fomos, eu sentia uma falta incrível de Venice Beach, aonde tinha sido tão feliz.   Logo depois do festival, enquanto pensava na vida, minha mãe morreu.

Desci para tomar café, nos últimos meses ficava mais tempo na cama, estava agora com os cabelos todos brancos, mas sempre arrumados como ela gostava.  Entrei, a chamei, não me respondeu, fui até seu quarto, a vi na cama, dormindo placidamente, a chamei outra vez, mas era tarde, tinha morrido dormindo.

Na leitura do testamento, fiquei vendo como tinha dinheiro, ela sabia investir muito bem seu dinheiro.  Ri muito quando descobri uma conta que entendi que era o dinheiro dos shows que fazíamos juntos.

Desci para viver em sua casa, convidei o Simba para viver comigo, ele entendeu outra coisa, lhe disse que me desculpasse, mas ainda me doía a falta do Brown, não era capaz de me interessar, ele recebeu um convite para tocar em Toronto, resolveu aceitar.

Fiquei literalmente sozinho.   Aluguei os apartamentos de cima, com uma parte do meu dinheiro e do Brown, voltei para Venice Beach.   Recomecei outra vez a tocar nos lugares, agora com quase quarenta anos, era um belo desconhecido outra vez.

O que me surpreendeu que pela primeira vez, conseguia compor músicas, tinha aprendido isso quando estudava, mas era como se tivesse ficado guardado um alguma caixa esquecida da minha mente.

Quando tinha um bom número delas me apresentei num casa de jazz, aonde tinha tocado em Los Angeles, fez sucesso, logo gravaram todas as músicas.  Ganhei um prêmio, gostava dessa nova faceta, me chamaram para fazer a trilha sonora de um filme, li o argumento, bem como tinha uma ideia para musica incidental, preparei com queria o projeto.

Tive que ir a NYC, por um problema com um inquilino, resolvi vender tudo, tinha saído do clima de Venice Beach, para o puto inverno de NYC, pensei já não quero viver aqui, fiquei com um dos apartamentos de cima, mandei transportar para lá o piano da minha mãe, meus livros, nada mais. Vendi o grande, bem como o outro, assim se precisasse tinha um pouso.

Transferi toda a conta para perto de casa.   Um dia conversando com um amigo na praia, esse me contou que ajudava num orfanato, se eu não queria dar aulas de música lá.  Contei para ele, que se não fosse minha mãe teria acabado num, falei do que tinha acontecido.

Passei a ir, fazia sucesso com os garotos, chegava com meu piano elétrico, dava aulas, encontrei uns dois com alma de músicos, fiz uma coisa, institui bolsa de estudos, em nome da minha mãe, assim esses garotos podiam ir a um conservatório de música, entre meu amigo Donald e eu, os levamos para as aulas.

Um dia apareceu um menino novo no lugar.  Seus pais tinham sido artistas, morreram nas drogas, o garoto me viu ao piano, se sentou ao lado, sem saber por que comecei a cantar para a garotada “Over de Rainbow”, ele sabia a letra, começou a cantar comigo.

Me apaixonei por ele, perguntei se podia adota-lo.   A diretora, disse que estavam tentando localizar algum familiar dos pais, mas não encontraram nada.  Ela moveu seus contatos, o consegui adotar, lhe dei meu sobrenome.  O dele era divertido, era Punk, como um personagem do Shakespeare, ri muito com isso, era tudo que ele sabia dele.

Agora tinha uma família outra vez.

SUBURBAN BOY

                                    

Ele era o quarto filho, sua mãe queria desesperadamente uma menina, naquela época não se fazia exames para saber, nem ela queria.   O pior disso tudo, é que tudo que tinha sonhado era fazer uma universidade, detestava ser dona de casa, muito mais cuidar de crianças.  Não tinha paciência.

Já no terceiro filho, chegou para viver com eles, Lotte uma amiga de infância de sua mãe que tinha ficado solteira, essa foi nossa mãe verdadeira, a que todos respeitavam, acatavam suas ordens, todo mundo dizia que devia ter sido militar, pois só faltava nos colocar em ordem, fazer revisão, isso ela fazia, antes de irmos à escola.

Minha mãe quando me esperava fez um enxoval todo em cor de rosa, queria desesperadamente talvez uma filha, para brincar de boneca, como dizia Lotte.

Mas nasci eu, talvez como dizia o médico, nunca tinha visto uma criança tão feia, nem tão cabeluda.   Era ao contrário dos meus irmãos, todos eles loiros de olhos azuis, como meu pai, eu ao contrário devo ter saído o lado de minha mãe, moreno, cabelos negros, olhos negros.

Ela imediatamente fez uma cirurgia para não ter mais filhos, com isso basta.

Ficou frustrada por não ter uma filha, Lotte estava sempre brigando com ela, pois me queria vestir de menina.  Para o batizado, tinha mandado fazer uma roupa cor de rosa, toda bordada, na véspera, Lotte que nunca tinha sido tonta, colocou a roupa para descolorir, para ficar branca, retirou todas os apliques de rosinhas que tinha, foi minha salvação, imaginava depois com essa história ter todo mundo me gozando quando visse, uma foto.

Ao contrário do esperado, era o querido do meu pai, eu o olhava com admiração, aquele homem alto, quase dois metros de altura, loiros com os olhos transparente, quando era criança pensava não me admira que ela tenha se apaixonado por ele.

Morávamos numa bela casa no Boulevard John F. Kennedy, em Weehawken, em frente ao Hamilton Park.  Da varanda da casa, bem como os quartos da frente se tinha uma vista fantástica de NYC, eu tive o privilégio de dormir num deles, dividia quarto com meu irmão mais velho Brian.  Ele se apaixonou por mim desde que nasci.  Dizia sempre me gozando, era o bebe mais feio que tinha visto em minha vida.  Ele ao contrário era o homem mais bonito que conheci, não me admira que acabasse como ator de cinema.

O outro quarto da frente era da Lotte, meus pais ocupavam um quarto que dava para o quintal da casa, que era uma suíte, no outro quarto meus irmãos Boris, Billy.  Eu quando era pequeno não entendia, todos os nomes começavam com “B”, menos o meu que era Sam, um dia meu irmão me contou em segredo, minha mãe queria que me chamasse Samantha, daí me chamar de Sam.

Não fui a típica criança bonita, tampouco na adolescência, olhava meus irmãos com inveja, pois eles sim eram bonitos, eu tinha uma cara dura, na adolescência cheia de grãos, Lotte sempre me passava produtos, mas fiquei com a pele toda esburacada, tinha um nariz como os da família de minha mãe, grande, ela era descendente de turcos.    De meus irmãos, todos iguais ao do meu pai.   Eles não entendiam por que eu era seu favorito.  Talvez por ser diferente deles, no final da sua vida não os reconhecia, dizia que eu era seu único filho.  Talvez porque era o único que ficou em casa.

Brian era o mais divertido, já tinha nascido para o cinema, essa era uma verdade, alto, tinha, 1,95 de altura, encorpado pelo esporte, era capitão do time de futebol, era bom no atletismo, o querido de todas as garotas, mas ao contrário dos outros participava do teatro da escola.  Eu era obrigado a ler com ele os textos, fazendo o papel feminino.

O mais interessante, era que eu o pegava na cama, ora com garotas, ora com algum amigo seu, quando lhe perguntei sobre isso, me disse que gostava de variar, não me admira que esteja hoje em seu terceiro matrimonio, mas todos sem filhos, nunca os quis ter.  Eu sempre fui seu confidente, achava ótimo isso, me contava as coisas, eu o escutava muito sério, nunca comentei com nenhum dos outros, tampouco com meus pais, ele sabia que em mim podia confiar.

As vezes estava com algum amigo seu no quarto, me mandava vigiar a escada, assim não tinha perigo.   Uma vez o vi com o outro rapaz mais bonito da escola, os dois se rivalizavam nos esportes, nas garotas, os dois estavam fazendo um sessenta e nove, eu devia ter uma 12 anos, lhe perguntei depois que tal era isso.  Me respondeu rindo, já chegara teu tempo, é divertido.

Quando foi estudar arte dramático, minha mãe, virou para ele na mesa, soltou, está na hora de voares de casa.   Isso ela sempre fez com todos, menos comigo, não teve essa oportunidade.

Meu pai não queria, ela batia a mão na mesa, dizendo, os filhos são como os pássaros, tem que voar, ir em busca de outro ninho.   Eu fiquei desesperado, ia perder o único amigo que tinha, mas ela foi com ele, procurar um apartamento pequeno, perto de aonde ia estudar.

Depois foi Boris, resolveu fazer belas artes, foi a mesma coisa, lhe disse na cara, não quero que minha casa vire um studio de pintor, ou o que seja.   Lotte se matava de rir.

Hoje Boris vive em Paris, fez duas exposições com sucesso em NYC, se mandou para Paris, só voltava quando tinha algum enterro, primeiro minha mãe, depois do velho, por último da Lotte.

Billy, foi o único meio louco da família, se metia em milhões de confusões, gostava de uma boa erva, um belo dia, ninguém precisou falar para ele voar, se mandou, de vez em quando mandava um cartão desses turísticos, dizendo aonde estava.  Trabalhava em poços de petróleo, seu negócio não era estudar.   Eu ao contrário deles, tinha encontrado meu refúgio nos livros, comecei lendo os da Lotte, ela adorava os romances água com açúcar, no escritório só tinham livros de direito, pois meu pai era advogado num dos escritórios mais famosos da cidade.

Nenhum filho quis fazer direito.  Quando só fiquei eu em casa, ele sempre falava nessa frustação que tinha.   Queria que todos estudassem direito, para montar um escritório só com seus filhos.

Justo nessa época morreu minha mãe, sem sofrimento, nada, estava vendo televisão na sala ao lado da cozinha, aonde as duas ficavam horas falando.  Lotte contava uma história de uma vizinha que tinha encontrado na rua, começou a rir, estranhou que minha mãe não o fizesse, estava com a cabeça caída sobre o peito.  Tinha morrido silenciosamente.

Não posso falar muito nos meus sentimentos, pois as vezes pensava que Lotte era minha mãe, pois sempre tinha sido ela que cuidava de mim, me levava a escola, até ter idade para ir com meus irmãos.   Era quem nos acompanhava a alguma festa, que ia resolver os problemas na escola, quem fazia compra, ou seja ela era a dona da casa.

Então só ficamos os três.   Eu subia a rua, na avenida tomava um ônibus, ia para a universidade, só voltava de noite, porque fazia ao mesmo tempo direito, literatura.  Eu queria fazer só literatura, mas para agradar meu pai, fiz direito.

No enterro de minha mãe, o Brian, que veio acompanhado de uma mulher linda, era sua namorada em Hollywood, já tinha feito dois filmes, eu quase o beijei na boca, como o via fazendo com seus amigos.  Estava lindo.

Passou dois dias foi embora, logo em seguida Boris foi para Paris, minha mãe ainda teve a oportunidade de ver sua exposição mais importante na cidade, uma individual que vendeu tudo, mas disse que não se satisfazia, que iria estudar para escultor em Paris. 

Meses depois o Billy desapareceu pela primeira vez.  Ficou mais de anos fora, as vezes telefonava para Lotte pedindo dinheiro, se dizia algum absurdo, ela lhe perguntava se tinha cara de banco, repense o valor, torne a me chamar, ainda soltava, vá trabalhar sem vergonha.

Passavam uns dois dias, chamava outra vez, diminuindo o valor.  Ela perguntava aonde ele estava, mandava o dinheiro escondida de meu pai.  Depois que desligava essas ligações balançava a cabeça me dizendo, meu querido, esse jamais vai assentar a cabeça.

Tempos depois meu pai, pediu que ela se cassasse com ele, ela aceitou desde que eu concordasse, mas que ela seguiria vivendo em seu quarto, ele no dele.   Eu achava natural, era ela que fazia tudo.  Nessa época, ele fez uma coisa que nunca tinha feito com minha mãe, me explicou que ela odiava isso, já Lotte gostava.

A levava a todas as festas que era convidado, ela se arrumava toda, ia ao cabelereiro, fazia tudo que tinha direito, comprava um vestido novo, discreto como ela, mas bonito, alguns descobri depois que eram de segunda mão que ela arrumava.

Mas eu sabia que ao chegar em casa, que tinham saído, porque encontrava um bilhete dizendo a comida aonde estava.

Eu me apaixonava por todos os homens que me dessem atenção, mas confundia tudo. Ninguém queria nada comigo, eu era o feio da universidade, era grande isso sim, pelo esporte, forte, tinha um belo corpo, mas de cara, até diziam que eu sorrindo ficava mais feio.

Tinha os cabelos crespos muito escuro, algumas vezes me confundiam com algum mexicano, ou sul-americano.  A polícia me parava volta e meia.   Um dia, depois de mostrar meu cartão de universitário, um ficou me olhando, como dizendo que não acreditava.  Fiquei apaixonado por esse homem, ele era descendente de irlandeses, era tão feio como eu.  Como estavam sempre no mesmo lugar, o via sempre, um dia estava lendo um livro na praça em frente a universidade, se aproximou, perguntando o que eu lia, lhe mostrei, era para um trabalho que fazia sobre James Joyce, Ulysses, ele comentou que não tinha conseguido passar das dez primeiras páginas, começamos a falar sobre isso, me convidou para um café, acabamos em seu apartamento em Queens. 

Lhe perguntei o que fazia no seu dia de folga tão longe de casa, me disse que tinha ido atrás de mim.  Na cama erámos como um embate de dois machos alfas, pois o tamanho era o mesmo, quando tinha uma folga no final de semana, passávamos na cama.   Um dia sem mais nem menos me disse que ia se casar.  Fiquei surpreso, mas aceitei.

Nessa época já pensava em entrar para a polícia, não queria ser advogado, achava um saco, literatura só arrumaria um emprego de professor, eu queria aventura.

Acabei literatura antes, tomei a decisão, falei primeiro com a Lotte, ela riu, me contou pela primeira vez um detalhe de sua família original, seu pai era xerife na cidade aonde tinha nascido, nunca me disse qual.

Ajudou que eu falasse com meu pai, ele ficou frustrado, nessa época ele também já estava farto de ser advogado, aceitou rapidamente.   Fui para a academia, como tinha formação universitária, foi mais fácil.   Quando sai, patrulhei algum tempo, logo passei para inspetor, pois era bom em descobrir coisas, diziam que eu assustava no interrogatório, claro fazia um pouco de teatro, me fazia de mau, a cara ajudava, era fácil.

Voltei a encontrar meu antigo namorado, tinha se casado, divorciado, tinha um filho, andamos mais algumas vezes na cama, mas tinha perdido meu interesse.  Não sei se foi por vingança, espalhou que eu era gay.  Na época isso era uma merda.

Mas fiz que não era comigo, fui transferido depois para a delegacia mais importante de Manhattan, era uma espécie em extinção como dizia, pois era difícil de compartir com um colega.  Gostava de fazer as coisas sozinho.

O chefe um dia de castigo, depois de uma briga com meu companheiro, me colocou uma mulher para andar comigo.  Se deram mal, funcionávamos juntos.  Ela gostava de conduzir, eu não, era uma louca ao volante.

Sabia que eu falava pouco, estava sempre atento a tudo, não tinha tempo para conversas triviais. Nessa época morreu meu pai, já muito mal de Alzheimer, na época se dizia demência, só reconhecia a mim, Lotte morreu antes, vieram o Brian com sua segunda esposa, bem como Boris, acompanhando de um japonês, com quem vivia.  O problema ficava sendo o velho, os dois renunciaram a casa, pois era necessário vende-la, para pagar uma residência para ele, eu nunca estava em casa, tinha um pequeno apartamento perto da delegacia. Localizei o Billy que mandava uma procuração, mas queria a metade de sua parte, primeiro pensei em comprar, tinha um dinheiro de um livro que tinha escrito sobre um caso que tinha resolvido. Mas claro que ia fazer com essa casa tão grande.  Nessa época minha companheira Brittany, me acompanhou para resolver tudo, quando viu a casa ficou como louca, me chamou de garoto suburbano, ela tinha nascido e crescido no Harlen, me dizia, porque não comprávamos a casa os dois juntos.   Mas nem precisamos mandar o velho para a residência, ele morreu antes.

Nesses dias conversei como Brian, viu que eu estava escrevendo outro livro, pediu para ler, depois me perguntou se eu podia transformar num roteiro de cinema.  Não tinha prática, mas fiz um curso de noite para isso, nesse período pedi ao chefe que me deixasse num horário fixo.

Nunca ninguém reclamou nada, pois as vezes usava nos textos histórias que tinha passado comigo resolvendo um caso.  Porque mudava o nome das pessoas, o bairro, trocava algumas, coisas, imaginava como a pessoa podia ter chegado até ali.

Fiz o curso, criei a figura do inspetor, que depois seria durante anos, o personagem predileto do Brian.  Com o dinheiro que ganhei, comprei um apartamento melhor o West Side.

Justamente, nessa época me apaixonei outra vez, mas claro, nem chegou a durar semanas, um tio complicado, advogado, escondido dentro de uma armário escuro.

Eu nunca falava da minha vida particular com ninguém, Bella reclamava que falava de seus namorados, que eu só dizia hum, hum.   Até que tempos depois a vi num momento que tomávamos café, olhando uma revista de vestidos de noivas.  Lhe perguntei se ia se casar, disse que seu atual namorado a tinha pedido em matrimônio.   Perguntei como o tinha conhecido, me contou que num desses encontros a cegas com outra pessoa.

Meses mais tardes quando o vi de longe, era o tal do romance que tinha tido durante algumas semanas, o sujeito era bonito, mas como uma mulher na cama.

Fiquei quieto, ela sempre estava com uma revista nova, eu de brincadeira perguntava se era tão difícil escolher.  Ela dizia que as vezes ele falava no assunto, para depois dar um tempo.

Um dia sem querer me dei de cara com os dois, tinha ido fazer compras antes de ir para casa num supermercado, quando sai, dei de cara com eles, ele fingiu não me conhecer, eu também.

Tinha sempre uma dúvida de falar qualquer coisa para ela, pois nunca tinha mencionado meus relacionamentos.   Sabia que os outros da delegacia comentavam, porque estava sempre só.

Mas claro estava ocupado, do meu último livro, mandei uma cópia para o Brian, ele disse que eu pensasse em transformar numa série, uma coisa que se colocava de moda, pois precisava trabalhar sempre, pois agora tinha três pensões de ex-mulheres para pagar.

Quando veio da última vez, tinha me perguntado se não tinha nenhuma namorada, ou se tinha relações com a Bella, me abri com ele, te via mais feliz, quando estavas com algum amigo teu na cama, que sempre quis isso para mim.  Mas claro até hoje não deu certo.

Ele me abraçou, dizendo que exemplo que te dei.

Não esperava minha resposta, pois eu acho que devias sair do armário, eras mais feliz pelo menos, essas mulheres realmente as amas, ou porque as tens, não tens filho, nada disso.

Me confessou que seguia tendo sexo com homens, mas sempre que fossem fora do circuito.

Vives escondido.  Fiz uma maldade com ele, transformei o personagem num inspetor que sai do armário.    Quando leu o primeiro capítulo da série, me telefonou as gargalhadas, filho da puta, queres me obrigar a sair do armário.   Lhe disse que não, se o personagem tinha a ver comigo, tinha que ser assim.

Por incrível que pareça, os produtores gostaram, porque não era uma coisa escandalosa, apenas um homem que tem relações, durante sua investigação.

Foi quando aconteceu o terremoto da Bella.  Estava um dia em casa, quando recebi um vídeo, bem como uma chamada dela com urgência.

Tinha chegado na casa do namorado, o tinha encontrado na cama com outro, se escondeu, filmou um vídeo, mas ela era uma mulher dura, desceu, foi ao seu carro, colocou umas luvas, uma máscara, um gorro, pegou um revolver, mas antes descarregou o mesmo.  Uma porra que era da época que patrulhava nas ruas.   Entrou no apartamento outra vez, eu namorado estava de quatro algemado na cabeceira da cama, os prendeu um ao outro, não deixou o outro tirar o pau do cu dele. Mas colocou, de uma certa maneira a porra no outro, que não podia mover-se que a mesma entrava mais, pegou o celular dos dois, colocou para gravar, mandou para todos os da lista do celular. Amigos, clientes do escritório, para todo mundo.

Mas os deixou ali algemados, presos um no outro. Retirou sua porra, pois podia ser uma prova contra ela, limpou todas as impressões da sua entrada antes, foi embora tranquilamente, me encontrei com ela no bar da esquina, me mostrou o vídeo.

Por isso essa filho da puta, sempre mudava a época do casamento. Mas foi uma bela vingança.

Mesmo assim não contei nada para ela.

Vi o vídeo, dos dois, me matava de rir, pareciam dois cachorros fazendo sexo, se poder se separar, ela tinha feito de tal maneira que se via a cara dos dois o tempo todo.

Tinha deixado a porta aberta, uma vizinha que era dona do apartamento, além de fofoqueira do mesmo, também tirou fotos, além de pedir ao namorado que saísse do apartamento.

Eu fiquei imaginando o caso, ela fez uma coisa que achei demais, ficou furiosa, o encarou no dia seguinte, pois tinha mandado o vídeo para si mesma.

O sujeito estava arrasado, tinha perdido o emprego, os dois trabalhavam no mesmo escritório, o outro era filho do dono, todos os clientes, colegas, tinham recebido o vídeo.

Resolveram sair da cidade.   Pediu desculpas a ela, chorando, mas ela era perfeita para ele se esconder, ela gravou tudo isso, depois me mostrou.

Bela como podes ser tão má?

Se ele tivesse me falado que era gay, sem problemas, mas me usar, nem pensar.

Na verdade eu sempre tinha pensado que ela era lesbiana, pois tinha um tipo meio masculinizado, por isso a tinha colocado comigo, por detrás todo mundo dizia que pelo menos os dois gays do departamento estavam juntos.

Ela nunca tinha desconfiado, contei isso para ela.  Ficou furiosa, queria pedir transferência de delegacia.  Reclamei dizendo como podia pensar em me deixar, ela era minha amiga.

Me respondeu, eu sou tua amiga, mas tu não, nunca me contas nada.

Isso é verdade Bella, mas minha vida é trabalhar, escrever, aqueles romances de uma noite, nada mais.  Não tenho parte romântica na minha vida.

Mostrei o roteiro da série, ela disse que só ficava, se eu inventasse um personagem baseado nela.   Refiz todo o roteiro.

Os produtores gostaram, assim eu lhe dava também uma parte do dinheiro, ela comprou um apartamento pequeno perto do meu, pode sair do Harlem, aonde ainda vivia com sua família.

Por essa época chegou à delegacia, um sujeito, com a cara como a minha, tinha cara de mau, vinha da DEA, de narcóticos, tinha estado infiltrado anos.

Os dois juntos, podia se dizer que era meu parente.  Desde o primeiro dia vi que me olhava, um dia me agarrou, me colocou ao seu lado diante de um espelho.  Realmente nos parecíamos.

Ficamos amigos, lhe falaram que suspeitavam que eu era gay, mas ele mandou quem tinha falado, cuidar de sua vida que ganhava mais.

Saímos tomávamos cerveja os três, ele estava sempre conversando com a Bella, um dia veio com uma notícia bomba, tinha sido convidada, para trabalhar como ajudante de um fiscal, ela tinha o curso de direito, seria a inspetora da mesma, iria ganhar quase o dobro.

Quando vi, tinha como companheiro o Raul, era como eu, falava pouco quando estava trabalhando, gostava de dirigir o carro como um louco, eu me matava de rir, parecia um gangster dirigindo.

Todo mundo falava dos dois, mas importava uma merda.   Ninguém sabia nada dele, eu ao contrário sim, tinha estado infiltrado muito tempo, tinha tido muitos problemas depois, pois quase fica enganchado nas drogas.  Mas conseguiu resolver o caso.

Depois tinha passado mais de dois anos em tratamento, tenho pesadelos, com coisas que vi, que fiz, que não me orgulheço.

Para mim, tinha encontrado um companheiro igual a mim.

Os bandidos tinham medo dos dois, pois parecíamos mais bandidos do que eles, pela nossa cara feia.   Ele era descendente de mexicanos.

Um dia me levou a casa de seus pais, no Bronx, era uma família imensa, mas como eu, ele era o mais feio de todos.

A casa de meus pais, estava alugada, pois não a vendemos.

Do Boris eu não sabia nunca nada, ele sempre telefonava ao Brian, para quem contava tudo, seguia com o japonês, Brian ria, dizendo em nossa família alguma coisa saiu errada, todos homens mas a não ser o Jimmy, que não sabemos, somos todos gays.

Brian seguia mantendo o seu personagem próprio de macho alfa, as mulheres mesmo sabendo que seu personagem na série era gay, isso não parecia lhes importar.

Uma vez por semana, nos reuníamos com a Bella, para tomar uma cerveja.  Ela agora se vestia melhor, tinha mudado tudo, cortado os cabelos mais modernos, a roupa também era outro tipo, uma vez brinquei que devia estar muito enamorada.  Me respondeu, aprendi contigo uma coisa, amar a mim mesma.

Um dia me perguntou se já tinha ido para a cama com o Raul.  

Nem tinha me passado isso pela cabeça.

Estas perdendo o tempo, pois ele te olha de uma maneira especial.

Um domingo, ele apareceu lá em casa, nos tinham dado um caso importante, um assassinato de um rico banqueiro.   Passamos horas revisando o caso, não fomos os primeiros a ver o mesmo, estava parado.

Ele examinou minha casa, inteira, me soltou na cara de gozação, imaginei um apartamento, daqueles cheio de coisas, mas por aonde olho, só vejo livro, passou a mão pela minha mesa de trabalho, uma mesa bruta, que tinha encontrado uma vez num desses lugares que vendem coisas de segunda mão.

Me olhou nos olhos, já fizeste sexo em cima dela.

Eu só respondi “como”, sem entender a pergunta.

Me pegou de surpresa, me empurrou para cima da mesma, fizemos sexo com urgência.

Ficou olhando para minha cara.

Desculpa, mas não podia aguentar mais, quando vi essa mesa, fiquei imaginando fazer sexo contigo aqui.  Foi bom demais.

Eu estava sem respiração, fazer sexo com ele, era como estar numa montanha russa.

Ele seguiu indo a sua casa para trocar de roupa, mas dormíamos juntos, eu morto de medo, pois adorava trabalhar com ele.   Quando escrevia, ele agora se sentava numa poltrona, lhe passava o capitulo, as vezes fazia alguma sugestão.

Sempre imaginei uma vida assim, me dizia, dois homens como nós vivendo suas vidas.

Tempos depois, após um inverno de merda, acabávamos de resolver o crime do banqueiro, demoramos que descobrir que o relatório inicial estava malfeito, o detetive tinha escondido detalhes, pois era amigo da mulher do banqueiro, mas mesmo assim resolvemos o problema.

Fazia calor, como se de repente o inverno tivesse acabado, em seguida tivesse começado o verão, sem passar pela primavera.

Olhávamos, o rio Hudson, lhe mostrei do outro lado aonde tinha sido criado.  Me disse que sempre tinha gostado disso.

Faziam quase um ano que estávamos juntos, olhei para ele, lhe perguntei o que pensava de nós.

Segurou minha mão, ficou me olhando, eu não sei você, mas estou apaixonado, quero viver sempre contigo, quando te vi no primeiro dia na delegacia, mesmo no dia que te coloquei ao meu lado, era mais para dizer, nos completamos.

Tive um problema com os inquilinos, ele foi comigo até lá, a casa estava um desastre. Ele amou a mesma, mas eu lhe disse, para viver aqui, trabalhar do outro lado é complicado.

Depois tenho que vender, tem a parte dos meus irmãos.  Só então ele ficou sabendo que o Brian que sempre falava era um ator de cinema que ele gostava, falei do Boris, que vivia em Paris, do Billy que ninguém sabia aonde estava.   A última vez que tinha sabido dele, estava no Dubai, num campo de petróleo.

Quando Brian veio a NYC, para uma entrevista na televisão, os apresentei, fiquei com ciúmes, pois o meu irmão passou metade da noite falando com ele.   Ao leva-lo ao hotel, pensei agora vai convidar o Raul para subir.

Virou-se para ele, o segurou pelos ombros, gostei da tua escolha irmão, mas tu Raul, nem te atreva a fazer alguma maldade com meu irmão, venho aqui te encho de porrada.  Me beijou dizendo, finalmente encontraste tua meia laranja, estou com inveja.

Fomos embora rindo, gostei de ver tua cara com ciúmes do teu irmão, me soltou na cara, era uma verdade. 

Mas estávamos conversando, na verdade ele estava fazendo um inquérito para saber se sirvo para ti.

Brian tinha comprado uma casa em Malibu, pois finalmente agora só tinha uma ex-mulher solteira, as outras tinham se casado, lhe sobrava dinheiro.

Tiramos férias juntos, fomos passar uns dias lá.  Adoramos, descobrimos que ele tinha uma aventura com um surfista de uns 40 anos, os dois juntos eram um monumento.

Era como me lembrava dele, quando jovem com seus namorados.  Quando comentei isso, ele riu muito, chamou o James, ele não te reconheceu.

Era realmente um dos seus namorados de jovem.  Todos os dois tinha se casado, se divorciado, se reencontrado.   Raul de sacanagem dizia que parecia um conto de fadas.

De noite na cama, disse, poderia dizer que imagino os dois na cama.  Mas nunca será nada parecido com o que temos.

Eu tinha um bom dinheiro, guardado das últimas temporadas da série.  Rindo lhe disse, que adoraria viver lá.

Vamos um dia os quatro comer num restaurante de uma amigo de Brian, em Venice Beach, foi um amor à primeira vista, adorei o lugar.  Era verão, estávamos sentados no restaurante, na calçada, quando vimos um ladrão escapado da polícia, o Raul, somente estendeu a perna o sujeito caiu, ele rapidamente colocou o pé em cima da mão do mesmo, com a arma.

Nos identificamos, para o policial.   Esse filho da puta, sempre me faz correr, menos mal que falta pouco para me aposentar.  Levou o mesmo a delegacia dali, voltou para conversar conosco.

Depois nos levou para conhecer a delegacia, todo mundo queria autografo do Brian, ele soltava que quem escrevia a história era eu.

O capitão, nos ofereceu trabalho, Raul disse que gostaria de tentar, eu soltei que queria parar de trabalhar, ajudaria mas queria estar fora escrevendo, estava fazendo um livro novo.

Conversei com Brian sobre a casa, temos que vender a mesma, está uma merda fechada.

Tu como o mais velho devia tomar rédeas no assunto.  Raul, conhecia gente em muitos lugares, começou a procurar pelo Billy, o último que sabíamos era do Dubai.

Acabamos descobrindo que estava na Indonésia preso por drogas.  Movemos mundo e fundo, mas já era tarde, ele estava no último estágio da Aids, contraída através de seringas contaminadas.   Fomos até lá, para tentar liberta-lo para morrer fora da prisão, mas essas coisas lá eram difíceis, com muito custo subornando muita gente conseguimos, o levamos para um hospital, que parecia o mais limpo, nos revezamos Brian, James, Raul e eu, para cuidar dele, Boris não se moveu, disse que estava fazendo um trabalho imenso, antes de morrer assinou os papeis da sua parte.

Quando voltamos, com suas cinzas, a enterramos junto com nossos pais, com a Lotte, me lembrava dela, o chamando de bala perdida.  Na verdade era um belo desconhecido para nós, nunca soubemos nada de sua vida.   Nos dias no hospital, disse que tinha vivido como queria, que tinha experimentado todas as drogas possíveis, acabarei morrendo por causa de um seringa contaminada.

Mandamos a parte do Boris, na verdade nunca mais o vimos, dez anos depois fomos avisados pelo seu namorado, que sequer sabíamos o nome, os dois sempre falavam tudo em japonês, nem sabíamos que Boris tinha vivido um tempo por lá.   Já o tinha cremado, o ia levar para o Japão, para um lugar aonde os dois tinham se conhecido.

Ainda disse ao Brian, realmente nossa mãe nos mandou voar. 

Ele me disse, tu foste o único que ficou para trás.

James um dia me contou que se lembrava de mim olhando pela fresta da porta os dois fazendo sexo.  O amava desde essa época.

Agora vivemos em Venice Beach, consegui com a venda do apartamento de NYC, bem com minha parte da casa, algo de dinheiro do Raul, comprar uma casa no canal. Vivemos bem os dois, ele trabalha como investigador, as vezes me conta o caso, porque diz que tenho sempre uma maneira de pensar aguda.  Vejo coisas que ele não vê.

A tempos atrás levou um tiro, quando soube, fiquei muito nervoso, porque de pensar em perde-lo, ia ser difícil.

Meu irmão ria, dizendo os dois são mais feios que a mãe da miséria, mas quando estão juntos, vocês se olham, ficam bonitos.   Nunca alguém diria que são gays.

Um dia recebemos o convite do casamente da Bella, se casava com uma fiscal de NYC, rimos muito, fomos os dois, lhe disse ao ouvido, nunca me enganaste.

Fomos visitar a família do Raul, que sempre fazia uma festa imensa quando nos via.

Sua mãe que dizia que estava velha, nos perguntou na mesa na frente de toda a família, quando vocês dois vão se casar, quero morrer tranquila, que meu Raul, esteja com alguém que o cuide.

Seus irmão nunca tinha desconfiado que vivíamos juntos a tantos anos.

Eram metidos a machões.

Ele ria muito essa noite, estamos fudidos me soltou, terás que se casar comigo na marra, pois ela não vai desistir.

Um dia apareceu com duas alianças, que tinha visto, muito masculinas, me pediu em casamento, estávamos só os dois em casa.   Eu ri muito, viva tua mãe, estou esperando a muito tempo esse pedido, embora para mim não seja importante.

Teria que ser em NYC, lá fomos os quatro, imaginem a festa que faziam com o Brian, um ator famoso na festa deles.

Foi uma festa familiar, como dizia sua mãe, muito simples, mas quando nos tocamos, tinham pelo menos umas cem pessoas na festa, num salão que ela tinha arrumado, tudo com comida mexicana, com direito a mariachis, família imensa, Brian se divertiu horrores, aquele homem imenso, loiro, ninguém acreditava que era meu irmão, muitos pensavam que eu era mexicano, principalmente agora que por causa do sol da praia, estava muito queimado.

Um dos sobrinhos do Raul, destoava dos outros.  Era filho do primeiro casamento de um de seus irmãos, até a pouco tempo tinha vivido com sua mãe.  Era moreno com olhos verdes.

Estava embaixo das asas da mãe do Raul.

No final da festa quando os dois estávamos sentados com ela, o chamou Antonio, venha aqui meu filho.  Na frente dos dois lhe perguntou se gostaria de ser nosso filho.  Levamos um susto danado.   Ela como sempre foi clara, não tenho muito tempo de vida. Esse menino precisa de dois homens como pais, ele é gay, teu irmão o aceitou porque a mãe do Antonio morreu, ele sempre viveu com ela, não encaixa aqui.

Olhei para o garoto, que nos olhava com adoração.  Eu disse que com uma condição, iria conversar com o Raul, mas se fosse assim o queria de papel passado, nada de filho emprestado.

Ela me dava mil beijos na cara.  Quando te vi a primeira vez com o Raul, vocês nem estavam juntos, pensei, esse é o homem perfeito para meu filho, eu sempre soube que ele era gay.

Se escondia no meio dessa família de brutos, os dois podem ser feios como dizem os outros, mas são belos por dentro.

Nessa noite levamos horas conversando.  Raul tinha medo, conhecia bem seu irmão, era um sujeito complicado.   Meu argumento era, se dizemos sim, falamos com tua mãe, deixe tudo nas mãos dela.   O pai nem se aproxima dele, os irmãos tampouco.

Ainda ficamos mais dias ali na casa dela, um dia ela disse que estava tudo resolvido, que tinha conversado com o filho, bem com a nora, que dava graças a deus em se livrar do garoto.

Nos deram de papel passado o Antonio.

O levamos conosco, ele tinha nessa época 13 anos, era alto, mas desengonçado, tinha saído a nós dois, pois não era um garoto bonito.

Quando chegamos a Venice Beach, ele adorou, logo tinha amigos na praia, fazia exercícios nas barras com os conhecidos, era muito agarrado aos dois.  Talvez porque não queria perder nenhum minuto da vida do nosso filho, Raul se aposentou.

Agora tinha uma horta no fundo da casa, ia fazer surf com o Antonio, sua mãe, tinha razão ele mudou, era um paizão.   Era tudo que o Antonio precisavam um pai, no caso dois.

Talvez por sermos como erámos, nada afetados, ele também deixou de ser.  Anos depois participou de um filme do Brian, fazia um papel bom, de um rapaz mexicano, que quer escapar das drogas, o roteiro era meu.

Daí não parou mais, mas a única coisa que pedi, foi que fizesse universidade, ele obedeceu, lhe disse que escolhesse o que queria, foi fazer uma de cinema, logo estava trabalhando como um louco num projeto.

Escrevi seu primeiro roteiro, os dois ajudamos em tudo, Raul fazia um pequeno papel, ficava bem no cinema.   Ele ria dizendo, eu agora velho, gostoso, os homens ficaram como loucos atrás de mim, eu de gozação o ameaçava de cortar seu piru.

Estamos até hoje levando a vida.  Antes da mãe dele morrer, fomos várias vezes vê-la, ela dizia que sabia que não tinha errado.

Seu enterro foi impressionante, muita gente, que os filhos nem sabiam que existia, uma das noras disse, que toda essa gente sempre vinha pedir auxílio para ela, orientação, era como uma dessas velhas da vilas do México, que cuidam da comunidade.

Fui com Raul, mas dois irmãos deles, além do Antonio, levar suas cinzas para a vila de aonde tinha saído, ela dizia que não queria que enterrassem suas cinzas em NYC, pois odiava os invernos.   Foi uma coisa muito emotiva, tinha saído jovem de lá, agora voltava.

Acabamos ficando quase dois meses, pois Antonio estava de férias, os dois, começamos a alinhavar uma história dela, para o cinema.

Contamos sua infância, a partir da memória do pessoal da vila, até ela partir para Estados Unidos com o namorado.  Até eu fiz uma participação, fazendo papel de um bandido da fronteira. Brian foi um dos produtores, Antonio ganhou uma série de prêmios, principalmente como diretor jovem.

James sentia ciúmes do relacionamento que Brian tinha com o Antônio, pois ele tinha filhos do seu casamento, mas Brian nunca tinha tido filhos, se identificava com o Antonio, porque o fazia me lembrar quando jovem.

Um dia brigaram, Brian apareceu em casa, chateado, foi ficando.  Embora a casa fosse sua, James levou um tempo para ir embora, soubemos depois com um jovem que podia ser seu filho.

Brian nunca mais foi embora, ficou vivendo em casa, trabalhando com o Antonio, agora era seu protegido, quando lhe perguntavam se tinha alguma coisa entre eles, ficava horrorizado, pode ser meu neto, nem pensar.   Os dois amavam a mesma coisa, o cinema, isso os unia.

Agora estão preparando um filme, Brian tinha uma coisa guardada que nunca soube existia, um diário da Lotte, que falava dela, de nossa mãe, quando me entregou, ele pediu se eu podia escrever um roteiro.

Com o diário entendi muitas coisas, mas escrevi a história.  Ia desde quando se conheceram na cidade pequena que viviam, até se reencontrarem outra vez, em NYC.

Brian caçoava de mim, dizia que eu tinha nascido errado, que tinha alma de mulher para poder entende-las dessa maneira.

Agora estamos esperando a estreia, deu muito trabalho a montagem, pois tinham os dois filmado demais.

Seguimos em frente, sempre.

BRUCE STORM

                                     

Seu verdadeiro nome era Ray Dern, resolveu mudar, quando chegou a Los Angeles, pensando em fazer carreira no cinema.

Tinha saído de Montana, a bem dizer expulsado por sua família, que era super religiosa, com 15 anos tinha levado surras homéricas de seu pai, pois queria ser diferente.  Quando lhe perguntavam ele não sabia explicar, apenas sabia que não encaixava ali.

Desde criança, tinha uma imaginação fértil, em sua casa estava proibida a televisão, livros, nada de ir ao cinema.

Quando descobriu a biblioteca da pequena cidade, dizia que tinha sido uma farra de fazer gosto, as pessoas não entendiam, ele com um simples livro, soltava sua imaginação, se o escritor descrevia uma cidade, ele já se sentia andando por ela, gravava em sua cabeça a imagem que tinha.  Na cidade o único cinema tinha fechado as portas a muito tempo, os livros na biblioteca eram censurados, mas a senhora que tomava conta da mesma, quando descobriu seu gosto pelos livros, ele com sua voz rouca, lhe explicou como se sentia, começou a lhe emprestar livros que ela tinha escondido depois da purga que fizeram lá.

Ele os colocava dentro de um saco plástico, os enterrava ao pé de uma árvore, no meio do bosque nos fundos do rancho que seu pai tinha.

Mas claro nem tudo é perfeito, seu irmão mais velho, o detestava, nunca tinha entendido por quê. Contou para o velho, esse lhe deu uma surra, que não pode se sentar em dias.

Mas nem por isso se revoltou contra o mesmo.  A bibliotecária quando soube, ficou horrorizada, pensou tenho que fazer por esse garoto, o que não fiz por mim.

Tinha suas economias, mas ficou chocada, quando ele disse que a única forma de escapar dali era entrar para o exército.

Ela justamente tinha ficado para trás por causa disso, seu único irmão entrou para o exército, nunca mais voltou, morreu em combate.  A ela tocou cuidar de seus pais, já muito velhos.

Tinha uma caixa desses de biscoitos que alguém lhe tinha dado de presente, ali guardava tudo que sobrava de seu salário, não pagava aluguel, a casa era própria, suas roupas duravam muito, a chamava de agarrada por isso.   Mas na verdade pensava, para que comprar roupa nova, se a que tenho basta, só ia as missa ao domingo, depois voltava para casa.

Falou com o Ray, invés de levar os livros venha ler aqui, assim me contas como imagina.

Os dois tinham uma simbiose perfeita, ele lia os livros, depois se sentavam na mesa da cozinha, assim ninguém os via, ele falava do primeiro capitulo, como imaginava a cena, ela delirava.

Ele entrava por detrás da casa, assim ninguém via, ou pensavam que passavam desapercebidos.

O que não era verdade, numa cidades dessas perdidas no meio do nada, todo mundo sabe de tudo, até a cor do peido que soltas.

Logo chegou aos ouvidos do pai dele.  Tinha acabado de fazer 17 anos, sem futuro, que não fosse trabalhar no campo. Por isso apesar de não ser muito alto, tinha um corpo fantástico.

Era moreno, cabelos crespos, olhos escuros, uma boca sensual, ombros largos, cintura estreitas, pernas muito firmes.

Quando seu pai, o ameaçou de novo, segurou o cinturão, quem deu a surra foi ele, se vingando de tudo que já tinha apanhado.

Nesse dia ela lhe deu as chaves do velho carro de seu pai, dias antes ela tinha levado a oficina mecânica, mandou arrumar o mesmo.

Lhe deu a caixa de biscoitos, isso dará para arrumares um emprego, vá para o mais longe que esse carro aguente.   Ela tinha feito uma montagem, na carteira de motorista do irmão, colou uma foto dele, assim não teria problema.  Passou a se chamar Bruce.

Saiu da cidade de noite, antes que seu irmão ou seu pai pudessem fazer qualquer coisa, sua mãe era uma mulher apática, parecia viver num mundo à parte, só a escutava falar alguma coisa, quando rezava, fora isso, nenhum carinho, ou mesmo um gesto.

A velha bibliotecária, sabia que depois toda culpa recairia sobre ela, mas não se importou, estava velha, ele a tinha feito reviver seus sonhos de juventude, de escapar dali, nada mais justo pensava, que ele pelo menos possa escapar.

Ao sair da pequena cidade, ao entrar numa estrada interestadual, sentiu uma euforia, ainda pensou, deve ser assim que se sentem os pássaros, quando voam pela primeira vez.

Foi economizando o dinheiro todo o que pode, precisava de ter o máximo para quando chegasse a uma cidade que resolvesse, aqui quero viver.

Quando chegou finalmente a Los Angeles, o primeiro era encontrar um lugar para viver, tinha que ser muito simples.  Seus sonhos de Hollywood ainda lhe pareciam distantes.

Os primeiros dias ficou num hotel desse que se alugam uma parte dos quartos por horas, para as putas, andando por uma avenida, descobriu uma livraria, sua sede de ler era imensa, mas viu um cartaz de que procuravam pessoas para trabalharem.

Se apresentou no caixa, a mulher o olhou de cima a baixo, perguntou o que estava fazendo na cidade, pela maneira que falava sabia que não era dali.  Sentiu confiança nela, contou mais ou menos sua história.  Ela disse que pagava por semana, pois aqui nunca para ninguém, todos vem atrás dos sonhos de Hollywood, mal conseguem uma ponta num filme, se acham atores para o resto da vida.

Lhe disse, que a volta da esquina, alugavam um pequeno apartamento, disse isso rindo, porque como ele viu depois era mínimo, mas que era melhor que o hotel não tinha dúvida.  Ela explicou que podia descontar no seu salário.

Fez um trato com ela, trabalharia o dia inteiro, mas podia pintar o apartamento de branco, pois estava precisando.  Levou dois dias fazendo uma faxina total no mesmo.

Ela ria muito, de como ele tratava os livros, as vezes o pegava, alisando a capa do mesmo com respeito.  Lia de tudo que lhe despertasse curiosidade.

Ela abria inclusive no domingo, pois por ali andavam muitos turistas.  Ele a sua maneira, se lembrou de conversas com a bibliotecária, separava os livros por autores, por temas, arrumou uma mesa, só com mapas da cidade, outra com livros de fotografia de estrelas de cinema, mas sempre abria um em especial, falava para os clientes, esse fotografo, é o melhor, olhem como consegue captar a figura do artista, realmente tinha um que, que o transformava num dos melhores ao seu ver.

Uma vez uma cliente perguntou se ainda era vivo?

Não sei, mas vou descobrir.

Realmente o homem era vivo, vivia retirado em Malibu, mas vivo.

Um domingo pediu licença a senhora para ter a parte da tarde livre, se atreveu, agora sua sede de conhecer as coisas era maior.

Tinha descoberto aonde ele morava, foi até lá.  Bateu na porta, atendeu um homem de uns 60 anos, muito queimado do sol.  Ele perguntou pelo senhor Barry Lyveston?

Sou eu mesmo, algum problema?

Explicou, admiro seu trabalho, outro dia vendendo seu livro uma cliente perguntou se ainda era vivo, pois nunca mais tinha ouvido falar no senhor.

Pode me chamar de Barry.   Vendeste o livro?

Sim, claro, pedi inclusive mais para a editora.   Adoro poder dizer que é um dos melhores que vejo na livraria.

O levou para uma varanda que dava para o mar.

Começou a perguntar pela vida dele, era ao contrário, ele tinha ido para fazer perguntas, mas era o homem que lhe fazia.

Contou o que lhe tinha acontecido, sentia absoluta confiança nele.

Tinha um livro em cima da mesa, eu quando vejo essa foto por exemplo, me parece que o senhor está contando uma história, não é uma simples fotografia.  A artista faz a pose, o senhor faz a foto.

Senhor não, Barry.    Sim é mais ou menos isso, como vim do cinema, para mim sempre foi importante esse detalhe, contar uma história.

Odeio as poses, principalmente as falsas.   Lhe explicou o que queria dizer.

Barry, ainda fazes cinema?

Quando me chamam sim, mas hoje em dia com a moda de filmes de ação, cada vez menos.

Mostrou uma série de fotos que estava fazendo nesse momento.  Quero conseguir captar a sensualidade, sem ser vulgar.  Mas a maioria das pessoas não entendem.

Mostrou a foto de um rapaz em cima de uma cama, nu.   Veja ele está fazendo uma pose, perdi horas lhe explicando o que queria, mas ele não entendeu.

Estou montando um livro sobre isso, a sensualidade, sem ser nada vulgar.  Senão contrataria um ator pornográfico, mas esse não é meu negócio.

Já entendi o Barry quer naturalidade, que a pessoa esteja em cima dessa cama, relaxada, talvez pensando em algo, verdade.

Contou para ele, que quando começou a ler, que como nunca tinha ido ao cinema, tampouco tinha visto nunca uma televisão, gostava que o autor descrevesse o lugar.

Por exemplo se essa foto fosse perfeita, o relato seria que depois de uma relação sexual, a pessoa estivesse contente, relaxada, pois tinha realizado algo.

Barry ficou olhando para ele. Estas no caminho certo.

Minha ideia era ter uma pessoa, para posar para uma série de fotos, para transformar num livro. Passou para ele, uma série de anotações, ele se esqueceu que o Barry estava ali, começou a ler o texto, eram todos de uma sensualidade impressionante, lhe excitavam.

Não notou que Barry estava com uma câmera na mão o filmando, quando finalmente levantou a cabeça, com a sua boca sensual meio aberta, sem querer riu.

Barry mostrou para ele, o que tinha feito, era como se tivesse captado tudo que ele estava lendo.  Num determinado momento, ele passando a língua pelos lábios lentamente, nada de pressa, o texto falava de passar a língua, lentamente pelo corpo da outra pessoa, isso o tinha excitado.

Você deve ser muito experimentado na cama, soltou.

Ele teve um ataque de riso, se engana Barry, sou virgem ainda, nunca fiz sexo com ninguém.

Barry riu, não posso acreditar, hoje os jovens aos vinte anos, parecem velhos sexualmente, já exploraram de tudo, todas as drogas, são como desencantados.

Mostrou uma foto, pelo vista feita num lugar de ocupa, um rapaz bonito, mas se via que estava drogado.  Disse que eram fotos de um projeto, que estava em edição.  A ideia saiu de um filme, o ator não conseguia interpretar o personagem, que acaba nas drogas, o filho da puta, sabia se drogar, mas como ficava não.  O diretor não queria que ele tivesse dopado no momento, então o levei a este lugar.   Mesmo assim não conseguiu.

Eu quando li os livros proibidos na minha cidade, contou da sua amiga, li os de Jack Kerouac, fiquei imaginando essa viagem que fez, primeiro pensei que era imaginaria como as minhas, mas quando falava do encontro com os amigos da mesma geração, fui sentindo uma inveja incrível, entendia que era como se estivessem perdidos numa época que não era a sua, por isso usavam drogas.    Depois fui lendo tudo que havia sobre essa famosa geração, estava tudo escondido no sótão da casa dessa senhora, Allen Ginsberg, Willian Burroughs, Charles Bukowski, alguns tinha que ler mais vezes, pois claro no meu conceito de rapaz provinciano não entendia aonde queriam chegar, mas ao mesmo tempo, faziam com que minha imaginação estivesse solta na vida que levavam.

Foi uma experiencia impressionante, foram os únicos livros que trouxe comigo, me acompanharam no velho carro, até aqui.  Algumas vezes parei em lugares que tinham passado, evidentemente não tinha nada a ver com o que tinham escrito.   Então imaginava, como seria o mesmo seu eu estivesse sobre o efeito de alguma droga.  Acho que a mente tem esse fator de nos possibilitar, imaginar.  

Para eles devia ser difícil se soltar num mundo que não admitia a liberdade sexual, nada disso. Eu imaginava como seria.

A cara do Barry era impressionante, me fala tudo isso um rapaz que diz que nunca fez sexo, na cidade do pecado.

Sim, vejo pelas ruas, as putas, os rapazes que se prostituem, não me imagino no lugar deles, é uma vida difícil, aonde se mistura, fome, desespero, drogas, tudo, espero poder seguir trabalhando no que seja, para não passar por isso.

Barry soltou que a muito tempo não tinha uma conversa interessante, lhe perguntou o que mais o tinha excitado, as fotos, ou o texto.

Sem dúvida o texto, se foste tu que os escreveste, deves ter uma sensibilidade a flor da pele.

Estava morto de fome, disse que ia embora, porque tinha que comer alguma coisa.

Merda, me perdoe, a conversa estava interessante, que me esqueci desse detalhe.

Comes alguma coisa comigo?

Foram os dois para a cozinha, Barry preparou sanduiches de pastrami, de outras coisas que ele nunca tinha comido, lhe ofereceu uma cerveja.  Ele perguntou se não tinha uma coca cola, pois não bebia.  Tenho horror a isso, gosto de estar sóbrio para saber o que estou fazendo.

Sentaram-se numa mesa na varada, a luz batia diretamente nas mãos do Barry.  Eram tremendas, grandes como ele, mostravam claro sua idade, mas o que ele via, eram que tinham experiencias.

Falou disso, há uma diferença grande, quando olhamos uma pessoa, falou da sua amiga, ela poderia ser considerada como uma velha, claro tinha idade, mas na verdade, tinha ficado jovem na mente, nossas conversas podiam durar horas, ela dizia que eu a tinha feito recuperar sua juventude guardada em alguma caixa de sua mente, de seus sonhos.  Os quais eram velhos demais para realizar.

Depois disso foi embora, disse que tinha que levantar cedo para ir trabalhar. Olhou diretamente os olhos do Barry, perguntou se podia voltar.

Claro, quando queira, lhe deu o número do seu celular.

Ele agora fazia uma coisa, cada livro novo que sabia que ia interessar a sua amiga, Mrs. White, mandava para ela, na direção da biblioteca, embrulhava claro no papel da livraria, dentro do livro colocava uma carta.  Queria saber como estava, contava o que tinha feito naquele tempo, o que ia conhecendo, a cidade, os novos autores que tinha descoberto.  Mesmo autores estrangeiros, quando mandou um livro de Camus, comentou com ela o que tinha sentido, o mesmo com Simone de Beauvoir, que gostava mais que Jean-Paul Sartre.  Ia agora sempre que podia escapar a casa do Barry.

Ficou duas vezes para dormir.  Um dia, sabia que tinha que partir dele isso, fez um pedido, eu fico imaginando como será fazer sexo contigo, não quero perder minha virgindade com nenhum idiota, fico imaginando essas tuas mãos sábias explorando meu corpo, pode me fazer esse favor.

A cara do Barry era fantástica, lhe explicou que ele tinha tido relações com homens, com mulheres principalmente, mas que ansiava isso, estar na cama com ele, pois já ansiava cada visita dele.  Pela primeira vez tenho com quem falar, expor minhas ideias, que me entende, não faz cara pensando, velho idiota.

Foi uma coisa maravilhosa para ele, tinha sido muito, mas muito mais do que tinha imaginado, Barry tomou seu tempo para lhe deixar como louco, lhe penetrou suavemente, como depois se deixou penetrar, no final chegaram a um orgasmo ao mesmo tempo.

Ele ficou ali jogado na cama, se lembrando de cada detalhe que sua mente tinha guardado.

Barry tinha levantado para ir ao banheiro, quando voltou, ele estava como ele tinha imaginado a foto, que não tinha conseguido fazer com o outro rapaz.  Se dedicou a faze-la, por último subiu em cima da cama, para fotografar seu rosto desde cima, pediu que ele continuasse com o que estava fazendo, ele seguiu.

Depois foram revelar a foto, viu todo o processo, já tinham surgidos as câmeras digitais, mas Barry gostava de trabalhar a moda antiga, com as analógicas.  Foi um gozo, se ver surgindo foi ficando excitado, voltaram outra vez para a cama.

Depois os dois ali deitados um nos braço do outro, era isso que ele imaginava, os segredos de alcova.   Barry perguntou se ele queria posar para ele, para toda a ideia do livro, te dou o texto, assim poderás imaginar o que eu quero.

Agora já podia ver as fotos já secas.

Barry comentou, que hoje em dia, as pessoas, faziam sexo, em seguida desapareciam, era a famosa foda de uma noite, já que não tinham nada para compartir, para falar.

Mas ele estava ali.

Na noite seguinte, leu os textos curtos de cada ideia do Barry, pela primeira vez, tinha ideia do que era o sexo entre dois homens, fechou os olhos, nu, jogado na cama, começou a imaginar cada texto dele, era como se seu corpo entendesse a mensagem.

No dia seguinte, comentou com a dona da livraria, o que tinha feito, ir conhecer o Barry, tenho ido a sua casa sempre que posso.   É uma pessoa que entende a minha cabeça, bem como eu entendo a dele.      Me perguntou se eu poderia posar para ele, eu adoraria, o que achas disso?

Ela sorriu, não eres um jovem corrente, que veio para Hollywood, para fazer filmes idiotas, como os que se fazem agora, ou filmes de ação, a tua cabeça exige que tenha consistência no que fazes, acabaras fazendo filmes no underground.

Como por instigação, voltou a ler Jack Kerouac, mas agora com outra perspectiva, acabou relendo todos.  Quando falou com Barry a respeito do cinema underground, ele começou a mostrar sua coleção a respeito.

As fotos tinham ficado excelente, ele as estava montando com o texto dessa parte, agora sempre dormia com ele quando ia a sua casa, as sessões de sexo eram incríveis.

Lhe disse que concordava em posar para as fotos, desde que pudesse ler o texto antes, discutir o mesmo.  

Claro, nada ia me agradar mais.

Foram fazer umas fotos no campo de um amigo dele.  Montou um fundo infinito com um pano sujo, perguntou se tinha medo a cavalos.

Imagina vim do campo, como vou ter medo a cavalo.

Lhe trouxeram um, o dono, amigo do Barry, disse que era o perfeito para o que queria, pois estava surdo.  Tinha participado de alguma filmagem, não sabia o que tinha acontecido o mesmo estava surdo.

Bruce pediu uma escova, passou pelo cavalo, lhe deu cenouras, quando leu o que Barry queria, se imaginou um guerreio de alguma tribo de antigamente.  Possou nu em cima da cavalo, o que seria talvez as melhores fotos, que acabariam merecendo um livro a parte.  A mais famosa era ele deitado em cima do cavalo de costas, a fizeram em uma série de lugares, ao mesmo tempo fizeram sexo no campo com o cavalo olhando para os dois.

Quando viu as fotos, arrastou literalmente Barry para a cama, o cavalgou, como imaginava que faria um índio, usando-o como se fosse um cavalo, fez dele um brinquedo em suas mãos.

Barry disse que já podia morrer, pois nunca tinha tido um prazer como esse.

Semanas depois lhe avisou que estava fazendo um filme, que havia uma parte muda, mas que o ator não entendia o conceito.   Lhe explicou, o levou para falar com uma conhecida sua, Sarah Jameson que tinha possado para ele, era famosa como stripper, não como as atuais, tinha feito muitas fotografias em revistas.

Era uma mulher fantástica, de quase 1,90 metros, morena, com uma pele azeitonada, bem como uns cabelos, agora com fios brancos.

Ela lhe explicou como funcionava em sua cabeça.  Quando me contratavam para fazer um stripper para algum homem, primeiro conversava com ele, para entender o que queria, 80% das vezes nem fazia sexo com o mesmo, eram voyeurs, queriam observar.  Então entendia que tinha que alimentar com cada gesto seus desejos, tudo muito lentamente.

Ali sentada em sua sala, estava completamente vestida, se colocou numa diagonal, foi falando lentamente um texto que conhecia do Barry, retirando cada parte de sua roupa. Bruce estava como louco, excitado, porque a ideia era essa excitar, sem tocar.

No filme, se tratava de uma mulher jovem, casada com um homem muito mais velho, que não sabia realizar seus desejos.  A história se passava numa fazenda de gado, um cowboy lhe chama a atenção.

A primeira cena, ela está escondida, ele vai tomar banho num rio.  Isto a excita, pois ele se sabe observado, pensa que é outro cowboy, então está pensando em outro homem.

Numa outra sequência, ele está se preparando para tomar um banho, ela o observa através de um fresta na parede de madeira.   Nessa ele imagina que o faz para seu amigo.

Bruce ensaiou a mesma mil vezes, fazendo isso para o Barry, que o filmou através de uma cortina.  Quando ele conseguiu fazer completamente, filmaram no studio.

O diretor lhe pagou um bom dinheiro para isso, apareceria nos créditos, o mesmo disse que ele deveria estudar dicção, pois tinha uma voz complicada, ele sabia que sim, se devia um soco que seu irmão lhe tinha dado quando criança no pescoço.  Era uma voz rouca, quebrada como diziam alguns.

Barry dizia que era perfeita, que o alucinava na cama, escutar ele falando alguma coisa que tinha escrito, no seu ouvido.

O filme quando estreou, ele não gostou, tinham cortado certas partes, Barry, tinha essa parte completa de, quando tinham feito em sua casa.

Logo era procurado por produtores, diretores de filmes pornográficos, ficou furioso, não entendia, nem queria fazer isso.  Conversou com Barry sua ideia era outra.  Gostava da ideia intima de sexo com ele, não pensava em fazer sexo com mais ninguém, tenho a ti, para que preciso mostrar-me fazendo sexo com outro homem ou mulher.

Barry tinha feito a montagem do livro de fotos, com os textos, dele como o cavalo, era tudo em branco e negro, eram perfeitas.  No livro pela primeira vez, Barry colocava seu nome, como se fosse uma dupla.   A primeira crítica que saiu num jornal, o considerou um livro erótico, perfeito, a conjunção de dois machos, o homem, bem como o cavalo.

Já nessa época vivia praticamente na casa dele, se levantava muito cedo, para ir trabalhar, pois levava mais tempo para chegar.  Quando o livro chegou à livraria, algumas pessoas percebiam que era ele o da foto.   Demorou a entender o preço de uma certa fama, pois a maioria o convidava para fazer sexo.   As primeiras vezes ficou horrorizado, a dona da livraria soltou que ela mesma se dispunha a isso, mas falou as gargalhadas.

Mas ele seguiu fiel, ao Barry, não sabia que o que sentia era amor, mas só queria estar com ele.

Barry que tinha mais vivência lhe disse que devia experimentar com outra pessoa, para ter certeza.

Foi uma merda, pois a outra pessoa queria simplesmente sexo, mais nada, o erotismo não figurava na imaginação do coitado como ele chamaria o outro.  Se levantou, se vestiu foi embora, não sentia nada.

Fiz o que me propuseste soltou ao Barry, contou como tinha acontecido. Me levantei, me vesti fui embora.   Não sou uma puta, quero o erotismo.

Barry mostrou um texto que tinha escrito, para sua amiga Sara Jameson, ia fazer um vídeo, ela precisava de dinheiro para uma operação.  Ele se ofereceu para fazer o parceiro.

Os dois se encaixaram a perfeição, apesar dela ser muito mais alta do que ele.

Barry montou o cenário, perfeito, a meia luz, com uma iluminação perfeita, nada era de mal gosto, sim de um erotismo total, mesmo o sexo que fizeram a maior parte na estava na montagem final.   Ela ria ao final, quando ficaram os dois deitados lado a lado, segurando a mãos, que era o fecho do vídeo, quando ele acabou de montar, colocar a música, o apresentou para uma série de produtores, pois precisava do dinheiro para ela. 

Todos queriam, mas que incluísse as cenas de sexo puro.  Nenhum deles concordou.

Quando foi apresentado finalmente num cinema de filmes eróticos, foi um sucesso, o vídeo foi reproduzido mil vezes.

Ele agora era Bruce Storm, escreveu para sua amiga, contando do filme, ela disse que sonhava ver, mas que não tinha aonde fazer isso.

Os dois eram chamados para entrevistas, queriam saber como era fazer o vídeo como tinha sido.

Ele com sua voz particular, contou que ela o tinha ensinado a se preparar para o filme que tinha feito, lamentava as cenas cortadas, porque completo era mais bonito.

Comentou que Barry tinha ensaiado com ele em casa, tinha feito principalmente a cena do banheiro.  Este conseguiu autorização, para publicar esse ensaio.

Mas fez uma coisa, refez fotografias que tinha feito ao mesmo tempo, vinham como num pequeno livro, um cd com o vídeo, além das fotos como post cards soltos.   Era um sucesso de venda, agora ganhava dinheiro suficiente para ter uma casa maior, mas o que fez foi comprar o rancho do amigo do Barry, ali o cavalo surdo era o rei.

Fez outra série de fotos como se fosse um cowboy que vai fazendo um stripper.

Não podiam classificar como ator pornô, pois não fazia cenas de sexo, mas sim eróticas.

Foi ficando conhecido, Barry voltou a crista da onda, porque existiam muitas chamadas para fazer filmes, mas tinha encontrado seu lugar no que queria fazer.  Dizia brincando tiveste que aparecer em minha vida, para saber o que queria fazer.

Escreveu um texto sobre a dualidade do sexo, baseado num texto de um dos escritores Beat, fizeram um vídeo imenso, ele tinha visto o trabalho de um ator de origem índio, com seus cabelos lisos imensos, eram ele, Sarah, Toni, o filmaram no seu pequeno rancho, no meio dos cavalos, ela a princípio tinha medo, mas a ensinou a se comportar com eles.

O final fizeram uma repetição, da cena da mulher o vendo tomar banho num lago, ele ao mesmo tempo se oferecia para ela, como para ele.  Não havia sexo, simplesmente insinuavam.

O vídeo ganhou um prêmio.

Barry resolveu fazer seu primeiro longa-metragem como diretor, o queria como protagonista, foi um trabalho lento, misturava sua história, com a famosa viagem de Jack Kerouac, no seu velho carro, se lembrou de um dia na viagem em que tinha escutado uma música no posto de gasolina, em que foi cantando pela primeira vez na vida uma música que não conhecia.

Quando a fez para o Barry, ele achou ótimo, então nessa cena, é como se tivesse estacionado o carro, numa lateral da estrada, ele começa a imaginar a música, que fala de sexo, entre homens, ele canta a música imaginando o prazer que seria fazer sexo com o homem amado.  Algumas partes estava em close, ele imaginando o Barry a primeira vez que fizeram sexo, que primeiro beijou seu corpo inteiro, depois com a ponta da língua ia passando pelos lugares eróticos, no meio da filmagem teve um orgasmo.  Barry só filmava a cara dele, sentido isso.

Depois lhe diria que tinha ficado com ciúmes do homem que ele estava imaginando.

Não podes ter ciúmes, na cama essa noite, contou o que tinha imaginado, fez com o Barry o que ele tinha feito com ele no primeiro dia, o levando a loucura.  Os dois na cama, tinham um sexo impressionante.

Barry tinha um certo ciúmes dele com Toni, pois ele via este olhar Bruce como que querendo alguma coisa.  No filme que tinham feito juntos, via que estava excitado basicamente todo o tempo.    Chegou a dizer ao Barry, morro de inveja de ti, pois ele só pensa estar contigo.

Era uma verdade, já levavam bastante anos juntos, ele não podia imaginar fazendo sexo com outra pessoa.

Agora quando tinham tempo iam para o rancho, agora existiam dois homens lá cuidado dos cavalos, mas quando ele chegava, Storm, seu cavalo surdo, vinha ficar perto dele.

O último filme deles, fez muito sucesso, como sempre era todo em branco e negro, ele contracenava com um ator negro, que Barry tinha descoberto, entre eles rolava uma sensualidade impressionante, as cenas de sexo eram sugeridas, Mark Oliver, disse que tinha aprendido como devia ser o sexo entre duas pessoas.  Passou em vários festivais de cinema.

Ele foi aprendendo com o Barry todas as técnicas de como fazer um filme.

Em seguida escreveu um roteiro, bem como imaginou tudo, a partir de um livro que tinha lido, sobre raças, os atores eram o Mark Oliver com o Tony, era como dois cowboys, que levam um rebanho de cavalos, se descobrem, ele num certo ponto foi mais explicito que o Barry.

Fez uma cena dos dois se explorando, no meio do deserto, jogados em cima de uma manta, explicou aos dois como queria a cena, fez antes vários exercícios com eles, para que descobrisse o ponto fraco do outro.   Gravou a cena, durante duas horas, quando estavam se penetrando, ele apagou a câmera, dos deixou sozinhos fazendo sexo.  Só acendeu a câmera de novo, quando chegavam ao orgasmo, mas filmou somente a cara dos dois, um em cima do outro, com a cara quase encostada.

Barry era como seu assistente.  Ria muito, conseguiste que alguém fizesse o que fazes melhor.

Menos mal que tenho um aluno privilegiado.   A crítica foi super bem, ele só sugeria o que tinha acontecido de verdade, mas não aparecia, o filme acabava justamente nessa cena, com os dois com a boca quase se encostando num beijo, o prazer que sentia.

Mark Oliver, que se dizia heterossexual, na verdade tinha se deixado penetrar pelo Toni.  Ria muito com isso.  Durante um tempo mantiveram para sossego do Barry, um relacionamento.

Estavam juntos já a mais de 10 anos, quando Barry morreu dormindo, tinha feito sexo antes de dormir, ele comentou com ele, que devia ir ao médico, pois o via muito cansado.

Não despertou no dia seguinte.  Foi um choque, ele nunca tinha visto a morte de tão perto. De uma maneira espontânea, ficou sentado ao lado dele, fazendo carinho como ele gostava na sua cabeça, só depois de horas chamou um médico para fazer o atestado de óbito.

Barry lhe deixou tudo que tinha, inclusive as licenças de sua obra.  Ele nunca mais deixaria de falar delas, muita gente pensava que se aproveitava para promocionar.  Quando lhe perguntavam em alguma entrevista, ele dizia que o que sabia tinha aprendido com ele, me ensinou a compartilhar.    Sabia por que se falava muito, que Barry durante os anos que esteve na cima como fotografo de cinema, guardava a sete chaves a maneira como filmava ou dirigia a luz, as ideias.

Mas com ele, tinha sido generoso. A pedido de uma revista, escreveu um artigo, falando sobre isso, como o tinha ido conhecer, por curiosidade se ainda era vivo.  Como olhou a mão dele, as ideias compartidas, inclusive comentava que ele tinha sido o único homem de sua vida, no momento não sabia que chegaria a sentir o que tinha com ele com outra pessoa.

Quem sempre estava junto com ele agora o escutando, compartindo ideias era Sarah, ela tinha conhecido os dois, compartilhado muita coisa juntos.

Seu primeiro vídeo em seguida, foi em cima de um filme japonês, em que via uma Mama Sama, explicando a uma discipula como devia se comportar, se maquilar, não escondia a influência, mas o filme era erótico, Sarah ensinando duas jovens, uma branca outra negra, como fazer um stripper, como seduzir um homem.

Sarah, já tinha nessa época quase 70 anos, pois era da mesma idade do Barry, em algumas cenas, a crítica dizia que ela superava as alunas que eram jovens.

Agora ele assinava sozinho a direção, em casa as vezes se pegava, se virando para comentar com o Barry uma ideia.

Fez um filme que muitos diziam que era imperdível, era como uma homenagem ao Barry, fazia o seu papel, ele era como o Barry.   O mesmo começava como ele tinha feito na hora da morte do Barry, o tempo que o teve só para ele, antes de chamar o médico, a ambulância, o que tinha sentido.  Depois como acontecia, ele estando sentado nu na varanda, sentia a chegada do Barry para estar com ele, como o fantasma o levava para a cama.

Fez um trabalho impressionante com o Mark, tens que sentir que eu estou te tocando, mas o público nunca verá, pois é um fantasma.   Por duas vezes teve que parar a filmagem, porque Mark começava a chorar.  No filme sugeria que ele se masturbava pensando no outro, nesse momento, Sarah filmava para ele, estava nu em cima do Mark, um olhando para o outro, sentindo um orgasmo sem penetrações.

Quando acabou a filmagem da cena, Mark realmente tinha ejaculado.

Nunca mais me peça para fazer isso, mais um pouco me descontrolo, ia te penetrar.

Numa das noites que ele ficava ali com ele, comentou que o relacionamento dele com o Toni tinha ido a merda por isso, a meses atrás quando fazíamos sexo, em vez de dizer o nome dele, falei o teu.  Ficou furioso, mas era uma verdade, queria estar contigo.

Quando estiveram juntos na cama, ele saberia imediatamente, que não tinha nada a ver, tampouco comparar com o que tinha antes, tampouco esperava.

Mark era ardente, queria possuir de maneira completa, as vezes era afoito, o foi colocando à sua maneira de sentir o sexo.  Ele dizia assim me levas a loucura.

Estiveram juntos muito tempo, uma dia desconfiou que ele estava tomando drogas, foi honesto, lhe perguntou por quê?

Era complicado, ele no começo não era gay, era um homem hetero, de repente com ele aprendeu a sentir outra coisa, as vezes se perdia nisso, sem saber bem aonde se situar, saia para procurar sexo com mulheres, mas já não se encontrava.

As vezes sinto que como me tiveste vampirizado, só consigo sentir prazer se me penetras ou te penetro.  O resto deixa de existir. 

Não podia esquecer que ele vinha de um mundo totalmente diferente, com o começo de sua vida como um marginal.  Agora tinha um nome, era conhecido, as fotos que tinha feito dele para um livro, já eram famosas, os homens queria fazer sexo com ele, bem como as mulheres.  Isso o confundia.  Cada vez mais era dependente dele.

Cada vez que alguém se insinuava para ele, corria para casa para estar com Bruce, pedir para fazer sexo, não queria ceder à tentação de fazer sexo com outra pessoa.  Como sabia que se fizesse, iria se perder.  

Sua vida se cortou no melhor momento de sua carreira, tinha acabado de fazer um filme como tinha sonhado, para um grande estúdio de Hollywood, mas morreu num acidente de carro, voltando para casa.  Vinha como um louco, pois um dos atores famosos, tinha tentado fazer sexo com ele.   Corria para sua proteção, se desconcentrou perdeu o controle do carro.  Ficou quase duas semanas entre a vida e a morte, com Bruce ao seu lado.

Ele parou para analisar tudo isso, talvez ele por todo seu percurso, Mark vinha de uma família complicada, metida nas drogas, a princípio tinha se prostituido com mulheres, por que tinha um corpo realmente fantástico, mas quando descobriu filmado com eles o outro lado, ficou confuso, mas se apaixonou como um louco por Bruce, no hospital, lhe dizia uma vez me perguntaste se eu estava usando drogas, eu não precisava, eras minha droga, queria estar as 24 do dia agarrado a ti, fazendo um sexo interminável.

Morreu agarrando forte sua mão, Bruce tinha chegado a sentir dor, pela força dele, mas não soltou sua mão, suas últimas palavras impressionaram, disse que Barry estava ali, que agora iria com ele fazer um filme deus sabe aonde.

As enfermeiras queriam lhe tampar, mas ele pediu para ficar sozinho com ele, fez a sua despedida, deitado ao seu lado na cama, acariciando o rosto que tinha aprendido a amar. Agora sabia que tinha amado o Barry, como tinha amado esses anos o Mark, era duas pessoas completamente diferente.

Barry era seguro de si, sabia quem era, Mark ao contrário, com todo seu corpo forte, bem como uma vivência diferente, era frágil, agora o sabia, pela conversa dos últimos dias.  Pois estava sempre lhe dizendo, aprendi contigo a ser forte, mas no fundo sempre fui como uma criança que precisa da proteção que não tive na minha infância.

Quando o filme estreou, claro, se via que tinha aprendido a ser um personagem.  Ganhou dois prêmios póstumos.   Mas era mais famoso com os filmes que tinha feito com ele, bem com o Barry.

Toni apareceu para o enterro, mas foi honesto, eu sempre te quis, mas tinhas ao Barry, depois quando te vi escolhendo o Mark, morri de ciúmes, me afastei de tudo, voltei para aonde estava a minha família, mas claro lá tampouco encaixei, sabiam o que eu tinha feito por aqui.  Eu era uma pessoa que os incomodava na sua masculinidade.

Ele pegou essa ideia, fez um roteiro sobre o assunto, uma pessoa de uma etnia, que se afasta, vai pelo mundo, quando volta, não encaixa no mundo antigo.

Toni era o ator principal, agora era suficientemente conhecido dos studios para poder fazer esse tipo de filme que não encaixava dentro dos padrões tido como normais pelas grandes produtoras.

O filme fez muito sucesso, Toni voltou a ser conhecido, recebendo convites para outros filmes, mas sempre o consultava sobre o que devia fazer.

Pela primeira vez tinha medo de ceder, fazer sexo com ele, acreditava que ele tinha imaginado ao logo dos anos, terem um relacionamento, se não funcionasse podia acabar com a amizade deles, estava sempre ali, na sua casa, para que ele viesse lhe falar.

Estava escrevendo como uma biografia de sua vida, desde que tinha saído de casa, da amiga que o tinha ajudado a ter uma cabeça inteira em termos de aprender dos livros.  Ainda seguia como sempre indo à livraria, para encontrar livros novos. 

As vezes sentia que buscava desesperadamente um escritor que despertasse nele esse sentimento que tinha ao ler os que tinha lido com atraso, de gerações.

Um produtor lhe mandou o roteiro de um filme, dizia que encaixava com ele, sua maneira de pensar, era de um escritor jovem.

Quando leu o roteiro, gostou, mas via que existiam personagens demais, que isso fazia que o sentido da história se perdesse.

Perguntou se podia marcar uma entrevista com a pessoa.

Lhe avisaram que a pessoa o iria lhe procurar.  Deixou de lado o roteiro, seguiu escrevendo, mas claro a pessoa nunca apareceu.   Fez o filme com outro diretor, aconteceu o que ele pensava, que o filme se perdia com tantos personagens.

Quando o conheceu, sem querer sentiu como se estivesse vendo no espelho.  Mas ele de uma determinada maneira, tinha aprendido com humildade, tudo que podia com o Barry, mesmo depois quando começou a fazer os seus filmes, ele estava ali para compartilhar.

Finalmente o rapaz veio falar com ele, quando me comentaram o que tinhas dito, não podia em minha cabeça aceitar que colocassem defeito no que tinha criado.

Conversou longamente com ele, tinha feito uma serie de anotações ao longo do roteiro.

No filme o personagem que tinha menos desenvolvimento, era justamente o personagem mais forte, que no fundo era o próprio escritor.

Começou a reescrever um texto só com esse personagem, um dia Toni chegou para conversar com ele, os viu juntos, ficou furioso, disse, estou te esperando a muito tempo, vejo que estou de fora.

Por mais que tentasse argumentar com ele, que não queria perder sua amizade que era importante para ele, não entendeu.   Tempos depois soube que estava internado para uma desintoxicação de drogas.  Foi visita-lo, este disse que não queria nenhuma visita dele.

Ao rapaz com quem estava reescrevendo o texto, sentiu muito ter interferido sem querer no relacionamento deles.

Contou a história, quando me conheceu, eu vivia com o Barry, não sou uma pessoa de aventuras, ao contrário do que dizem de mim, sou só de uma pessoa, depois estive com o Mark, que ao contrário do Barry era inseguro.

Então quando Toni reapareceu, tinha me esperado todo esse tempo, fui franco, precisava de um tempo, sua amizade para mim era importante, mas ele queria mais, isso era impossível em minha cabeça, pois não sentia o mesmo que ele, tampouco queria alimentar isso, mas ele sim alimentou.

Quando te viu comigo, pensou que tinha perdido outra vez.  Ninguém é culpado de nada, cada um estava na verdade defendendo seu terreno.

Max O ‘Smith, entendia, talvez quando ouvi falar de ti para dirigir o filme, já tinha visto todos seus trabalhos na pinacoteca.  Me deu medo, pensei esse tio vai me descobrir, vai saber que personagem sou eu, por isso fiquei com medo.

Como sabia que esse personagem sou eu no fundo?

Porque o pouco que aparece, ele é forte, está tendo coragem de se colocar para fora, isso hoje em dia deveria ser mais fácil com todos os avances que podes imaginar.

Mas veja bem, tem seu erotismo, pois o colocas de uma maneira que parece um voyeur, ele observa os outros, mas não se compromete.

Começaram os dois a desenvolverem o personagem, Max depois de um tempo já quando tinham mais intimidade, contou que uma vez o filme que ele aparecia, se desnudando, fazendo o stripper, me masturbei muito, imaginando que te mostrava para mim.

Como o Mark, tenho medo de me colocar para fora, depois não poder controlar.

Essas coisas Max, controlar é uma idiotice, eu sempre fui sempre de uma pessoa só, imagina, apesar de falarem horrores de mim, só tive realmente dois homens na minha vida, estou com 46 anos, o que se fossemos colocar nos paramentos de hoje, eu seria uma vergonha nacional, os mais jovens, hoje já fizeram sexo com muitos outros, mas me pergunto será que se entregaram realmente a cada um, o que sentiram, analise por ai, verás que dentro de algum tempo estarão vazios, porque no fundo é a solidão.

Cimentei minha relação com Harry, com a cabeça, isso era o principal, nos entendíamos, podíamos discutir sem medo textos, coisas que ele escrevia, ele sabia que não ia dizer que era bonito só para agradar, eu queria entender o que ele fazia.    Aprendi fotografia analógica, que sigo usando até hoje, a dominar uma câmera de vídeo, bem como das poderosas, que ninguém usa mais, enfim, foi meu mestre, meu amigo, amante.  Sou no fundo o fruto da nossa relação.

Quando finalmente foram para a cama, foi porque Max pediu, lhe disse rindo, estou cansado de chegar em casa me masturbar pensando em ti.

O ensinou a fazer sexo como ele gostava, ele ao final dizia, agora entendo.  Quando se deram conta, já tinha se passado mais de dez anos, com vários filmes, na bagagem.  A maioria dos roteiros faziam juntos, a partir da ideia de um ou de outro.

Ganharam muitos prêmios pelos festivais pelo mundo, era um filme totalmente diferente do que tinha feito antes, mas eram sérios, de maneira nenhuma vulgares.

Um dia um marinheiro, se aproximou dos dois na praia, era um negro de 1,90 de altura, contou que tinha visto em vídeos os filmes deles.

Queria contar minha história para vocês.

Ficaram escutando, ele voltou várias vezes, contou que fazia um tratamento psicológico, por uma série de motivos, mais seu psicólogo disse que ele tinha que colocar esse primeiro para fora.    Sua vida tinha começado cedo, sua mãe, tinha um amante, trabalhava, esse era distribuidor de drogas, mas nunca permitiu que ele se envolvesse nisso.  As vezes chegava em casa, tirava toda a roupa ia tomar banho, quando ele tinha uns 13 anos, notou que ele se excitava com isso.  Me levou para a cama, dizendo que ia me ensinar a fazer sexo, virei sua puta, minha mãe levou anos para suspeitar.

Como chegava antes dela em casa, sempre fazia sexo comigo, me acostumei, uma pessoa que nunca teve carinho na vida, confundi isso com carinho, amor.   Mas no fundo para ele era somente sexo.

Um dia ela chegou antes, me escutou gemendo de prazer com ele.  Ficou uma fera, ele se desculpou dizendo que o culpado era eu.

Me colocaram para fora de casa, a princípio, aguentei, dormindo na praia, mas depois descobri que ele tinha contado para todos seus amigos, alguns me procuravam atrás de sexo.  Só um me ajudou, me levou até a frente de um desses lugares, em que entras para o exército, me mandou a vida.  

Assim foi com entrei para a marinha, desenvolvi meu corpo a força, de menino frágil virei o que eu sou, mas não estava mentalmente preparado para a guerra, tudo que sabia de violência, era os vídeos jogos.   Mas a realidade nua e crua, quando bate na tua cara, é muito difícil superar.

Nunca me droguei como fazia meus companheiros para aguentar, até que fui ferido o ano passado, finalmente me devolveram para cá.   Mas claro, nesse meio tempo, passei nas mãos de muitos companheiros, isso desequilibrou totalmente minha cabeça.

Nem sei quem sou, trouxe o que venho escrevendo, dessa primeira parte da minha vida, o psicólogo diz que daria um filme.

Se tornou como o filho deles, lhe deram um quarto para dormir, começaram a trabalhar com ele o texto, até terem um roteiro realmente de cinema, ia até seu descobrimento do sexo com esse homem, até a hora que entra para o exército.

O filme foi um sucesso, concorreu ao Oscar, o rapaz mudou de nome, pois temia ser reconhecido pelos companheiros da marinha.

Mas depois com os anos, se relaxou, começou a fazer surf com o pessoal da praia, fez amigos, até se apaixonou várias vezes, com muita cautela, se reconstruiu outra vez.

Nunca quis fazer uma segunda parte da história, dizia que era ainda muito doloroso falar nisso.

Os dois tinham agora um filho adulto, os ajudava em tudo, desde montar um cenário, inclusive ao momento que escreviam algo, ele acompanhava.

Muitos pensavam que fazia sexo os três, mas isso nem pensar.

Max dizia que finalmente sabia o que ele queria dizer com alguns de seus filmes, precisei despertar uma manhã na tua cama, me perguntando se isso que tive durante a noite foi realmente realidade.

O mesmo se passou comigo, no dia seguinte que fiz pela primeira vez sexo com Barry, ele me tornou o homem que sou.

SAM ROSE

                                       

Seu verdadeiro nome era Samuel Waitrose, mas tinha mudado para sempre por Sam Rose, esse era seu nome artístico, bem como o que usava normalmente, tinha trocado mediante uma lei, que lhe permitia isso.

A muito tempo não cantava em NYC, seu público normalmente era do Oeste do país, aonde ele vivia a muitos anos.   Tinha deixado sua amada Malibu, aonde tinha uma casa na praia, por isso, estava sempre com a pele dourada, com seus cabelos castanhos, largos, queimado do sol.  No alto de seu 1,90 de altura, seu corpo magnifico de surfista a tempo quase completo.  As garotas na praia suspiravam por ele, mas mantinha sua vida pessoal, no mais estrito sigilo.   Os jornalista sabiam que se perguntavam alguma coisa que não fosse relativa ao seu último trabalho, seus discos, seus shows, estavam fadados a não saber nada, pois se levantava sem responder, indo embora.

Podia inclusive dar uma entrevista para qualquer grande magazine, mostrar sua casa, seu estúdio de gravação, fotos com seus músicos, mas jamais junto a alguém.   A gravadora que tinha insistido nisso, tinha ido para a casa do caralho, pois ele tinha exigido uma clausula no contrato a esse respeito.

Nem seus músicos se atreviam a falar nada, pois quando assinavam um contrato para tocar na banda, havia uma clausula a respeito, o único que tinha se atrevido, pagou uma boa multa.

Estava exausto, tinha feito shows numa sequência incrível, Boston, Chicago, Filadélfia, Toronto, Montreal, agora para finalizar duas noites no Times Square Garden, para ninguém botar defeito.

Quando terminou o show, sua roupa estava totalmente enxarcada, havia um homem desses que de longe se nota que é do FBI ou da CIA, parado na porta.  O afastou, entrou, fechou a porta, já tinha imaginado que isso iria acontecer, mas de maneira nenhuma ia fazer nenhuma concessão.

Entrou no banheiro do camarim, tirou toda sua roupa, ficando completamente nu.  Entrou embaixo do chuveiro, não sabia quanto tempo esteve ali.

Seu manager apareceu, lhe disse que devia colocar seu carro pronto para sair.

Este lhe perguntou quem eram esses homens aí fora?

Livre-se deles, dizendo que me nego ao que pretendem, se não se vão, chame a polícia, denuncie assedio a minha individualidade.

Se vestiu, seu camarim tinha uma porta que dava ao seguinte, assim quase numa sequência, foi passando pelos de seus músicos, fez um pedido a um deles, era muito parecido com ele, lhe disse, no meu camarim, tem uma roupa em cima da cadeira, vista a mesma, use meu chapéu, saia do mesmo, vão tentar falar contigo, faça como se fosse um músico famoso, desça até a garagem, entre no carro disponível, nos vemos no hotel.

Esperou o escândalo que se fez na porta do camarim, para sair pelo outro lado, tinha prendido o cabelo, dentro de um gorro desses de inverno, com um casaco com capuz, saiu pelo outro, lado, se misturando na multidão.  Foi andando tranquilamente até o hotel, mas não entrou em seguida, ali estavam os mesmos homens esperando.

Filho da puta, foi tudo que pensou, nunca me deixara em paz, não basta ter trocado de nome, ainda me persegue.

Se referia ao seu pai, hoje em dia um juiz da suprema corte, muito conhecido por disfrutar da alta sociedade de NYC.

Mas nunca o poderia perdoar, pelo fato de ter perdido a única pessoa que tinha amado na vida, sua mãe.

Na época, tinha sido um escândalo, que no enterro dela, ele tivesse aberto a boca, o acusando de ser o assassino literalmente dela.

Depois desapareceu, tomou rumo ao outro lado do pais. Como excelente aluno que era, tinha uma bolsa de estudo, começou a estudar, literatura, filosofia, mas era um excelente compositor, cantor, se revelou logo cantando em pequenos shows, para ganhar a vida, foi descoberto, mas acabou a universidade.  Ou seja, não era um cantor idiota, sem formação.

Tinha sim mudado de nome radicalmente, apesar de seu nome original terminar em Rose, Waitrose, esse era o nome de sua mãe.  A tinha amado com loucura.

Ela tinha se sacrificado por seu pai, na época que ele estudava, ela era quem trabalhava, tinha uma certa experiencia, era bonita como um sol, essa era a sensação que ele tinha dela.  Alta, magra, loira de olhos castanhos, tinha trabalhado de secretária, estava na universidade, mas se apaixonou, seu pai teria que abandonar seus estudos, pois seus avós tinham falido.

Ela se sacrificou, era uma garota do interior, uma mulher simples, trabalhou todo o tempo para que ele pudesse estudar.  Ele acabou a universidade, até conseguir um emprego foi difícil, mas ela estava ali para ele.  Quando ele começou a carreira de ajudante de fiscal, foi que ficou gravida, depois de uma quantidade de abortos, ela quase morreu quando ele nasceu.

Seu pai, foi subindo, ao mesmo tempo que ia se afastando da família. Viviam no final numa bela casa, mas ele mesmo em casa estava sempre trabalhando.  Chegava, mexia nos seus cabelos, se fechava no escritório.  Foi deixando os dois em segundo plano, pois tinha sonhos, quando se tornou fiscal, a coisa piorou, passou a batalhar para ser fiscal chefe, então seu tempo para a família desapareceu, ela não encaixava na vida da maioria das outras mulheres dos homens que se dedicavam a isso, festas, coquetéis, não era uma mulher fachada.  Tentou voltar a trabalhar, ele não permitiu, o que iam falar dele, sempre dizia isso sua defesa.

Claro ela começou a beber, esperando que ele viesse pela noite, mas muitas vezes nunca aparecia, então ele a levava para a cama.   Um garoto de 12 anos, fazer isso, era muito forte, ela na verdade nunca reclamava, só dizia que tinha perdido sua juventude a troco de nada.

Quando ele aparecia, discutiam, ele o que fazia era subir para o telhado da casa para não escutar, até que escutava a porta batendo, um carro se afastando.

Então descia, para recolher como ele pensava os cacos que sobravam ali. Sua mãe destroçada.

Ela dizia, a única coisa que tinha de bom na vida era ele.

Estava estudando música, as vezes chegava mais tarde em casa, pois ficava ensaiando com os companheiros, na verdade era quase uma desculpa, para não chegar em casa a ver bebendo.

Mesmo assim, quando chegava, pegava seu violão, cantava uma música para ela.

Não siga a carreira de teu pai, dizia, seja cantor, serás um sucesso, dizia isso passando a mão pelo seu rosto.

Ele tinha 16 anos, sabiam que ele tinha uma aventura com uma mulher da alta sociedade, aparecia quando muito uma ou duas vezes por semana.  Depois não se sabia dele. Sempre tinham tido uma conta conjunta, sabia que ele não prestava atenção, começou a tirar uma quantidade grande de dinheiro, colocava em sua conta, para ele ir à universidade.

A última semana antes de morrer, tinha sido dura, ele tinha pedido o divórcio, alegando uma série de besteiras, ela se negou, a chegou a acusar de que eu não era seu filho, mas sim de alguma aventura.   A partir de então, ela mal levantava, já estava com um copo na mão.

Nesse dia chegou em casa, queria mostrar uma música nova que tinha composto, ficou parado na porta sem poder se mover, ela estava sentada na poltrona preferida dele, no escritório, tinha se suicidado.  O acusava de aproveitador.  Como a casa a muito tempo estava no nome dela, a deixava para ele.   Mas dizia que nunca o perdoaria por ter roubado sua juventude.  Nesse dia tinha colocado uma carta dirigida ao maior jornal da cidade contando o que ele tinha feito com ela.

Ficou horas ali, se despedindo dela, chamou a polícia, sem chamar a ambulância, já não havia nada a fazer.  Sabia que seu pai conseguiria esconder qualquer coisa, por isso a carta, ele guardou, nesse dia preparou a mochila para ir embora.

Quem avisou seu pai foi a polícia, este fez como sempre um farol impressionante. A ele quando lhe perguntaram, perguntou a que jornal pertencia, lhe disse que procurasse na correspondência, que ela tinha mandado uma carta ao jornal.

Se trancou na casa de um amigo, ficou lá, escapou de todo o circo que seu pai promoveu, entrevistas lacrimosas, uma série de besteira.

No dia da cerimônia do enterro, ele foi, quando o padre o chamou para falar, a primeira coisa que ele disse, foi que havia um erro, era não era católica, ele estava acompanhado do pastor de uma igreja batista.  Tinha horror a padres como o senhor que se vende, para os políticos sujos dessa cidade, o obrigou a sair do altar, comece tudo outra vez, disse ao pastor, apontou o dedo para o pai, dizendo aos policiais que estavam ao fundo, por favor prendam esse criminoso. A cerimônia só seguira quando esse filho da puta saia da igreja.

Não se moveu do altar, o pai ficou sentado olhando para ele.

Não esperava o que veio em seguida, tirou a carta do bolso, vou ler a última coisa que minha mãe deixou escrita, leu tudo. Aonde está a fulana, sua amante, por quem o senhor deixou sua família.   Aonde estão seus amigos da Máfia, que o protegem, o senhor não passa de um bom filho da puta, mas não se preocupe, deixo de usar seu nome hoje mesmo, porque essa acusação para conseguir o divórcio, confirma como o senhor é baixo.  Ele não sabia que sua mãe tinha gravado, se escutava a discussão dos dois, ele ameaçando de revelar que não era seu filho, que ela não passava de uma puta.

Metade dos presentes se levantou, saíram da capela.  Ele sinalizou dois guardas da dali, pais de amigos seus, pediu que o retirassem, já que não era da família, para prosseguirem o funeral.

Nada de festas, nada de enterro, ele procedeu com o pastor o que ela tinha pedido, ser cremada, que suas cinzas fosse para o outro lado do pais, para estar o mais longe dele possível.

No outro dia se publicou a carta aonde ela contava todos os podres que sabia dele.

Ele deixou nas mãos de um advogado a carta, bem como autorização para venderem a casa com tudo que estava dentro, mas antes, retirou a roupa que o pai tinha ali, fez uma fogueira na frente da casa, que sua amante comprasse novas para ele.  Mas fez uma coisa, sabia a combinação do cofre, entregou a um jornalista, cópia de tudo que tinha ali escondido, por isso ele levou anos para poder prosseguir sua carreia de juiz.

Jogou sua guitarra, bem como seu violão, no banco detrás do seu carro, atravessou todo o pais, já tinha dado entrada na mudança de nome, entrou na universidade já com seu novo nome, Sam Rose.   Se negava sempre a dar concertos na costa leste.

Entrou no hotel pela entrada de serviço, na porta do apartamento que tinha reservado para ele, estava a secretária de seu pai.

A atendeu sem abrir a porta.  Ela disse que seu pai estava mal, que precisava de um transplante de medula óssea.

Começou a rir, se transformou numa gargalhada, se abriu a porta ao lado, era seu relações públicas, por um acaso estava com uma jornalista, venha tenho um furo para ti.

Esta senhora é a secretária do homem que diz agora ser meu pai, a mulher queria ir embora, mas ele segurou seus pulsos, só te solto se dizer por que estão me perseguindo a noite inteira.

Ela disse, viu que a jornalista gravava com seu celular, agora grave também minha resposta, ele para pedir o divórcio de minha mãe, disse que eu não era seu filho, tampouco quero saber se sou apto a lhe dar parte da minha medula óssea, quero que ele morra sofrendo muito.

Pediu a jornalista, publique imediatamente na internet, que o presunto filho do juiz federal, disse o nome do pai, se nega terminantemente a lhe doar medula óssea, que quer que ele sofra muito.

Soltou a secretária, já tens o que queria.

Abriu a porta de seu apartamento, viu que o telefone não parava de tocar, tirou o mesmo do gancho, fechou a porta de seu quarto, se jogou na cama.

No dia seguinte logo cedo, saiu pela porta de serviço do hotel, rumo ao aeroporto.

Embarcou num avião da discográfica.   De lá foi direto para sua casa em Malibu, pediu a um dos vizinhos que era policial, agora todos sabiam que ele tinha um passado, que pusesse guardas em frente a mesma.

Ele lhe disse, o melhor que fazes é ir para algum lugar distinto.

Não, aqui é minha casa, já tinha orientado seu advogado para pedir uma ordem de afastamento de qualquer pessoa vinculada ao seu pai.

A gravadora, mandou dois seguranças, ele entrava na água, fazia seu surfe de sempre, depois se fechava em casa.  Quando procuravam seu manager, esse dizia que estava preparando seu novo disco.

Meses depois soube que tinha morrido, que lhe deixava uma fortuna, fez sua única aparição, com um cheque no valor que tinha deixado, entregando o mesmo a um orfanato, quiça essas crianças possam aproveitar o dinheiro de um filho da puta.

Sabia que tinha irmãos do segundo casamento dele, mas os ignorou, tampouco foi ao enterro do mesmo.

Tinha dinheiro suficiente para muitos anos, lhe deu um branco na cabeça, não era capaz de produzir.  Sabia que outros músicos com problemas, se agarravam a bebida, ou mesmo as drogas, isso ele nunca tinha suportado.

Ficou ali na sua casa, vivendo como sempre, de dedicou a escrever a história de sua mãe, tudo que ela tinha lhe contado.

Um dia, sentado na varanda olhando o mar, começou a compor uma música em homenagem a ela, bem como a todas as mulheres que se sacrificam por suas famílias.  Era um gênero totalmente novo. Pela primeira vez, tocava com uma orquestra como ele queria.

Quando a música começou a tocar nas rádios, nos podcast, foi um sucesso incrível, finalmente deu entrevista, mas como sempre falando da música, só contava minha mãe se chamava Rose, por isso uso esse nome.  Foi uma mulher incrível, acabo de escrever um livro sobre ela, sobre as mulheres que sacrificam suas vidas pela família, por seus filhos.

As editoras, começaram a procurar por ele, mas só assinou contrato, se não exigiam entrevistas, tampouco tarde de autógrafos.   O livro acabava de sujar a memória do seu pai, pois publicou numa parte os documentos que o ligavam a Máfia, que ele tinha usado para subir na vida.

Sua mulher tentou que isso não fosse publicado, mas os documentos estavam ali.  Riu muito quando soube que o argumento, era que seus irmãos, nem sabiam que ele existia.

Mas não retirou o livro de maneira nenhuma.  Ela entrou com uma ação mas perdeu.

Um dia estava na sua varanda, escrevendo como sempre, estava batalhando com uma palavra que não saia, pegava o violão, tocava esse pedaço, mas não conseguia encaixar nenhuma palavra, escutou uma voz dizendo, tente com essa.

Ele olhou, ali em pé estava um rapaz, que devia ter a idade, que tinha quando saiu pelo mundo.

Sem tornar a olhar para ele, pois era como se ver no espelho, experimentou, encaixou.

Porra, agora terei de colocar como coautor um desconhecido que invade minha varanda.

Sou teu irmão Cris, não sabia que existia, mas sempre amei tua música, talvez porque tenha um fundo de verdade.

Posso me sentar?

Sim, em que posso te ajudar.

Ajudar, não creio que possa, estou sim farto de manter uma fachada, a idiota da minha mãe, faz tudo para isso, ele a tempo tinha sua secretária, a mesma que foi te procurar, como amante. Era um bom filho da puta.  Li teu livro, não te condeno em absoluto.

Deve ter tentado conseguir tua medula óssea, porque nem eu, tampouco meu irmão éramos compatíveis.   Agora que a merda foi espalhada pelo ventilador, em que mostra que ele sempre foi como eu pensava, um bom filho da puta.  Nada a declarar senhor juiz, disse isso rindo.

Bem-vindo ao mundo real Chris.

Como chama teu irmão?

Robert, ele é autista, vive fechado em casa, não pense tu que minha mãe deixe suas festas, seu jogo de Bridge com as amigas para cuidar dele.  Tem uma quantidade de gente para isso.

Ela quando se casou com ele, o fez com separação de bens, porque já dizia que não era tonta.

Tu não sabias mas ela estava no enterro de tua mãe, me disse que tu tens um caralho de fazer gosto por ter feito o que fez.   O mesmo quando a amante foi te pedir para doar para o velho.

Morreu sozinho no hospital, pois todo mundo sabia dele, até a amante desapareceu.

Tampouco fomos ao enterro, ninguém de casa. Tinham sim alguns poucos amigos, dizem que algum chefão da máfia que o apoiava.

Avisei minha mãe que vinha te conhecer, ela ficou preocupada por cinco minutos, como sempre, depois o celular tocou, alguém a chamando para alguma festa, se esqueceu do assunto, aproveitei, peguei o primeiro avião para cá.

Pois eu quando vim, foi no meu velho carro, usei toda essas distância para ir me afastando de tudo.

Estudas?

Não sei o que quero, minha mãe que diz que tenho que estudar direito, mas odeio a ideia. Pensei muito em milhões de coisas, mas não consigo me decidir.

Tomas drogas?

Nem pensar, repetiu uma frase que ele a tempos tinha falado numa entrevista, que nunca tinha aceitado a drogas, nem tampouco o álcool, pois nublavam sua criação.  Tenho que ter a cabeça despejada para saber o que fazer, como seguir em frente.

A essa entrevista, se a segues ao pé da letra fico contente por ti.

Toque de novo a música inteira por favor.

Viu que ele era educado, tocou, realmente a palavra sugerida encaixava.

A música, como a poesia, embora nunca tenha escrito nenhuma, as vezes é difícil encontrar uma palavra que expresse o que sentes, além de fazer rima.  Obrigado.

Sem querer seguiu escrevendo, viu que Chris olhava para o mar.

Sabes fazer surf?

Não, sempre quis aprender, mas minha mãe nunca permitiu.

Se levantou, chamou um dos garotos da praia, este veio até sua varanda, podes ensinar meu irmão a fazer surf?

Claro que sim Sam.

Venha o levou aonde tinha roupa da praia, veja se te serve.

A cara do Chris era ótima.  Quando for a hora de jantar, como cedo, te chamo.

Voltou a trabalhar, ele sempre quis ter irmãos, amigos tinha uns poucos, mas a garotada da praia eram o melhor para ele.

Na verdade, nunca tinha tido aventuras que durassem muito, pois sempre procurava fora do seu ambiente, inclusive preferia dormir na casa da pessoa, que trazer para a sua.

Tinha passado pela sua vida, homens, mulheres, mas nunca tinha encontrado sua meia laranja.

Nunca tinha se preocupado com isso, não queria ter filhos, temia cometer erros como tinha feito seu pai com ele, agora sabia também com seus irmãos.

Seguiu compondo, quando acabou, tornou a gravar inteira, mandou para seus músicos, assim saberiam do que se tratava para gravarem no dia seguinte.

No jantar conversou com Chris a respeito do Robert.

Eu o chamo de Bob, ele não gosta que as pessoas cheguem muito perto dele, o velho nunca chegava, aliás a mim tampouco.   Eu desde garoto ficava puto, pois ele ignorava meu irmão, dizia que isso devia vir da parte de minha mãe, como se fosse uma doença contagiosa ou hereditária.

Eu para vir aqui, só fiquei sossegado quando a senhora que me criou, disse que ficava, é uma das poucas pessoas que ele deixa se aproximar.

Eu sempre mostro para ele tuas músicas, ele gosta, marca o ritmo, aquela que fizeste para tua mãe ele adora, “Rose”, essa.

Vou pedir para o juiz me dar maioridade, pois assim posso receber o fideicomisso, deixado pelo meu avô.  Também se sou maior de idade, posso tentar tirar meu irmão daquela casa, o colocar numa escola especial.

Ela, bem como ele, sempre o esconderam de tudo, para todos os efeitos sou filho único. Acreditas que ele no seu testamento, deixou dinheiro para ti, para mim, para o Bob nada, como se ele não existisse.

Se queres te ajudo, tenho um excelente advogado em NYC, foi quem me ajudou contra ele, inclusive vendeu a casa que era da minha mãe, a única coisa que ele fez certa.

Dizia que com isso pagava os anos que ela trabalhou, o sustentando para que estudasse. Mas se esqueceu que ela perdeu a oportunidade de estudar como queria, se sacrificou por ele, como se uma casa resolvesse o problema.

Esse dinheiro ficou numa conta, que esse mesmo advogado administra, como um fundo. Nunca toquei nele.  O que ele me deixou, doei para um orfanato, mais isso tudo mundo sabe por que foi publicado nos jornais, na televisão.

Foi quando decidi te procurar, pensei se o sujeito faz isso, ele é honesto, não quer esse dinheiro para nada.

Como era tarde para chamar o advogado, perguntou aonde ele tinha sua bagagem.

Não tenho, só essa mochila, com umas cuecas, duas camisetas, não sabia se ias me receber.

Venha, o levou a um quarto que nunca usava, arrumaram a cama juntos, dormes aqui, amanhã cedo falamos com o advogado, conforme for vou contigo.

Só que depois tenho que ir me encontrar com meu grupo para gravar a música de ontem.

Chris rindo disse, eu vou exigir minha parte, só por causa de uma palavra.

Depois ainda ficaram vendo a lua sobre o mar.

Sempre sonhei com isso, odeio NYC, vivemos preso naquele edifício de luxo, que foi a casa do meu avô.  Meu irmão nem sai para ir a uma praça, nada.

É como se ela o protegesse, mas na verdade tem vergonha dele.  Me desculpe o que vou falar, sei que amaste tua mãe, mas acho que ela aguentou o velho, porque aparentemente ele era importante, convidado para festas nas mansões de Washington, aonde ela se cruzava com gente importante.

Quem me criou, no momento faz isso com meu irmão, é uma senhora negra, chamada Dorothy, ela sempre foi mais minha mãe que a verdadeira.   Com todo o dinheiro que tem, se ocupa de ir ao cabelereiro, ter as unhas perfeitas, almoços com as amigas, jogar bridge, etc.

Perdeu muitas, depois do teu livro, me disse que teve que entrar na justiça contra ti, pois estragava seu modo de vida.

Pois alegava ao contrário, que isso prejudicava aos dois.

Vê aonde estou metido, mas com o dinheiro que me deixou meu avô, posso cuidar do meu irmão, fazer alguma coisa que eu goste. 

Eu adoro música como tu, toco piano, em casa sempre existiu um piano, que mais parecia de enfeite, daqueles negros imensos. Cheio de retratos de pessoas importantes que ela conhece, mas um dia me deu a louca, estava irritado com o comportamento dela, levantei essa tampa jogando tudo no chão, me sentei comecei a tocar, gostei, como tenho um paga mensal, para não pedir dinheiro, comecei a fazer aulas em segredo.

No dia seguinte falaram com o advogado, marcaram para o dia seguinte, ele iria gravar a música, depois pegariam um avião.  Ligou para sua gravadora, disse que precisava ir a NYC, claro imediatamente autorizaram o avião.  Com uma condição, ele se apresentaria de noite, num show de televisão tocando alguma música nova.

No studio, Chris, assistiu os primeiros momentos do ensaio, lhe disse ao ouvido, porque não colocas o piano de fundo, acho que ficaria bem, em vez de começar dessa maneira, olha o que vou te mostrar.

Sentou-se ao piano, começou a dedilhar os primeiros acordes, uma e outra vez, a partir daqui arranca só com tua voz, depois entram os outros, fazes como um lamento, até aquela palavra.

O editor, disse, de aonde tiraste essa figura interessante?

É meu irmão Chris.

Gosto da ideia dele, vamos experimentar.

Assim fizeram, depois ficaram escutando a música.

Puta merda soltou o editor, nem precisamos gravar de novo.  Vamos experimentar, uma segunda opção, que seja só os dois, ele tocando o piano, tu o violão, num tom mais baixo, cante essa música a princípio como se estivesse falando a letra, creio que pode ficar bom também.

Assim fizeram, ficava completamente diferente, sua voz inclusive ficava mais encorpada.

Como vais fazer amanhã a noite no programa de televisão, terás que cantar uma música?

Cantarei essa, se o Chris me acompanha.

Claro que sim, olhe como eu toco “Rose”, faço muito para o Bob.

Começou a tocar, como se fosse uma Naná, ficava lindo.

Gostei, vamos ver se consigo cantar contigo junto.  Abaixou dois tom sua voz, assim ficava diferente, mais suave.

Nunca a imaginei desta maneira.

Eu quando escutei essa música, me parecia que estavas recordando de tua mãe cantando para ti, foi o que entendi desde o começo.

Foram com seu velho jeep até o aeroporto de manhã, de lá um carro da gravadora os levou ao advogado que estava esperando.

Esse estudou todo o caso, foi com eles ao advogado de seu avô, que disse que sim, que ele podia pedir isso, como faria anos, dentro de uma semana, podia pedir isso, assim teria dinheiro para tocar sua vida.  Tinham combinado em nenhum momento falar nada do Bob.

Foram almoçar, deram de cara com sua mãe no restaurante, ela nem tinha percebido que ele não estava em casa.

Quando o apresentou a ela, foi ríspida, como ousas procurar meu filho?

Fui eu que ontem tomei um avião, fui até lá para conhecer meu irmão, ele me recebeu bem, pude conhecer um homem sério, direto.  Falamos muito, de mim, do Bob, do meu futuro.

A cara dela ficou vermelha, quando uma das amigas perguntou quem era o Bob.

Chris não perdeu tempo, é meu irmão pequeno, que ela esconde porque tem autismo, tem vergonha dele.

A mulher, se levantou, pegou sua bolsa, foi embora sem sequer dizer até logo.

Assim vais acabar com as poucas amizades que tenho.

Amiga, essa mulher só se encontra com a senhora, porque pensa que eres alguém na vida, mas deve estar decepcionada.

Depois do almoço vou levar o Sam para conhecer o Bob.

A cara dela era de espanto, com o filho falando com ela dessa maneira.

Ela saiu, entrou na limousine, sem dizer até logo para ninguém.

Com certeza vai ao massagista, para se relaxar.

Realmente quando chegaram em casa ela não estava, ele imediatamente adorou a Dorothy, essa disse baixinho, o Bob perguntou por ti.

Venha, pegou a mão do irmão maior, o levou para o salão, ali estava sentado o menino mais bonito que tinha visto na vida.  Loiro com os olhos azuis quase transparente, muito magro.

Esse quando viu o irmão correu para ele, mas parou quando viu o Sam.

Não tenhas medo Bob, ele é nosso irmão mais velho. Te lembras daquela música que gostas, foi ele quem a fez.  Abriu o piano, começou a tocar “Rose”, ele cantou junto, a cara do garoto era fantástica, se balançava ao ritmo, como se alguém o balançasse para dormir.

Ficou ali parado, o menino se aproximou, pegou na sua mão.

Olha a que ele fez ontem, tocou para ele, os dois cantando juntos, o garoto, veio se sentar junto com o Chris, nisso, entrou a mãe.

Estava furiosa, principalmente quando viu o quadro, dos três irmãos juntos.

Viu que o Bob tinha medo dela, pegou a mão da Dorothy, a arrastou para fora dali.

Bom Chris, vou embora, estou no hotel, devem ter reservado uma suíte, queres ir comigo.

Ele só disse a mãe, para sintonizar o programa de televisão essa noite.

Ela ficou com a boca aberta.

Espera por mim na portaria, vou buscar algo de roupa, me despedir do Bob, dizer a Dorothy que coloque no programa hoje á noite.

Ele educadamente disse até logo para a mulher.

Ficou na portaria do prédio, entraram duas garotas, que ficaram olhando para ele, justo saia o Chris, saíram os dois juntos do edifício.

Ela estava espumando, estava ligando para o massagista, pois está nervosa.

Como a suíte do hotel tinha um piano, ensaiaram as duas músicas.

Vamos cantar primeiro Rose para o Bob, ele vai gostar.

O carro da discográfica, veio busca-los para irem ao canal de televisão, avisou a produção que seu irmão ia acompanha-lo ao piano, que seria duas músicas, uma antiga, revista pelo irmão e outra que tinham composto juntos.

Se vestiram, esperaram sua vez.

Quando o apresentador os anunciou, dizendo que Sam Rose pela primeira vez cantava junto com seu irmão Chris.

Quando o foco os iluminou, Sam explicou, que cantavam essa música especialmente para seu irmão menor Bob, é um arranjo que fez meu irmão Chris, sobre essa música que compus para minha mãe, contou que ele tinha entendido de outra maneira, que pode ser de aonde saiu essa música, ele me fez lembrar que quando eu era pequeno ela me cantava sempre para dormir.

A cantaram, o publico veio abaixo.   Agora essa outra que compusemos ontem no nosso encontro, que ele me sugeriu cantar desta maneira, fizemos duas gravações diferentes.

Cantaram de novo, o publico gostou, pois no final, cantavam o refrão com os dois.

O apresentador perguntou se o Chris também era um Rose?

Rose não é meu sobrenome verdadeiro, eu mudei a muito anos atrás, quando minha mãe morreu, ela se chamava assim, quis ligar definitivamente minha vida ao seu nome.

Ele é filho do segundo casamento do meu pai, bem como meu irmão Bob.

Que tal Chris, cantar com teu irmão.

Eu sempre gostei das músicas dele, mas não sabia que era meu irmão, Bob, nosso outro irmão sofre de autismo, mas adora essa música “Rose”, eu comecei a tocar piano, para ele.

Quando saíram, eles riam, Chris, falou, ela deve estar furiosa, agora todo mundo sabe que tem um filho autista.

O celular dele não parava, mas só atendeu uma chamada da Dorothy.

Meu filho que maravilha te ver cantando, Bob adorou, chegou a cantar um pedaço da música,

Mais feliz ficou porque dedicaram a ele a música.  Diz que gosta do irmão.

Passou o celular para o Bob, ele só ria no telefone.

A mãe o chamou várias vezes, mas ele não atendeu.  Ela faz o mesmo quando está fora, se chamo por alguma coisa, nunca atende.

Eles se mudaram de hotel, Sam resolveu ficar para apoiar o irmão, foram para um apart hotel, assim ficavam mais à vontade.

Os dois advogados se apresentaram diante do juiz de menores, que ia apreciar o caso, no último momento intimaram sua mãe.   Ele se sentou ao fundo da sala, pois tudo era uma decisão do Chris.

Ela perdeu a estribeiras, quando o viu na sala.   Achou que ele tinha instigado ao Chris, mas esse disse que a ideia de procurar o irmão tinha sido dele, queria falar com alguém sobre o meu futuro, já que a senhora esta sempre muito ocupada, com sua vida particular.

Ele explicou o que queria para o Juiz.    Quero poder decidir sozinho o que vou fazer da minha vida, para isso meu avô me deixou esse dinheiro.

Quando acabou tudo, o juiz disse que tinha visto os dois na televisão, gosto muito dessa música, minha mulher também.  Mas essa nova leitura fica espetacular.   A nova, fez minha mulher chorar, segundo ela, é uma música dedicada as mulheres.

O arranjo quem fez foi o Chris, soltou o Sam, pior senhor Juiz, agora vou ter que dar a parceria para esse garoto, vai ganhar dinheiro as minhas custas, colocou o braço em cima do ombro dele.

Chris, perguntou se podia falar com o juiz a sós?

Sim, posso te dar uns 15 minutos.

Quero fazer uma consulta, mas só entre nós dois.

Todos saíram da sala.

Ele voltou sorrindo.

Sua mãe os esperava fora, tinha perdido a pose, quer dizer que te vás de casa?

Se a senhora nem notou que eu não estava durante dois dias, não farei muita falta, foi a resposta.

Depois que se afastaram ele falou com seu novo advogado, o juiz acha que tenho possibilidades de ter a guarda do Bob, se você me ajuda a cuidar dele.

Vou pensar no que me estar pedindo.

No caminho para o apart hotel, foi lhe dizendo, tens que fazer com que a Dorothy, fale com o Juiz, afinal foi ela que tem criou, que cuida do Bob, se sua mãe ganha, pode afastar os dois.

O problema será aonde vamos viver?

Posso me mudar para uma casa maior ali na praia, ou mesmo conseguir a do lado, que está a venda, conheço o dono, assim vocês teriam a casa de vocês, mas eu estaria junto.

Achas que o Bob ia gostar de viver ali.

Acho que sim, eu pelo menos poderia ensinar ele a fazer surf.

Já falas como um campeão na matéria.

Mas seja qual seja tua decisão eu vou te apoiar.

Tinham que se preparar, afinal sua mãe tinha o poder sobre o irmão.  Talvez a decisão fosse que ele estivesse numa escola especial, bem cuidado.

Foi uma larga batalha, mas sem querer depois de muitos meses, Sam, falou com os empregados da casa, que estavam fartos da encenação.  Sabiam que agora ela tinha um amante que levava para casa.

Precisavam de fotos, para comprovar.  Quem as conseguiu foi a Dorothy, que queria proteger seu garoto como chamava o Bob.

Não deu outra, era o próprio juiz que levava o caso.  Foram os dois ao escritório do mesmo, que os recebeu com desprezo.   Mas quando viu as provas, ou deixava o caso, ou escândalo.

Esse se recusou, então não restou outra que abrir a porta, fazer entrar uma repórter do melhor jornal da cidade, entregar a ela um envelope na frente dele, bem como um vídeo que os viam sentados na mesa do café da manhã em roupas menores.

Foi um bom escândalo, sem duvida nenhuma o juiz seguinte deu a guarda ao Sam, no caso dele faltar o Chris, mas o melhor foi descobrir, com o advogado dela, que tinha sido seu amante, o testamento real do seu avô, o apartamento era dos garotos, bem com todo o recheio.

Ela se negava a sair, o apartamento era cheio de obras de arte, Chris chamou um experto no assunto, que levou tudo para vender, a eles não interessava nada disso, deixaram somente o quarto dela, sem decoração nenhuma, um quadro que estava ali, valia milhões, foi um escândalo completo.

Quando os levou para a nova casa ao lado da sua, acompanhados da Dorothy, além de Mirthes, uma senhora que cozinhava os pratos que o Bob gostava.  Era uma casa maior que a sua, agora Chris estudava música na universidade, elaborar partituras, tinha planos de posteriormente fazer composição, bem como regência.

Bob começou a sair da sua casca, era bem recebido pelos garotos da praia, que estavam sempre de olho nele.  De sua casa, como sempre trabalhando na varanda, as vezes levava um susto, pois ali estava o Bob, escutando ele compor.

Tinha um ouvido musical impressionante, as vezes lhe soltava algo que faltava na música.

Foram tocando a vida em frente, agora Chris sempre se apresentava com ele.  Se recusavam a fazer shows em NYC, apesar de terem ali uma plateia cativa.

As vezes vinham desde lá para gravar um show com eles dois.

Anos depois, indo a escola, pela primeira vez escutaram Bob cantando numa festa da mesma, “Rose”, tinha uma voz cálida, tinha falado no começo, minha música preferida, do meu irmão Sam.

Dorothy viveu com eles até idade muito avançada.  Depois tinha na casa uma senhora que cuidava dela, Sam dizia que ela era a mãe real dos meninos.  Da verdadeira nunca mais souberam, com tanto escândalo, desapareceu.

As vezes ele pensavam, os dois deviam ser a famosa meia laranja, um do outro, tanto seu pai como ela, não eram flor que se cheirasse.

Ele levou muito tempo para encontrar a sua parte afetiva realizada, a principio teve receio, pois conheceu um transexual, que era músico como ele, professor da escola que ia o Bob, foram se conhecendo, se encontrando, acabaram juntos.

Ele não escondia mais nada, mas seguia não permitindo perguntas sobre sua vida particular, nem a dos meninos, já bastava tudo que tinham aguentado.

Seu companheiro, Geo, dizia, tive que virar homem para me apaixonar por outro homem. Mas se completavam.

Com o tempo, fizeram uma bela composição, ajudados pelo Bob, que agora tocava piano também, mas claro não gostava dos shows, muita gente o confundia.

Seu maior prazer era surfar com os amigos da praia, nisso era melhor que o Chris, ria muito com isso.

Esse dizia ao Sam, ainda bem que tive a coragem de te procurar, embora pensasse que ia bater com o nariz na porta. 

Eres meu irmão, não tens culpa dos erros dos outros.

Quando Chris se casou, Bob e ele foram padrinhos, a madrinha foi a Dorothy, a garota era especial, também amava a música.

Enfim sem querer, acabaram formando uma família verdadeira.

GRITOS SURDOS

                               

Lamentava o que tinha acontecido na noite anterior, mas sabia sempre o caminho a tomar, por isso estava de novo no seu psicólogo.  Esse ia estranhar, mas como uma bofetada, seus pesadelos tinham voltado.

No dia anterior, seu irmão mais novo, com o qual não tinha tido muita convivência, a partir que era filho de seu pai, com sua segunda esposa, tinha aparecido de visita, quando abriu a porta o viu vestido de militar, tinha explodido.

Esse puto velho te convenceu, lhe disse que sequer dizer bom dia ou qualquer outro cumprimento.  Espumava de ódio, demorou para se acalmar, piorou quando o outro lhe contou que tinha entrado para o exército, porque seu pai lhe contava seus logros.

Tudo mentira desse velho asqueroso.  Não entendeste ainda que é um hipócrita, tudo bem é um coronel, mas nunca foi a guerra, se limita a treinar as pessoas, mas nunca matou ninguém, tampouco viu morrer nenhum companheiro em seus braços, nunca viu a miséria dos países que outros como ele dizem que temos que ir para salvar o mundo.

Não é o que ele diz.  Mostra seus galões triunfantes, conta histórias.

Nada disso é real, venha comigo, mal deu o tempo de seu irmão colocar a bagagem no chão o saiu arrastando, antes lhe mostrou sua prótese da perna direita, ele te falou disso?

Não sabia que tinhas uma prótese.

Pois essa é a verdade, tampouco te contou que levo anos entrando, saído de clínicas, por causa dos meus problemas psicológicos, tentando deixar as drogas para dormir, para despertar, coisas que me faça esquecer o que passei.

O enfiou em seu jeep, de malas maneiras, o levou a casa de um general retirado, se apresentou como sempre ali, de supetão, fez o mesmo lhe contar ao irmão quem era seu pai na verdade.

O General o chamou de lambe botas, de puxa saco, esse filho da puta nunca foi a uma guerra, aproveitou que seu pai foi militar, para sempre escapar.

Ele gravou a conversa inteira com o General, pediu para o irmão chamar o pai, este atendeu, pensando que ele estava em algum campo de treinamento.  Ele tirou o celular da mão do irmão, disse estou mandando esta gravação para todos teus amigos do Pentágono, bem como para teus amigos que você vive contando mentiras.  Manda mais um filho para morrer, em nome da tua idiotice, estás fudido, mando também para todos os jornalistas de Washington, para publicarem umas verdades sobre ti.

O velho gritava para que ele não fizesse isso, mas já tinha apertado o botão, ali estava gravada a conversa do general, com seu irmão, bem como coisas que ele sabia.  Tinha convencido seu irmão menor de ir a guerra quando ele estava em Iraque.  Este morreu na primeira saída, pois não estava preparado.

Fazia o mesmo com esse agora, mandou a gravação para a mãe dele também, assim saberia com quem estava casada.

Voltaram para sua casa, pediu que o irmão colocasse outra roupa, lhe disse claramente, não te conheço, mas se fosse tu, saia do pais, mas não ia para o exército.

Foram para a praia, o foi apresentando uma série de ex-militares, como ele todos com problemas, um lhe faltava um braço, outro um olho, enfim mil misérias.

De noite, acordou de uma maneira que não se lembrava a muito tempo, aos gritos, que iam aumentando de volume, para acabar num grito surdo como ele dizia, um grito sem som nenhum, com os olhos arregalados.

Quando seu irmão conseguiu por fim acalma-lo, resmungou, mais uma vez terei de mudar de casa, pois os vizinhos vão reclamar, embora vivesse no último andar, se escutava tudo.

Passou uma duas horas, chorando, se lembrando de tudo, principalmente da última vez, o comboio tinha entrado numa aldeia, no centro da mesma embaixo de uma árvore estavam todos os velhos, crianças, mulheres mortos, mal entraram sofreram um ataque massivo.

Ele foi um dos poucos que sobreviveu, quem conseguiu avisar a base.

Mas da maneira que tinha caído, olhava para um garoto morto, com a boca escancarada num grito surdo como ele chamava, se via que estava gritando na hora de sua morte.

Isso tinha acabado com o pouco de tinha de cabeça, mais ainda quando voltou, depois de meses na Alemanha, aonde tinha acabado por amputar sua perna. Desde um pouco abaixo da articulação, usava uma prótese, tinha acabado caindo da cama.

Seu irmão estava horrorizado.

Ele se levantou, usando as muletas, foi para o banheiro, se colocou embaixo do chuveiro, chorando como uma criança, pediu que ele fosse embora, mas que o escutasse, encontre com tua mãe uma maneira de escapar disso.  Ela é rica, pode te ajudar.

Ele ao contrário tinha entrado para o exército, porque mal podiam viver da miséria de mesada que seu pai dava para ele, e seus irmãos, eram mais três, duas garotas depois dele, além do pequeno que tinha morrido.  Isso levou sua mãe ao desespero.

Mas o coitado tinha procurado seu pai, pedindo ajuda, este o convenceu de entrar para o exército como tinha feito com seu único filho desse segundo casamento.

Esperou um bom tempo, pois não tinha consulta marcada, contou tudo para o psicólogo, volto a ter pesadelos, creio que quando volte, encontrarei o proprietário pedindo que saia do mesmo.

Isso já tinha acontecido mil vezes.   Pior agora não tinha dinheiro para entrar para um clínica, as do exército nem pensar.

Quando saiu da consulta, seu celular tinha várias chamadas, viu que era da mulher de seu pai, chamou, estava meio histérica.   Perguntou se realmente era verdade?

Sim, ele vai negar mas é tudo verdade, nunca foi a guerra nenhuma, conta mentiras para todo mundo, eu fui a guerra porque não podia ir a uma universidade, já não tinha direito a pensão dele.   Mas o filho da puta convenceu meu irmão pequeno quando foi pedir ajuda para ir à universidade que fizesse o mesmo, morreu dois dias depois ao chegar.

É isso que a senhora quer para seu filho. Que volte dentro de um caixão, que tenha que viver o resto de sua vida com uma bandeira, que nem serve para limpar a bunda.

Só a escutou dizer, o coloquei hoje para fora da minha casa, estou movendo tudo, para evitar que meu filho siga no exército, me chamou chorando, é um menino que não tem experiencia nenhuma de vida.

Quando chegou em casa, não viu o proprietário, tomou duas pastilhas para dormir, fechou tudo, ficou com a casa no escuro.  Tirou a prótese, se jogou na cama.

Despertou outra vez de madrugada, usava para evitar os gritos, uma espécie de mordaça, tinha aprendido com um amigo seu, colocava um aparelho desses que usam os que tem bruxismo, para proteger os dentes, bem como uma mordaça de uma fita adesiva, como essas que se viam em filmes policiais, assim os gritos ficavam baixos.

Sabia que o sonho ia se repetir uma e outra vez.

Viu que seu celular, tinha mensagens de suas duas irmãs, graças a deus as duas tinha escapado de um destino horrível.  Uma era enfermeira num dos melhores hospitais de Los Angeles, a outra advogada num bom escritório.

Quando se livrou de tudo isso, as chamou as duas disseram o mesmo, leia os jornais, bem como olhe os tele diários.

Era sobre o seu pai, entrevistavam vários amigos dele, que pensavam que eram um homem curtido das guerras.  Outros o consideravam um bufão.

O pentágono o tinha colocado na rua, por falsificar, papeis que atestavam que tinha estado na frente de batalha.

Quando abriu a porta para sair, para ir comprar pão, deu de cara com ele, apontava uma arma para ele.

Ficou rindo, pois a arma estava travada, lhe deu um murro na cara, o deixando desacordado, chamou a polícia, o denunciou.

Se negou a retirar os cargos, ele o tinha ameaçado com uma arma, se sentia melhor se vingando dele.

No dia que o julgavam, ficou sentado na última fila, a quantidade de papeis que o fiscal tinha conseguido contra ele era muita.

Pelo visto tinha vivido sua vida inteira uma imensa mentira, podia ser julgado pelos militares, mas estes abriram mão por causa do escândalo, que tinha provocado.

60 por cento dos papeis de suas promoções, eram falsos.

Se via que ele estava alterado, quando o chamaram para depois, ele exigiu que falassem dos títulos que tinha, mas o fiscal se dirigiu a ele, por seu nome normal.  Lhe disse que o exército, tinha lhe retirado qualquer título.

Quando o juiz leu sua sentença de 15 anos de prisão por falsidade ideológica, ele espumava, foi então que se levantou, deixando que o visse.

Vou te matar filho da puta, ninguém pode comigo.  Pensaram que ele estava ameaçando o juiz, que lhe deu mais cinco anos de presente.

Saiu dali, no seu velho jeep, que era a única coisa que tinha de valor, estava seu saco de roupa, foi embora sem destino.  Tinha uma pequena paga de pensão por invalidez, daria para viver em alguma cidade pequena do interior.

Saiu sem destino, rindo feliz pela primeira vez em muitos anos.

Era uma vingança, ele sabia disso. Mas se olhasse para trás, o abandono que esse homem tinha feito com sua família.  Tinha passado a vida inteira arrotando caviar, quando devia comer merda do chiqueiro que era mentalmente.

Tinha visto sua mãe ir fenecendo, lentamente, trabalhando como uma louca como costureira, para os manter alimentado, vivendo num edifício miserável, enquanto ele vivia numa mansão, claro as custas da atual mulher.

Agora pelo menos estaria no meio da escoria a que pertencia.

Passou vários dias acampando no deserto, tinha parado para pensar, pois se tinha pesadelos, ali podia gritar à vontade, quando muito espantaria os escorpiões.

Quando acabou seus mantimentos, foi até a cidade mais próxima, mas foi acampar outra vez, aos pés de uma montanha.

Encontrou por ali, um pequeno riacho que desaparecia de repente no meio das pedras.

Ali pela primeira vez conseguiu dormir sem tomar remédio nenhum.

Um dia despertou com um velho índio, sentado de cócoras em cima de uma pedra o observando.

Ele lhe disse bom dia, colocou sua prótese, se levantou, colocou mais lenha na pequena fogueira para fazer café, estendeu uma caneca limpa com café ao homem, que seguia o olhando sem dizer nenhuma palavra.

Quando viu, estava contando para o homem sua história, falando inclusive dos seus traumas, seus pesadelos.

O homem seguia sem falar, o pegou pela mão, entrou numa cova, logo em seguida de aonde estava, só então entendeu que tinha acampado num lugar sagrado pelos índios, pediu desculpas, não sabia.

O homem o fez entrar numa gruta, que estava iluminada com tochas molhadas talvez em petróleo.  Viu então de aonde vinha a agua do riacho, o homem se sentou, lhe disse para fazer o mesmo.

Ele tirou a prótese, mas claro para isso tinha que tirar suas calças, o homem disse que devia ficar como estava, ali sentado no chão na frente dele.

Fechou os olhos, começou uma viagem que nunca poderia imaginar, sem tomar drogas, nada que o induzisse.

Toda sua vida passada, enfrentando o mesmo homem, o que era atualmente seu pai, um sujeito que sempre tinha sido egoísta, covarde, para não citar coisas mais complicadas.

Em nenhuma vida, ele tinha deixado de lutar contra ele.  Agora entendia a raiva que tinha dele desde criança.  Era um homem frio com os filhos.

Foi ficando ali com o velho índio, quando esse disse que tinha passado esse tempo refletindo sobre a vida, o levou até aonde vivia, num povoado de casebres, aonde ele era o chamã, ninguém perguntou nada a respeito dele.

Foi aprendendo com o velho uma série de coisas, o ajudava em sua horta com as ervas, agora com a chegada do inverno, era o tempo de recolher o que se podia, fazer pequenas porções, deixar para secar.   Aprendeu o uso de cada uma.  Uma vez por semana, ia até a cidade mais próxima, para usar num locutório, um telefone, para chamar as irmãs, assim sabia noticias delas, bem como de sua mãe.

Um ano depois, soube que tinham assassinado seu pai em prisão, alguém descobriu que as histórias que contavam era mentiras, tinham lido na biblioteca, jornais antigos sobre ele.

Cada um tem o fim que merece, foi tudo que comentou.  Sua irmã que era advogada, ainda comentou que tinha se juntado a um grupo de raça ária, que esses não tinham perdoado suas mentiras.  Isso era uma coisa compulsiva nele.

Nenhuma de suas irmãs, pensava em casar-se ter filhos, tinham tido uma vida muito desgraçada, para desejar colocar filhos no mundo.

Ele foi ficando, só sabia mais ou menos do tempo, contando as estações, primavera, verão, outono, inverno, pelo que plantava em cada uma.

Agora se reunia com os outros homens que tinham sobrado da tribo, numa velha cabana, aonde o velho praticava antigos rituais, levou um bom tempo, apareceu um homem que tinha servido o exercito como ele, tinha os mesmos problemas, o velho lhe disse que ele devia cuidar desse homem.   O levou para essa cabana, aonde usavam ervas, nas brasas, isso além de escutar tudo que o outro falava que tinha visto, como tinha sido usado pelos seus superiores, contava que dali tinham saído cinco rapazes, enganados pelos recrutadores, mas que agora ele jamais ia permitir que voltassem ali.   Só ele tinha retornado, tinha sido colocados num regimento, aonde só existiam como dizia um comandante a escoria da sociedade, negros, mexicanos, homens que para escapar da prisão entravam no exército, eram uma bucha de canhão perfeita, ninguém ia sentir falta deles.

Os dois podia levar dias conversando.  Se tornaram amigos, ele sempre estava ali, quando o outro tinha pesadelos, agora já podia falar dos seus com alguém.

Os dois ajudavam o velho em tudo, inclusive com suas economias, tinham comprado um trator de segunda mão, que Osborne consertou, aravam a terra, ajudando a tribo, plantando milho, trigo o que fosse necessário.  Iam nas terras sem cultivar das pessoas da tribo, quando fizeram a primeira colheita de milho, já não necessitavam de ajuda do governo, depois fizeram a de trigo, estudaram uma maneira de guardar o que sobrava para os meses de inverno, para distribuir entre as pessoas.  Algumas mulheres, sempre traziam tortas de trigo que faziam para eles, mas também aprenderam a fazer.    Um dos homens trouxe vários cavalos, misturados de Mustang, com outros abandonados.  Esse se dedicava a ir pelas fazendas, comprar cavalos, éguas que as pessoas não queriam mais.  Davam ali seu repouso de guerreiro.  Construíram entre todos um grande celeiro, aonde deixar os animais durante os meses mais pesados de inverno.

Como por milagre, algumas éguas tiveram potros, que eram a alegria da criançada.

Nesses meses como não podia ir à escola da vila mais próxima, eles, que tinham aprendido um pouco ensinavam as crianças.  Tinham encontrado o equilíbrio numa vida simples, não permitiam aos jovens, porque lhes ensinava com exemplos, bebida, drogas, a maioria das vezes conseguiam.

Quando apareceram recrutadores, os expulsaram dali, desta vez não levavam nenhum jovem para serem bucha de canhão.

Eles agora tinham aprendido do velho, ensinavam os valores antigos da raça, Osborne, ria muito quando o velho o chamava de cavalo tonto, quando lhe perguntou por que, lhe disse que era por sua maneira de andar com a prótese.

No inverno seguinte, fizeram uma coisa os dois, se documentaram aonde, existiam índios que tinham perdido tudo por culpa do exército, que viviam pelas ruas como homeless, ou nas drogas, os catequisavam, construíram uma cabana imensa, a moda antiga, com uma grande lareira ao centro, os que quiseram vir, eles purgavam, ensinavam a conviver outra vez ali, se recaiam nas drogas, o mandavam voltar de aonde tinham saído, mas a maioria ficava, tinham todos largas conversas pelo que tinham passado, quando chegava a primavera, ajudavam a todos no campo, eles mesmos cultivavam uma boa parcela de terra, plantando o que necessitavam, milho, batatas, trigo, assim tinham como se manter no inverno.

Todos tinham uma pensão do exército, conseguiram na cidade uma índia que era professora, entre todos construíram uma escola para os mais pequenos.

Esta acabou se casando com um dos homens recuperados por eles.

Outros, que tinham sofrido na carne abusos sexuais, criavam casais entre eles.

Numa das idas a cidade, uma senhora se aproximou, tinha ido visitar uma irmã sua que era freira num orfanato, ali estava duas crianças descendentes de índios, que ninguém sabia de aonde eram.   Conseguiram com a ajuda desta trazer as crianças, a casa do velho agora era deles, as criavam como seus filhos.

Tinha com o Osborne uma relação, baseada na confiança, no amor que acabaram descobrindo entre eles.

O velho ninguém sabia a idade certa, nem ele mesmo, um dia faleceu, antes de morrer, disse que ele estava preparado para ajudar ali, veja tudo que vocês dois fizeram pela gente daqui, continuem ajudando.

Os dois chegaram a ver seus dois filhos adotivos, bem como outras crianças, irem à universidade, com bolsas de estudos, eles batalhavam para isso.

Chegou um momento que sua irmã que era enfermeira veio viver ali com eles, os ajudava a cuidar dos enfermos.  Falava com a outra, sem querer encontrei a paz que buscava a tanto tempo, passou a viver com um dos homens que ali estava, já a muito tempo recuperado, mas seguiam fazendo o de sempre, a temporada que ia buscando irmãos perdidos, não lhes importava a que tribo pertencessem ali, formava uma tribo a parte.

Chegou um momento que perdeu noção também da idade que tinha, com o tempo deixou de usar a prótese, para andar com muletas.   Uma vez voltou com Osborne aonde o velho o tinha encontrado, estiveram ali retirados quase um mês, durante o inverno.

Quando voltaram a sensação que tinham era que voltavam para seu lar, ou o que fosse isso, tudo tinha seguido funcionando como se eles estivesse sempre presente, isso era salutar.

Nas parcelas de terras agora, todos tinham cavalos, o homem que tinha trazido os primeiros, seguia fazendo o mesmo, saia pelos rodeios, trazia cavalos que ninguém mais queriam, cuidavam dos mesmos, seguindo os ensinamentos do velho, cada família tinha agora, pequenos celeiros para terem seus animais.   Juntaram durante muito tempo, todos com os excedentes que vendiam como uma cooperativa, trouxeram ovelhas, que alguns criavam, as mulheres aprenderam a trabalhar em teares, que Osborne construiu seguindo um livro antigo, agora eram capaz de fazerem mantas como as antigas faziam.  Ele tanto movimentou que conseguiu que um senador, conseguisse, um grupo pequeno de búfalos, os começaram a criar livres, só comiam a carne dos que ficavam mais velhos.   As crianças voltaram a aprender a usar arco e flecha, para voltarem ao tempo passado.  Aprendiam a usar os cavalos sem artefatos como os homens brancos.  Ele mesmo, cavalo manco, montava, usando somente uma perna, levou tempo, mas conseguiu encontrar o equilíbrio.

Na vez seguinte quando foram para o retiro espiritual como ele chamava, levaram um grupo de jovens, para alguns a princípio, era como ir de excursão, quando chegaram lá, viram que era outra coisa, todos se compenetraram.

Um dos seus garotos que tinha estudado medicina, voltou, foi aprendendo ajuntar o que tinha aprendido na universidade, as medicinas do velho, que já sabia desde criança.

Ele foi a revelação dessa última viagem deles, pois viram que tinham um poder de cura, muito particular, seria o próximo chamã, nem ele, tampouco Osborne se consideravam chamamés, mas sim um discípulo do velho.

Peter montou uma pequena clínica, no meio do caminho entre aonde viviam, e a vila mais próxima, assim podia atender a todos, sua irmã que era enfermeira, ensinou tudo a um grupo de garotas, algumas foram estudar fora, outras ficaram ali ajudando.

Sempre havia uma que estudava para professora, para seguir cuidando das crianças.

Alguns iam fazer universidade, não voltavam, ninguém dizia nada, pois como o velho tinha lhe falado, as pessoas têm direito a voar com suas própria asas e destino.

Agora velhos, se sentavam na varanda da cabana, ficavam olhando os mais jovens trabalhando no campo.  Tinham meios de subsistência próprios, o orgulho voltava a existir entre eles.

Ele que estava perdido, tinha encontrado seu caminho.  Agora sonhava muito com o velho que lhe dizia que sua próxima vida teria outro caminho a seguir.

Sabia que mais dias, menos dias, deixaria de existir, mas isso já não importava, tinha feito algo de valor.

JORGE DA CAPADÓCIA

                               

Despertou rindo, tinha sonhado com São Jorge falando com ele, de fundo escutava a música de Jorge Ben Jor, ria sempre com isso, pois sabia que seu dia seria melhor.

Sua mãe era apaixonada por Jorge Ben Jor, quando ele compôs essa música ela não duvidou nenhum minuto em coloca-la no bebê que estava por nascer, todo mundo ria, pois ela não tinha ideia se seria homem ou mulher.

Meu pai foi contra desde o princípio, ele era filho de santo de Xangô, queria que meu nome fosse o símbolo do mesmo.  Ficava dizendo o tempo todo que ela iria contrariar seu santo.

Pior nasci no dia que se comemorava São Jorge, uma grande festa ali no centro da cidade, na igreja dedicada a ele, ela trabalhava numa loja justo em frente, viviam os dois na mangueira.

Logo cedo, quando o sino da igreja começou a tocar, ela trabalhava tranquilamente, pois tinha errado nas contas, achava que eu só nasceria um mês depois.

Estava atendendo uma cliente, que aproveitava que tinha vindo trazer oferenda na igreja, quando rompeu águas.

O menino nasceu ali mesmo, as amigas logo disseram, nasceu no dia dele, vai ser protegido por ele.  Imagina nascer ali em pleno Saara, na Rua da Alfândega, foi um corre, corre, desgraçado, acho que nesse momento, ficou marcada a minha vida, estar sempre no meio da confusão, mas com São Jorge me protegendo.

Imagina alguém se chamar Jorge da Capadócia Silva Santos, pois bem esse é meu nome. Um pouco grande para um pobre.  Quando na escola na lista de chamada, como havia por ali muitos Jorge, a professora dizia alto em bom som, Jorge da Capadócia, todo mundo ria.

Eu a princípio ficava zangado, mas depois me acostumei.  Minha mãe no meu aniversário, para contrariar meu pai, colocava em vez de parabéns, Jorge da Capadócia, cantada por Jorge Ben Jor.

Eles iam trabalhar, me deixava ali numa escola, perto do Campo de Santana, aonde eu passava o dia inteiro.   Ela trabalhou nessa loja até morrer, ele trabalhava na construção. Vivíamos num barraco lá na Mangueira.

Minha mãe dizia que eu não podia escutar a bateria, que começa a dançar, em pequeno, era como se me colocasse uma bateria.

Mas talvez o fato de terem que me deixar em algum lugar para trabalhar, me isolou dos garotos da favela, que desde jovem caiam nas drogas.

Meu pai tinha um padrinho, um coronel da aeronáutica, esse quando fiquei maior, me meteu na escola interno em Barbacena, talvez tenha sido minha salvação.   Só vinha para casa nas férias, era uma festa, ela também tirava férias para estar com seu filho querido.  Eu sempre me questionava por que a vida deles nunca melhorava, levei anos para entender isso, claro com o salário de merda que ganhavam, sobreviviam.  Isso ela não queria para mim.

O Coronel Antônio dos Prazeres entendia meus pais, pois seu único filho tinha se perdido justo aí, nas drogas, ele bem como sua mulher que eu chamava de madrinha, praticamente me adotaram quando eu tinha uns 15 anos, minha mãe morreu, num assalto no ônibus, voltando para casa, cansada do trabalho.  Entrou um filho da puta no ônibus para assaltar para comprar drogas, como ninguém queria dar, deu um tiro, acertando justamente nela.

Meu pai ficou perdido, pois quem vestia as calças em casa era ela.  Só assentou cabeça quando encontrou outra mulher dura de roer, mas que não me queria em sua casa.

O jeito foi seguir na escola, depois vim morar na casa do Coronel dos Prazeres.  Eles dois ficaram me incentivando a entrar para a universidade, pois esse era o sonho dos dois, vivíamos ali no Rio Comprido. Eu de uma certa maneira estava cansado de estar preso, como tinha estado interno na escola.

Pensei muito bem o que queria fazer, ele riu.  Imaginem um mulato claro, cabelos crespos, olhos verdes, que herdei de algum antepassado, 1,85 metros de altura.  Queria fazer arquitetura.  Eles me deram força, bem como um carro de segunda mão, para me deslocar a universidade do Fundão.  Tinha sido bom aluno, passei com uma boa colocação no vestibular.

No final do primeiro ano, eu pensando quando chegasse as férias ia poder fazer uma coisa que amava, me dedicar ao surf, com minha velha prancha de segunda mão.  Nada disso o Coronel arrumou para que fosse trabalhar durante as férias num escritório de arquitetura de um amigo dele no centro da cidade.  Entre centro da cidade, Ipanema, havia uma grande diferença.

Mas fui, adorava a madrinha, bem como respeitava o coronel, sabia que devia demasiado a eles que me queriam como filho.  Eu entendia, eles não queriam de maneira nenhuma que eu caísse nas tentações da juventude.

Quando começavam os ensaios da mangueira, íamos uma vez por mês, assim eu via meu pai, acabado, frustrado com sua vida, sempre que me via, falava da minha mãe, que mulher como ela eu jamais encontraria, eu concordava.

Nos outros finais de semana, eu ia a praia com minha velha prancha para fazer surf, todos me olhavam de lado, pois a maioria tinha das novas.

Não me incomodava, eu gostava mesmo era de estar dentro d’água, aonde me sentia um peixe a mais.

No escritório eu não passava a principio de um office boy, pau para toda obra, mas não me importava, pois ganhava algo.

Eu escutava sempre alguém falado ou reclamando dos cálculos de estrutura, no escritório, o contratavam por fora para os grandes projetos, sem eles nada parava em pé.

Tinha um companheiro que cada vez que via um sujeito trazendo o cálculo do projeto, dizia esse sim sabe ganhar dinheiro.

Me interessei sobre o assunto, pois era fera em matemática, mas depois descobri que ia além disso.   Fui a secretária me informar, me disseram que eu poderia já ir fazendo por fora, como uma especialização, ou terminar o curso dentro de dois anos para fazer.  Se o vais fazendo agora, quando acabe o curso, terás dois diplomas.

Falei com o padrinho, junto com a madrinha, para saber o que achavam.  Ele foi se informar, era uma verdade, cada projeto, o arquiteto que fazia os cálculos, ganhavam uma boa mordida no orçamento.

Me disse que fosse em frente, eu conseguia conciliar meus horários, embora não me deixasse tempo para nada, já ia bem adiantado no curso, quando um dia escutei um engenheiro que trabalhava ali, reclamar, que havia algum erro no projeto, pois tinha se esquecido, que claro o edifício ficava na Barra da Tijuca, seria construído em cima da areia.

Vi o projeto ali jogado, me sentei comecei a fazer os cálculos, realmente havia um erro, recomecei outra vez, vi aonde estava o erro, comentei com o engenheiro, ele me arrastou ao escritório do chefe, tive que comentar que estava fazendo o curso nesse momento, me faltavam meses para acabar, que quando terminasse, teria dois diplomas.

Agora cada projeto que chegava do escritório que fazia os cálculos, me pedia para refazer.

Rápido me dei conta, porque um colega trabalhava ali, que raramente iam olhar o local, examinar a terra, até uma certa profundidade, uma coisa essencial nos cálculos.   Tinha aprendido que teria que analisar a terra, a inclinação, tudo a respeito aonde ia se construir.

Com isso fui refazendo os projetos todos, que voltavam, para ver se estava certo, não reclamava, pois estava aprendendo.   Ia até o local da obra, analisava tudo, voltava com um bloco cheio de anotações.

Quando acabei o curso, além da festa que meus padrinhos fizeram, veio meu pai também com seu filho pequeno.  Ele tinha inveja de mim, eu dele, por estar perto do meu velho.

No dia seguinte o arquiteto chefe me chamou, pensei, claro já não necessitam de um estagiário, vão me colocar na rua.

Era ao contrário, tinha feito uma reunião, ele bem como seu sócio, queriam me contratar, para ao contrário de mandarem os cálculos para fora, que eu os fizesse.   Me pagariam bem, para mim era um bom dinheiro.

Falei com os padrinhos.

A resposta sempre certa do velho coronel, era, tens que começar em algum lugar, ai eles já te conhecem, tudo bem se fosses por fora, ias ganhar mais, mas ninguém te conhece, deixe teu nome aparecer no projeto, isso era uma coisa obrigatória, pois tinha que aparecer quem tinha feito o cálculo de estrutura.

Aceitei, tinha agora uma sala só para mim, além da inveja dos outros.  Mas eu pensava sempre, Jorge me protege.

Ao contrário dos outros ia as obras, observava as pessoas trabalhando, me atrevia a examinar cada detalhe.   Um dia notei que o cimento era uma merda, estava muito molhado.  Era uma empresa subcontratada, falei com o chefe, este ficou uma fúria, pois a mesma era do seu cunhado.  Esse filho da puta, sempre querendo ganhar mais dinheiro.

No que mandou analisar, fez um escândalo imenso, pois claro havia um perigo nisso, as construções na Barra da Tijuca, tinham que ser perfeitas.

Um dos problemas, era que os arquitetos mal saiam do escritório. Alegavam que ir a Barra da Tijuca e voltar, perdiam muito tempo.

Ele como sempre explodia, resolveu mudar o escritório para lá.   Eu arrumei um pequeno apartamento, logo no inicio na parte antiga, que em alguns anos iria desaparecer, para dar lugar a edifícios imensos.   Nos finais de semana, os padrinhos, vinham com meu pai, que estava agora com a cabeça quase toda branca, tinha se aposentado, mas ganhava uma miséria, quando ia embora, eu sempre arrumava um jeito de lhe enfiar dinheiro no bolso.

Ele sorria, eres igual tua mãe, fazia tudo muito simples, para ninguém prestar atenção. Ela estaria feliz com o rumo da tua vida.

Não tinha muito tempo para nada, mas a menor folga, escapava para a praia, fazer surf, isso era uma delícia.    A empresa estava construindo por ali, tinham demolido dois edifícios antigos, iam construir um de uma maneira que queria experimentar, mais moderna, grandes com varanda de frente para o mar.  Trabalhei como um louco nesse projeto, pois por baixo tinha um lençol de água, fiquei estudando todas as opções, pois no momento que demoliram os dois edifícios, se viu que a estrutura estava toda enferrujada.

Comecei a ler, sobre um sistema novo que se usava na Europa.  Meu chefe muito esperto, me deu um bilhete de avião, bem como contato com os fabricantes, para ver como funcionava.

Imaginem que apesar de ter estudado na escola da aeronáutica, nunca tinha feito um voo tão grande.  Se tratava de saber mais que os outros, estudar, isso era comigo.

Madrinha se preocupava porque não tinha nenhum romance sério.  Era uma verdade, tinha romances relâmpagos de uma só noite, nada mais.  Garotas que se impressionavam comigo, mas quando viam meu velho carro, não tinha coragem de me desfazer dele, davam no pé.

Ou quando viam meu apartamento pequeno, apertado, cheio de livros, projetos pelas paredes, deviam pensar esse não vai a lugar nenhum.

Mal sabiam que eu estava fazendo uma caixinha para um dia desses montar um escritório só para mim, já era conhecido.

Embarquei, não sei por que me veio a cabeça a música preferida da minha mãe, Jorge da Capadócia.  Aquilo foi como um estalo na minha cabeça.  Ainda pensei, Jorge, abre meus caminhos.

Foi o que aconteceu. Fui para passar uns 15 dias na fábrica, me viram tão empenhados, embora todos falassem francês, o meu era rudimentar, entendia, anotava, procurava encontrar defeitos.

Antes de ir embora, fui convidado para almoçar com o dono da fábrica.  Foi claro comigo, preciso de gente como tu, que se esforça ao máximo, para isso.

Queres vir trabalhar aqui, escreveu num papel, o que me pagaria por mês, era meu salário de dois anos, fiz os cálculos mentalmente, transformando os valores ao câmbio do dia.

Me faziam um contrato para dois anos, depois me associaria ao projeto que tinham para as zonas de praia do Brasil.   Disse que ia pensar.

No hotel, apesar do fuso horário, telefonei para os padrinhos, levam um susto de fazer gosto.

Contei para eles o que tinham me oferecido, o que achavam que devia fazer?

Nunca cuspa no prato que comeste esse tempo todo.  Acho que deves vir até aqui, resolver esse projeto, falar da oferta, voltar para aí, vamos sentir tua falta, mas é a tua vida.

Falei outra vez com o dono da empresa.

Mandariam um sistema para resolverem o problema imediato do edifício, mas eu tinha que assinar um contrato antes.

Sai da sala dele, telefonei para o meu chefe no Rio, comentei, ele aplaudia, acho fantástico, diga a ele que me interessa ser sócio dele quando venha para o Brasil.

Venha nos oriente nesse projeto, depois a vida é tua.

Foi o que fiz, ia sentir muita falta do mar.  Mas antes de ir embora, fui a igreja de São Jorge, na frente aonde tinha nascido, rezei muito pela minha mãe, que ele me desse proteção.  Nunca tinha tido tempo para ser muito religioso.  Mas ele sempre estava na minha cabeça.

Depois atravessei a rua, me apresentei para algumas amigas da minha mãe, que riram muito, a maioria estava para se aposentar, como elas diziam com um salário de merda.  Uma delas, que tinha inclusive ajudado minha mãe no parto, riu, imagine, era meu primeiro dia aqui, a chefa na minha frente diz ui, só vejo água caído pelas suas pernas, com a confusão da festa de São Jorge imagina como estava isso aqui.

Corri por um lençol, na loja do lado, logo em seguida nasceste tu.

Me contou que nunca tinha se casado, pois não queria filhos, meus irmãos todos acabaram nas drogas, numa vida desgraçada.  Eu nunca pude estudar, mas fico feliz em te ver, imagino como estaria tua mãe sabendo disso.

Meu pai, apareceu no almoço de despedida que os padrinhos fizeram ali no Rio Comprido, estava baleado, de tanto trabalhar, em coisas que já nem podia. Como sempre vinha com o seu filho pequeno.   Este estava chateado, pois queria seguir estudando, mas claro não havia dinheiro.  Me afastei com ele, perguntei o que queria estudar.

Quero ser médico, foi taxativo.

Muito bem, vou te ajudar, falarei com meu padrinho, enviarei dinheiro para teu curso, através dele, está velho, mas não se esqueça é um coronel.

Eu sei, ele já vem me ajudando. Me disseram para vir viver aqui, mas quem vai cuidar do velho, minha mãe desapareceu a muito tempo, agora somos só os dois.

Me sentei quando foram embora com os padrinhos, falei longamente com eles, eu mandaria dinheiro sempre, mas que eles controlassem.  Nos fundos da casa deles, tinha um pequeno apartamento em cima da garagem, já disse para teu pai vir viver aqui, mas ele acha que é por caridade.  Nesse dia subi a mangueira de noite para falar com o velho, arrastei os dois sem admitir discussão nenhuma, lhe fiz ver que o menino tinha direito a seguir em frente.  Os padrinhos tinham me ajudado, senão não estaria aonde estou.  Tanto falei que ele aceitou.

Fui embora mais tranquilo, assim pelo menos ele teria um final de vida mais cuidado, ao lado dos amigos de sempre, bem como meu irmão, Juca poderia ir à universidade.

Cumpri o prometido, todos os meses fazia um deposito para o Coronel, assim ele controlava tudo.  Dizia quando eu telefonava, que mandava a mais, mas dizia que era para os remédios do velho.

Mandava fotos do apartamento que o dono da empresa tinha alugado para mim, me dediquei a trabalhar, fazia um curso pelas noites para falar melhor a língua, poder me comunicar com os operários.

Sem querer o trabalho me proporcionou, oportunidades, que nunca poderia agradecer, quando eram consultados por algum pais, para um projeto, me mandavam, primeiro ir olhar a estrutura que queriam restaurar, examinar o que existia ali, nisso conheci a Espanha, Itália, Alemanha, mas principalmente a própria França.

Fiz nome, escrevi artigos para revistas, falando do nosso produto, explicando o uso, como se devia analisar tudo.  Fui convidado para dar palestras em universidades.  Estava feliz, claro o único que me faltava era uma família, principalmente a praia.

Quando meu pai morreu, voei na mesma noite para o Rio de Janeiro, chegar, sentir o mal cheiro da cidade, que te batia na cara mal saia do Aeroporto, era foda. 

Lá estava meu irmão Juca, mais bonito do que eu me lembrava.  Estava arrasado, eu sentia, porque era meu pai, mas sentiria mais se fossem os padrinhos.

Fizemos o enterro, o coloquei ao lado da minha mãe, Juca chorou nos meus braços, ele em breve acabava medicina, queria fazer uma especialização, lhe disse que podia contar comigo.

Os padrinhos também estavam velhos, era duro ver isso.

Juca estava fazendo especialização ali no hospital da Aeronáutica, ali no Rio Comprido, me disse em que.  Fiquei de olhar para ele, assim ele poderia ir para fora.

Mais uma vez ele me disse, como vou deixar esses dois sozinhos.  Quem estava na porta, foi o velho coronel.

O abraçou, nem pensar, os filhos são para voar, se teu irmão te consegue isso, iremos para uma casa de pessoas de idade lá pelos lados de Jacarepaguá, teremos uma boa vida no final, mas o melhor foi ter ajudado vocês dois que foram como filhos para nós, a ir em frente.

Seis meses depois, consegui o que ele queria, um hospital em Paris, que trabalhava justamente no que ele queria.

Meu chefe é claro, mediou tudo.

Um dia estava conversando com ele, tinha se divorciado recentemente, teve que soltar um bom lastre de dinheiro para a ex-mulher, pelo divórcio, ela ameaçava um escândalo, que para ele seria uma merda.

Me soltou a queima roupa, descobriu que eu tinha um romance, com um velho companheiro de universidade.  Eu conhecia o sujeito, era também casado.

Mas deu uma só cacetada, levei duas, pois ele, aceitou uma oferta de sua empresa que queria a anos que fosse para os Estados Unidos.   Me largaram na sarjeta.

Os dois começamos a sair juntos, ir jantar, tomar um vinho, acabamos na cama nem sei como.

Me contou a crise de ciúmes que seu namorado anterior tinha tido, quando me contratou, dizia que tinha outros interesses.

Só que esses interesses levaram anos para acontecer.

Nas primeiras férias juntos, o levei ao Rio de Janeiro, para conhecer o carnaval.  Quando me viu sambando ficou como louco.  Me dizia depois ao ouvido, só de pensar que eres meu, ficava orgulhoso.

Matei a vontade de fazer surf.  Voltamos, um dia que estava com ele em Paris, dei de cara com meu irmão Juca.

Este estava acompanhado de uma loira daquelas de capa de revista.  Disse que iria acabar o curso em breve, lhe apresentei o Jean dizendo que ele tinha feito possível seu sonho, não fui eu quem conseguiu isso para ti.

Me perguntou se eu tinha mudado de endereço, enquanto Jean conversava com sua namorada, dei uma volta com ele ao quarteirão, contei o que tinha acontecido, que eu agora vivia com ele.

Fui honesto, nunca pensei que fosse amar a um homem, mas aconteceu, além de ser meu melhor amigo.

Contei que tinha ido com o Jean, muitas vezes visitar os padrinhos em Jacarepaguá, me disseram que os chama sempre.  Pois é, estão velhos, dei um dinheiro por fora, para eles poderem ter uma boa vida lá, afinal nos ajudaram aos dois.

Não sabia disso?

Pois é, custa caro, ele mantém tudo com sua aposentadoria, sabe como é na pátria amada, enquanto produzes bem, depois estás de escanteio.

Me perguntou se pensava em voltar ao Brasil, para montar a tal fabrica.

Andamos olhando, mas vejo que os interesses não são os mesmos. Querem como sempre ganhar dinheiro fácil, enganar o sócio estrangeiro.

Jean, como eu, não tem filhos, esta contente com o que conseguiu.  Eu mais ainda porque me projetou para o mundo vamos dizer assim.  Esse mês iremos para Londres, darei durante uma semana aulas em Oxford, para alunos que se especializam.

Não posso pedir mais da vida.  Rindo contei para ele, que tinha levado o Jean, para visitar o lugar que tinha nascido.  Tive que explicar muito, a loja que minha mãe trabalhava, não existe mais, tudo está vindo abaixo ali no Saara.

E tu, pensas em voltar?

Tive um convite para ficar, mas queria justamente falar contigo.  O que achas.

Nos sentamos numa mesa, fiz os cálculos com ele, valia a pena ele ficar. Qualquer coisa te ajudo.

Nada disso, isso já fizeste o bastante, senão teria terminado como meus irmãos, no tráfico de drogas, fudidos, nem sei se algum esta vivo hoje em dia.

Ele foi ficando, chegou a se casar com aquela beleza toda, os dois filhos dele, são meus afilhados.

Jean, foi meu primeiro amor com outro homem, quando se cansou, passou a fábrica para frente, eu fui dar aulas a convite da universidade em Aix en Provence, seguimos vivendo por lá, pelo menos eu tinha o mar por perto.

Mas tinha um sonho, sem querer por dar aulas na universidade, fui com os alunos a Capadócia na Turquia, foi como voltar para casa, me apaixonei.

Consegui com o governo Turco licença para fazer um estudo sobre as cidades subterrâneas, imaginar como tinham sido concebidas.  Foi o máximo, fui para ficar um mês, acabei me interessando por milhões de coisas da área, aprendi a língua, acabei dando aulas na universidade de lá.

Me interessava apesar de parecer absurdo para alguns, como tinham se engenhado para construir essas cidades, pois, era como ir escavando para baixo sempre.  Fazia mapas detalhados do lugar, depois explorava o do andar de baixo, documentava tudo. Para ver como se encaixavam no final.

Escrevi um livro sobre isso.  Fiz aulas com um professor da universidade de Istambul, ele me levou para conhecer a cidade subterrânea, que existia por debaixo da cidade.  Era impressionante, por isso podia viver muito tempo, durante qualquer cerco a cidade.

Estava explorando uma via de acesso, que tinham certeza de que iria dar ao porto, por aonde podia receber abastecimento. 

Jean dizia que esse professor estava apaixonado por mim.   Um dia comentou de durante minha ausência tinha conhecido outra pessoa, que estava apaixonado.  Eu entendi, estava fora de casa meses, lhe desejei boa sorte na sua nova aventura.

Consegui financiamento para explorar tudo o que estava fazendo, o governo Turco me deu permissão para seguir com o professor Ismael, fazendo o trabalho, íamos detalhando tudo, ele sabia como eu era bom desenhando mapas, observando, medindo as estruturas, a pouco tempo, na construção de um edifício muito alto nessa zona, ao colocarem as novas estruturas, tinham afundado.  Fizemos os dois um informe detalhado, acabamos encontrado a via que dava justamente ao túnel que ia até o porto, inclusive uma via, que levava fora da muralha.

Estava feliz, era como se pagasse ao Jorge da Capadócia tudo que tinha feito por mim.

Recebi junto ao Ismael, uma comenda do governo turco.  Agora falava bem a língua, contei a minha história.  No dia seguinte saia nos Jornais.  Para essa cerimonia, veio meu irmão com a família.  Foi uma festa.

Ismael, um dia que quase morremos numa das nossas aventuras embaixo da terra, ele tinha ficado preso, embaixo de um desmoronamento, mandei buscar socorro, mas fiquei com ele, pensou que ia morrer, se declarou para mim.

Passamos a viver juntos, numa vila que comprei com o dinheiro que tinha, uma vez por ano, saia pelos países que me convidavam para falar sobre a Capadócia, bem como nosso trabalho em Istanbul, íamos os dois, eram nossas férias.

Quando ficamos mais velhos, numa das pesquisas que fazíamos, descobrimos, uma cidade antiga, tudo começou por curiosidade, já sabíamos que ali, se levanta uma pedra, descobre algo.  A pequena cidade, embaixo, era uma dessas de veraneio, simplesmente.

Tinha uma pequena enseada.  Subíamos a montanha que estava por detrás, para fazer fotos, achei estranho, uma parte de terra que tinha desmoronado, começamos a imaginar, encontramos uma torre, a equipe de arqueólogos, nos convidou para participar, tínhamos nos conhecido em Istambul, durante nosso trabalho.

Encontrei uma nova paixão, junto com o Ismael, participávamos com os jovens estudantes abrindo a terra para encontrar uma cidade, que devia ter sido comercial, a torre era como um sistema de vigia.  Datava de séculos antes de Cristo, foi emocionante.  A cidade nos agradeceu, encontramos uma casa, ficamos vivendo lá, eu encantado, pelo menos podia tomar banho de mar.   Acabamos escrevendo dois livros sobre o local, agora nos estudavam pelo que tínhamos feito em Istambul, bem como dessa nova descoberta.

Chegamos a acreditar, inclusive ao encontrarmos uma espécie de cripta, que por ali tinham andado os cruzados, mas quando os arqueólogos examinaram, era um lugar de repouso de algum guerreiro de Saladino.   A cidade tinha sido destruída justamente nessa época, pelos cruzados, o tempo a sepultou.

Quando escrevíamos era ao mesmo tempo, eu o fazia em francês, ele em árabe, depois trocávamos ideias a respeito.

Recebi um convite para ir ao Rio de Janeiro falar sobre isso.  Me informei direito, era para meia dúzia de gatos pingados, foi mais fácil convida-los através do governo Turco para que viesse, conhecessem em primeira mão, o que tinha feito por ali.  Se uniu ao grupo o embaixador brasileiro, o tratei como qualquer um, estivemos na Capadócia, aonde contei o porquê do meu nome, depois o que o trabalho por debaixo da cidade, por sorte o tal embaixador sofria claustrofobia não se atreveu a descer.  Depois os levei ao último trabalho, que não tinha acabado ainda.

Por isso queriam que fosse a Brasília para receber uma comenda, me recusei, já não pensava mais em voltar ao Brasil, quando me entrevistaram a respeito, eu soltei na cara, já não devia favores a ninguém, muito menos para o governo.  Soltei que deviam ajudar mais aos estudantes para irem em frente, claro como sempre não gostaram.

Mas tinha minha vida organizada ali, vivia feliz com o Ismael, estávamos sempre mergulhados no que ainda se ia descobrindo, ao final, agora se chegava aonde tinha sido a muralha que protegia a cidade.

Mas nossa casa a beira do mar, era fantástica.  Agora era só esperar o final, pois tinha noção que isso aconteceria, tinha passado por muitos estágios em minha vida.  Afinal tinha uma paz interior, fantástica, pois imaginem um garoto que nasceu ali em plena rua da Alfandega, na frente da Igreja de São Jorge, chegar aonde cheguei.

Meu irmão Juca hoje era famoso em sua especialidade, tinha a mesma noção do que eu, que nunca dariam valor ao que ele fazia.   Vinha agora todas as férias passar dias conosco.

Nunca poderíamos esquecer dos Padrinhos, soubemos que tinham morrido, já meses depois de os terem enterrados, mas na minha última ida até lá, ele foi também, visitamos os dois no cemitério, mandamos rezar uma missa na igreja de São Jorge, para eles.

Fechei a porta, para qualquer lembrança do pais, pois não valia a pena.

FRIEND’S FOREVER

                                  

Olho para trás, sinto um vazio imenso.  Sou o único que resta de uma amizade entre três amigos, ontem me aposentei, a festa foi concorrida, embora sentisse já esse vazio, faltavam meus amigos mais íntimos ali.  Olhava pelo vasto salão, cheio a rebentar, mas não os encontrava, me dei conta que finalmente estou ficando velho, que olho para trás procurando esses amigos que já não estão.

Foram tantos anos de amizade, que só de pensar, as lagrimas escorrem pela minha cara, sem vergonha nenhuma.  Neste casarão que pertenceu a minha família por gerações, que em breve ficará vazio, o deixarei para uma instituição de caridade, que o venda, faça bom uso dele.

Olho os quadros de J. Mara pelas paredes, fico pensando, se pudesse levar para o outro lado, qual levaria, todos tem grande importância na minha vida.  Mas acredito que levaria, um que tenho na minha mesa de cabeceira, que Jiro fez, quando estávamos na escola, é um desenho a lápis, aonde estamos os três.  Ele dizia que tinha se colocado no retrato, porque sempre seriamos amigos de alma.   Grande verdade.

Nos conhecemos no primeiro dia de aula, os três descobrimos depois, nascemos com dias de diferença, mas na mesma semana.  Íamos de mãos dadas com nossas mães, os três diferentes como gotas de água. Jiro descendente de japonês, Bruno de italianos, eu de irlandeses, nada mais distantes um do outro.  Mas nós olhamos, vimos que o resto da turma não interessava.

Nos sentamos todos juntos, um perto do outro, quando a professora disse o nome de cada um, o guardamos para sempre, no recreio já nos juntamos.

Cada um também tinha pais com empregos ou trabalho diferentes, meu pai, era advogado, o do Jiro tinha um restaurante de Sushi, além de dar classe de artes marciais, o do Bruno era gerente de um restaurante italiano em Little Italy, mas vivíamos todos no mesmo quarteirão em Staten Island.

Acabou que nossas mães tão diferentes uma da outra, acabaram amigas, pois todos os dias iam nos levar, como buscar.  Com o tempo, começaram depois de nos deixar, irem tomar um café, fazer compras juntas, foram amigas para o resto de suas vidas.

Já nossos pais, foi mais difícil, meu pai dizia que o pai do Bruno era da Máfia, pois o restaurante que dirigia pertencia a uma família mafiosa.  Descobriria depois que ele odiava esse trabalho, quanto ao pai do Jiro, não gostava por causa das artes marciais.

Mas sem querer acabaram amigos. 

Sem dúvida nenhuma devíamos ser uma grande decepção para eles, nenhum dos três, gostava muito do esporte, mas nos saímos bem nas aulas do pai do Jiro.  Acabaram indo nos ver lutar, nisso na verdade erámos bons, todos chegamos à faixa preta a categoria máxima, creio que foi isso que no final os uniu.   Num dos campeonatos, defendendo Staten Island, ganhamos os três, fizeram uma comemoração conjunta, imagine a confusão de comida, churrasco, com sushi e macarrão, isso virou uma coisa de sempre, pois passamos a comemorar nossos aniversários juntos.

Depois já maiores, não necessitávamos que nossas mães nos levassem, os três caminhávamos para a escola todos os dias, o ponto de partida era a esquina da minha casa, dali partíamos.

Começamos a aprender artes marciais, pois, o famoso bullying que se fala hoje em dia, já existia.  Assim nos defendíamos uns aos outros.  O que incomodava os outros, era que estávamos sempre conversando, fazíamos tudo juntos, um ia ao banheiro, os outros dois também, se jogávamos bola, ou basquete, na mesma equipe sempre.  Não adiantava o professor tentar nos separar, nos recusávamos a fazer o que ele dizia.

Em contrapartida, fomos sempre as notas mais altas da classe, um ensinava ao outro o que não entendia.  Nas provas os professores nos separavam, pois achavam que copiávamos um do outro, o que não era verdade.

Quando chegou a idade de descobrir o sexo, o fizemos juntos, nos escondíamos no porão da casa do Bruno, experimentamos tudo.  No fundo creio que nos amávamos muito, quanto ao amor de um pelo outro, descobri muito mais tarde que era como um círculo.

Mas sexo, descobrimos com um vizinho do Bruno.  Esse um dia nos contou que tinha um vizinho, inspetor de polícia, que a mulher tinha abandonado, vivia ao lado de sua casa, de sua janela dava para ver o quarto do homem.  Ele chegava em casa, ficava de cuecas nada mais que isso.

Tinha um corpo fantástico.  Descobriu um dia que Bruno o olhava, mas nunca fechou cortina, nada disso.

Um dia nos pegou os três olhando através da cortina, mas sabia, que estávamos os três nos masturbando por causa disso.

Nessa época, nossas mães, voltaram a trabalhar, minha mãe era secretária em um escritório de advogados, a mãe do Bruno, era caixa no restaurante que trabalhava seu pai, a do Jiro, ajudava o marido no restaurante.  Então estávamos depois da escola os três juntos.

Teve um ano que pedimos o mesmo de presente de aniversário, um Walk Talkie, nunca deixávamos de nos falar o tempo todo.

Dias depois, estávamos indo para a casa do Bruno, quando vimos fumaça saindo por baixo da porta da garagem do homem, tentamos levantar a porta da mesma, era impossível, Bruno sabia que ele nunca fechava a porta da cozinha, entramos por ela.  Ele estava na garagem, com o motor ligado, já estava desmaiado, Bruno abriu a porta do carro, desligou o motor, entre os três o arrastamos para a cozinha. 

Semanas antes aprendemos numa das aulas, os primeiros socorros.  Começamos a nos revezar a fazer respiração assistida.  Gostei de colocar meus lábios em cima do seu.

Quando ele voltou a si, ficou olhando para nós, dava pena.

Estava completamente nu. Jiro lhe trouxe água, ele só perguntou por que o salvamos, ele não queria viver, se sentia sozinho.

Se tornou a partir desse dia nosso mentor.  Uma coisa nos ligava, os três amávamos os livros, ele também, por toda a casa, estava cheia de livros.

Ele se levantou, colocou um shorts, nos contou tudo.  Sua mulher o tinha abandonado, porque descobriu que ele era gay.  Se divorciaram, em seguida ela tinha se casado com outro.

Meu amante também me deixou, pois queria aventuras, minha vida perdeu sentido.  Viu que Jiro tinha um livro nas mãos que tinha encontrado no chão.  Sem querer começamos a comentar o mesmo, os três já conhecíamos a história.  Foi algo sensacional, cada um tinha um ponto de vista diferente, quando vimos estávamos sentados na cozinha, comendo uma pizza, falando de livros.

Por aonde se andava na casa, tinha livros.  Ele disse que era sua paixão desde criança.

Quando falamos em sexo, ele nos olhou, perguntando se fazíamos sexo entre os três.

Rimos muito, lhe dissemos que a muito tempo, era esse nosso grande segredo.

Quando vimos estávamos na cama com ele, seu corpo era alucinante. Fomos amantes dele, mais de 5 anos.  Nos seus dias livres nos avisava, nos levava a praia, muitos pensávamos que éramos seus filhos adotivos, nunca desmentimos.

Chegou um momento que começou a frequentar o lugar que aprendíamos artes marciais, um dia se apaixonou por um japonês, passaram a viver juntos, através do pai do Jiro, se tornou amigo dos nossos pais.  Descobríamos anos mais tarde, que seguia fazendo sexo com Bruno.

Chegou a época de ir à universidade, discutimos muito com nossos pais, bem como entre nós, com ele, Bernal tinha uma cabeça para entendermos perfeita, não colocava as dúvidas que nos colocavam nossos pais.   Não argumentava, mas sim nos fazia pensar.

Eu queria fazer direito, bem como o Bruno, já Jiro queria fazer Belas Artes, ele era o mais decidido, já Bruno queria fazer direito, para me acompanhar.

Fomos juntos a universidade, Bernal nos ensinou a conduzir, nos deu de presente o carro que tinha sido de sua mulher, estava a tanto tempo abandonado na garagem, mandou arrumar o motor, nos deu de presente no Natal.

Creio mesmo que as três famílias se juntaram por uma coisa, meus pais, tinham imaginado ter muitos filhos, principalmente por causa da casa imensa que ele tinha herdado, mas minha mãe quase morreu no meu parto, ficou incapacitada para ter mais filhos.  A mãe do Bruno foi a mesma coisa.  Já os pais do Jiro, porque queriam ter um filho só, mas que pudesse ter futuro, que eles não tinham tido.

Bruno também era o primeiro da sua família a ir à universidade, o sonho de sua mãe.  Mas ao contrário dos nossos companheiros, não saímos de casa.  Íamos de manhã os três juntos, voltávamos de tarde, ainda usávamos o Walk Talkie para nos comunicar, até surgir o celular.

Fizemos outros conhecidos, mas amigos nem pensar.

Eu estava entusiasmado com a universidade, já o Bruno não.  Um dia tivemos uma conversa séria com o Bernal.  Ele tinha escutado seus pais, falando com um parente, que era mafioso, esse dizia que com o Bruno como advogado, não iam mais precisar contratar nenhum advogado.

Isso o colocava com um pé atrás.   Ele era intuitivo, inteligente, Bernal o questionou de que lado queria estar.   Ele respondeu que da lei.  No último ano da universidade, a deixou, conversou com seus pais primeiro a respeito, entrou para a academia de polícia.  Com o curso mesmo inacabado, entraria depois como inspetor. 

Perdi meu companheiro de debates sobre as coisas do curso.  Jiro sim tinha conhecido muita gente louca, nos apresentou, mas ele nunca se drogava como os outros.

Foi interessante, pela primeira vez tínhamos aventuras com outros rapazes.  Nessa época Bernal, tornou a ficar sozinho. Seu companheiro disse que estava farto de dividi-lo conosco, pois se estávamos juntos, a conversa girava em torno ao que estávamos fazendo.

Agora ia conosco pela noite de NYC, de uma certa maneira nos protegia, contra os que andavam nas drogas essas coisas.  Descobri anos depois, que todos encontrávamos uma maneira de estar com ele só para nós.   Eu adorava ter longos papos com ele, fazíamos sexo, depois ficávamos fumando, conversando sobre lei, como eu devia encarar o que devia fazer a seguir.  Nunca escondemos um do outro isso, mas creio que ele gostava mesmo era do Bruno.

Me questionou muito se queria ser como meu pai, um advogado de um escritório, ele achava isso chato, me dizia que eu devia tentar primeiro ser fiscal.  Fazer uma carreira, além destes terem um bom salário.   Podes ser que ganhes menos, mas poderás construir uma carreira.

O mesmo fazia com o Jiro, um dos programas que fazíamos, por causa dele, era irmos a exposições, ao museus, ver o que havia de novo.  Isso gerava papos homéricos, em seguida, pois com ele podíamos falar de tudo.

Talvez por isso de uma certa maneira estávamos apaixonados por ele.  Ele gostava disso, dizia nunca me encaixei em turma nenhuma, mas com vocês me sinto vivo.  A única coisa que dizia era que nunca entrássemos para o exército, para não ser bucha de canhão.

Os livros agora o comprávamos de uma maneira interessante, cada um comprava um, as visitas as livrarias eram todos juntos, íamos passando um para o outro, inclusive, fazíamos anotações em papeis a parte, marcando o número da página, o que pensávamos a respeito.

Depois claro isso gerava largas discussões.  Não sei se nossos pais, algum dia desconfiaram de alguma coisa, mas nunca falaram a respeito.

No inverno alugamos uma vez uma cabana, para ir esquiar, mas nunca fizemos tanto sexo como desta vez.

Eu tinha uma certa paixão pelo Jiro, seu corpo liso, sem pelos, me excitava sempre. Eu pensava que ele também, pois estava sempre me desenhando.  Hoje pela casa inteira, tenho retratos meus.

Bruno conseguiu ir trabalhar na mesma delegacia do Bernal, esse foi seu instrutor durante muito tempo. 

Eu entrei para os escritórios de fiscais, como ajudante de um que me indicou o Bernal, o sujeito era mal-humorado, estava sempre com a cara fechada, mas nunca aprendi tanto com alguém como ele.  Me dizia leia todo o processo, analise, mil vezes, de todos os ângulos possíveis, olhe bem as provas, bem como as analises dela.  Não deixe escapar nada.  Foi o melhor professor que tive.   Um dia me soltou em plena cara, me olhando muito sério, estávamos almoçando no escritório, estou apaixonado por ti.

Fiquei olhando para ele de boca aberta, sabia que tinha se divorciado a muitos anos atrás, Bernal comentou alguma coisa a respeito. 

Um dia acabei na cama com ele, tudo ficou mais completo.  Mas era um sujeito fechado em si mesmo.  Tinha sido capitão do exército, as vezes quanto tinha muita pressão, tinha pesadelos.

Se agarrava a mim, como se fosse seu salva vida.

Tudo acabou de uma maneira bruta, acabava um julgamento, que tínhamos conseguido a vitória, ele estava falando com os jornalistas, eu estava mais atrás, de repente vi saído entre as colunas, um sujeito com uma arma na mão, gritei, mas aquela confusão de jornalistas falando ao mesmo tempo, ele não escutou, levou um tiro na cabeça.  Fiquei ali segurando a mesma nos meus joelhos.

Foi meu primeiro encontro com a morte, uma bofetada das duras.  Mas meus amigos estava aí para me ajudar.

Nessa época, dividíamos um apartamento imenso no Soho, ainda não era famoso, Jiro acabava de ter sua primeira individual, já tinha dado entrevistas na televisão, era cotado como uma revelação, seus trabalhos tinha influências orientais, bem como adorava usar papel. Depois de ganhar um bom dinheiro, foi passar um ano no Japão, aprendendo técnicas de lá.  Nas férias fomos os outros passar uns 20 dias com ele.

Na volta, outro pancada na cabeça, meu pai morreu, de uma maneira totalmente idiota, vinha andando pela rua, tinha ido visitar um cliente, de repente, começou um tiroteio na rua, voaram sua cabeça.   Mas claro, todos se juntaram para nos apoiar.

Minha mãe tomou uma resolução dura, fechou a casa, como eu vivia na cidade, ela foi viver com uma irmã dela, que era viúva, essa sim falava das nossas vidas.  Dizia que não entendia esses garotos, todos bonitos, solteiros.  Minha mãe respondia, que a vida era nossa, que podíamos fazer o que quiséssemos com ela.

Depois foi o pai do Bruno, uma briga entre facções da Máfia, entraram pelo restaurante adentro dando tiros, ele se jogou em cima de sua mulher para defende-la, acabou ele morrendo.

Todo mundo junto outra vez.   Minha mãe, que estava farta de sua irmã, voltou para casa, convidou a mãe do Bruno para viver com ela.  Anos depois foi a mãe do Jiro, seu pai teve um largo processo contra o câncer, as três se juntaram para cuidar dele.

Depois o mesmo, as três foram viver juntas.  Claro, aniversários, todas as festas, nos deslocávamos para lá.  Bernal estava para se aposentar, as ajudava no que elas não podiam resolver.   Depois da morte do meu namorado, me agarrei a ele como um salva vidas, os dois tinham a mesma idade.  Ele ria, estava com os cabelos ficando branco.  Talvez dos três foi o quem mais perto esteve dele.  Analisava isso, como cada um o via.   Para Bruno ele era como o mestre, para o Jiro, alguém que o entendia na sua arte, na sua busca.  Mas a mim, tinha me orientado, podia discutir com ele os casos.  Quando me nomearam fiscal, pedi para que ele viesse trabalhar comigo, como meu inspetor.   Foram os melhores anos da minha vida.  Todo mundo achava natural, ele estar sempre ao meu lado.

Foi talvez a melhor época da minha vida, era a pessoa que podia discutir de tudo.  Os outros sentiam ciúmes, isso se via, mas claro, o dividia menos com eles.  Bruno estava num relacionamento com um sujeito que nenhum de nós gostava, mas era a vida dele, ninguém interferia, estávamos sempre para ele, quando vinha lamber suas feridas.

Jiro ao contrário tinha se fechado completamente, o mais importante para ele era seu trabalho.

As vezes passava semana sem vê-lo, mas quando nos encontrávamos, eram horas falando, cada um do seu trabalho.   Sua última exposição tinha sido um sucesso tão grande, que o convidaram para fazer uma em Paris.  Lá foi ele, mas nós falávamos horas pelo telefone, quando tiramos férias fomos visita-lo.  Bernal lhe perguntou num jantar, por que ele não tinha namorado?

Soltou que a pessoa que ele amava, estava com outra pessoa.

Vimos sua exposição, saímos pela cidade com ele, nos mostrou o lugar que ele adorava, ficaria mais dois anos por lá.  Desta primeira vez, um dia que Bernal saiu para comprar um presente de última hora, ele se agarrou a mim, fizemos sexo, em pé no corredor do seu studio.  Me disse ao ouvido, te amo muito.

Depois descobri que Bernal tinha feito de propósito, me diria que não sentia ciúmes, porque sabia que ele me amava.

A seguinte perda balançou todo mundo, Bruno morreu no famoso 11S, estava justamente no andar que entrou o primeiro avião, para prender um homem envolvido numa desses desfalques piramidais.   Não sobrou nada dele, se sabia que estava ali, pois tinha falado instantes antes com seu superior, morreu ele, bem como seu companheiro, além de outros dois policiais.

Foi uma porrada em toda regra.  Para Bernal, foi outra vez como perder mais um amigo querido, levamos todos muito tempo para nos recuperar.

Nesse dia os dois fomos buscar o Jiro no aeroporto, pois voltava para NYC, vimos de longe o que acontecia.   Foi uma tragédia impressionante.   Sua mãe quando recebeu a notícia, teve um enfarte fulminante, ele era seu garoto, tinha falado com ele essa manhã.

A ele não conseguimos enterrar, o enterro foi o dela.   Depois foi como conta gotas, minha mãe, a do Jiro, ao final ficamos os três.  Convenci o Jiro de usar dois quartos grandes da casa como studio, nos dois também voltamos a viver nela.

A tristeza do Bernal, era impressionante, se aposentou, se sentia desorientado, foi quando descobrimos que tinha Alzheimer, nos tocou aos dois cuidar dele.   Na mesma época, consegui meu cargo final, ser juiz. Tinha um bom salário, sabia investir o que ganhava, como não tinha que pagar aluguel, além do carro de juiz, com um chofer, era mais fácil.  Pagávamos dois enfermeiros que se revezavam para cuidar dele.

Acho que a única coisa, real que disse, antes de se fechar num mutismo impressionante, foi para o Jiro, cuide do meu garoto, amo os dois.    Meses depois morreu dormindo.

Se não fosse o Jiro, nem sei o que seria de mim.  Me ajudou, eu tinha realmente chegado a amar profundamente o Bernal.  Tinha sido meu mentor, meu amigo, meu protetor, era muita coisa na vida de uma pessoa.

Agora na casa só sobrávamos os dois, as nossas conversas de noite quando chegava, era impressionante, seguíamos lendo os livros, comentando entre nós dois.

Um dia Jiro me disse, que tinha descoberto que me amava, num dia que fazíamos sexo todos juntos, que eu fazia sexo com ele, não queria que eu saísse de dentro dele, me queria só para ele.   A partir desse dia foi assim.   Apesar dos convites, só aceitava expor fora, se pintasse no seu Studio, que viesse buscar, eu ia com ele as vernissages, voltávamos juntos.

Seguimos com o hábito de ir a exposições, aos museus, dizia que comigo podia discutir qualquer coisa.  Que ele um tempo tinha pensado que amava o Bruno, mas esse como ele dizia gostava de explorar horizontes novos.

A dez anos atrás, cheguei em casa, estava tudo a escuras, subi para os quartos que ele usava como studio, o encontrei morto, sentado na sua mesa de trabalho, debruçado sobre um dos muitos retratos que fazia de mim.  Um dia me explicou, cada artista tem uma mania, um desenham mãos, ou alguma outra parte do corpo, antes de começar uma nova série, eu desenho a ti, pois eres meu talismã.   Tinha acabado uma trabalho imenso, que a maioria tinha ido para museus de vários países.  Tudo em papel, ali estava ele me desenhando novamente, quando teve um enfarte.

Senti abrir um buraco embaixo de mim, tudo que pude fazer, foi chamar a emergência, a tempos tínhamos conversado sobre dinheiro.  Bernal deixou tudo que tinha para mim, eu tinha a casa dos meus pais.  Ele dinheiro do seu trabalho, gastávamos pouco, então decidimos, que ajudaríamos a gente jovem.  Ele deixava dinheiro para bolsas de estudos, para jovens com talento.  Tudo estava estipulado.   Eu tinha feito o mesmo, para algum bom estudante de direito, que pensasse em fazer pós-graduação.

Segui trabalhando, pois era o único que tinha, viver na mesma casa seria um suplício, fiz o que minha mãe tinha feito, embora algumas pessoas não entendesse, aluguei um pequeno apartamento sem luxo nenhum, só necessitava de uma mesa grande para colocar os processos que levava para ler em casa.   Tentava me confraternizar com os outros juízes, fiscais, mas os via como uns tontos que não tinham vivido nada.

Escolhi como ajudante um jovem negro, com um futuro promissor, tinha sido fiscal adjunto, era brilhante.  Foi como o filho que não tive, quando resolvi voltar a viver na casa, ele veio junto, as conversas eram impressionante, me surpreendia sua inteligência, ele tinha usado uma das bolsas de estudos que eu pagava para seguir em frente, se sentia agradecido.

Um dia lhe contei toda a história dos meus amigos.  Ele ria, me chamava de velho malandro. Um dia me contou que quando jovem tinha sofrido abuso de uma gang, que depois disso, nunca mais tinha feito sexo.   É o meu companheiro do ocaso, agora será fiscal, nomeado pelo novo governador, eu me aposentei, contei para ele o que tinha sentido na festa, ele estava ao meu lado, mas os outros três não.

Agora o espero chegar todos os dias, para conversar, colocar em dia as novidades, da cidade.

Lhe disse que no momento que se apaixone por uma pessoa mais jovem, ele está livre para voar.  Me diz que nem pensar, que primeiro o ensinei a amar a si mesmo, que me ama com paixão.   Fazemos dois tipo diferente, eu velho, cabelos brancos, posso ser seu pai, ele negro, com uma barba imensa, pois é mulçumano, me ensinou a rezar com ele.

Um dia o surpreendi em seu escritório quando trabalhava comigo, abrindo um tapete, rezando, eu tinha perdido a fé a muito tempo, começamos a conversar sobre isso.  Aprendi a rezar, não vou a nenhuma mesquita, como ele vai, mas rezo em casa, arrumei uma poltrona, que fica em direção a Meca, rezo pensando nos meus amigos, que dia desses com certeza irei encontrar novamente.

As vezes sonho com eles, esperando ansiosamente esse dia, como será vivermos juntos outra vez, mesmo que seja em outro plano.  Na verdade amei a todos, mas nenhum como o Bernal, me lembro sempre, que quando o tiramos do carro, que fazíamos respiração assistida, o primeiro beijo que lhe dei, como ele dizia, pois foi na hora que voltou a si.  Disse que nunca tinha esquecido aqueles lábios contra os seus, nem eu tampouco.  Anos depois me daria beijos larguíssimos, que eu adorava.

Com ele sonho muito, as vezes me desperto procurando por ele, mas já falta pouco, isso espero.

POR NATUREZA GIGANTE

                                      

Olhando sua mão levantada, agora se dava conta que a idade não podia se esconder justo nelas.

Pensando no que os médicos tinha falado dele, não estaria vivo a muito tempo, mas ele continuava existindo, indo em frente, agora com quase oitenta anos.

Tinha nascido antes do tempo, porque era muito grande, segundo os médicos um movimento seu no útero de sua mãe, poderia matá-la.  Pesava quase seis quilos, na hora que o retiraram mediante uma cesárea.

Sua avó reclamava que ele já era muito pesado desde criança, o único que aguentava estar mais tempo com ele no colo, eram seu avô, seu pai, pois eram altos.   Os dois tinham por volta de um metro e noventa.

Quando foi a escola, ele sempre era o maior da turma, os pediatras estavam preocupados que não fosse inteligente o suficiente.  Quando fizeram testes com ele, olhava na cara deles, pediam aqueles jogos de colocar as peças dentro dos seus respectivos lugares, eles nunca entenderam que ele fazia ao contrário de proposito, pois aquilo lhe parecia chato.   Amontoava todas como se fosse uma construção, algumas vezes deixava a última em equilíbrio.

Quem prestou atenção nisso foi uma psicóloga, o deixou brincando com todas as peças ali no chão, ele construiu coisas diferentes, não colocou nenhuma nas caixas correspondentes.

Ela o deixou fazer o que queria, no final disse, me ajudas agora a guardar tudo isso, ele imediatamente colocou tudo aonde devia, inclusive separando por cores.

Virou-se para sua mãe, teu filho não tem problema nenhum de retraso, ao contrário vocês vão ter problemas, porque ele é inteligente.

Com 12 anos tinha 1,70 de altura, isso assustava seus companheiros, que fugiam dele no recreio, até o dia que estava ali sentado, um grupo de mais idade jogava basquete, a bola veio parar nos seus pés.  De aonde estava, numa diagonal, no final da quadra, pegou a bola, jogou como tinha visto fazerem na televisão, a bola apesar da distância, passou pelo aro, o treinador viu aquilo, ficou de boca aberta.  

O único problema era que ele usava óculos, para miopia.

Quando o chamaram para jogar basquete, aceitou, só para poder fazer amigos, com isso acabou capitão da equipe.    Estavam em último lugar na tabela de classificação, nos torneios escolares, ele conseguiu subir a equipe até a final.  Dizem as más línguas que perderam a final, por um problema técnico.

Mas nos anos seguintes, foram para cima sempre, ele além disso era o melhor aluno, em qualquer matéria, tinha uma cabeça privilegiada.

Fez amigos, mas aquela das garotas estarem atrás dele, todo mundo, baterem nas suas costas, como se ele fosse o melhor do mundo, não o conquistou muito, pois entendeu que tudo era por interesse.

Mas seguiu jogando, quando entendeu que era a oportunidade de ir a universidade, pois seus pais jamais iriam poder bancar a mesma para ele.

O que se espantavam os olheiros, os que veem das faculdades para olhar os jogadores, eram que suas notas eram excelentes, da maioria, nunca eram.

Era respeitoso, com o entrenador, porque tinha aprendido isso em casa.  Com 16 anos, quase véspera de ir à universidade, começou um dia a passar mal. Sangrava, pensaram primeiro que era pelo anus, depois dos exames médicos, descobriram que ele era hermafrodita.  Seus pais que eram religiosos, ficaram chocados, mas ele sabia que no fundo, sua mãe sabia disso tudo.

A coisa agora era, ocultar isso, para conseguir a universidade ou desistir.

Fizeram um exames mais exaustivo, os médicos se assustaram, porque ele tinha útero, além de com o tempo, se não fizesse ginastica, teria peitos.

Pelo menos uma universidade se interessou nele por causa das notas.  Por sorte era do outro lado do pais, assim o caso não seria um escândalo.

A principio se sentiu confuso, sempre tinha se sentido homem, inclusive era bem dotado nesse aspecto.  A decisão do basquete era por fazer amigos, quando percebeu que isso só tinha uma vantagem de ir à universidade, foi deixando de lado.

Falaram com muitos médicos, mas claro, os psicólogos, diziam que podia fazer uma série de operações, a partir do momento que ele decidisse qual o sexo que queria.

Ele nunca tinha sido burro, ao contrário, estava provado que seu Coeficiente era altíssimo, parou uns dias para pensar, depois de conversar com um psicólogo, em quem sentiu confiança.

Este lhe dizia que a decisão tinha que ser só sua, pois quem viveria com isso o resto da vida seria ele.

Seu pai, bem com seu avô queriam que optasse por ser homem.  Mas claro isso implicaria numa série de procedimentos, operações, anos de operações.  Não estava disposto a isso, porque quando consultava diretamente os médicos, agora ele exigia falar com eles em solitário, sem sua família se meter no assunto.

A maioria, lhe dizia que não saberia como se sentiria no futuro.  Se até agora ele se sentia uma pessoa completa, não viam por que se operar.  O que falavam do sangramento, tinha sido sua primeira menstruação.

Imaginem um homem de 1,98 de altura menstruado, seria a gozação de todos.

Seu psicólogo, lhe disse que resolvesse, não deixasse que nenhum especialista o analisasse, vais virar um elefante de circo, te levarão para todos os congressos médicos, para te exibirem.

Sua avô tinha um irmão que vivia em Los Angeles, era casado sem filhos. O acolheram, trocou de nome, pois isso se podia fazer.

Começou a ir a universidade, fazia duas ao mesmo tempo, as pessoas diziam que uma não encaixava na outra, estudava física, bem como literatura, sempre tinha amado os livros.

Quando terminou a universidade tinha finalmente 2,15 metros de altura. A coisa mais complicada era comprar roupas, embora ele adorasse andar sempre de bermudas, como os surfistas, ter camisetas imensas, seguia fazendo exercícios, tomou hormonas para os peitos não crescerem.  Tênis só por encomenda, tamanho 48, mas o mais interessante é que tinha um ritmo alucinante para seu tamanho.

Fez graduação no MIT em física quântica, aos mesmo tempo que fazia um curso de escritura.

Mas chegou um momento que a física deixou de interessa-lo, mesmo assim, acabou a graduação, embora tivesse convites de trabalhos.  Pensou muito a respeito.  Como o seu psicólogo tinha falado, ele sempre se sentia um elefante de feira.

De repente seu crescimento parou, teve uma mudança súbita no seu metabolismo, os médicos não entendiam por quê.  Os que o acompanhavam a tempo, não entendiam em absoluto por quê.

Nesse período, se sentia confuso, ansioso, calores.  Um dos médicos chegou à conclusão de que ele estava na menopausa, pela sua parte feminina.

Pensava que puta confusão, como posso ter menopausa, se não tenho nem trinta anos, mas claro os exames concordavam.   Foram meses de uma sensação estranha.

Foi passar uns dias com sua família, pela primeira ver percebeu que os incomodava, para seus avôs que tinham idade, ele era uma aberração da natureza.

Aquele aparentemente homem de 2,15 metros, que era ao mesmo tempo um homem/mulher.

Seus pais, no fundo se sentiam confusos, eles mesmo tinham se acusado entre si, para saber de quem era a culpa de ele ser assim.

Chegou à conclusão que nunca poderia viver ali com eles.  O melhor era seguir mantendo uma relação à distância.

Seus tios, ao contrário o queriam como filho, arrumou para dar aulas na universidade de Los Angeles, em física e física quântica.  

Ganhava bem, alugou um apartamento só para ele, dizia que estava cansado de dormir com os pés fora da cama, na verdade necessitava de espaço para sua vida.

Mandou fazer uma cama especial para ele, sua tia confeccionou seus lençóis, o apartamento não era imenso, mas para ele era perfeito.   Tinha tudo que precisava, um espaço para seus livros, uma grande poltrona que mandou fazer, para se sentar para ler.

Uma boa mesa de trabalho para preparar aulas no seu laptop, tinha assim conseguido um equilíbrio.   Na universidade, se dava bem com todo mundo, embora sempre quisessem arrumar uma namorada para ele.

Quando ia a praia, ia muito cedo, na hora que esta não estava muito cheia, ou no final do dia.

Seguia fazendo largas caminhadas, fazia exercícios, na barras que tinham perto do posto salva vidas.  Mas o que incomodava as pessoas, era sua introspecção.

As vezes ria, se sentia atraído por uma mulher, em seguida por um homem, mas nunca se decidia dar um passo além.

Um dos companheiros de universidade, quase tão alto quanto ele, estava passando por um momento difícil.  Um dia estava sentado nos jardins, lendo um livro, ao mesmo tempo comendo um sanduiche.  Este se sentou na sua frente.

As vezes sinto inveja de ti, foi seu primeiro comentário.  Aparentemente estas sempre em paz, não ter vejo nervoso, mas bem sim controlado.

Eu ao contrário, estou sempre descontrolado.   Meus relacionamentos, sempre dão errado, pois acham que com todo esse tamanho sou tonto, o que não é verdade.

Muita gente se apaixona pelo que tenho no meio das pernas, mas depois de saciarem sua curiosidade, me deixam de lado, minhas conversas, os assuntos que me interessam, não fazem parte do universo deles.

Lhe respondeu que disso ele entendia, que os assuntos que o fascinavam, a maioria das pessoas, não se interessavam.   Um psicólogo que me acompanhou durante muito tempo, me dizia que eu tinha que tomar cuidado para não virar um elefante de circo de variedades.

Começaram a conversar, com o tempo virou uma amizade.

Gordon Brown, ao contrário tinha sido uma estrela no basquete, tinha deixado, por um acidente. Mas tinha feito universidade com notas excelentes, ele era professor de Literatura americana.

Discutiam muito a falta de escritores negros.

O pessoal falava dos dois, imagina aqueles dois, desse tamanho sem namoradas.

Scott na verdade passava disso, as vezes alguma pessoa se aproximava, se insinuava, inclusive alunas, pois ele não era feio.   Pedia desculpas, mas dizia que tinha um compromisso sério.

Um dia estavam entrando em sua casa, para emprestar uns livros para o Gordon, quando este no corredor, pegou sua cabeça entre as mãos, o beijou.

Foi um susto, pois não esperava.  Se separou, perdão Gordon, temos que conversar, eu não quero perder um amigo.

Gordon, lhe confessou que sempre tinha sido gay, as complicações que isso implicava, quando comecei a falar contigo, eu tinha sido abandonado por um companheiro, ele só queria o meu piru.

Pela primeira vez na sua vida, se abriu, falou que era hermafrodita.

Gordon, respondeu, não me importo muito, pois na verdade creio que somos como dizem sempre, a meia laranja, ou a alma gêmea um do outro.

Um dia disse ao Gordon que ia ao médico que o acompanhava a anos, precisava saber os cuidados a tomar.

Então vou contigo, já que estamos juntos, nada mais certo que eu sabia dos limites que tenho.

Quando se apresentaram juntos o médico riu, disse que ele tinha não só arrumado alguém a sua altura, bem como podia compartir sua vida.

Só não te aconselho a ficar gravido, pois isso é uma coisa que pode acontecer, tens o útero não desenvolvido, pelo tamanho dos dois, seria uma criança grande demais, poderia te matar.

Talvez seja a hora dos dois conversarem, decidirem qual seria tua opção, homem ou mulher, antes que o tempo passe demais.

Foi o que fizeram, conversaram muito, ele ainda foi várias vezes ao seu psicólogo para conversar, tinha que tomar uma decisão, gostava de ser homem como o Gordon na cama se davam bem, nunca tinha se sentido uma mulher com ele.  Sabia que ele o queria como homem também, pois tinha conversado a respeito.

Esperou chegar a época das férias, fez a operação, Gordon não saiu do seu lado, retirou o útero, ficando somente com sua parte masculina.

Quando se refez de tudo isso, Gordon um dia soltou, se um dia os dois quisessem filhos, podiam adotar, pois ele próprio tinha sido adotado num orfanato.

Tive sorte, de ter uns pais adotivos que me queriam.  Infelizmente morreram anos atrás num acidente de carro, não tinham como esconder que eu era adotado, pois eram brancos, eu negro.  Mas o mais importante era isso, me queriam, eu era o filho que eles desejavam, por isso me esforcei ao máximo para ser bom aluno, um atleta, pois meu pai adorava o basquete.

Portanto se um dia pensamos, tem muita criança no mundo esperando um pai adotivo.

Um dia foi com ele ao orfanato, justo naqueles dias, uma jovem, queria dar seus filhos em adoção, eram gêmeos, um branco, outro negro, de pais diferentes.  Ela conversou com eles, estava na universidade, tinha sonhos, fui irresponsável confesso, mas meus pais são muito estritos, nunca aceitaram isso.

Adotaram os dois, como ainda não existiam os casamentos gays, cada um adotou um, assim não eram separados.

Nunca pensaram que seriam tão felizes, os companheiros falavam, mas eles passavam por cima disso.  Depois de quase 15 anos juntos, quando saiu os primeiros casamentos gays em San Francisco, se casaram tranquilamente, sem confusão.  

Sua tia era a única que sabia de tudo, os apoiou, adorava os meninos, tinha sempre com ela, uma foto dos dois, um em cada braço.

Agora trinta anos depois, olhava para trás, Gordon, estava ao seu lado como sempre, estavam aposentados, levavam uma vida tranquila, numa cidade perto de San Diego, a beira do mar.

Os meninos, tinham crescido, achavam natural, um pai branco, outro negro, já que eram assim.

Sabiam que era adotados, mas isso não lhes importava.  Um era médico, o outro era um dos escritores mais promissores da América.

A mãe deles tinha aparecido algumas vezes, mas claro estava o fator de que nunca tinham convivido com ela.  A tratavam bem, com educação, como tinham sido ensinados.  Mas não iam muito além disso.

Porque olhas tanto tua mão, lhe perguntou Gordon?

Porque nelas posso ver que o tempo passou, que sobrevivi, vivi, sou feliz contigo, tinham enfrentado todos os problemas juntos, sempre.   Nada do famoso comeram perdizes, foram felizes, mas estavam sempre dentro da realidade.

Quando ele teve câncer nos peitos, talvez porque nunca se desenvolveram, Gordon esteve aí como sempre, o apoiando.

Ele quando teve câncer de próstata, foi igual, ficou ao seu lado para tudo.

Os dois agora tinham os cabelos brancos, esperavam por netos, mas os meninos não estavam para esse labor.

O que era médico trabalhava em Urgência, sua grande paixão, dizia que não sobrava tempo, o outro, vivia indo pelo mundo, era jornalista, além de escrever livros muito solicitados.

Eles agora estava sos outra vez, as aves tinham voado do ninho, como dizia o Gordon, mas tinham um ao outro.

As vezes algum vizinho passava pela rua, via aqueles dois homens imensos, de mãos dadas, balançava a cabeça, como dizendo, como é possível.  Mas para eles isso não significava nada.

MESTRE CANJICA

                                                  

Eu Sei Que Vou Te Amar

Tom Jobim

Eu sei que vou te amar

Por toda a minha vida eu vou te amar

Em cada despedida eu vou te amar

Desesperadamente, eu sei que vou te amar

E cada verso meu será

Pra te dizer que eu sei que vou te amar

Por toda minha vida

Eu sei que vou chorar

A cada ausência tua eu vou chorar

Mas cada volta tua há de apagar

O que está ausência tua me causou

Eu sei que vou sofrer a eterna desventura de viver

A espera de viver ao lado teu

Por toda a minha vida

Despertou pensando nessa música, ainda pensou, meu passado me condena, as vezes acreditava piamente nisso, que o passado era como uma onda, ia, voltava, quebrava na praia, mas nunca desaparecia por causa da repetição.

Ele tinha se inventado, reinventado mil vezes, mas seguia como dizia sobrevivendo, isso sempre, as vezes dizia as pessoas, eu sou um sobrevivente de mim mesmo, mil vezes.

Era conhecido pelos íntimos como Mestre Canjica, mas seu nome verdadeiro de Adalberto Castro Mendonça, tinha nascido em Salvador, Bahia, era um soteropolitano da gema, como dizia, além de ser filho de Xangó, Iansã, com um Exu Bara, para o acompanhar a vida inteira.

Era um tipo baixo, como sua mãe, uma mulata para ninguém botar defeito, tinha somente 1,60, foi trabalhar na casa do Coronel Olímpio Mendonça, ela se chamava Doroteia Castro, era uma mulher para ninguém botar defeito.  Ajudava em tudo, principalmente a cuidar da mulher do Coronel Mendonça.   Na época os tratamentos de câncer não eram tão bons como agora, era a segunda vez que tinha a doença.  Cuidou dela até morrer, os filhos nunca aparecia, tinham suas vidas, diziam que não gostavam de ver sua mãe morrer, vieram ao enterro, para saber se depois tinham direito a alguma herança.  Nada, tudo era do Coronel.

Ele se apaixonou por Doro, ou Doroteia, sem remédio, dai nasceu Adalberto Castro Mendonça, ele fez questão de colocar o nome no garoto, para surpresa de muitos, era muito claro, olhos verde, cabelos crespos loiros, um sorriso na cara, o médico riu, dizendo que era raro isso, uma criança nascer sorrindo.

O velho se apaixonou perdidamente pelo filho.  O chamava de Canijo, pelo seu tamanho, quando foi para a escola, claro sofria bullying, mas seu pai o colocou para aprender capoeira com Mestre Surpresa, esse era famoso na época, diziam que era uma caixa de surpresa, pois sempre sabia improvisar, derrotando os que vinham lutar com ele.

O menino se revelou, tinha uma facilidade incrível para isso, não gostava muito era de estudar, tinha verdadeira paixão, vendo sua mãe cozinhar, ela era uma das Yaos, de uma famosa senhora do Candomblé.   Tinha um restaurante na Praia Vermelha, chamado Comida de Santo, tinha licença deles para reproduzir as comidas de suas oferendas.

A lista das comidas era imensa, mas se o cliente pedia para fazer uma entrega, ela a fazia dentro dos preceitos, nunca entregava no restaurante, mas sim na sua casa, que ficava por detrás do mesmo, ali, vivia com seu filho querido, que desde criança a ajudava nesses afazeres, o Coronel ria daquele garoto tão pequeno, mas que sabia de tudo, cada comida, como devia ser, como devia arrumar na oferenda.

Mas Adalberto, mestre Canjica, era apaixonado justamente por esse milho branco, a senhora do Candomblé, dizia que ele era protegido também por Oxalá-Oxalufan, dai estar de sobreaviso de tudo.   Quando a mãe fechava o restaurante, nos dias que ia ao Terreiro ele ia junto, cuidava de todas as quartinhas, colocando água nelas, mas tinha seu preferido, que era Exu Bara, aonde colocava as frutas que ele gostava.  A senhora ficava rindo, esse minino, em vez de dizer menino, nem precisa fazer a cabeça, já nasceu feito.  Saberá ir pelo mundo, como Oxalá manda, se reinventando, sobrevivendo a qualquer preço.

Mas no restaurante de sua mãe, sabia fazer todas as comidas que os clientes iam ali especialmente comer, um acarajé de entrada, alguns ia comer uma moqueca, com tudo que tinha de direito, mungunzá, sarapatel, a lista era imensa.

Ele ia fazer 17 anos quando um dia sua mãe foi chamada as pressa no terreiro, ali lhe explicaram que o Coronel tinha seus dias contados, que ia haver uma grande confusão, com os herdeiros, era melhor mandar Mestre Canjica, se mandar pelo mundo, que aliás era sua obrigação.

Ela chorou muito, resolveu contar para o Coronel, a muito que ele tinha mandado os filhos a merda, tinha uma plantação imensa de cacau, no interior, os filhos queriam tudo o que ele tinha, nunca iam reconhecer o Adalberto como irmão. 

O velho, abriu uma conta no banco no nome dele, colocou lá um bom dinheiro.  Quando soube da história, sentaram-se os três, lhe explicaram a situação, teus irmãos nunca vão se contentar com todo dinheiro que possa dar para eles, vão querer tua parte também, eu fiz as contas, depositei esse valor numa conta no banco, a principio mexa o menos possível nela para não chamar a atenção.  Deves ir embora, quero que esteja vivo para sempre.

Foram ao terreiro, a Senhora fez uma larga proteção para ele, alguns chamava de fechar o corpo, mas no fundo era só uma proteção, ficou ali sete dias, ela lhe disse umas coisas em particular, que seu destino era correr o mundo.  Ajudar a quem precisasse, mas que nunca confiasse demasiado em ninguém, principalmente em se tratando de amor.   Que primeiro ama-se a si mesmo, depois já se veria.   Lhe deu a direção de um filho de santo que ela tinha preparado com esmero no Rio de Janeiro.  Mas cuidado, deixe sempre teu Exu, examinar primeiro para ver se gostas ou não como ele trabalha.

Saiu de madrugada de Salvador, num caminhão de um amigo de seu pai, que descia para o Rio de Janeiro, carregado de Cacau.

Era um senhor, muito divertido, lhe soltou numa das paradas que fizeram para comer, na beira de um rio, aonde aproveitaram para tomar um banho.  Menino, saíste na hora certa, havia um zum-zum-zum terrível lá na Baixa do Sapateiro, um dos teus irmãos estava contratando um cangaceiro para dar conta de ti.

Quando estavam chegando ao Rio, pararam para dormir, sonhou com seu pai, sabia que ele tinha desencarnado.  Quando conseguiu falar com sua mãe, ela lhe contou, os filhos tinham aparecido, levado o pai, para um enterro decente, que a proibiam de ir.

Estou recolhida aqui no terreiro, aqui eles não entram, ficarei aqui um bom tempo, mas tu cuidado, proteja tuas costas, não confie em ninguém.

Na parada seguinte, que fizeram antes de entrar no Rio, viu que o velho ficava estranho, pensou esse filho da puta vai me matar, pegou a mochila, que era a única coisa que tinha, parava nesse momento por ali, o ônibus da Viação Cometa, que fazia a linha São Paulo/Rio de Janeiro, viu que um homem descia, falou com o motorista, pagou o bilhete, quando o velho saiu, ele já não estava mais.  Não tinha comentado de maneira nenhuma com o velho, aonde iria.

Desceu na Rodoviária do Rio, se informou de um endereço, que tinha na mão, dado em segredo pela Senhora do terreiro.  Era logo ali em Santo Cristo.

Foi andando com sua mochila, impressionado com o cheiro do canal do Mangue.  Foi perguntando ali, aqui, até que encontrou a rua, que ficava numa subida, era como uma favela, mas tudo limpo.  A vizinha disse que o homem que procurava, trabalhava no cais do porto, normalmente mais tarde estaria no bar da esquina tomando uma cerveja.

Viu que ele ia, esperar, ela era também baiana, lhe ofereceu comida.  Venha garoto, fiz um sarapatel dos bons.   Foi conversando com ele, aonde ia comprar os ingredientes, na feira dos nordestinos, ali em São Cristóvão, ele comentou que sua mãe era uma cozinheira de mão cheia.

Ela estava preparando uns acarajés de encomenda para o dito cujo bar, ele cuidou para ela com cuidado, enquanto ela fazia outra coisa, preparou os recheios, a sua maneira, ela ria muito, que mãos tens garoto, provou o tempero, está de lamber os beiços.

Depois foi com ela levar até o bar, era a hora que os estivadores voltavam do porto, tomavam uma cerveja, alguns comiam ali mesmo, ela chamou o Ernesto, ele entregou a carta que tinha no bolso.  Ele leu, riu, mais um refugiado da santa Bahia, provou o acarajé, soltou tia Nuncia, a senhora mudou o recheio. 

Mudei nada, foi ele quem fez.  Logo foi contratado para trabalhar ali naquele bar, para começar estava bom.

A casa do Ernesto era pequena, mas estava super limpa, riu ao entrar, pois viu um altar para Exu, entendeu logo.   Ele dormiria no chão, em cima de um colchão que o Ernesto arrumou, mas isso não importava, não ia contar que tinha dinheiro para montar uma casa.

Ficou morando ali um tempo, até ter um salário para alugar um pequeno apartamento mais em baixo, perto do bar.  Mas nunca perdeu a amizade com o Ernesto, era bom na Capoeira também.

Nos domingos iam logo cedo a feira de São Cristóvão, ali olhava os outros tipos de comida do Nordeste, depois aprendeu tudo com tia Nuncia, no barraco dela, não tinha sala, mas sim uma imensa cozinha, com uma mesa imensa aonde se preparava tudo.

Aprendeu as outras comidas.  Ia com o patrão logo cedo, a Cobal, para comprar tudo fresco.  O Bar ficou famoso, no domingo de tarde era super concorrido.

Quando conversou com o Ernesto sobre o pai de santo que tinha falado a Senhora, ele soltou, esqueça, esse virou um engana tonto.  Faz tudo por dinheiro, mal te vê, diz que tens olho gordo em cima de ti, pede logo uma matança, que ele cobra uma fortuna, agora vive com os dedos cheios de anéis de ouro, pulseiras, se o trabalho é mais forte, logo pede uma pulseira de ouro para agradar o santo.  Tudo balela, mal sabe ele que os que fazem isso, acabam mal.

Te levarei a um que vou uma vez por mês, aqui na Mangueira, a mãe de santo é porreta.

Dito e feito, o fez lembrar-se imediatamente da Senhora da Bahia.   Como seu Exu ficou contente seguiu em frente.

Um dia parou um carro na frente do restaurante, isso era raro por ali, que todo mundo tinha carro de segunda mão.   Desceu um senhor bem-vestido, para o Adalberto, muito bonito, sempre tinha gostado de homens mais velhos.

Se sentou numa mesa num canto, ele saiu da cozinha, perguntou o que queria comer, ali não tinha garçom, era ele que saia, perguntava o que queria o cliente.

Isso fez graça ao homem, olhe bem para mim, me prepare o que quiser.   Lhe trouxe de entradas uns acarajés que tinha acabado de fazer, lhe preparou um Vatapá, pois tinha comprado tudo fresco na Cobal essa manhã, de sobremesa, lhe trouxe um bolo de mandioca, que tinha feito de madrugada, antes de sair para o mercado. 

Ernesto dizia que ele dormia pouco.   Ele ria, nada disso, eu quando saio do restaurante, só fazia o almoço, deixava a cozinha brilhando, ia para seu pequeno apartamento, caia no sono, se levantava lá pelas sete horas, preparava os doces, fazia todos esses doces que a garotada adora, bananada, cocadas, brancas, negras, olho de sogra, preparava as bandejas, no dia seguinte entregaria a duas senhoras que ficavam sentadas na porta da casa vendendo, ele as pagava bem.   Sempre era uma maneira de ganhar mais um.

Uma vez por semana, telefonava do orelhão da esquina para sua mãe, essa tinha decidido viver ali no terreiro, o homem que tinha amado, não estava mais, tinha virado a Yao preferida da Senhora.  

Voltando ao cliente, viu que ele cada coisa que comia, anotava num caderninho.  Não foi embora em seguida como faziam os clientes, esperou que ele terminasse de limpar a cozinha, fez uma entrevista com ele, lhe contou que escrevia numa coluna de culinária do O Globo, estava escrevendo artigos, sobre comidas de boteco.  Mas tinha se surpreendido com ele.

Bom a comida daqui, está sempre fresca, vamos ao Cobal de madrugada, compro tudo fresco, assim o que tiver de melhor nesse dia, é o que eu ofereço ao cliente.

O homem baixinho, lhe disse, devias abrir um restaurante, para ti, lhe entregou o cartão, que dia estas livre?

Nunca, eu trabalho de domingo a domingo.

Lhe perguntou se faria uma grande comilança, que queria oferecer aos amigos, me telefona, combinamos.

Ele comentou com tia Nuncia.

Caralho soltou ela, esse homem é famoso, olha aqui no cartão, se faz chamar de Apicius, o primeiro grande cozinheiro que se conhece.  Mas embaixo estava escrito o nome Marcus Silveira.

Logo que saiu a crônica na revista de domingo, o botequim ficou cheio, claro como todo donos, a ganancia falou mais alto.  Ele pediu um aumento, o dono miserável, lhe deu um aumento mixuruca.

Tomou coragem, incentivado por tinha Nuncia, telefonou para o Marcus Silveira, quando contou a história, ele riu, sempre é assim, os donos de restaurantes nunca reconhecem que se não fosse pelos cozinheiros não seriam nada.

Aproveitou, que o dono ia fechar por uns dias, para aumentar o mesmo, pintar, colocar mesas novas.

Combinou a tal comilança.  Só preciso seu Marcus, de um furgão, para ir ao Mercado logo cedo, depois na feira de São Cristóvão, depois sou todo seu.

No dia combinado, apareceu um furgão, ele tia Nuncia, tinham descido, para o largo, para não chamar muita atenção.  Depois foram para a casa do jornalista, que vivia numa bela casa na Gávea.

Os dois se meteram na cozinha, prepararam uma moqueca de lamber os beiços, de entrada ele fez acarajés, uma salada de feijão fradinho com polvo, regada no azeite, cheiro verde, os doces trouxe de casa, um belo manjar de coco, bolo de mandioca, o Marcus tinha contratado dois garçons.

Foi um sucesso, todos queriam receitas, mas isso nem pensar, quando saíram da cozinha, depois de se assearem, cada um com seu turbante do seu santo, receberam uns aplausos merecidos.

Marcus sentou-se com os dois, disse claramente estão perdendo tempo nesse boteco, eu abriria um lugar pequeno para não perder a essência, no centro da cidade, que fechasse aos domingos, afinal é um dia para descansar.  Um olhou para o outro, soltaram ao mesmo tempo, não conheço o centro direito para isso.

Entraram no carro com ele, vou te mostrar um lugar que herdei recentemente, não quero ser sócio, só cobrarei o aluguel.  Era ali na rua do Ouvidor no final, já quase Beco do Teles, o movimento aqui é durante a semana e no sábado.   Era um botequim antigo, precisava sim de uma reforma na cozinha e no banheiro.  Uma pessoa na barra, esse homem que levou vocês para fazer compras, trabalhou aqui, pode cuidar da barra, atender os clientes.

Ou então mantem como gostas, atendes tu, tem lugar para poucas mesas, bem como algumas na rua.

Depois de muito conversar, tia Nuncia disse que tinha umas economias, ele não tinha mexido no seu dinheiro, que só rendia.  Nem tinha tempo para gastar direito, podemos colocar uma senhora vestida de baiana, vendendo doces ali ao lado.  Assim a sobremesa vem dela.

Mas usaremos cada dia a roupa de um santo.

Fecharam negócio, mas honestamente avisaram o dono do botequim que iam se mudar, o homem não gostou nenhum pouco pois imaginava ganhar mais dinheiro em cima deles.

Tinham sido honesto, não tanto como ele, mas iniciaram as reformas, a cozinha ficou moderna, o banheiro também, reformaram o balcão, segundo Nestor, o homem que o levava de compras, era bom estar bem surtido de cerveja, caipirinha, algum que outro refrigerante.

Assim fizeram, deram nome ao lugar, como o da sua mãe, Comida de Santo.  No sábado sempre tinha feijoada, resolveram usar louças de barro, pois eram mais fácil de substituir.

Os dois na cozinha apesar de pequena se apanhavam, Nestor os apanhava de manhã, já carregavam o tabuleiro da baiana, que era uma conhecida da tia Nuncia, compravam peixes, tinham sempre na carta, uma moqueca, o prato do santo do dia, acarajé, foi um sucesso.

Nestor sabia como as pessoas gostavam de cerveja, estavam sempre super geladas, tinha na parte de cima, um congelador, que ele ia repondo, no sábado trazia seu filho para ajudar, a servir as mesas.   As vezes tinha fila de espera.  Quando saíram outra vez no Apicius, era a semana inteira, quando chegava no fim do sábado, estavam sonhando com o domingo, para dormirem até tarde.

No domingo de tarde, sempre subia para ver seu Exu, colocar agua nas quartinhas ele mesmo, embora ali tivesse uma Yao, para fazer isso.

As vezes tinha uma aventura, mas não passava disso, não tinha tempo para romances loucos, nunca tinha saído para boates, ou coisa parecida.  Primeiro não era bonito, era ajeitado como dizia tia Nuncia.

Um dia Marcus apareceu com um cozinheiro francês, esse ficou louco com ele, se meteu na cozinha para ver os dois trabalharem.

Uma vez por mês passaram a ir ao seu restaurante para fazer uma comida especial.  Viu que ele queria era aprender.

Um dia disse para tia Nuncia, esse sem vergonha, quer é roubar nossas receitas, não vamos mais.  O homem insistiu, mas alegaram que era seu dia de descansar.

O mesmo tentou fazer igual, mas claro o pulo do gato ele não sabia.

Marcus não gostou muito, em represália, aumentou o aluguel.   Mas ele era malandro velho, o obrigou a respeitar o contrato até o final.  Andou bisbilhotando por ali.

Tia Nuncia, disse que estava muito cansada, já não tinha idade para tanto movimento.

Ele tinha conhecido uma mocetona na casa de santo, a chamou para trabalhar com ele. Fechou o restaurante, na surdina foi visitar primeiro sua mãe.

Estava muito envelhecida, passou uns dias com ela, voltou a sua luta.

Pensava em abrir em Copacabana, mas viu que os alugueis eram absurdos.  Um dia conversando com um sujeito, ele disse que tinha um no Leme, bem situado, a pessoa que ocupava o local, ia se aposentar.

Foi dar uma olhada, tinha uma boa clientela, o grande problema, era que abria ao meio-dia, bem como de noite.   Bolou uma carta especial, de dia uma comida mais pesada, de noite muito peixe, saladas, tira gosto.  O homem lhe ofereceu um pequeno apartamento logo em cima, assim ele podia entre um horário e outro dormir um pouco.

Montou um esquema, diferente, ia a Cobal logo cedo, deixava tudo preparado, para o meio-dia, que ali era mais tarde, a hora que o pessoal saia da praia, depois descansava, voltava de noite, Nini, sua ajudante, começava a preparar saladas, ele entrava com sopas, ou seja tinham comida para a noite, além claro de uma serie de tira gosto.  Funcionava muito bem, nunca mais claro saíram na coluna do Apicius, tinham deixado o Marcus na mão.

Manteve o Nestor como sua mão direita, para irem ao mercado, de noite seu filho coordenava os garçom.    Os turistas adoravam, era uma comida diferente.  Finais de semana, queriam comer a famosa feijoada do Mestre Canjica.

Conheceu um americano, se apaixonou, era totalmente ao contrário dele, alto, magro, cabelos negros, barba, olhos azuis, Tim O’Brien, trabalhava numa companhia americana.

Ele adorava sacanagem, principalmente dizia que não entendia como ele sendo baixinho tinha um caralho tão grande.

Um belo dia, disse que voltava para os Estados Unidos, iria trabalhar em NYC, por que não vens comigo?

Ele ainda pensou, me engana que eu gosto, aqui eu sou o rei da cocada, mas lá, como vai ser.

Quando chegou o inverno, foi com a desculpa de tirar umas férias para ver como era o ambiente, claro quando chegou o Tim, já tinha outro namorado.

Ele sabia que esse homem não podia ficar sem uma coisa dura na mão, riu muito quando pensou nisso.    Este lhe pediu, fez uma comida boa para os amigos dele, ficaram como loucos.

Foi para ficar uma semana, ficou quinze dias, fez várias comidas, nas casas dos amigos dele, mas cobrando, que malandro que é malandro não bobeia.

Acabou gostando da cidade. Mas claro viver lá era caro, bem com montar um negócio requeria dinheiro.

Voltou para o Brasil, levou mais um ano, com o restaurante, foi a Bahia porque sua mãe tinha morrido.

Conversou com a Senhora, agora muito velha, ela disse para ele que no jogo, aparecia que ele devia se arriscar, mas primeiro faça como fizeste, trabalhe de empregado.

Pensou muito a respeito, conheceu clientes que ficavam num hotel ali perto, um era cozinheiro em Paris, lhe disse que tinha uma comida excelente, mas precisava a ter requinte.

Perguntou como se preparava uma comida para entregar ao santo.

Primeiro o levou ao terreiro, pois ele tinha curiosidade, a mãe de santo, lhe disse para oferecer uma comida para Nanã que era a santa de cabeça dele.

Ele preparou um sarapatel, além de um mungunzá. Arrumou tudo em tigelas brancas.

O Pierre lhe disse, isso é uma boa apresentação, mas imagine isso, num prato de qualidade, arrumado a perfeição, sem o exagero de comida que vocês fazem aqui.  Um prato aqui, comem mais de uma pessoa, não me admira que os pobres sejam gordos.

Pierre conversou muito com ele, claro na cama também, se sentiam atraídos um pelo outro, contou que tinha ao lado de seu restaurante um armazém, se ele quisesse abriria ali um Comida de Santo, Mestre Canjica ria muito, pois a pronuncia era ótima. Fazes uma pequena cozinha ligada à minha, para não ter problema de licença, montas como queres, eu te alugo o local, mas o dono serás tu, nada de sociedade, minha experiencia é horrível.

Pensou muito, quando Pierre estava para ir embora aceitou.  Passou para frente o seu, colocou todo seu dinheiro no Banco do Brasil, assim podia mover para lá.  Lhe deram um cartão de crédito de muito valor.

Claro sair do Rio pleno verão, pegar o inverno de lá, foi duro, conseguiu um pequeno apartamento, justo a volta da esquina.   Primeiro ficou uns meses trabalhando com o Pierre, os dois eram iguais na cozinha, falavam o estritamente necessário.

Aprendeu a ir aos mercados aonde tinham os produtos africanos, similares, evidentemente a comida dos santos vinha de África então era fácil, com o quiabo, foi montando uma carta, mais comestível, ao mesmo tempo que foi reformando o local, sem pressa nenhuma, usando o salário que Pierre lhe pagava.  O medo do Pierre era outro, que ele se apaixonasse por algum francês.

Tira isso de tua cabeça, mon cher ami, lhe dizia, não sou de aventura, se estou contigo, me basta.

Mandou fazer toalhas com tecidos africanos, um dos cozinheiros do Pierre era de Benin, sabia já fazer algumas coisas.   Tinha feito curso de doces, os apresentava os de Brasil de outra maneira, acrescentou alguns doces da cozinha mineira.

Primeiro era fazer um boca a boca, disse ao Pierre, vou fazer umas quitandas, colocar duas africanas vestidas de filhas de santo, distribuindo, pequenas porções.

Lhe apareceram duas emigrantes da Bahia, aí foi fácil, com seus turbantes, colares de contas, não queria guias, mil balangandãs, chamavam atenção.  Abririam de terça a domingo, descansariam segunda-feira.

Logo na primeira semana foi super bem, claro, agora era a propaganda boca a boca. Pierre bem relacionado, convidou críticos gastronômicos para irem almoçar, ou jantar.

A cerveja era servida como no Brasil, muito gelada, bem como uma das meninas fazia caipirinha, as apresentavam em pequenos copos, para as pessoas provarem.

Nos sábados tinham feijoada, que ele se virava para fazer, pois faltavam ingredientes, mas as pessoas não sabiam disso.  Improvisava.  Servia em pratos que tinha mandado fazer, todos de barro esmaltado.   O próprio prato estava dividido em partes, uma para o feijão, outra para o arroz, para a farofa, dai por diante.  Doces, os de sempre, mas agora como sabia fazer sorvetes, apresentava o bolo de mandioca, com um sorvete de maracujá. Era um contraste na boca do cliente.

Aos domingos, tinha um fornecedor de peixes, que lhe trazia logo de manhã, os que ele queria para fazer uma moqueca.  Ficou conhecido também como um restaurante de comida de mercado, estava sempre cheio.  Mas na segunda feira, era seu dia de descanso, além de visitar um africano Babalorixá, que tinha conhecido, fazia suas obrigações.

Esse quando foi ao restaurante, ficou encantado, nos meses de inverno, como era uma comida quente em calorias, tinham reservas imensas.

Não voltou ao Brasil nem para férias.   Muita gente aparecia, para propor franquias, mas ele sabia que isso podia lhe dar dinheiro, mas também muita dor de cabeça.

Pierre tinha se transformado, além de um grande amigo, numa pessoa que ele confiava, amava.

Quando desceram umas férias para a zona do Mediterrâneo, ele lhe disse, aqui, quero ter meu repouso de guerreiro, um restaurante pequeno como o de Paris, para os meses de verão, no inverno só abrir ao meio-dia.  Pela primeira vez, os dois iam trabalhar lado a lado, Pierre tinha aprendido a fazer tudo.  Alia inclusive podia trabalhar mais com peixes frescos.

Foi o que fizeram, venderam tudo em Paris, antes convidou todos os jornalistas que tinham lhe dado apoio nesses anos todos, para uma grande despedida, preparou, um grande banquete de comidas de Santo.   Foi uma reportagem impressionante, dando a dica de aonde estariam os dois a partir de agora.

Montaram um perto de Cassis, numa vila muito pequena, junto ao pequeno porto de pescadores, no verão aquilo fervia. No inverno desfrutavam da casa que tinham construído, um pouco mais afastado, numa pequena praia, ali ele tinha seus santos, integrados a natureza.

Quando viu tinham se passados muitos anos, um dia se olhou no espelho, tinha seus cabelos todos brancos, bem como o Pierre. Agora tinham cozinheiros, que aguentavam a carga, passavam mais tempo desfrutando um do outro.

Levou o Pierre a primeira vez a Bahia, lá ficou sabendo dos irmãos, tinham perdido toda a fortuna do velho, em imensas brigas.   Ele visitou o tumulo do pai, bem como de sua mãe, soube depois que o pessoal do terreiro, tinha conseguido enterra-la justo ao lado do dele.

A nova senhora do terreiro, o recebeu muito bem.  Conversaram muito, pois tinha conhecido sua mãe.

Voltou mais tranquilo para a França, de lá já não se moveria mais.

SCARFACE

                                         

Meu nome é Brian Palmer, mais conhecido pelos amigos, parentes como o Scarface, pela imensa cicatriz que vem da parte da coroinha da cabeça, até a mandíbula, do lado direito do rosto, além de ser cego desse olho, que permanece costurado, pelos médicos. Além de assustar as pessoas, com outro detalhe, do meu ombro direito sai uma armação de metal, como os antigos lutadores medievais, que vai até meus dedos, tudo isso do lado direito.

As crianças quando me veem, primeiro gritam, assustada, algumas como os filhos de meu primo Jasper, morriam de curiosidade, queriam experimentar sua armadura, como diziam eles. O maior perguntava logo, se ele era guerreiro de que saga, por causa das séries de televisão.

Sou coronel do exército americano, a dois anos atrás voltei do Afeganistão dessa maneira, primeiro pensaram que na verdade estava morto.  Vinha num carro desses militares, em uma caravana, para levar medicamentos à base, por um acaso tinham vindo no mesmo avião em que eu voltava de Washington, aonde tinha ido a uma reunião da cúpula do exército.

Fomos atacados de muitos lados, o carro que ia, voou ao passar por cima de uma bomba.

Fui jogado a metros de distância, tinha meu lado direito totalmente paralisado, mal podendo me defender, primeiro fui dado como morto, até que um soldado viu que eu tentava me levantar com o braço esquerdo.

Fui levado para a base, de lá transferido de Helicóptero para o aeroporto, de lá para Alemanha.

Por não terem tempo, grampearam toda a cicatriz, depois de limpar tudo.  Ao juntarem de qualquer maneira as duas partes, ela se cicatrizou como estava.

O mais importante eram as operações que tinham que fazer, como por exemplo, salvarem o pulmão do lado direito, tudo era no lado direito, talvez porque eu estivesse encostado na porta.

Como estava dopado todo o tempo, não tive consciência de nada.  Me despertei depois de quase um mês, pois tinha estado em coma.  Segundo o médico eu tinha morrido duas vezes na mesa de operação.   Na minha cabeça, era como se eu estivesse indo em direção a luz, mas que me puxavam para trás.   Tinha sim um ruido infernal, bombas, tiros, muitos esse ruido me atordoava.  Era como se tivessem presos na minha orelha, mas claro, era minha memória auditiva que funcionava sem parar.   Eu tentava me esconder, me encolher para que nada me acertasse, mas tudo isso era fruto da minha imaginação.

Quando despertei, que o médico falou comigo, eu imediatamente tomei consciência, lhe disse que não queria tomar nada que me pudesse viciar.  Tinha visto vídeos recentemente de justamente isso, muitos soldados viciados em drogas.

Quando tentei levantar meu braço direito, vi que não podia.  Ele o levantou para mim. Estas usando um novo tipo de prótese, curamos todo seu braço, mas ele perdeu o movimento. Esta malha, vai da tua mão até o ombro, bem como depois te mostramos, está ligada a um chips na tua cabeça do lado esquerdo, que coordena os movimentos.

Tuas pernas já estão curadas.   Mas por último, deixamos a cicatriz, pois os médicos esperam recuperar teu olho.  Por isso não mexemos em nada, não temos médicos aqui especializados.

Me mostrou a cicatriz, era horrível, como tinha juntado a carne, de qualquer maneira, parecia uma coisa mal costurada.   Atravessava toda minha cara, desde a parte detrás da minha cabeça.

Quando estive melhor, me transferiram para um hospital militar em San Francisco.

Meu primo Jasper me veio visitar, trazia minha avó com ele.  Os dois basicamente fomos criados juntos.  

Tínhamos a mesma idade, nossas avós eram irmãs, gêmeas, dai sermos tão parecidos os dois, ele também tinha dois irmãos maiores gêmeos.   Mas parecíamos crianças clonadas como dizia minha avó Britanie.  Quando estávamos todos juntos, era uma gozada, brincávamos, de trocar nossa roupa, para fazer confusão, pois quando nos chamávamos, para ir embora, as vezes dentro do carro, se davam conta, tinham que voltar para trocar as crianças novamente.

Eu me divertia, os maiores não.  Eu vivia com minha mãe, que em paz descanse, na casa da minha avó.   Ela era viúva de um piloto da aeronáutica, que tinha sido abatido no Iraque. Nunca o encontraram.   Então como ela dizia, era viúva de ninguém.

O jeito foi irmos morar com a minha avó, para que ela pudesse trabalhar, morreu no 11N, estava numa das torres, a primeira, segundo me lembrava.  Agora era filho de pais desaparecidos.

Fui criado, educado por minha avó, quando os outros diziam coitadinho, ela ficava uma fera, pois dizia que disso nada, eu era um homem, que tinha que aguentar as coisas da vida.

Isso eu tinha uns 14 anos, era um aluno exemplar.  Nessa época coloquei na cabeça que tinha que ser militar.   Não houve maneira, mas claro com os antepassados que tinha, fui para academia militar para estudar.

Jasper ao contrário, era investigador da polícia.  Era o melhor da polícia de NYC, tinha muitas medalhas, foi sendo promovido.

Quando os dois me vieram visitar, a enfermeira antes, por causa da idade de minha avó, avisou, não se assustem com sua cara, pois isso afeta dos visitantes.  A senhora se coloque do lado esquerdo da cama, por aonde ele possa a ver.

A coitada, nervosa, se colocou ao lado direito, então a primeira coisa que viu, foi o que não deveria, tiveram que colocar uma cadeira imediatamente para ela se sentar.  Ficou ali segurando minha mão, cheia de malha de metal.   Nessa época ainda não sentia nada da mão, levaria meses, ou melhor um ano para sentir os dedos.  Pedi ao meu primo, que a colocasse do outro lado, pois não podia vê-la direito.

Pareceu se relaxar.   Ficou segurando minha mão, a levava ao seu rosto, como quando contou o de minha mãe, a beijava muito.  Para mim ela estava como sempre, com seus cabelos brancos perfeitamente arrumados num coque.

Jasper se sentou ao lado dela, tinha que falar devagar, pois a cicatriz repuxava minha cara, fazendo com que a cicatriz ficasse mais feia, além de ter uma certa dificuldade para falar.

Disse a ele que não sabia quando sairia dali, teria que ir antes para um outro hospital para fazer fisioterapia, para aprender a usar meu braço, a cara ficaria por último.  Os médicos não sabiam ainda do meu olho, vinham olhavam, tornavam a costurar as pálpebras novamente.

Eu rindo disse, como não posso ver a cara deles, só sei que balançam a cabeça, mas nunca dizem nada.

Como tens tem alimentado, me perguntou ela, isso para ela sempre era importante, na sua cabeça eu sempre estava magro, mas claro tinha crescido muito rápido, na família todos éramos altos, mas meu pai tinha 1,90 de altura, nas fotos que existiam dele, eu parecia um boneco nas suas mãos.   Na verdade não me lembro dele, mesmo com as poucas fotos, para mim ele nunca existiu.   Minha mãe, era alta também para uma mulher, elegante, sempre arrumada, cheirando bem, eu adorava quando ela chegava em casa, a primeira coisa que fazia era se jogar numa poltrona, jogar para o alto, seus sapatos, pedido pelo amor de deus uns chinelos.

Eu ia correndo buscar.  Na, verdade, os deixava de uma maneira, para logo correr por eles, me jogar nos braços dela.     Me dizia, me solta os cabelos, usava um coque como da minha avô, rindo me dizia meu filho é esperto.  Como sabia aonde ela ia se jogar, deixava ali, a caixa de grampos de cabelos, bem como uma escova, pois em seguida, pedia me dando beijos, se eu podia escovar os mesmo, era largos, loiros, eu amava fazer isso, era como prestar um serviço, pago com beijos.   Minha avó entrava com uma bandeja de martinis, para as duas.

Minha mãe dizia para ela, devíamos ter um móvel bar, para não vires com isso da cozinha, ela mesma o comprou, horas antes dela chegar, colocava a garrafa de martini num balde com gelo, para ficar como ela gostava, muito gelado.   No dia que morreu, eu fiz igual, já tinha aprendido a preparar o martini como ela gostava.   Minha avó, estava sentada no sofá, com o telefone do lado, esperando alguma notícia.  Mas não tivemos nenhuma, o pai do Jasper, também tinha morrido no mesmo atentado.  A ele se pode enterrar, minha mãe não.   Ela estava justamente no andar que tinha se chocado o primeiro avião.

Nunca se encontrou nada.

Eu alimentava esperança, imaginando que no momento, ela devia estar em outro lugar, como por exemplo ter ido comprar café, ou fazer algum serviço externo.

Nas claro tudo era fruto da minha imaginação.  Apesar da minha idade, passei a me sentar com minha avó no final do dia, para tomar martini.  Substitui a mesma falando como tinha sido o dia. Foi justamente num final de tarde, que disse que tinha conseguido me inscrever na escola para ser militar.   Ela chorou muito, me perguntou se eu não tinha outras opções, ou sonhos, já perdemos muita gente nessa família.

Os dois ficaram ali, uma semana, depois chegou à família do Jasper, iriam de férias a praia.

Ela queria ficar, mas eu disse que não iria em seguida para o outro hospital.  Pedi ao Jasper que cuidasse dela.   Sua avó agora vivia com a minha, as duas estavam viúvas, se faziam companhia.

Levei quase um ano e meio, para sair do hospital, aonde além de fisioterapia, fazia terapia com um psicólogo, principalmente por causa dos ruídos.  Se uma bandeja de metal caia no chão, eu tinha ataques de pânico, o que me dava certa vergonha.

Um dia estávamos no jardim do hospital, eu com um enfermeiro que me ensinava a mover-me com um olho só, quando uma ambulância, deu a saída, houve um estampido do tubo de descarga, joguei o enfermeiro no chão, pensando que era um tiro, fiquei em cima dele, querendo proteger.

Quando fiquei calmo, riu, dizendo, se querias me montar, era só pedir, abaixava as calças rapidamente.

Ele o tempo todo cuidava de mim, talvez por isso não tinha horror a minha cara, tinha se acostumado, as vezes vinha ao meu quarto de madrugada, fazíamos sexo. 

O que me incomodava, era que se fazia carinho, só do lado bom.

O dia que reclamei disso, acabou confessando que lhe dava um certo horror, tocar nessa parte.

Pois era aí, que eu queria um carinho.

Só sai do hospital, para ir a NYC, para o enterro de minha avó.  Quando Jasper me avisou, tomei um avião, evidentemente todos olhavam para mim no aeroporto, ele foi me buscar no aeroporto.  Me abraçou muito, sabia o quanto amava minha avó.

O féretro estava na igreja que ela frequentava, me fez entrar por uma lateral, para não ter que aguentar as velhas amigas dela, sabia que todas me fariam perguntas, me sentei ao lado de sua família.  Porquê da minha a única pessoa que restava estava dentro da caixa.

Mas na saída claro, tive que aguentar, os olhares de pena, o filho mais velho do Jasper, ficou segurando minha mão, de gladiador como ele dizia.

Mas as putas velhas queriam era olhar a minha cara, fingi que não me incomodava.  Usava agora um parche em cima do olho morto.  Já sabia que não havia solução, quando fizesse a cirurgia estética, me colocariam um olho de vidro.   Usava minha cabeça de uma maneira que podia ver tudo como se tivesse dois olhos.

Dentro de meses sairia do hospital definitivamente, já tinha movimento suficiente, bem como tinha aprendido a usar meu braço biônico, isso era o Jasper que dizia.  Um dia de gozação, me disse ao ouvido, bater punheta com essa mão deve ser fantástico.  Eu lhe respondi rindo, coloque o teu para fora que faço para ti.   Quando erámos garotos, fazíamos isso, um masturbava o outro.

A única que nunca se aproximava muito era sua mulher, dizia que não podia se controlar me olhando, lhe dava medo.

Fomos os dois a leitura do testamento, minha avó me deixava sua casa, bem como seu velho carro, uma boa soma no banco.   Não me preocupava, se não quisesse seguir no exército, teria uma boa aposentadoria.

Voltei para Washington, estive falando horrores de minha avó para o psicólogo, de uma certa maneira ela tinha sido como uma mãe para mim.

Agora eu corria pelos jardins do hospital, para me manter em forma, conseguia mover o braço como se fosse normal, já não ficava pendurado.

Resolvi me aposentar, me chamariam em breve para fazer a cirurgia plástica.  Segundo o médico, não ia melhorar muito, tinha feito um escâner perfeito da minha cabeça, ficaria eternamente com essa cicatriz, mas um pouco menor.

Eu sabia que tinha um corpo bonito, tinha 1,90, ombros largos, pernas largas, gostava de correr. Quando cheguei a NYC, com minha pequena bagagem, meu uniforme, roupas normais não tinha nenhuma.  Pedi ao Jasper, precisava de roupas para meu dia a dia, bem como roupas para correr, tinha deixado no hospital a que tinha usado, pois estava velha e fedia muito.

Ele riu a bessa, me indicou ao abrir o porta malas, duas maletas, roupas que minha mulher separou para ti, tínhamos o mesmo corpo.

As de esporte, estão novas, pois sempre digo que vou começar a correr, mas nunca o faço, já basta o que corro atrás dos bandidos.   Não acreditei muito, mas concordei.

Ele de uma certa maneira me protegia.  Sabia que se entrássemos num shopping, a quantidade de gente se afastando, os olhares tudo isso, era incomodo.

Queria que eu ficasse na sua casa, era uns dois quarteirões da casa da minha avó, mas lhe pedi desculpas, pois queria ficar sozinho.  Estava acostumado a isso.

Dentro de dois meses voltaria a Washington para a cirurgia definitiva da cara, bem como colocar o olho de cristal.

Só pedi que me ajudasse numa coisa, eu tinha pesadelos, os quartos da casa, davam para as casas vizinhas, o único que não, pois ficava numa esquina, era o que minha avó usava como biblioteca, bem como aonde nos sentávamos sempre para o martini.

Assim se eu gritasse de noite, não assustava os vizinhos.  Era um bairro de Staten Island, residencial, com casas antigas, mas todas muito bem conservada.

Não sabia o que ia fazer com o carro da minha avó, lhe comentei isso, já que nunca tinha gostado de conduzir, com um olho só, não sabia ainda o que fazer.

O carro a muito tempo não está aí, tive que tirar da tua avó, era um perigo conduzindo. Depois como fazia tudo andando, não vejo por quê.

Eu fiquei rindo, sua avó tinha morrido um meses antes da minha, as duas só saiam de casa, para irem jogar bridge com suas amigas.  Depois de uns quantos martinis a mais, imaginava o perigo nas ruas tranquilas.

A despensa como a geladeira, estava cheia, quis lhe pagar, mas não aceitou, eu ia contratar a mesma senhora que vinha fazer comidas para minha avó, as deixava todas prontas, era só esquentar no micro ondas.  Agora quem vem é a filha dela, pois tens que aceitar que ela já estava velha.

Nessa noite, talvez por me sentir em casa novamente, dormir como os anjos.  Me levantei, coloquei uma roupa para correr, fazia calor, coloquei uma camiseta sem manga.  Sai correndo, mas claro, me esqueci completamente dos vizinhos, as senhoras nessa hora saiam com as crianças para levar a escola.  No primeiro quarteirão em direção a beira do rio, aonde tem uma pista, só escutei gritos das crianças, das mulheres, que levavam um susto ao me ver, uma inclusive chamou a polícia que me alcançou.   Um policial, pediu desculpas, mas acabas de assustar todo mundo, com esse braço, com a sua cara.

Eu sabia, pedi desculpa mas tinha esquecido disso. Mas continuei saindo uns dois dias mais, até que resolvi, sair de madrugada, me levantava as cinco, me preparava, tomava um café, saia, depois o fazia no final do dia.

Um detalhe, quando fui olhar as roupas que me tinha trazido o Jasper, metade ainda estava com a etiqueta.

Lhe disse que não precisava me proteger, não queria ofender, mas eu tinha que enfrentar a realidade.

Quando saia pela tarde, passava em frente a casa de um amigo de escola, perguntei a ele pelo Jasper, me contou que agora era um milionário, trabalhava na bolsa de valores, era casado com uma milionária também.  Um dia os vi, cada um chegava com um carro do último tipo, mas vi que não gostaram muito de ter que me encarar.  Deixei de procurar.

Agora saia cada vez mais cedo, pois, o era a hora que estava mais frescos, do lado do braço com a armadura, não podia colocar a malha, pois se desfiavam, então cortava a manga.

Me vesti como todos os dias, tomei um café bem forte como gostava, a essas horas a ruas estavam vazias, assim não incomodava ninguém, me cruzava quando muito com alguns que saiam para correr a essa hora.  Para ir em direção a pista ao longo do rio, tinha que passar em frente da casa dos antipáticos como eu dizia.

Estava quase chegando, quando escutei tiros, me escondi instantaneamente, vi que duas pessoas saiam com os carros, quando venci meu terror, vi que as casas vizinhas acendiam as luzes, mas ninguém saia fora.  Me aproximei, já com o celular na mão chamando o Jasper, vi o nosso conhecido estendido no chão da garagem aberta.

Jasper atendeu sonolento, lhe contei o que tinha visto, dois homens saíram, com os carros, os vi de longe, nosso conhecido está estendido no chão da garagem com um tiro na cabeça, fui falando com ele, enquanto ele se vestia, olhei pela janela do salão, o mesmo parecia ter acontecido com a mulher, lhe disse que me sentava nos degraus da casa, esperando por ele.

Mas claro antes chegaram os policiais, que me queriam colocar uma algema, tinham me feito deitar no chão.  Quando ele chegou, se apresentou, disse que podiam me soltar, pois eu tinha dado o alarme.  Contei tudo para ele, bem como para o inspetor da polícia local, falei dos carros fantásticos que tinha, saíram os dois da garagem, um virou à direita outro a esquerda, talvez para despistar.  Eu tinha boa memória, disse o tipo de carro, eram desses feitos especialmente para as pessoas, bem como a matricula.

O inspetor, me disse olhando diretamente na cara, já sei quem es, li o resume quando te denunciaram por assustar as crianças dos vizinhos, quando deviam ter render homenagens.

Filhos das puta, sempre com medo de tudo.

Agradeci o comentário, eu entendo, não sou uma figura agradável de ver, além de estar também como eles, me acostumando outra vez a viver no meio de gente pseudo normal.

Ele adorou o pseudo normal, estendeu a mão Jorge Patrick, antes que me pergunte, sou filho de um português com uma irlandesa.

Examinaram a casa toda, eu disse que passava ali todas as manhãs, por essa hora, mas que nunca tinha visto nenhum movimento na casa.

Os dois tinham olhado tudo, disseram que a casa estava toda revirada.

Eu perguntei se podia seguir com a minha rotina.  Estava já uma hora atrasado, qualquer coisa eu estaria em seguida em casa.

Fiz a minha corrida, desta vez cruzando com mais pessoas, claro quando voltei, era a hora que as crianças iam a escola.  Não me importei, os gritos eram menores.  Uma senhora me parou, era professora da escola, me perguntou se eu podia ir a mesma assim a crianças me via de perto, eu contaria o que tinha me acontecido, será melhor para o senhor, bem como para elas, sabe como essas mulheres que não trabalham são frescas. tudo as assustam.  Menos os preços das roupas que compram para irem simplesmente ao supermercado.

Era uma verdade, quando ia ao supermercado, as mulheres pareciam que estavam num desfile.

Quando Jasper soube do que andava fazendo, se matou de rir.  A mulher que ele tinha contratado para ir fazer a comida, no dia que me viu desmaiou.  Eu disse que não precisava mais ir, comecei a ver programas de televisão na cozinha, bem como encontrei o livro de receitas de minha avó, marquei as páginas que me interessavam, assim eu mesmo me ocupava fazendo a comida.

Nessa tarde o inspetor Jorge apareceu, justo quando estava fazendo um bolo, receita antiga da minha avó.    Me soltou sem mais nem menos que quando muito sabia fritar um ovo.

Acabou ficando para jantar, antes enquanto tomávamos martini, eu disse que era a bebida da casa, preparei como fazia para minha mãe, ficamos conversando, ele me perguntou o que eu sabia do casal.  Lhe disse que ele, era conhecido da escola, quando fui cumprimenta-lo, a mulher me olhou horrorizada, nunca mais parei nem para dizer bom dia.  Tudo que sei que tinham esses carros fantásticos, como ganham a vida, ou se tem dinheiro, ou inimigos, não tenho menor ideia.  Contei sem vergonha nenhuma meu instinto, quando ouvi os tiros, que tinha me escondido, fiquei tremendo um tempo até me controlar, foi quando vi os carros saindo.

Que da porta da garagem tinha visto que o homem tinha um tiro na cabeça, por isso nem entrei, depois olhei pela janela, a vi caída num charco de sangue no meio do salão.

Perguntei se eles tinham algum cofre, se guardavam dinheiro em casa, o que seria um chamariz.

Isso não sabemos, sabemos sim que ela trabalhavam com diamantes, vem de uma família de judeus ricos da cidade.

Depois ficamos conversando, enquanto jantávamos.  Me elogiou outra vez pela comida, quando foi embora, me olhou de frente me perguntou se podia voltar outro dia.

Lhe perguntei diretamente por quê?

Quero te conhecer melhor, foi a resposta.

Tive que rir, atualmente meu único amigo era o Jasper, mas claro isso desde a infância.

Lhe disse que se viesse, não estranhasse se não estava, que dentro de dias iria a Washington para me operar.  Sem mais nem porque, passou a mão afetuosamente na minha parte com a cicatriz.   Ok, quando tenha tempo, virei aqui, agora estamos atrás de quem fez isso aos teus vizinhos.

Dois dias depois me chamaram, chamei um Uber, logo de manhã, fui para Washington, fui direto para o hospital, fizeram como sempre todos os exames de rotina.

Só não podiam me colocar no scanner pois meu braço ficava preso no teto.

A operação deve ter durado horas, quando sai, tinha a cabeça toda enfaixada, parecia uma múmia.   Agora havia de esperar, dias depois tiraram a parte enfaixada, o médico disse para quem esperava problemas, não havia nenhum.   A cicatriz agora era como uma linha, pode ser com o tempo, fique parecendo uma arruga.  No dia anterior tinha aberto uma parte, me colocado a prótese do olho.   Quando me vi, finalmente uma semana depois, estava com melhor aparência.  O olho de cristal, ficava bem preso, não era necessário tirar de noite, nada disso, tampouco ele se moveria.  Seria como um olho estático.

Telefonei ao Jasper, riu muito dizendo, que fizeste com o inspetor Jorge, não para de perguntar por ti.

Nada lhe respondi, lhe ofereci um jantar.

O estás prendendo pela barriga, um bom começo.  Tenho dias livres vou te buscar no aeroporto.

Ainda tinha manchas na cara, mas a aparência era melhor.    No avião, vim pensando o que poderia fazer, pois, precisava me ocupar, fui escrevendo o que era necessária ter dois olhos, para trabalhar.

Jasper, me abraçou, dizendo apesar das manchas, tens uma cara fantástica.

As crianças estão loucas para te verem.  Fomos falando do caso, não era seu, mas Jorge o tinha consultado várias vezes, sobre a vida dos dois em Manhattan, tinha descoberto, que ele tinha feito algumas merdas, muitos clientes estavam arruinados por causa dele.   Inclusive algum capo da Máfia, para quem ele lavava dinheiro.

Almocei na casa do Jasper, com toda a família, seu filho mais velho como sempre se colocou ao meu lado.  Os outros ainda mantinham distância, este me fez uma série de perguntas, mas nada tontas.  Se podia mover o olho, como funcionava, etc.

Era muito esperto, inteligente.

Depois fui para casa.  No dia seguinte retornei a rotina de ir correr como sempre fazia.  Tinha me acostumado ao horário, resolvi mantê-lo, assim o único que fazia, era ir dormir mais cedo, pois me levantava as cinco.

Não tinha o hábito de ver televisão, por isso estava na cozinha, mas só para ver programas de cozinha.

Resolvi fazer um curso, assim me preparava melhor, descobri isso, que gostava de cozinhar, tinha facilidade, pelo menos me ocupava.

As crianças quando me viam agora prestavam atenção, vendo que tinha o outro olho.

Quando Jorge apareceu com o caso, estavam com o mesmo parado, pois não tinha encontrado contas substanciais nos bancos, nada, cofres na casa.  Não entendiam por que tinham entrado na casa.

Segundo sabia a casa tinha sido inteiramente reformada, para transforma-la numa casa moderna, vocês olharam nas tomadas, as casas modernas têm justamente aí os cofres, é fácil de olhar.   Fui até lá com ele, pedi ao policial que dirigia seu carro, que tentasse puxar a tomada para fora, não deu outra, encontramos pelo menos 8 cofres pequenos, todos cheios de saquinhos de diamantes.

Era uma coisa logica, se sua mulher trabalhava com diamantes, nada mais normal, em vez de ter contas nos bancos que pudessem ser embargadas pela justiça, trocavam por diamantes, já que esse era seu trabalho, também fácil de ser transportado. 

Examinamos as maletas todas, uma realmente pesa mais que o norma, me mostrou, examinei direito, claro tinha duas placas de metal, para impedir que se visse se tinha dinheiro ou joias.

Tudo muito pensado.  Mandaste avaliar os quadros modernos desta casas.

Jorge disse que não.

Pois só esse indiquei um, se for um original de Georgia O’Keeffe, deve valer milhões, numa outra parede da sala, isso eu tinha visto pela janela, existia um imenso do Jackson Pollock, no escritório tinha um do Jean-Michel Basquiat.  Só esses três valem uma fortuna, isso se forem originais.  Busque saber se eles não tinha nenhum espaço em algum armazém.

Jorge se matava de rir, devia te contratar para trabalhar na polícia.  Quando foi me deixar em casa, perguntou o que ia ter de jantar?

O que gostarias de comer?

Ficou me olhando sério, prefiro deixar ao teu gosto, mas isso me olhando de cima a baixo.

Fiz uma receita nova que estava aprendendo nas aulas.

Ele apareceu mais relaxado, de calças jeans, camiseta, sapatos sem meias.

O esperava com um martini. 

Comentou que outro dia, tinha se reunido com os da polícia num bar, tinha pedido um, riram de mim, dizem que isso é coisa de gente fina.

Pois eu aprendi a tomar com minha avó, minha mãe, era um ritual todos os dias, nunca fomos ricos.

Depois de jantar, caiu um temporal impressionante, lhe perguntei se ficava para dormir.

Posso te arrumar algum quarto da casa.

Riu, prefiro a tua cama, foi sensacional, ele não se incomodava com o meu braço pesado nada do gênero, passamos horas nos explorando.

Estou apaixonado por ti, desde que te conheci, mas não sabia se tinhas alguém.

De manhã como era domingo, perguntou se eu ia a missa?

Jamais, deixei de acreditar em qualquer coisa, depois da morte de minha mãe.

Me disse que ia olhar quanto cobravam os consultores da polícia, pois pelo que tinham encontrado, ele resolvia o caso.

Nada disso, falta tu descobrires aonde foram parar aqueles dois carros, valem uma verdadeira fortuna, foram feitos por encomenda, mostrei na internet um anuncio dos mesmos.

Devem ter trocado de cores, placas etc.

O Fabricante, soltou na cara dele, se nem me pagaram os malditos carros, me passou ações de empresas, que agora não valem nada.

Acabou se tornando um suspeito.  Acabou confessando que tinha mandado dois homens recuperar os mesmo, que os tinha vendido em seguida, com outra placa.

Caso resolvido.

Quando Jasper soube disso, me trouxe uma série de casos sem resolver.  Me sentei com os processos, cadernetas de anotações dos detetives, comecei a ler, alguns era impossível, ler o que escreviam.  Eram casos que estavam parados, porque não encontravam suspeito.

Um tinha descartado a noiva do sujeito, porque segundo uma anotação do detetive, tinha cara de anjo, tinha chorado muito a morte dele.

Esse foi fácil demais, pois quando a abordaram outra vez, estava ameaçando o novo namorado, com uma arma, a mesma que tinha matado o anterior.

Quando viu, tinha arrumado uma fonte de ingressos nova.

Ele agora fazia uma coisa, se sentava com os detetives, depois de ler o que tinham escrito, falavam de tudo que se lembravam do caso.  Assim era mais fácil resolver.

Quando Jorge lhe perguntou como fazia, ele respondeu tranquilamente, que esse era seu trabalho.  Eu aprendi a falar árabe, farsi, todas as línguas de aonde estávamos.

Mas ao mesmo tempo, usávamos um interprete, claro esse nunca nos traduzia a 100% o que queria se saber.   Eu fazia as perguntas, pelo movimento ou comportamento do suspeito, ou mesmo do informante, sabia quando estavam mentindo, foi um largo aprendizado.

Jorge não gostou, quando o Jasper conseguiu me contratar, para observar os interrogatórios, mesmo analisar processos que estavam abertos.

Eu saia todos os dias de casa, pela manhã mantinha o meu ritmo de corridas, queria participar de uma maratona que ia acontecer na cidade.

Depois tomava um banho frio, agora usava umas camisas com mangas mais largas, que mandei fazer para o inverno, assim podia me mover melhor como braço.

A cicatriz existia, mas era uma fina marca na minha cabeça, até o maxilar.  O olho claro não se movia, mas já não metia tanto medo, raspava minha cabeça todos os dias, pois com cabelos ela aparecia mais.

Colocava um traje, tinha comprado alguns, numa loja de um amigo do Jorge, ele mandava arrumar a manga do braço direito.

Tinha com um saleta só para mim.   Agora eram os próprios detetives, que quando estavam empacados, me traziam os papeis para analisarmos juntos.

A maioria dos casos conseguíamos resolver, ou num interrogatório, eu ficava do outro lado do espelho, dava dicas, tipo, agora pergunte isso, para provocar quem estava sendo interrogado.

Sabia quando mentiam, que as histórias não tinham fundamento.

Jorge tinha medo, que eu conseguisse um novo namorado, na cidade, mas eu voltava todos os dias para casa sozinho.

Ele acabou indo morar comigo.   Além da boa amizade que tinha com ele, Jasper nos finais de semana se juntava, para uma cerveja, ver um partido.

Um dia seu filho, me chamou a parte, me falou de um professor que tinha um comportamento estranho segundo ele, com alguns alunos.

Fui procurar pelo sujeito, era um pédofilo que era procurado em Los Angeles.

Disse ao Jasper, já tens um futuro sucessor na saga policial da família, pois tinha sido ele que tinha levantado a lebre.

Claro que os anos foram passando, as vezes tinha dificuldade para manejar meu braço, fiz exames radicais, para saber por que, a princípio trocaram o chip do mesmo, mas era alguma coisa mais.   Me doía mais, pesava.

Depois de consultar vários médicos, a noticia ao final, eram desagradáveis, teria que amputar meu braço, a altura do ombro, pois estavam surgindo tumores, ao largo da malha.

Tinha duas opções, conversei com o Jorge primeiro.  Seus argumentos foram firmes, seja o que for, te quero vivo.

Quando comentei com o Jasper, foi a mesma coisa, te falta um olho, nem por isso, tua cabeça deixou de funcionar, quantos casos resolvemos pela simples observação tua.

Teria que ser num hospital em Washington, fui para lá com os dois amigos de alma. Desta vez Jasper queria estar presente, já basta que faças tudo sozinho.

Era uma maneira pelo que percebi de se afastar um pouco, seu casamento desmoronava, não sabia o que fazer.   Nos dois conversávamos muito com ele.

Sua mulher soltou um dia, que seu problema estava aí, estar todos seus momentos livres com nos dois, se não estávamos indo para a cama os três.

A operação correu bem, o horror que eu tinha, era que continuava sentido o braço, as vezes tentava pegar alguma coisa com o braço direito, tinha me acostumado a dar a ordem a minha cabeça para isso, mas claro ele não estava mais lá.

Depois de toda cicatrização, me colocaram um braço artificial, que agora usavam para alguns retornados, não era nada novo, mas funcionava como o anterior.  Ainda fiquei quase um mês por lá aprendendo a maneja-lo.

Agora minha mão inclusive parecia a mão de um robot de última geração, só não podia sentir.

Mas segui em frente, não ia dar o braço a torcer nunca, isso não encaixava comigo.

Agora Jasper morava conosco, tinha um quarto só para ele.  Arrumamos outro em cima, quando nos finais de semana tocava os garotos ficarem lá.

O seu filho como sempre, um dia, muito sério pediu para falar comigo.

Tinha escutado sua mãe falar que ele fazia sexo com os dois.

Fui honesto para ele, algo se rompeu entre teus pais, mas nada disso é verdade, teu pai continua sendo meu melhor amigo, desde nossa infância.   Ele fica esperando os dias que pode estar com vocês, os ama.   Mesmo que ele fosse realmente gay, não mudaria nada.

Falei longamente com ele a respeito, agora já tinha 16 anos, pensavam entrar para a academia de polícia, mas sua mãe era contra.   Queria que ele fosse a universidade.

Eu lhe disse, porque realmente não fazes uma, algo que gostes, sempre te vi analisando os fatos, as pessoas muito bem, pense em fazer psicologia.

Tem mais, eres meu preferido, eu pagarei tua universidade.   Talvez seja interessante ires fazer longe daqui.  Para nunca sofreres pressão para decidir tua vida, lembre-se ela é só tua.

Eu tinha um bom dinheiro guardado, não só da herança de minha avó, que ficou sendo aplicada, bem como do que ganhava como consultor.

Falei sério com o Jasper, deixe teu filho escolher o que ele queira fazer, eu pagarei sua universidade, tu te guardes para pagar a dos outros.

Tempos depois, trouxe seu irmão menor, para falar comigo, estava trabalhando em casa, estava sem camisa, agora tudo que se via, era um braço mecânico, como uma máquina de fábrica.

Me sentei conversando com os dois, agora sua mãe via que com ele não funcionava, falava com o pequeno.

Jasper estava saindo, com uma colega, lhe disse para apresentar aos seus filhos, quando viessem num final de semana, para fazermos um churrasco, assim essa história que estamos os três fazendo sexo, morre.

Me olhou, sorriu, soltou, bem que eu queria.

Nada disso, por enquanto pense nos teus filhos.

Um ano depois Jorge morreu, num assalto idiota, uns garotos, entraram numa licoreira para roubar, tomaram reféns, quando a polícia apareceu, começaram a atirar como loucos.

Uma bala o atingiu na cabeça, morreu no ato.

Fiquei arrasado, Jasper não saiu do meu lado, nem seus garotos que tinham aprendido a apreciar o Jorge.  Sua família era de Boston, extremamente católica, um irmão veio buscar o corpo, pediu que eu não fosse ao enterro, porque, ia fazer mal aos seus pais.

Acabei concordando, sabia que eles não falavam com Jorge por isso, bem como ele tinha saído de lá para poder viver sua vida.

Para quem não tinha visto enterrar seu pai, tampouco sua mãe, pensei nisso, para mim ele seguia vivo em alguma parte.

Fui com Jasper olhar a universidade aonde seu filho queria estudar, depois ele voltaria com sua mãe, esta tinha se casado outra vez.

Os meninos passavam mais tempo lá em casa que na sua nova casa.

Jasper vendeu a casa que tinha sido de sua mãe, colocou numa aplicação num banco, para os meninos poderem ir a Universidade.

Na volta, votamos os dois, paramos para dormir num motel.  Eu todas as noites tinha que retirar o braço para dormir, ele me ajudou, pois queria saber como era.  Quando ficares velho, alguém terá que fazer isso por ti.  Quando vimos estávamos na cama.

Me disse que sempre tinha me amado, quando voltaste, eu queria fazer carinho no teu rosto, mas não ficava bem, estava casado, tinha filhos.   Agora o primeiro sai do ninho, ele me perguntou depois da morte do Jorge, se eu gostava de ti, fui honesto com ele, que sim.

Não sei por que, meus pesadelos voltaram, eu voltava a gritar durante a noite. O psicólogo achava porque sentia falta do meu braço.   Depois de analisar muito, cheguei à conclusão que era verdade.   Mas ter Jasper agarrado comigo, me tranquilizava.

Quando os dois menores voaram para fora do ninho, ficamos os dois, ele se aposentou da polícia, estava farto.   No verão alugávamos uma cabana perto de Cape Code, os garotos estavam espalhados pelos Estados Unidos, cada um montando sua família.

Só o mais velho, tinha ido para San Francisco.  Quando fomos visita-lo ele vivia com um rapaz descendente de japoneses.   Jasper a princípio não aceitou muito.  Mas falei com ele, ele te aceitou, porque não podes aceita-lo.

Com ele passávamos largas temporadas, o clima me incomodava menos que o de NYC, a solução foi vender tudo que tinha, comprar uma casa na praia, o único problema, eu não podia entrar no mar, mas adorava pescar com o Jasper.

Ele sempre tinha sido minha família.  Então agora era o melhor, já tinha netos.

Seus filhos passavam ação de graças conosco na praia, depois se dividiam entre sua mãe, e as famílias das mulheres.   Conosco ficava sempre seu filho mais velho.

Agora ele, com seu companheiro, querem adotar.  Nos dois incentivamos.

Mas o que gosto mesmo, é de no final do dia me sentar na varanda da casa, ficar olhando o mar, pois é uma das poucas maneiras que posso desfrutar.

PLAY OFF – DESEMPATE

                            

Era meu último Play Off, tinha decidido pendurar os tênis, não podia dizer chuteiras porque não era jogador de futebol.

Esperava para entrar na cancha, para a segunda parte, viu uma confusão muito grande na porta, pensou que eram jornalistas, para falarem de seu amigo Sammy, pela primeira vez jogavam em equipes contraria, sentia falta dele para jogar, mas por qualquer motivo que ainda não tinha entendido, ele decidiu jogar no time contrário.  Ele respeitou sua decisão, andava muito estranho ultimamente.    Jogou como nunca, sabendo que era sua despedida, seu contrato tinha terminado, queriam renovar, mas ele não.

Ganharam, era seu segundo anel, depois foi para o vestuário, estava cansado, o treinador, se aproximou, tem uma pessoa querendo falar contigo.  Acabou de tomar seu banho, se vestiu, disse adeus aos companheiros, saiu.

Deu de cara com Charles Jackson, para CJ.   Um detetive que ele era apaixonado, nunca tinha falado nada a respeito, ao mesmo tempo, esse homem era como uma ave agourenta, na sua vida, só aparecia para lhe dar más notícias.

Perguntou o que era desta vez, procurou Sammy com o olhar, ali estavam todos os jogadores que tinham participado do Play Off deste ano.

C.Jackson, lhe apertou sua mão, o arrastando dali.

Perguntou se ele tinha visto Sammy no dia anterior.

Não, depois do partido não quis falar comigo, estava furioso.   Eu estranhei pois sempre falávamos dos jogos, como tinha sido, o que achávamos.  Aliás essas eram as únicas conversas que tinham ultimamente.  Na última temporada, Sammy tinha mudado de time, sem consulta-lo, eles que se falavam de tudo.

Se conheciam desde criança, tinha compartidos desgraças pessoais, bem como triunfos na universidade, ele era o único que sabia que deixava o basquete.  Se não falasse com ele, com quem falaria.   Tinha ficado furioso com ele, como podia fazer isso, se o basquete tinha sido a vida dos dois, todos esses anos, vamos dizer assim, a salvação.

Tinham começado a se afastar, quando Sammy se deslumbrou por ter dinheiro.  Ele ao contrário sempre tinha tido.

Sentou-se numa cadeira dessas de plástico, o inspetor sentou-se na frente dele. Não sabes nada, verdade?

Saber o que?

Sammy morreu ontem a noite, estava completamente drogado, avançou um semáforo, morreu no ato, com a cabeça degolada.

Foi abrindo a boca, mas não lhe saia grito nenhum, seus gritos tinha acabado, as lagrimas escorriam pela sua cara, pareciam uma enxurrada.    Tinha ficado surdo, via que C. Jackson falava com ele, mas não escutava.

Começou a tremer, foi caindo num poço fundo, negro, estava farto de tantas desgraças será que isso nunca ia acabar.

Viu que ele se levantava, mas não se mexeu, ele saiu, voltou com o entrenador.

Desculpe filho, mas não quis te dar essa notícias antes do jogo, entre os dois o levantaram, saíram por uma porta lateral, lhe perguntaram se tinha vindo de carro.  Ele nunca tinha tido carro, andava com o Sammy, para que precisava de carro.

O inspetor, disse que o levava para casa.

Aonde está Sammy?

Não podes vê-lo ainda, estão fazendo a autopsia.

Ele seguia querendo gritar, as lagrimas continuava caindo pela sua cara.  Teve que ser literalmente levado para cima no edifício pelo inspetor, esse abriu a porta, deve ter ficado de boca aberta com seu apartamento.  Ao contrário dos outros jogadores, que viviam em apartamentos suntuosos, ele vivia num pequeno, era o último andar, um sala quarto, uma varanda fechada, com duas estantes cheias de livros, a mesa de centro tinha pilhas imensas, como explicar, que os livros eram tudo para ele.   Sem eles já tinha morrido a muito tempo.

Era conhecido como o EUNUCO, da NBA, pois nunca o tinham ligado com ninguém, nenhuma modelo, ou outro homem.  Vivia uma vida retirada, a única pessoa que sabia de sua história era o Sammy, também era o único que tinha uma chave do apartamento.

Caiu numa das poltronas, só tinham duas.   Agora fazia sentido o que Sammy tinha falado para ele.   “Nem no final me deixas vencer”.

C.Jackson, disse que talvez ele estivesse drogado.

Drogas, sempre as malditas drogas, foi o que soltou.

Colocou as mãos na cara, deixou que as lagrimas continuassem escorrendo por elas.

Perdão soltou, não sei o que te dizer.  Ontem depois do partido estava furioso, mas não fui eu que batalhou contra ele, tinha sido um companheiro seu de equipe.

Falou o que ele lhe tinha dito, saiu dos vestuário furioso.

Fomos nos afastando, apesar de ser meu único amigo, tinha comprado a dois anos um apartamento maravilhoso, levando sua mãe para viver com ele, mas ela preferiu voltar a viver na mesma casa que tinha vivido sempre.

O celular do C. Jackson começou a tocar, ele pediu licença se afastou, ficou escutando.

Eram da autopsia, ele estava até a alma de drogas.

Comentou, que treinador, lhe tinha perguntado isso, antes de Sammy sair da equipe, indo para outra ganhando mais.  Ele tinha se negado, pois já tinha decidido que seria sua última temporada.

Não tinha nada planejado, o basquete tinha sido seu refugio desde criança, era tudo para ele, mas seu psicólogo tinha falado muito com ele, que talvez tivesse chegado a hora de enfrentar a vida de frente, afinal ia fazer trinta e cinco anos, começou a tremer outra vez.

Quando C. Jackson, colocou a mão no seu ombro, desta vez se permitiu colocar a cabeça em cima da mesma, tinha amado toda vida esse homem, embora ele sempre viesse com más notícias.

Este perguntou se tinha alguém que podia chamar para ficar com ele.  Sorriu, só o Sammy me entendia, não tenho ninguém em minha, vida, amigos, família nada.

Pode ir-se eu fico bem sozinho, estou acostumado.

C. Jackson, deu a volta se ajoelho na frente dele, tinha que se controlar, pois o queria beijar, viu que sua têmporas, estavam cheias de cabelos brancos, mas isso aos seus olhos o fazia mais bonito.

Sammy era o único que sabia que eu deixava a NBA, esse foi meu último jogo. Lhe contei outro dia, antes do jogo entre nossas equipes, nada disso me ajuda hoje em dia.  Preciso enfrentar minha vida finalmente de frente.

A mãe dele já sabe?

Sim, está com a família dela.   Queres ir até lá?

Não tens que trabalhar?

Não já avisei que ficarei contigo.

Entrou novamente no velho carro do inspetor, não disse nenhuma palavra, esse de vez em quando num semáforo, lhe segurava a mão.  Se ele fosse uma pessoa que pudesse verbalizar, diria por favor me abrace, me beija.

Mas não dizia nada, isso era uma coisa impossível para ele.  Não sabia verbalizar mais as coisas.

Fechou os olhos, se lembrando como tinha conhecido o Sammy.   Estavam na mesma escola do bairro que viviam.  Os outros garotos nunca se aproximavam dele, pois era diferente, alto, loiro, olhos verdes, já era forte, pois de tarde ajudava no armazém do pai.  Esse era um bom filho da puta, de vez em quando chegava a escola com os braços, com manchas rojas, mesmo usando a camisa de mangas compridas não dava para esconder, que o pai tinha descarregado nele sua fúria.

Sammy era a mesma coisa, seu padrasto, era outro filho da puta.  Um dia uma bola veio parar aos seus pés, ele se levantou, de aonde estava encestou.  Todo mundo ficou de boca aberta, os dois começara a jogar um com o outro, sem nunca terem se falado.  Nenhum dos dois eram de muitas palavras.

Isso passou a ser um ponto entre eles, no fundo de sua casa, no lado da garagem, tinha um aro, ali jogavam no final do dia, ou nos dias que não ia ao armazém do pai.

Quando sua mãe ficou doente, ele ficava em casa com ela, escutava o assobio do Sammy, ela dizia teu amigo está aí, vá jogar com ele.

Ele se desafogava jogando com uma certa violência.

Os dois se entendiam, não faziam parte de grupo nenhum na escola, de nenhuma gang, das muitas que tinham pelo bairro.

Seu irmão, seu ídolo ao mesmo tempo tinha desaparecido, se não fosse sua mãe, ele acreditava que teria morrido.   Era ela que lhe dizia baixinho, tens que sair daqui, talvez o basquete seja o meio que tenhas de conseguir uma bolsa para a universidade.

Quando ela morreu, ou melhor se suicidou, tomando toda as medicações, possíveis, deixou um bilhete para ele, esconda as duas caixas que estão na garagem. Sabia do ela falava, era duas caixas de sapatos, que estavam cheia de dinheiro, ela durante anos tinha feito a caixa da loja de seu pai, pois ele não gostava dessa parte, ele achava que ela fazia isso para ter uma maneira de escapar da vida que tinha.

No último ano, ele a tirou de seu quarto, colocou no de seu irmão Dawson, trazia mulheres diferentes todas as noites, nunca ficava com ela, dava para escutar ele fazendo sexo com elas, porque era escandaloso.

Ele tinha se mudado para o sótão da casa, usava a parte da frente, assim não escutava nada.

Tampouco escutou nada quando ela morreu.   Quando desceu no dia seguinte, encontrou a casa cheia de policiais, seu pai tinha chamado a ambulância, eles a polícia, pois achavam a morte dela suspeita.   Foi a primeira vez que viu o C. Jackson, ele estava começando sua vida de policial.  Pensou antes de entender o que tinha acontecido, que homem bonito.

Foi interrogado várias vezes, seu pai era um homem violento.  Sua mãe tinha os braços cheio de marcas, ele se desculpou dizendo que a tinha sacudido para ver se colocava os comprimidos para fora.

Ficou como um louco, pois sua mãe era o único que tinha, Dawson tinha desaparecido, não sabia nada dele, até o dia que disse que ia embora, pois estava farto de seu pai.

Ele era filho do primeiro casamento, era 10 anos mais velho do que ele.  Seu pai o tinha visto dando um beijo num homem, um jamaicano, chamado Coton Jack, outro C.J. tinha lhe dado uma puta surra, que naquela casa ele não queria viado nenhum, queria homens como ele.

Minha mãe tentou defender o Dawson, levou um murro na cara com toda força, foi parar do outro lado da cozinha, lhe disse, cuida da tua vida, esse filho é meu, faça com que o seu seja homem pois senão o mato.

Dawson tinha desaparecido do mapa, anos depois o encontrei, vivia num acampamento de homeless, tinha entrado para a marinha, usava uma prótese na perna.

Nesse dia meu único consolo foi o Sammy.   Me arrastou com ele para nosso jogo de sempre, gostava da minha mãe. Ficávamos encestando, procurando fazer cada vez mais longe do aro.

Eu sempre ganhava, nesse dia tinha um ódio mortal.

Foi um enterro triste embaixo de chuva, a única irmã da minha mãe, veio com o marido, meu pai disse aos dois para desaparecerem, pois sabia que os dois eram umas merdas.

Assistiram o enterro o mais longe possível.

A partir desse dia, eu só existia nos momentos que estava jogando com o Sammy, erámos os melhores da escola.  O mais interessante, era que também erámos os melhores alunos, as notas mais altas, competíamos nisso também, mas porque um ensinava para o outro o que não tinha entendido nas aulas, eu era ótimo em matemática.  Ele em outras coisas.

Nos completávamos.

No mesmo dia do enterro, meu pai levou uma mulher para casa, mesmo com a distância podia escutar as gargalhadas dele, mas elas nunca ficavam.

Ele saia com seus amigos machões de toda a vida, eles tinham inveja pois tinha um negócio, eram bonitão, assim era fácil, trazer, uma mulher para casa.  Se repetia ou não, nunca soube.   Inclusive uma vez desci para tomar café para ir à escola, lá estava a mãe do Sammy, me disse para não falar nada para ele, meu pai entrou, enfiou dinheiro na mão dela.

Eu já tinha levado para meu quarto, escondido bem as duas caixas da minha mãe.  Agora eu levava o trabalho que ela fazia, tinha aprendido, fazia o mesmo, para um dia poder ir a universidade.

Nessa época vi o Dawson pela primeira vez, da pequena janela do meu quarto, o vi do outro lado da rua, olhando para a casa.  Não era uma cara normal, desencaixada, cheia de ódio.

Corri, mas não o encontrei.

Passei nos meus momentos livres, pois o tinha visto vestido de roupa militar, a procurar por ele, com o Sammy, mas o encontrei um dia, que fui sozinho com minha bicicleta pelo lugar que havia acampamentos de homeless militares.

Um homem tentava roubar minha bicicleta, quando ele apareceu do nada.

O que fazes vindo aqui me procurar sempre, não lhe respondi, simplesmente o abracei muito forte, eu o adorava, era meu ídolo desde pequeno.  Ele dizia que tinha que tomar cuidado comigo, porque quando era criança era como uma sombra dele, estava sempre atrás dele, para receber um carinho, ou que ele me levantasse por cima da cabeça dele, era como o visse de outra maneira.

Falei que minha mãe tinha morrido, que o filho da puta, levava cada dia uma mulher para dentro de casa, que minha vida era um inferno, se eu podia ficar com ele.

Me disse que ia dar um jeito.   Levou muito tempo assim, as vezes ia com o Sammy vê-lo, as vezes estava totalmente drogado, mas não me importava, ficava ali na sua tenda, segurando sua mão.

Lhe perguntei por que não fazia um tratamento para se livrar disso?

Me disse que era o único que tinha, que Coton Jack tinha morrido na guerra, era o amor de sua vida, nada tem sentido.   Um dia apareci, cheio de hematomas, o velho agora pega você não é.

Ficou dizendo baixinho, filho da puta, tenho que lhe parar os pés.

Eu já tinha 16 para 17 anos, era alto, magro, mas meu pai tinha uma força incrível. Tinha sido lutador de boxe em sua juventude. Quando te soltava um murro, não havia como se defender.

Dois dias depois, eu agora usava um casco para não escutar os ruídos, colocava alguma música no último volume.

Escutei mesmo assim um ruido, como se tivesse alguém discutindo.  Sabia que a mulher que meu pai tinha trazido para casa, tinha ido embora, pois tinha sentido a porta da casa bater, algumas saiam furiosas com ele.  Devia ser violento na cama.

Depois mais tarde já estava na cama, escutei uma discussão, pensei que a mulher tivesse voltado, pensei comigo, esse tormento nunca vai acabar.   Me faltavam meses para acabar, tinha a possibilidade de conseguir uma bolsa de estudos, na verdade eu o Sammy disputávamos a mesma, para irmos à universidade, como jogadores de basquete.  A cada jogo nos esforçávamos o máximo, porque sabíamos que tinham olheiros por ali.

Depois escutei como se alguém tivesse caído escadaria abaixo.

Mas até que resolvi sair do meu esconderijo, ou toca, como eu chamava meu quarto, já era tarde, desci, para ir à cozinha, vi meu pai numa posição grotesca aos pés da escada, chamei a ambulância, bem como pedi que viesse a polícia.

Quem apareceu como sempre foi o C. Jackson, mas eu já sabia que ele estava morto, porque tinha aprendido a tomar o pulso de minha mãe.

Eles achavam que alguém o tinha empurrado escadas abaixo.

C. Jackson, me perguntou o que eu estava fazendo, o levei até meu quarto, lhe expliquei que todas as noites ele trazia uma mulher para casa, desde a época que minha mãe estava doente.

Uso esse casco, com a música no último volume, para não escutar nada, mas disse que senti a porta batendo, com faziam algumas mulheres.  Depois o ruido de alguma coisa caindo, mas como ele sempre estava alto de bebida, eu nunca me atrevia sair, porque senão quem levava era eu.  Mostrei ainda as manchas rojas que tinha nos braços, ele tem uma força incrível.

Não mencionei que meu irmão estava na cidade, nem se o tinha visto.  Quando me perguntou do Dawson, lhe disse que era militar, mas não sabia se estava em alguma missão.  Ele não vive aqui a anos.

Me perguntou se queria que avisasse algum parente, lhe disse que não tinha nenhum.

Um dia depois voltou, porque tinha encontrado troços de pele, embaixo da unha, o ADN, era de alguém da família.   Na delegacia, me fizeram ficar nu, uma pessoa da oficina forense, examinou meu corpo inteiro para ver se tinha algum arranhão, o que encontraram foram muitas marcas no meu corpo.  Quando disse que meu pai sempre precisava de um saco de pancadas.

Eles começaram a procurar o Dawson, nesse meio tempo o advogado, estava providenciando o enterro dele, só depois leria seu testamento.

Dois dias depois, apareceu outra vez o C. Jackson, outra má noticia, estava com o Sammy, estudando para os exames finais, ele me pediu para o acompanhar.  Fomos os dois, não disse o que era, lhe perguntei se tinha que chamar o advogado de meu pai.

Não, fique tranquilo.   Já sabemos quem matou teu pai.

Me levou para ver o cadáver de meu irmão, tinha morrido de uma overdose, tinha a cara toda arranhada, pelo visto ele tinha matado nosso pai.

Fiquei arrasado, Sammy avisou sua mãe, ela o deixou ficar comigo.  Nessa noite tive pesadelos, com o Dawson, o matando.

Enterramos os dois ao lado de minha mãe.

Seu amigo todos estavam ali, mas me surpreendi, escutar a maioria deles, dizer, finalmente esse filho da puta palmou, merecia ter morrido a muito mais tempo.

Falei com o C. Jackson, tentando assim talvez, pensar que qualquer um deles, tivesse matado meu pai.

Ele explicou, que ele costumava se meter nos namoros dos amigos, roubando a namorada para uma foda, depois contava para todo mundo.

Fui escutar a leitura do Testamento, pedi ao Sammy para ir comigo, ele se sentou mais atrás.

O filho da puta, pelo menos deixava tudo para mim, nada para o Dawson, deve ter tido a coragem de colocar no testamento que não deixava nada para ele, pois era um viado.

Tampouco tinha nada agora, pois já estava morto mesmo.

Minha tia apareceu com seu famigerado marido.   Falei com o advogado, ia fazer 17 anos em alguns dias, falei da fama dos dois, pedi que falasse com o juiz para minha independência, afinal iria para a universidade.  O velho tinha me deixado a casa, o edifício do seu armazém, bem como o negócio.

Fui com ele falar com o juiz, o advogado tinha tirado informação a respeito de minha tia e seu marido, estava arruinados.

Assinou os papeis, para todos os efeitos, eu era maior de idade. 

Tínhamos o último jogo, demos um varapau desgraçado no outro time.  Eu jogava como um louco acompanhado do meu amigo.

Quando me ofereceram a bolsa de estudos, disse ao selecionador, que eu não precisava, podia pagar minha universidade, mas se eles queriam que jogasse, dessem a mesma ao Sammy.

Antes de ir, chamei o advogado, mandei vender a casa com tudo que tinha dentro, o armazém um chines estava interessado em ficar com o negócio, me pagaria mensalmente um aluguel do local.    Peguei todo o dinheiro das caixas, guardei num banco, fomos os dois para a universidade. Mas dois dias antes, o chamei, Sammy, vamos fazer uma farra.   Claro nossa roupa era de segunda.  Só usávamos os dois, roupas de segunda mão.

Na época era moda comprar roupas no Village, Soho, Chinatown, compramos, calças, camisetas, casacos, sapatos, tênis, tudo que nunca tínhamos tido, eu tinham um lema nessa época, com o Sammy, tudo que é meu é teu, afinal era o único amigo que tinha.

Compartíamos quartos, quem me chamou de eunuco a primeira vez foi ele, pois combinamos um código, se tinha uma meia amarada na porta, o outro não entrava, sinal que estava com alguém.

Isso era sempre ele, eu nunca levava ninguém, tampouco tinha a quem levar.

Tentei fazer sexo com uma garota, mas foi uma decepção, para conseguir chegar a final, tive que imaginar que era o C. Jackson.   Aquele homem me deixava louco.

Mas perdi a virgindade com um dos auxiliares técnicos, da equipe, no banheiro do ginásio, uma noite que cheguei ao nosso quarto, lá tinha uma meia amarrada, fui para o ginásio, fiquei encestando no aro, horas, depois resolvi tomar um banho, ele apareceu, me viu nu, foi um passo.   Depois eu me escondia em seu quarto as vezes.

Mas a brincadeira de Eunuco, já funcionava.

Quando fomos chamados para uma equipe, insisti que o Sammy fosse junto, meu salário era mais alto que o dele.

Ele foi morar num bom apartamento, eu comprei o que vivo até hoje.  Ele quando viu, me chamou de miserável.

Sammy, se lembra do meu quarto em casa, era assim, não preciso de muita coisa, não quero impressionar nenhuma garota.

Ele sabia da minha aventura, com o ajudante de treinador, mas ficou quieto, eu nunca escondi nada dele, tampouco tive nada com ele, era meu melhor amigo.

Chegamos à casa de sua mãe, pelo menos ele tinha comprado uma casa melhor para ela.

Me abraçou chorando, chamei nosso advogado, pedi para providenciarem todo o enterro, perguntei ao C. Jackson, se podia costurar a cabeça dele no tronco, para não fazer feio no caixão.  

Creio que o mesmo estará fechado, com um visor, pois seu estado é lastimável.

Só voltei a casa no dia seguinte, para trocar de roupa, a cerimônia, foi numa igreja batista, pois era aonde frequentava sua mãe.   Um dos novos amigos dele, se aproximou de mim, com um sorriso sarcástico disse, ele no final te odiava, principalmente depois que teu equipe ganhou o Play Off, disse que nunca iria conseguir sair da sua sombra.   Esse me levou a parte, me contou tudo que o Sammy tinha falado de mim.  Que tinha entrado na universidade, porque eu tinha desistido da bolsa de estudos, que quando fomos para a NBA, ele tinha entrado na equipe, porque eu tinha exigido, que ganhava mais do que ele.

Mas ele era meu único amigo, como não fazer isso?

Pois ele contou para toda a equipe que eres viado.

Me senti traído, mas o entendia, como podia pensar isso de mim, ele era o único que eu tinha, minha única família.

Chorei muito toda a cerimônia, não podia dizer aos outros, que chorava, porque me sentia abandonado, por meu amigo de infância.

No dia seguinte, fui com o advogado, para falar da assinatura do contrato.

Tinha saído uma noticia no jornal que eu saia do armário, que era gay.  Usei isso para não assinar o contrato, mesmo assim me choveram ofertas.  Quando quiseram me entrevistar, eu preferi falar do Sammy, que não podia ficar mais jogando, tinha que mudar o rumo da minha vida.

Fiz um balanço geral do meu dinheiro, tinha vendido ao chines a pouco tempo o edifício inteiro, o resto da herança do meu pai, tudo estava aplicado no banco, quando comprei o apartamento que vivia, paguei direto o mesmo, o meu salário sobrava, uma parte dele o destinava a escola de aonde tinha estudado, para ajudar os alunos a serem alguém, mas nunca divulgava isso.

Nem chegava a gastar basicamente meu salário.   Vivia modestamente, não gostava de luxo, a única coisa que tinha de extra era uma cabana em Cape Code, que comprei de um jogador em apuros.   Passava lá minhas férias sozinho.  Sammy ia por aí

com os novos amigos, de festa em festa, as vezes aparecia, eu jamais lhe fiz qualquer comentário, afinal a vida era sua.

Fiquei sabendo que não deixou muito dinheiro para a mãe, pedi ao advogado que vendesse esse apartamento de luxo que ele tinha, que administrasse o dinheiro para ela, não tinha muita noção, sempre tinha sido uma mulher pobre.

Antes de sair da cidade, fui falar com ela, para que não escutasse o que falavam de mim.  Alguns diziam que o Sammy tinha sido meu amante a vida inteira.

Eu sei meu filho, sempre foste amigo dele, mesmo naquele dia que me viste em tua casa, eu tinha feito sexo com teu pai, pois precisava de dinheiro.  Era um bom filho da puta, não fique ofendido.   Sammy me contou que mesmo tua mãe doente, ele levava mulheres para casa.

Soube por um dos amigos dele, que o criticou por isso, que a resposta o deixou horrorizado, que a casa era dele, se ela não gostasse que fosse embora, mas que o filho ficava, já bastava um ser gay.   Coitado nem sabia que eu também era.

Passei o verão escondido na cabana, só saia para fazer compras em alguma cidade perto, não queria ser reconhecido.

Chegou o inverno, segui ali.   Algumas noites tinha pesadelos, em ver o Sammy sem cabeça, ou mesmo meu irmão, empurrando meu pai, pela escada.  Tinha que enfrentar isso, já não tinha uma bola, nem um aro para me distrair.   Vi um cartaz na vila aonde fazia compras, de um gabinete de psicólogo, copiei o numero de telefone, chamei marquei uma hora.

Encontrei uma senhora, com os cabelos brancos, arrumados modestamente num coque, parecia uma avô que nunca tive.

Já no primeiro dia, creio que vomitei tudo que tinha guardado. Desde a minha infância, o amor que sentia pelo meu irmão, como meu pai maltratava minha mãe, sua morte, que eu achava que tinha sido ele.

Fui me sentindo melhor, agora saia para largos passeios pela praia, já não ficava fechado na cabana, logo chegaria a primavera, o verão.

Alguns dias simplesmente caminhava, outros corria, para me manter em forma.

Um dia esbarrei em C. Jackson.   Me perguntou o que fazia ali.

Férias permanente, lhe perguntei o mesmo?

Estou de férias, vi que tinha um braço, preso com um pano em volta do pescoço.

Levei um tiro, estou me recuperando.

Ficamos andando pela praia, nos sentamos numa pedra.  Quando te vi, pensei que más noticias me traz.  Porque sempre que te via, era para alguma coisa chata.

Sinto muito, era uma verdade.  Eu sempre ia assistir teus jogos, te admirava por ter suplantado tudo isso.  Sei que Sammy era teu melhor amigo.   Isso deve ter sido duro.

O pior soltei, foi que todo mundo sempre pensou que ele era meu macho, pois quando mudou de time, contou para todo mundo que sou gay.   Mas entre nós dois nunca ouve nada, me chamava de eunuco, porque sequer tinha aventuras, nem me atrevia por causa do ambiente.

Segues sozinho?

Sim, estou fazendo terapia, para quem teve tantas merdas na vida, achei melhor me afastar, faz mais de ano que estou aqui numa cabana que comprei.

Assim me deixam em paz, alguma coisa farei, mas não sei o que ainda, compro todos os livros que vejo.  Talvez faça algum curso para melhorar, eu fiz jornalismo, mas nunca exerci.

Já estou um pouco velho para começar, na verdade se fosse procurar um emprego, tenho certeza de que me contrataria, para falar de esportes.

Não quero nada disso, durante anos, me escondi atrás disso.  Fomos andando, sem querer lhe soltei que era apaixonado por ele, desde que te vi a primeira vez.  Embora o momento fosse trágico, me apaixonei.   Quando lhe contei que a única experiencia que tinha tido com uma garota, tive que imaginar que estava com ele, para chegar ao final.

Ele ficou rindo, chegamos a minha cabana o convidei para comer, tinha alguma coisa no congelador.   Ele parou na pequena sala, riu, não podia esperar outra coisa de ti, por aonde se olhasse tinha livros, pilhas dele, em volta de uma poltrona que ficava perto de uma janela, que dava para ver o mar.

Se aproximou, segurou minha cara, ele era mais baixo que meus dois metros de altura, me beijou, foi como eu imaginei.

O arrastei para a cama, nos demos conta no dia seguinte quando acordamos famintos, que não tínhamos comida nada.  Estávamos famintos.   A comida que tinha tirado do congelador, cheirava mal.

Me levou para comer num restaurante.

Me contou toda sua vida, com tinha se escondido no armário, desde o exército, depois na polícia.   Que eu sempre lhe atrai, mas achava que eu não era gay, depois imaginou que eu tinha alguma coisa com o Sammy pois estávamos sempre juntos.    Como chorei quando soube que tinha morrido.

Lhe contei o que seu novo companheiro de jogo me tinha falado, que no final ele me odiava, por isso contou para todo mundo que eu era gay.   Que eu tinha ido pela vida, o arrastando atrás de mim. 

Na verdade ele era bom, me fazia melhor, era um grande jogador.

Mas tu, destacava mais que ele, eras brilhante.

Talvez por meu desespero, não tinha outra coisa em que me apoiar, o basquete me salvou a vida inteira.

Fui lhe mostrando o livro que estava escrevendo, falando do basquete, desde o momento que descobri o mesmo com meu irmão mais velho.  O que fazia para suplantar as surras que me dava meu pai, mesmo com dor, não me permitia errar a canastra.

Fomos ficando, quando chegou o momento dele voltar a trabalhar, pela primeira vez fui claro com ele.  Se vais voltar a trabalhar, eu nunca vou superar, um dia que chegue alguém para me dizer que te mataram, não vou poder aguentar.

Por isso, prefiro guardar esse tempo que estivemos juntos, como os melhores dias da minha vida, mas não voltarei a te ver.

Ficou me olhando, soltou, como tu amaste o basquete, eu amo minha profissão, volto no final de semana.

Pela primeira vez na minha vida, tomei uma decisão, manter minha palavra, ele foi para NYC, eu também, arrumei uma pequena bagagem, já iria comprando o que fosse necessário pelo caminho, fui visitar as cidades da Europa, que tinha jogado, mas não conhecia, a não ser através do vidro de um ônibus, nem ao meu advogado avisei.   Desliguei meu celular. Fui embora, era como fugir de tudo.

Fiquei um ano viajando, pensava que interessante, deixas de ser famoso, deixas de existir.  Continuei sim escrevendo minha história toda, entrando em detalhes, de tudo que tinha sentido.

Cheguei por Amsterdam, aluguei uma Motorhome, fui viajando pelos lugares, a parte escrevia comparando o que tinha visto através de um cristal do ônibus, com o que via agora, andando pelas cidades.

Quando voltei, fui direto para a cabana, embaixo da porta tinha uma quantidade imensa de bilhetes do C. Jackson.

Mas não me atrevi a chamar.  Continuava achando o mesmo, se ele morresse eu morria junto. Tinha sido um eunuco toda a viagem, as vezes sentia dor no corpo, por o imaginar ao meu lado.

Mas não era fácil, me negava outra vez a enfrentar outra desgraça, sentia que meu equilíbrio era mínimo.

Dei o livro para a psicóloga ler, dois dias depois me devolveu.  Me disse que eu realmente tinha colocado a carne na assador, mais do que tinha feito com ela.

Mas não podes te esconder para sempre, isso do que tanto foges, faz parte da vida, nascer, crescer, morrer. 

Mandei para um editor, que a muito tempo tinha me perguntado se não queria escrever sobre basquete.

Me chamou, disse que editaria sem pensar duas vezes.  Quando o livro foi lançado, estava dando uma tarde de autógrafos, senti uma sombra na minha frente, senti seu cheiro, fiquei excitado, não podia me levantar, tudo que fiz, foi abaixar a cabeça, começar a chorar.

Quando me controlei, me levantei, ele estava ali, o abracei.  Sou um marmanjo que chora muito. Morri de saudades do teu cheiro.

Sai dali de mãos dadas com ele.

Sentamos numa praça, me disse, que depois tinha entendido o que eu tinha falado no nosso último dia juntos.   Que ao afastar, descobriu que me amava, embora ele fosse muitos anos mais velhos do que eu.

Aonde vives agora?

Disse que depois que o eunuco viajasse por todos os lugares que tinha ido antes, mas que não conhecia a cidade, voltei para a cabana, é o único lugar que fui feliz.  Nunca mudo o travesseiro que usaste para poder sentir seu cheiro.

No final de semana, apareceu, com uma maleta, pedi demissão da polícia, quero viver contigo.

Nisso estamos até hoje, vamos a cidade, para alguma coisa de médico, mas vivemos ali como se não houvesse outro lugar no mundo.  Fizemos amigos que vivem ali o ano inteiro, no verão levo uma livraria, tinha que me livrar de tudo que tinha, uma parte são livros de segunda mão, aviso que estão cheios de anotações do que eu sentia ou pensava.

Escrevi um outro livro, sobre todos os anos que comparti com o Sammy, com se com isso me livrasse da culpa de o ter arrastado atrás de mim.   Pedi uma entrevista para o rapaz que me contou tudo.     Ele tinha estado com o Sammy no último dia.   Podes imaginar que me soltou na cara, estive todos esses anos ao lado dele, ele nunca viu que eu o amava com toda minha alma, que queria ser teu.

Fiquei alucinado, pois o Sammy tinha fama de mulherengo.  Mas agora sei que me amava.

As vezes ainda desperto chorando porque sonhei com ele.  C. Jackson tem ciúmes de um fantasma, pois sabe que tem coisas que eu contaria ao Sammy, mas a ele não.

Um dia nos encontraremos no outro mundo, eu tornarei a dizer a ele, que não sei o que faria se tivesse descoberto isso antes.   Seria seu amante, chego à conclusão que nada disso mudaria o que aconteceu.

Nunca mais toquei numa bola de basquete, tampouco via os jogos.  C.Jackson que gostava, ia ver num bar, pois em casa não tinha televisão.

Se ele esta ficando velho, não aparece, mas eu sim, depois de todos esses anos correndo de um lado para o outro numa pista, estou pagando agora a mudança radical que me impus, sinto dores nas articulações, fui a um médico, me disse que tenho artrose precoce.

Me deu remédio para as dores, mas me nego a tomar, tenho medo, mas escondo através de andar na praia, me obrigo mesmo com dor, como quando fazia, meu pai me dava uma surra, com todas as dores, jogava a bola no aro, uma e outra vez.  Agora ando tudo o que posso.

C. Jackson desconfia, mas sorrio, o meu melhor sorriso, como quando o Sammy pergunta se estava sentido alguma coisa.   Lhe dizia que jamais daria o braço a torcer, que não ia me render.

Estou cometendo os mesmo erros de não colocar para fora o que sempre senti, não sei lidar com a dor.  Mas pelo menos agora sou consciente.

Vai chegar o momento, que terei que andar numa cadeira de rodas, mas tenho esperança de que como o C. Jackson, já tem 80 anos, morra antes de mim.

Ele terá que aceitar meus erros outra vez. Sei que sabe do que acontece, pois as vezes ao me levantar, meu corpo inteiro sente uma dor insuportável, respiro fundo, o obrigo a me obedecer.

Vou levando a vida com ele, com grandes momentos felizes.

O livro sobre o Sammy fez sucesso, mas destinei todos os lucros a escola aonde nos conhecemos.  Descobri a anos, que ela vive das ajudas da igreja batista, então me toca ajudar.

Graças a Deus já não choro muito, esta noite, sonhei com Sammy, com Dawson, me avisando que chega meu momento.   Me esperem já vou.

WHENEVER

                                    

Meu nome é John Lion Steiner, descendo de um lado de empresários do dinheiro, de outro lado de joalheiros judeus famosos.   Sou filho do segundo matrimônio de meu pai.  Minha mãe, era daquelas judias que tudo pelo glamour, não era bonita, mas sabia se vestir, se comportar nos melhores salões de NYC, tinha sido apaixonada por um rapaz que não era judeu, na universidade, tinha sido daquelas que iam para arrumar um bom casamento, mas resultou que o homem que queria era pobre.

Terminou a universidade, foi trabalhar numa das joalherias da família, um dia meu pai entrou para comprar um anel para uma amante.  Ela o atendeu, quando o viu escolhendo, uma coisa de mal gosto, lhe perguntou na cara, é para sua amante?

Ele ficou sem graça, ela o convenceu de comprar um anel, que impressionava, mas que não valia muito.  Se o senhor pretende um dia se casar com ela, lhe dê um diamante, mas se não compre esse, lhe custara menos, mas vai impressiona-la.

Impressionado ficou ele, com a desenvoltura dela.  Não comprou o anel, mas a convidou para jantar.   Ela lhe soltou na cara, estou solteira, mas não quero um amante, quero uma família.

Menos de um ano depois se casaram.   Meu avô que era conhecido por ser ranzinza, não gostou do meu pai, porque nunca ia a sinagoga, a fez casar-se com separações de bens.

Ela realizava seu sonho, um grande apartamento no Central Park, festas em que pudesse brilhar, amigas finas, mas como dizia o meu avô, falsas, isso ela veria mais tarde.

Se casaram num casamentos destes Judeus, por todo o alto, afinal ela era a filha preferida dele.

Quando nasci, segundo me contava ele, Abraham Steiner, me tornei seu neto preferido no mesmo instantes.   Diziam que quando pegavam um dos netos no colo, desatavam um berreiro, eu fui ao contrário, ficou imaginando que foi assim, vi aquele homem com os cabelos brancos imensos, uma barba branca, dizem que comecei a alisar a mesma, que passava as mãos pela cara dele.    Foi ele que escolheu meu nome, era o de seu irmão pequeno que morreu nos campos de concentração, com seus pais.

Ele levantou sua fortuna, de joalheiro, com um casamento desses combinados, mas que deu certo, estava sempre lamentando a morte de minha avó, segundo ele a única pessoa que o tinha entendido.

Meu irmão mais velho Remus, era filho de meu pai, com uma escocesa que tinha um mal humor incrível, passou isso para o filho.  Nunca chegou perto de mim, nos finais de semana que vinha passar com o pai.  Quando saiu da universidade foi trabalhar na empresa dele, de investimentos.

Eu ao contrário era a alegria da horta, segundo a governanta da casa, era um perigo, não gostava da maioria dos presentes que me davam quando era pequeno, os destruía e construía de outra maneira.   Um das minha primeiras loucuras, foi pegar um jogo da Lego, em que tudo é reto, me sentar na cozinha, acender o fogo, com uma faca, uma luva destas de cozinha, começar a colocar forma no que tinha construído.  Segundo a cozinheira que ria muito, eu quase coloquei fogo na cozinha.   Meu avô se deliciou, queria ver o que eu tinha feito.

Riu dizendo é o Lion reencarnado não é possível, seu irmão pequeno tinha feito belas artes em Paris, era escultor.

Depois, para não colocar fogo me deram um desses jogos de edifícios, fiz a mesma coisa, colei todas as peças, com a faca de pão, comecei a colocar da maneira que queria.  Ele tinha até morrer essa escultura, tinha feito um urso com ela.

Minha mãe ficava uma fúria, porque eu fazia isso, quando saíram os jogos desses modernos, eu destruí a consola, para ver o que tinha dentro, comecei a colar as peças para fazer um robot.

Duas vezes por semana, ficava a parte da tarde com meu avô, minha mãe ia jogar bridge com as amigas ricas.  Ele me levava para o talher central das joalherias, ficava esperando o que eu ia fazer, adorava ver os homens fazerem moldes das peças que ia executar, havia uma caixa grande que existiam moldes antigos, essa era minha diversão, falava com eles, dizendo um dia te usarei para construir algo.  Selecionava as que mais gostava.  Ele ficava as gargalhadas, dizendo o menino tem bom gosto, era moldes de peças que tinha feito sucesso, a maioria feita por ele.    Os empregados, diziam que era o único dia que meu avô ria.   Para mim, era um absurdo pensarem isso, se comigo estava sempre rindo, falando.

Foi a pessoa em que confiei todos meus sonhos.  Mesmo depois de garoto, já adolescente, meus dois dias com ele, eram imperdíveis, queriam que eu fosse a casa das pessoas ricas, eu odiava.

Soltava logo, hoje não posso é o dia do meu avô.  Ele já não trabalhava, mas íamos a sinagoga, ele me ensinava as coisas, depois íamos pelos museus.  Galerias de arte, me comprou a primeira escultura africana, pois me apaixonei por ela, a tenho até hoje.

Meu pai queria que eu fosse a universidade para fazer administração de empresas como meu irmão, mas me neguei, o velho foi o único que ficou do meu lado.

Queria ir estudar arte, fazia aulas de pinturas, escultura, a primeira que realizei, ele amou, fui até ao talher da joalheria, peguei uma serie de moldes, com ele compus uma imagem, que fui decorando com pedras falsa.   Ele mandou expor na vitrina da joalheria mais famosa.

Foi vendida em dois dias, o vendedor explicou que as pedras eram falsa, mas o comprador amou, quando perguntou o preço o vendedor ligou para meu avô.  Ele soltou um preço absurdo, o homem comprou.   Com esse dinheiro, passei a ter minha conta no banco.

Depois quando íamos a sinagoga, saia para tomar um café com os amigos, contava isso, como fosse a coisa mais importante do mundo.

Quando resolveu em vida, dividir sua herança entre os filhos, o fez particularmente interessante, sentou-se com todos, falou com eles.   Só um queria sua parte em dinheiro ou diamantes, iria viver em Tel Aviv.   Os outros cada um queria a joalheria que já tomava conta, para minha mãe, tocou diamantes, que ao final a salvaram para o resto da vida.

Nunca disse a ninguém, mas me entregou um envelope, fomos ao Banco, ele pediu uma caixa forte, colocou o envelope, bem como umas pequenas bolsas, não me deixou abrir.

Foi passar uma temporada com sua filha pequena, que tinha se casado com o dono de uma galeria de arte, em Paris.  

Eu as vezes chegava em casa, a escutava falando com minha mãe, que o velho era insuportável, que passava o dia inteiro reclamando de seu marido.

Um dia chamou soltou sem mais nem menos, sabe o que fez agora, disse que se aborrece, comprou um local de um antiquário em Saint Queen, imagina nessa idade, voltar a trabalhar, o mais interessante, que os mandou todos a merda, porque foram lá falar com ele, comprou um apartamento pequeno, ali perto, que não estava para viver na Avenue Montaigne, preferia simplicidade no fim de sua vida.

Os filhos voltaram com o rabo entre as pernas.  Eu saberia tempos depois que tinha comprado o apartamento em meu nome.

Estava preparando minha primeira exposição, que participava com outros alunos da escola, quando estourou a bomba.

Meu irmão que tinha assumido o escritório de meu pai, foi preso pelo FBI, estava lavando dinheiro de mafiosos.  Foi pior que colocar merda no ventilador.

Meu pai tinha se afastado dos negócios para lhe deixar se fazer homem como ele dizia, com minha mãe tinham aproveitado esse tempo, para fazerem cruzeiros com os amigos ricos.

Quando a bomba estourou ele estavam num dos melhores resorts de luxo do Mexico.

O escritório foi fechado, os clientes de meu pai desapareceram do mapa, eles voltaram correndo, mas já era tarde, tinha perdido a licença para operar na Bolsa de Valores.

Acabou tendo um enfarte, ficou em cadeira de rodas, eu já não vivia em casa, mas sim num pequeno apartamento no Harlen, num último andar de um edifício antigo, que era ao mesmo tempo meu studio.

Minha mãe, primeiro ficou como uma barata tonta, até que falou com meu avô, que lhe deu uma bronca incrível, tomou o primeiro avião, colocou ordem no pedaço.

Afinal ela tinha fortuna própria, mas a aconselhou a se mudar para um apartamento menor, aonde poderia manejar melhor as coisas.   Meu pai nunca se recuperou, morreu no final do mesmo ano.   Meu irmão estava preso, sua mulher, seu filho, foram morar com os pais dela, acabou se divorciando dele.

Meu avô aproveitou viu os meus trabalhos na exposição, me convidou para ir a sinagoga rezar pelo meu pai.    Pensei que ia falar mal dele, do filho, afinal ele tinha dinheiro investido com eles, que perdeu.   Mas não disse um pio.

Nos sentamos no café que íamos sempre, desta vez os amigos não se aproximaram.

Vê, quando alguma coisa acontece, principalmente se tem dinheiro pelo meio, passa isso, os que parecem teus amigos, somem como ratazanas de esgoto.

Mas não é isso que quero falar contigo, analisou as peças que tinha feito. Acho que devias vir comigo para Paris, entrar para a escola de Beaux Arts, tua tia conhece muita gente de lá, tem um cliente, escultor, vi os trabalhos dele, pode te orientar melhor.  Creio que estas meio perdido nessa confusão toda.  Não se preocupe com tua mãe, pois ela tem uma pequena fortuna pessoal.

Eu me preocupava pela minha mãe, pois nesse momento estava sozinha.  As fabulosas amigas do bridge, das viagens de primeira classe, tinha desaparecido todas, como meu avô dizia, como ratazanas.

Ela, para se distrair, voltou a trabalhar com seu irmão mais velho, justo na joalheria que tinha conhecido meu pai.   Era uma mulher que odiava ficar dentro de casa, contratou duas enfermeiras, elas cuidavam de meu pai.  Foi sincera comigo, não suporto ver o homem que amei, desaparecendo em vida, prefiro isso, pois sou capaz de mata-lo.

Quando meu avô falou com ela, concordou imediatamente.  

Meu pai nunca tinha sido uma pessoa próxima de mim, ao contrário, se fosse por ele, minha mãe teria abortado, dizia que estava velho demais para ter um filho pequeno.  Ele adorava seu filho mais velho.  Que acabou sendo uma decepção para ele.

Mas eu ia visita-lo todos os dias depois da escola de artes.  Ficava olhando na minha cara, enquanto eu mostrava os desenhos dos próximos projetos.   Acredito que eu devia ser uma decepção, pois era um homem que não gostava de arte.

Concordei, passei o Natal, com eles, fechei o meu studio, guardei as poucas coisas que tinha num dos quartos do apartamento de minha mãe, fui para Paris.

Quando, cheguei meu avô estava me esperando no aeroporto.  No alto dos seus quase noventa e cinco anos, se movia como um garoto.   Primeiro fez uma coisa comigo, fizemos todos os passeios turísticos, para que aprendesse amar Paris, depois fizemos passeios pelos lugares que os turistas não iam.   Minha tia ofereceu uma reunião em sua casa, cheia de artistas, discutindo teorias, técnicas, ele disse ao meu ouvido, essa é a gloria dos cinco minutos, fazem sucesso, acham que sabem tudo, te proíbo de falar essas besteiras.  Eu olhava para ele, pronto para obedecer, depois comentei em casa, quanta besteira, se arte para mim, são dez por cento de criação, depois 90 de suor para construir, colocar para fora.

Minha tia me apresentou o escultor que meu avô falava.  Era totalmente fora dos homens que eu tinha visto na sua casa.

Era um homem tosco, se o fosse definir.  Tinha dois metros de altura, ao mesmo tempo eu de brincadeira com ele dizia que seu espaço era imenso.  Ela quando me apresentou, primeiro reclamou com ele porque não tinha ido a sua reunião.

Olhou sério para ela, soltou, eu não tenho tempo para esses veadinhos de presépio. Tenho horror a isso, prefiro ficar tomando vinho num bistrô, lendo um livro, ou mesmo rabiscando ideias.

Se chamava Matheus Harlent, era judeu como nós.   Fui a suas aulas na École de Beaux Arts, um dia me soltou na cara, estas perdendo tempo aqui, esses que nada fazem, que discutem teorias, ou o que esculpir, te fazem perder tempo.

Me levou para seu studio, que era justamente para os lados aonde vivia meu avô.

Era uma antiga loja, bem como no andar de cima, vivia ele.

Embaixo tinha tirado todas as paredes, só deixando as colunas, tinha um forno quase industrial, mesas de trabalho, me olhou nos olhos, dizendo, aqui aprenderas trabalhando comigo. Me disse qual mesa poderia usar.

Perguntou se eu tinha feito escultura a partir do barro.  Aonde estudei achavam isso um atraso, queria que as esculturas fossem modernas, como a própria América.

Me ensinou como modelar, posso dizer que voltei a infância, um dia meu avô contou para ele o que eu fazia em criança.   No dia seguinte, apareceu com uma série de caixas de lego que tinha comprado num mercado, a maioria eram de segunda mão.    Feche os olhos, volte a sua infância, tente imaginar o que fazias.   Fazia tempo que não me divertia tanto, só que agora tinha um maçarico para trabalhar.  Quando acabei, ficou olhando de todos os ângulos, já tinhas madeira para ser escultor em criança.   Me levou comigo, a uma loja de tudo de segunda mão, compramos tudo que o homem tinha de lego, foi assim numa quantas lojas.

Agora, quero que faças uma em tamanho grande. 

Olhei bem para a cara dele, para seu tamanho todo, não podia confessar que estava apaixonado por ele, me levava pelo menos 10 ou 15 anos, não soube durante muito tempo sua idade.

Fechei com panos que encontrei, o local aonde trabalhava, não queria que ele visse.

Quando acabei, mostrei, era seu busto, ocupava dois metros de largo, como dois de altura, era uma escultura imensa.  

Ficou rindo, me deu um soco sem força no peito, me chamou de puxa-saco. Tirou uma foto no celular mandou para minha tia.

Olhou nos meus olhos, perguntou se eu tinha feito esboços?

Não, eu o tenho aqui dentro da minha cabeça, me aproximei dele o beijei.  Ele ficou quieto a princípio.

Não esta bem esse comportamento com teu professor, sou mais velho que você.

Não posso fazer nada, estou apaixonado por ti.

Me segurou pelos ombros, me disse que eu devia me apaixonar por alguém da minha idade.

Nem pensar, são uns chatos, falam demais, tu como eu, gosta de trabalhar em silencio, quando me corriges, o fazes com sentido.

Foi ele então quem me beijou, me levou com ele para seu apartamento em cima, foi como eu imaginei, era como nadar naquele corpo imenso, não queria me afastar dele.

Fomos despertados pela minha tia, que disse que ia buscar meu avô, para ver minha escultura.

Tomamos um banho os dois, juntos, eu reclamei, que dava muito trabalho limpa-lo todo, pois era grande demais.

Quando chegaram só meu avô notou que estávamos os dois com os cabelos molhados, os dois o levávamos compridos.

Minha tia batia palmas, vou mandar um caminhão buscar, para colocar na galeria.

Meu avô parou os pés dela.   Se vais fazer, faça direito, monte uma exposição para daqui algum tempo, o lance no mercado, colocar só essa lá, vai vender, mas também não fará nenhum benefício.

Matheus rindo disse que ia contratar meu avô como agente, pois ele sim sabia defender seus artistas.

Matheus me ensinou a usar um outro tipo de material, vamos usar o barro como base, fazer moldes, depois podes usar esses moldes para esse material mais leve.

Nesse dia meu avô, me abraçou muito quando fomos todos jantar por ali, num bistrô que ia sempre como Matheus, as pessoas que andavam por ali, riam sempre dos dois, pois estávamos sempre discutindo materiais para trabalhar, sem prestar atenção nos outros.

Nessa noite, minha tia, fez uma exceção, depois concordou que o lugar era perfeito para estar.

Meu avô quando se levantou, pediu que eu o levasse até em casa, era logo ali ao lado.

Me disse, não solte esse homem que conseguiste, sei que o amas, pela maneira como o olhas, meu irmão Lion era assim, não o deixe escapar.

Voltei rindo, depois Matheus queria saber por que eu estava rindo, contei o que tinha me falado meu avô, basicamente passamos a viver de uma maneira interessante, íamos todos os dias fazer um lanche com ele, o colocava na cama, ia dormir no nosso apartamento.

Comecei a desenvolver as ideias, ainda fiz umas quantas esculturas com o resto de lego que tinha ali.   Um dia andando por ali, numa loja de ferragens, tinha uma caixa do lado de fora, cheia de parafusos, resto de peças de metal, perguntei ao dono quanto custava tudo aquilo, ele me conhecia, soltou, leve tudo, depois me faça uma pequena escultura para colocar aqui.

Matheus ria da minha ideia, fiz figuras, bustos com barro, mas coloquei todas as peças que tinha na caixa, nelas, depois coloquei no forno, algumas peças se derreteram pela metade, outras inteiras, resolvi policromar as mesmas, deixando esse material de metal aparecendo.

Ficaram completamente diferente.

Tinha já peças para a exposição, mas queria fazer uma grande da mesma maneira, convidei o homem da loja de ferragens, para escolher uma pequena para ele.  Ficou babando, nos arrastou com ele, até a loja, nos fundo, tinham muitas peças de metal enferrujado.   Arrumei um jovem para me ajudar a levar tudo para o studio, separamos tudo já feito, comecei a trabalhar uma grande, era uma escultura do Matheus, nu, como eu o via, ficou horrorizado, as pessoas vão me ver nu, não se preocupe, mudo sua cara.

Justamente nesse dia, soube que meu pai tinha morrido, mudei uma parte da escultura, o fiz de memória, me lembrando como me olhava, quando lhe mostrava meus desenhos, como se não entendesse nada.   Seu enterro ia demorar uma semana, até conseguirem um autorização para meu irmão mais velho sair da prisão para ir.

Eu fiz um busto pequeno dele, para colocar no tumulo. Matheus foi comigo, meu avô queria ir, mas o médico o desaconselhou.

Fomos os dois, com uma caixa pesada no porão do avião, para as pessoas em volta devia se interessante, aquele rapaz, alto, magro, cheio de músculos, dormindo no ombro, daquele homem imenso, mal sabiam que era meu remanso de paz.

Minha mãe tinha ido ao aeroporto, nos buscar.

Conseguiu a muito custo, que meu irmão fosse liberado.   A cerimônia foi simples na sinagoga, só alguns amigos antigos de meu pai, a família de minha mãe, seu filho, bem como o filho deste.

Minha mãe, tinha ido buscar o garoto.

Eu rezei o Kadish, pois meu irmão não sabia, estava emocionado, mas sentia não ter conhecido meu pai, como conhecia o meu avô.  Ele nunca tinha entendido, como podia ter saído um artista na família, se ele odiava a arte.   Os quadros que tinha no apartamento, tinham sido comprados pela minha mãe.

Meu irmão foi outro choque, estava um velho, ombros encurvados, o filho ficou segurando a mão da minha mãe, tinha medo do pai.  Depois minha mãe me contou que sua mãe falava muito mal para ele do pai.

Pela primeira vez o abracei, pois me deu pena.  Disse que tinha inveja, poder viver em Paris, ainda lhe faltavam dois anos de prisão.   Lhe disse que fosse se preparando para quando saísse.

Mas na verdade nunca saiu de lá, o mandaram matar, por ter falado o nome de todos para quem tinha trabalhado.

O resto do tempo, passamos com minha mãe, visitando os museus que Matheus não conhecia.

Em algumas galerias, peguei o cartão, para depois mandar o catálogo da exposição.

Levamos minha mãe, conosco, para passar um tempo com sua irmã.  A desculpa era justamente essa que viesse para a exposição.   Minha tia fez uma festa em sua casa, para receber sua irmã.

Ela adorou claro ser o centro de atenção outra vez.  Outra coisa que adorou foi a loja de seu pai, entendia disso de antiguidades.

A exposição foi um sucesso, ela amou a escultura de meu pai, não podia dizer que só certos detalhes eram dele, o resto era o Matheus.

Ele estava orgulhoso de mim.  Em dois dias se vendeu tudo, o busto dele feito de lego, foi para um museu.   Ele dizia que não tinha obra nenhuma num museu, vinha esse pirralho, na primeira já tinha uma.  Na verdade, não era certo, tinha duas obras suas num museu em Israel.

Ampliamos com a loja que dava fundos com a nossa, dizia que eu deveria ter um espaço só meu.

Meu avô me deu um diamante, embora eu tivesse dinheiro.  Queria que fosse meu.

Os jornais quiseram me entrevistar, pensei bem, olhei para o Matheus, isso eu não gostava de fazer.   Minha tia, me encheu o saco, só concordei em fazer uma coletiva, bem como uma num canal de televisão sobre arte.

A coletiva, foi interessante, pois eu avisei ao princípio, que perguntas idiotas não responderia.

Falei tudo sobre meu trabalho, agradecendo ao Matheus em especial, me ter incentivado a ser eu mesmo no meu trabalho.  Quando falaram da escultura da lego, que era seu busto, cortei o mal pela raiz, contei primeiro o que eu fazia de criança, o desafio que ele me fez.

Um perguntou por que eu adulterava as peças de lego? 

Respondi da maneira muito simples, odiava coisas retas, contei que fazia o mesmo com os brinquedos desses de montar casas, que eram de madeira, colava tudo, depois dava forma com uma faca de pão.  Todos riram.  Mostrei uma foto que tinha da escultura na loja do meu avô.

Para nossa surpresa, minha mãe acabou ficando, morava com sua irmã, no luxo, depois comprou um carro velho, ia todo os dias para a loja do meu avô, com a desculpa que ele vendia barato tudo.  Acabou ficando morando lá, nada a prendia realmente em NYC.

Um tempo antes de morrer, meu avô me chamou para uma conversa séria, estava ali seu advogado.  Levei um susto, me acalmou, queria saber se eu estava disposto a fazer seu último desejo.

Me pediu, que levasse suas cinzas para Israel, que a levasse ao monte Sinai, que as deixasse lá, mas fora da urna.

Meses depois morreu, deixou para minha mãe a loja, para mim seu apartamento.  Me aconselhou que olhasse o que tinha no banco em NYC, nem me lembrava mais do mesmo.

Fui com Matheus, minha mãe, minha tia fazer sua última vontade.

Foi uma viagem interessante.  Matheus nunca tinha falado de sua vida anterior em Israel, eu tampouco perguntava, se ele queria falar bem, senão, me dava igual.

Quando as duas voltaram para Paris, fomos os dois passar um final de semana no mar Morto, ele contou, sua família era ultra ortodoxa, tinham infernizado sua vida desde infância, um dos motivos pelos quais ele não gostava de ir a sinagoga.  Ficou admirado eu saber rezar o Kadish no enterro do meu pai.

Me disse que o tinham obrigado a se casar, mas ele escapou antes, me contou que quando chegou a Paris, tinha se prostituido uns meses, de um ponto de vista, como vingança do que tinham feito com ele, na sua infância e juventude.  Até conseguir fazer o que queria, tinha tido muitos trabalhos.

Fomos olhar de longe sua família, ninguém o reconheceu.  Não vale a pena esfregar na cara deles, que hoje sou alguém, quando eles continuam iguais.  Seria uma vingança dolorosa.

Passei a ama-lo mais, mas percebi que isso o tinha feito mal por dentro, pois passou a fazer um trabalho escuro, começou a ir a um psicólogo, antes me explicou por que o fazia, não queria me encher com seus problemas.  Tudo o que ele tinha feito para escapar, voltava como uma bofetada em sua cara.    Me disse vê, eu te disse, uma vingança seria uma coisa amarga.

O via nervoso, tinha dificuldade para trabalhar, fomos ao médico, estava supre estressado.

Pedi desculpas, por ele ter ido comigo a Israel.   Ele disse que eu não tinha culpa nenhuma, eu era a alegria de sua vida, que nunca tinha pensado em amar alguém como me amava.

Um dia saiu, teve um ataque de pânico na rua, se esbarrou com alguns ultra ortodoxos, isso o deixou desencaixado.   Eu na verdade, não sabia o que tinha passado na sua infância, nem juventude.    Do ataque de pânico, generou, uma catarse profunda nele.  Acordava de madrugada aos gritos, me contou que com a idade de cinco anos, seu pai o trancava com pão e água salgada, para purgar os seus pecados.  Lhe pegava pelas coisas que tinha acontecido com a família na Rússia, quando ele próprio era o culpado.   Era um homem muito retorcido.  Três dias da semana não se comia em casa, ele ia pelas lixeiras dos restaurantes, procurando o que comer, por isso sempre tinha fome.

Um dia não desceu ao studio, disse que queria ficar mais um tempo na cama, me distrai fazendo alguma coisa, quando subi, estava desmaiado, tinha tomado toda sua medicação de uma vez só, chamei a ambulância, mas era tarde.

Demorei a me controlar, perdia assim as duas pessoas que mais tinha amado na vida, meu avô, Matheus.  O advogado era o mesmo do meu avô, ele pedia que suas cinzas fosse enterradas dentro do próprio studio, pois era o único lugar que era feliz.  Me deixava tudo, eres melhor do que eu fui jamais, não deixe de seguir trabalhando.

Foi uma porrada em plena cara, ao qual eu não estava preparado.   Minha tia, organizou uma exposição, vendeu suas últimas obras negras, duas foram para museus, um na Bélgica outro na Alemanha.  

Eu graças a deus, recebi um convite para expor em NYC, fui com a desculpa de dar uma olhada na galeria.   Precisava me afastar dali um tempo.

As duas foram comigo, minha mãe porque se preocupava por mim, minha tia, porque era minha agente, assim também aproveitavam para ver a família.

Ficamos no apartamento de minha mãe que estava fechado todos esses anos, ela disse que ia colocar o mesmo a venda, pois seguiria com a loja do meu avô, não tenho nada mais nessa cidade.   Resultou que a galeria era boa.

Fui olhar os documentos do banco, eram dois apartamentos na cidade, que estavam em meu nome, os impostos tudo isso, iam para essa conta, quando vi a quantidade de diamantes fiquei de boca aberta.

Um dos apartamento era no Brooklyn, não era grande, perfeito para mim, estava vazio, comprei só o necessário, com dois diamantes, aluguei um local que era uma antiga oficina.

Me joguei no trabalho.  Teria que preparar pelo menos 15 peças entre grandes, pequenas.

Inicialmente não sabia o que fazer.  Um dia me peguei pensando no que me tinha falado de sua infância, comecei a desenhar, imaginando como era estar fechado num lugar escuro, com agua salgada, um pedaço de pão, foi a primeira escultura, um dia vi um garoto pedindo dinheiro na rua, fui falar com ele, me disse que pedia dinheiro porque seus pais estavam na droga, tinha que alimentar seus irmãos.  Fui com ele a sua casa, quase bato no seu pai.

Levei ele, bem como o dois irmãos, para o meu apartamento, falei com o juizado de maiores,

Os levei ao médico, cuidei deles, descobri que tinham parentes no Texas, pedi ao advogado que descobrisse tudo.  Eles receberam os garotos.

A cara deles ficou na minha cabeça, continuei construindo a história do Matheus, misturada com a deles.  Quando ficaram prontas as peças, usei meu sistema, de misturar resto de metal, que fui buscar num ferro velho, o dono da galeria ficou louco com o que viu.

Minha tia, com minha mãe vieram para ver, o catalogo ficou fantástico, levaria vários para colocar na galeria, bem como na loja.

Se vendeu tudo na inauguração, isso que o dono da mesma acreditava que não funcionária.

Duas para museus, a primeira foi para San Francisco, a outra para um museu novo em Ottawa.

Logo me saíram exposição em San Francisco e Los Angeles.   Respirei fundo, primeiro fiz uma coisa que muita gente consideraria louca.  Primeiro fui ver se os garotos estavam bem, o mais velho, era o tinha mais problemas, os pequenos não porque não eram conscientes.  Tinham se adaptado melhor.   Perguntei se ele queria viver comigo, me disse que não podia deixar os pequenos, então falei com seus tios, paguei para que ele fosse a um psicólogo.

Dalí fui para San Francisco.  Nunca tinha vivido a vida gay, achei divertido, comecei a esboçar desenhos, fui a um show de Drag Queen, desenhei a várias, algumas pedi que posassem para mim.  Fui andar pelas ruas, a mistura de gentes me interessava, comprei uma câmera fotográfica, sai fotografando todas as pessoas que via pela frente.

Esbocei um desenho, que num primeiro momento, o dono da galeria, imaginou pelo tamanho, teria que ocupar a maior sala da galeria.  Ria muito, isso vai ser uma loucura.

Voltei para NYC, comecei a trabalhar, saia para comer, as vezes me sentava numa praça perto do studio, para refrescar minha cabeça.

Quando via, estava desenhando uma figura, uma cara, uma postura, eram coisas universais que não importava o lugar.

Compus o que queria, cenas que imaginava, a pessoa tendo em sua casa, etc.

Muitas eram uma mistura de barro, metal, policromadas, ou simplesmente em tom de sépia.

Quando estava na última, tirei foto de tudo mandei para minha tia, esperei seu comentário, só me disse uma coisa, se não tivesse comprometido com essa galeria, ia pagar o transporte de todas para levar para lá.  Sabia por isso, que tinha gostado.  Falei com minha mãe também, me soltou teu avô, quando viu o que tinhas feito com o lego, foi o único que se matou de rir, eu nunca tinha visto meu pai rir daquela maneira.  Me soltou que finalmente alguém na família saia como o irmão que ele amava.

Quando o da galeria veio buscar o material, perguntou se eu queria um hotel, em San Francisco, lhe pedi o mais simples possível, pois primeiro eu iria a Los Angeles, enquanto ele levava, montava a exposição, teriam que fazer fotos, montar o catalogo, coisas assim.

Quando estiveres livres, tens que vir a San Francisco para entrevistas.  Sabia que eu odiava as mesmas, mas era natural, queria divulgar tudo.

Fui para Los Angeles, aluguei um apartamento, pequeno, para ir pela cidade, contratei um jovem para me mostrar toda a cidade, foi interessante que ele fez aquela coisa de turista, lhe disse que nem pensar, queria ir pelo lado negro da cidade.  Apareceu com seu pai, que era inspetor de polícia.   Estava de férias, foi me mostrando tudo, me apresentava pessoas, para quando eu viesse por ali, para desenhar.

Quando me levou aonde rolava mais drogas, me aconselhou tomar cuidado.

Nessa parte, o homem que me acompanhava, amigo dele, me aconselhou fazer fotos.  Um dia estava fotografando um beco, aonde estava vários drogados, apareceu uma gang.

Era seu território, me levaram para falar com seu chefe.  Este tinha uma cara espantosa, lhe perguntei se o podia desenhar, como estava, levei a cadeira para uma área mais iluminada.

Me sentei no chão comecei a desenha-lo.   Me olhava com curiosidade.

Lhe mostrei o desenho, no mesmo ele não estava sentado, sim andando como eu imaginava.

Riu muito, fez o gesto de chocar os cinco como se dizia, eu não entendi.  Pedi desculpas.

Nessa noite apareceu aonde eu morava, vinha sozinho, sem nenhum dos detalhes loucos que ele usava, como por exemplo, cordões de ouro, mil pulseiras, roupas estapafúrdias.

Estava vestido normal, com uma calças jeans, camiseta, tinha um corpo fantástico.

Tirou toda a roupa me pediu para desenhar sem nada.   Acabamos na cama, rindo, graças a deus minhas roupas largas não deixavam meus homens verem que estava de pau duro, por tua culpa.  Nos despedimos, ele foi embora levando seu desenho.

Eu ria muito, nunca tinha me imaginado fazendo essas coisas.

Depois fui ficar um tempo em Venice Beach, desenhava o pessoal de lá, os surfistas, enfim um mundo à parte.

San Francisco, foi uma experiencia divertida, muita gente na inauguração, via as escultura marcadas mais de uma vez, disse ao dono da galeria que eu não fazia cópias.

Ele riu disse que ali era assim, todos diziam que queriam a peça, mas no marco com uma, se sinalizarem o valor. Caso contrário no final do dia, tiro tudo.  Mas se venderam 80 por cento, queriam comprar algumas peças da grande, ele disse que não, compunham uma ideia, quem comprou foi o museu de San Francisco, iam colocar no hall de entrada.

Ele ficou de ir inauguração, tinha se divertido pela primeira vez na entrevista, porque muitos sabiam de sua vida, coisas que ele nem tinha imaginado.  Quando começaram a perguntar coisas de sua vida, se levantou, eu avisei, se querem conversar sobre obras bem, caso contrário nada.

Uns quantos foram embora, o resto virou além de uma entrevista, uma larga conversa, de uma hora prevista durou 3, tinha um então, que conhecia todas as fases, tinha ido a Paris, NYC, falava com propriedade.

Houve uma derrapagem, falou na imensa feita de lego sobre Matheus.  Não fez uma pergunta, eu quando a vi em Tel Aviv, fiquei imaginando, com quanto amor a tinha feito, confesso, fiquei com inveja.   A mim as pessoas veem como se eu sou fútil, pois escrevo sobre arte, quando falam o que não gostam, logo me chamam de viado fútil.   Vejo as vezes, até entendo a necessidade do dinheiro, esculturas feitas apenas para decorar.  Mas as tuas não retratam as pessoas as formas de vida, quando vi essa imensa, que compões a população de San Francisco me emociono, me pergunto quantas pessoas se dão conta disso que somos uma mistura de raça.

Ele agradeceu, o comentário, pela primeira vez falou da escultura do Matheus. Sem querer contou da outra, ele ficou horrorizado que eu o retratasse num, como o via, tive que mudar, lhe dava medo, só muito depois entendi por quê.

Talvez desde o princípio na minha infância, meu avô me tirou as barreiras, a maioria das pessoas sabem da história da minha primeira escultura com lego, que dizem que quase coloquei fogo na casa, ele ao contrário amou, me incentivou.   Por isso não tenho barreiras.

O mesmo lhe perguntou como seria a de Los Angeles.

Segredo disse.

Nos vemos lá, não quero perder.

Foi embora, começou a trabalhar, trabalhou a do traficante, imaginando como seus homens o via, não como o carinhoso que tinha sido na cama com ele.  Evidentemente mudou sua cara, não queria se envolver em problemas, seja qual fosse.

Fez várias series, gostava mesmo de uma em que havia prostitutas, foi um trabalho complicado, fez duas esculturas de duas jovens prostitutas, quase garotas, se lembrou bailarina de Degas, fez como se fossem as mesmas, comprou roupas de segunda mão no estilo, as vestiu, teve que recosturar alguma coisa.  Quando vieram para fazer as fotos para o catalogo, o dono da galeria ria, eu vi a de San Francisco, fiquei pensando o que farias para Los Angeles, não me decepcionei.

A recepção era diferente, um cliente da galeria, comprou uma de surfista, que era uma sequência. Iria colocar no hall do edifício de sua empresa.

Recebeu alguns convites para sair, inclusive do jornalista, mas alegou estar cansado, quando este perguntou que ia fazer agora.  Ele disse que voltava para NYC, fecharia o studio por um tempo, iria para Paris enfrentar a realidade, de trabalhar outra vez no lugar aonde tinha sido feliz.

Queria ir trabalhando agora de uma maneira mais tranquila, podiam pensar que ele precisava de dinheiro, o que não era verdade.  Havia momentos, que pensava que jamais voltaria a NYC, isso tinha pensado quando vivia com Matheus, tal coisa não aconteceu, voltou.   Seu avô lhe dizia sempre, nunca digas não. 

Tinha lhe contado, que quando ele partiu para a América, queria que seu irmão fosse com ele, sabia da ameaça de Hitler.   Mas estava apaixonado, nunca poderia imaginar que seria seu fim.

Sua tia lhe agendou uma serie de exposições, se sentou com ela, disse que só faria uma por ano, queria tempo para trabalhar mais tranquilo, sem pressa, pesquisar novos materiais.

Quando falou isso, ela lhe mostrou um catalogo, de um escultor japonês, com uma técnica milenar.    Lhe chamou perguntando se podia lhe ensinar.

Foi imaginando encontrar um velho, mas encontrou um homem de sua idade, riram muito disse, este comentou que tinha aprendido de seu avô, fui o único da família a me interessar.  Só que o avô fazia peças para casa, ele tinha partido para um trabalho maior, tinha um problema de espaço.

Me ensinas, se quiseres vir para fazer trabalhos grandes, falou do forno que Matheus tinha deixado para ele.   O outro se entusiasmou.

Quando lhe perguntou se tinha que levar esposas, ou filhos, disse que não, sou gay.

Aprendeu a trabalhar em peças pequenas primeiro, fez uma série de coisas, mais europeia, tipo ânforas como se usavam antigamente para transportas ou guardar cereais.

Foram para Paris, despachou o que tinha feito, deu a parte do estúdio que ocupava Matheus, um dia surgiu uma relação com Tadao Ado, foram vivendo, o trabalho dos dois, apesar da técnica, era completamente diferente, um tinha uma visão oriental, o outro ocidental.

Sua tia quando viu o trabalho dos dois, fez uma proposta, se vocês trocam de enfoque, o Tadao faz a visão dele do Ocidente, tu do Oriente.

Como os estúdios estavam bem separados, um não via o trabalho do outro, ele se documentou sobre os samurais, seus cavalos, seus trajes de batalha, assistiu vário filme sobre isso, muito Kurosawa.

Quando acabaram, um foi olhar o do outro.  Tadao disse que ele tinha saído melhor parado da história. Mas de qualquer maneira sem se falarem tinham tido ideias parecidas.

Taparam a parte com o nome do autor, para a inauguração, todos acreditavam que a parte japonesa era do Tadao, principalmente como ele tinha feito os olhos.

Quando descobriram a ideia, as pessoas aplaudiam os dois.

Apesar de que o relacionamento deles funcionava, Tadao queria voltar para o Japão, não gostava de viver em Paris.

O deixou ir, não ia prendê-lo não ia fazer uma chantagem para que ele ficasse.  Se davam bem, mas claro nem chegava aos pés do Matheus.

Ele conheceu numa exposição de sua tia, uma artista africano, riram muito, a muitos anos atrás ele tinha conhecido o Matheus.

Quando conversaram, disse, nunca pude esquecer o que tivemos, mas eu tinha que voltar para a Africa.   As vezes não entendia sua postura, escutei falar algumas coisas a respeito dele, na época para um cara que veio do interior, era muito, hoje entendo, pensar em ter relacionamento com um homem que tinha se prostituido, não encaixava comigo, mas quando me dei conta que isso não importava, ele já estava contigo.

Aprendeu a técnica dele, fez uma série a pedido de um museu, em cima da obra de Picasso, Les Mademoiselle D’Avignon. Para colocarem no hall do mesmo.

Acabou fazendo uma séria para a exposição de Berlin, misturando todas, as vezes levava mais tempo, mas não se importou, teve que atrasar várias vezes, a exposição, porque a mistura de técnicas, nem sempre saia como queria.

Um dia estava no Bristô que sempre ia com Matheus, quando um homem veio falar com ele, tinha conhecido o mesmo antes de ele vir para Paris.   Ele já se prostituia em Tel Aviv, para conseguir dinheiro.   Me apaixonei por ele, mas claro não entendia que ele queria ir pela vida sem amaras.  Mas vejo que contigo foi diferente.

Olhando o sujeito, disse que viesse ao studio, o levou aonde o Matheus trabalhava, creio que ele sim te amou, abriu uma cortina, estava uma estante que ele usava, mostrou um busto que estava ali.  Era o próprio mais jovem.

Nessa noite saíram para jantar.  Xarif Farur era um sabra, judeu com árabe.  Estava trabalhando na Sorbonne, um dia os dois resolveram experimentar fazer sexo, para que, nunca mais se separaram.   Sua mãe gostava imenso do Xarif, conversavam horrores. 

Ela dizia nos jantares semanais na casa da tia, que finalmente tinha seu pouso.

Agora iria viver com elas, uma das sobrinhas delas, que tinha estudado arte, mas gostava mesmo de antiguidades, iria ajudar a sua mãe na loja.

Anos depois quando esta morreu, apesar de ter deixado para ele a loja, deu para ela, não precisava disso.

Agora com a idade seu trabalho era mais lento, foi uma vez com Xarif a NYC, para fechar tudo lá, vender o que lhe estava, pois já não queria sair de Paris.    Dois anos depois recebeu uma comenda do Governo Francês.

Estava trabalhando numa série dedicada a Franças, misturava seus heróis, Joana D’Arc, as mulheres da revolução, tinha visto um desenho num livro sobre a revolta, com a caída de Marie Antoniette, fez uma coisa divertida.

Um grupo de mulheres, desenhou as roupas, a fez de verdade com roupas de segunda mão, no meio delas ia Marie Antoniette, como se a própria estivesse levando a revolta.

Alguns críticos não gostaram mas de qualquer maneira foi considerada uma obra feminista.

Levou mais de dois anos para terminar tudo.

Xarif ria dizendo que ele estava ficando velho, mas suas obras agora requeriam mais detalhes para simbolizar tudo o que ele pensava.

Depois dessa exposição, tinha começado a desenhar para executar os mitos gregos.

Mas morreu antes, sentado em sua mesa desenhando.   Xarif tinha ido dormir, ele disse que seguia com seu desenho, mais um pouco.

Quando despertou de manhã, viu que ele sequer tinha ido dormir, estava debruçado em cima de sua mesa.   O que lhe impressionou, que estava desenhando o Matheus, tinha contado a dias, que tinha sonhado com ele, me desculpe Xarif se te ofendo, mas ninguém me entendeu tanto como ele.  Sigo o amando até hoje.

Pediu que suas cinzas ficassem juntas, até descobrirem aonde tinha enterrado a do Matheus levou tempo.

GOOGLY EYES

                                

Jerry devia ter uns seis ou sete anos quando um dia depois de um pesadelo acordou com os olhos esbugalhados, sua mãe assustada o levou a muitos médicos, nada, dizia que eram normais, que ele via bem, que não necessitava de óculos.

A levou a uma negra benzedeira que vivia nas margens do rio, aonde viviam todos os negros, ela olhou para ele, perguntou o que ele estava vendo em volta dela, ele foi dizendo.  Ela soltou uma gargalhada tremenda, dizendo esse menino vê o que ninguém vê.

Esse é seu futuro, ver as misérias do mundo, achar normal, porque estão na frente dele.

Essa foi uma verdade, que depois ele consideraria como uma maldição, ver tudo que os outros não viam, antecipar o futuro de alguns, ver a miséria de outros.    As vezes o que via era tão forte que fechava os olhos.

Sua mãe ao contrário pensava que essa maldição era o olho gordo de alguém, porque era rica, vinha de uma boa família, que não passava de inveja pura.

Ele passou a ir escondido na casa de negra velha, contar para ela o que ele via.

É meu filho lhe dizia ela, não queria estar na tua pele, eu vejo as coisas me calo, porque sou negra pobre, analfabeta.   Mas a você foi dado o direito de falar de tudo.

Podes olhar um político, ver que está mentindo, poder denunciar o que vê.

Na escola ele podia prever as coisas, quando olhava um grupinho, já sabia que vinham por ele, tinha o dom de poder se esconder, antes que lhe fizesse mal algum.

Nas aulas, antecipava que o professor estava falando, encontrando a solução antes, por isso tinha boas notas.  Durante anos sua mãe preocupada que lhe fizessem bullying ia de carro busca-lo na escola, isso fazia com que todos o chamasse de filhinho da mamãe.

Foi duro convence-la a não fazer mais isso.

Quando foi para a universidade, ela cismou de ir para a mesma cidade, tinha que proteger seu filho.  Seu pai graças a Deus não permitiu.  Disse que nem pensar, que ele era um homem adulto, que o devia deixar ir sozinho pelo mundo.

Mas ela o chamava dia sim, dia não.   Ele foi estudar jornalismo, não sabia se era uma escolha errada ou não, mas aguentou firme, era o que mais discutia com os professores a respeito de ética, outras problemas claves do jornalismo.

Mesmo assim, nunca quis participar do jornal da universidade.  Os colegas insistiam, mas ele dizia que quando tivesse alguma coisa, escreveria a respeito.

Um dia viu uma reunião de professores, discutiam com o reitor, o abuso de uma aluna, queriam tapar o sol com a peneira, falava do professor, que não estava presente.

Foi ao seu gabinete, por um acaso era um professor que ele respeitava.  Falava muito bem, tinha argumentos.

Sentou-se diante dele com uma desculpa qualquer, começaram a conversar, ele olhou para dentro do homem, viu que não tinha nada a esconder, era sim gay, portanto era o que ele escondia.

O homem levou um susto, porque não usa isso em sua defesa, que eres gay.   Este ficou de boca aberta, o senhor é um livro aberto, vai deixar que essa aluna, o coloque a margem da vida.

O homem tinha uma estampa, as garotas se apaixonavam por ele, por ser educado, respeitoso.

Algumas se insinuavam para ele, mas ele se mantinha a margem.

Depois foi falar, ou melhor observar a que lhe denunciava.  Esta estava feliz da vida com a sua vingança, tinha se insinuado para ele, chegou mesmo a invadir o quarto do professor.  Mas com quem tinha feito sexo, era como capitão da equipe de futebol.

Chegou para ela, soltou, se vais levar isso em frente, lembre-se estas gravida, do capitão da equipe de futebol, quando fizerem a prova de ADN, saberão que o professor não é o pai.

O homem que te fudeu, tampouco vai querer casar contigo, porque tem noiva, nunca vai acreditar que é o pai, mesmo com prova de ADN, serás a puta de todos da universidade.

Pediu para se possível reunirem todos na sala outra vez, convidou o professor, este pediu que não falasse de seu problema.  O encarou, professor, não é nenhum crime ser gay, falou de todos os professores do grupo reunido que eram, alguns era casados, se dizem alguma coisa eu abro a boca.

A garota quando o viu na reunião, se levantou assustada, pediu desculpas, mas tinha inventado a história do professor, porque ele não lhe dava a atenção que ela queria, como todas se apaixonavam por ele, por ser educado, respeitar os limites.  Eu perdi minha virgindade atrás do campo de futebol, com esse aí, sinalou o capitão da equipe.   Me disse que ficasse quieta, que acusasse alguém, pois sua família tem um compromisso com outra família muito rica, que me mataria se contasse.

Foi uma confusão de fazer dó.  Nessa noite ele escreveu pela primeira vez para o jornal, que tinham acusado o professor injustamente, que antes de publicarem qualquer merda, primeiro deviam saber qual era a verdade, consultar todas as fontes, aprender a olhar nos olhos das pessoas, se não sabiam fazer isso, seriam uma merda como profissionais.   Exigiu uma desculpa do jornal, porque senão contaria os podres de todo mundo que estava nele.  Inclusive quem consumia drogas, com quem tinham feito sexo.

Dois dias depois a garota que tinha escrito o artigo, pediu desculpas publicamente ao professor, era uma das que ele tinha rejeitado.

Depois veio tirar satisfação com ele. 

Ele riu na cara dela, que ela jamais passaria de uma dessas jornalistas que escrevem coluna de horóscopo da cidade de aonde tinha saído, que sempre seria um fraude.

Ela tentou difama-lo dizendo que fazia sexo com o professor.

Ele respondeu durante uma aula como mesmo na frente. Se levantou, apontou para ela, senhor, me desculpe o que vou fazer, essa senhorita me acusa de defende-lo, porque faço sexo com o senhor.   Se fosse verdade, eu jamais teria vergonha de falar a respeito.  Mas ao contrário, se estamos aqui discutindo ética, ela não tem nenhuma.  Tudo que escreve, copia de outros jornalistas já consagrados, mudando os termos as palavras, na verdade nem sabe o que está escrevendo.   Além claro de não poder confessar que é lesbiana.  Finge estar interessada no senhor, mas faz sexo apontou para uma outra colega, com esta senhorita, que alias se fosse ela eu escolheria melhor. 

O escândalo foi tremendo.  Até o professor colocar ordem na turma foi incrível.  As outras garotas da classe, todas a acusaram de tentar se aproximar delas, nos momentos que estavam na redação do jornal da universidade.  De fomentar suspeitas sobre alguns colegas.

Ela se levantou saiu enxovalhada da classe.

Jurou vingança, mas quando chegou tudo aos ouvidos da sua família, porque na turma tinha um estudante de sua cidade, os pais vieram busca-la, porque na cidade todos falavam dela.

Ele ao contrário, passou a ser o querido de todos, vinham conversar com ele, pois ele era o único ali que nunca tinha participado de nenhuma rodinha, nem comentários sobre os outros.

O professor lhe disse não sei como fazes, mas tens futuro.  Escreveu uma carta a um editor de um jornal de NYC.   Mas acabou a universidade, foi para lá, falou com o pai em particular, pois estava farto das ingerências de sua mãe. 

O pai lhe liberou o fideicomisso que tinha para ele de seu avô.  Não era muito, mas podia alugar um apartamento pequeno na cidade.

Se apresentou ao editor, com a carta do professor.

Esse o mandou, como prova, ler dois artigos, que escrevesse o que via nos mesmo.

Leu profundamente, em sua volta estava toda a confusão de um departamento de jornalismo, telefone tocando sem parar, gente falando alto, gritos de alguém chamando outra pessoa.

Ele deixou de escutar tudo, se concentrou somente nas letras, elas pareciam dançar na frente dele.   Os dois jornalistas, tinham escrito de uma maneira pessoal, um não tinha se aprofundado no assunto, simplesmente escrito o que as pessoas em volta tinham falado, mas não levantou nenhum fundamento, se tudo aquilo era verdade ou não.

O outro, tomou partido, falava da mesma coisa, mas tampouco ia na direção correta.  No fundo falavam de um assassinato, acusando uma pessoa, mas ele tinha lido em outro jornal que tinham entrevistado o inspetor de polícia, este tinha dúvidas a respeito.

Nada era o que parecia.   Entregou um escrito, baseado somente em tudo que tinha lido a respeito.

Perguntou ao editor, ao entregar se podia, tentar entrevistar o acusado, bem como ao inspetor.

O homem leu o que tinha escrito sobre as duas reportagem, ficou olhando na cara dele.

Tudo muito sério sem acusar ninguém verdade.

Mandou uma secretária lhe preparar um crachá, que ele fosse a delegacia, falasse com o inspetor.

Este se sentou com ele, ele mencionou as dúvidas que tinha o mesmo.  De tudo que eu li, tenho a sensação, que esse homem esconde alguma coisa, ou está assumindo a culpa por alguém, ou está sendo chantageado.

O inspetor disse que não o podia colocar diante do prisioneiro, mas podia deixar que ele visse um interrogatório, por detrás do espelho.  Se tiveres alguma sugestão, lhe disse que falasse por um microfone que estava ali, ele escutaria na sua orelha.

Quando o prisioneiro sentou-se olhou em direção ao espelho, ele entrou por seus olhos, olhou tudo que tinha em frente.   Disse ao inspetor, se dirija a ele com esse nome, disse o nome, o homem abriu uma boca imensa.   Foi dizendo ao inspetor tudo que via.  Esse homem tinha mudado de nome, para escapar de uma chantagem, mas alguém tinha descoberto isso, por isso tinham matado a pessoa que ele gostava, mas o acusava de a ter matado, por usar um nome falso.

O homem se desmoronou, contou tudo ao inspetor.  Depois chorava, não se pode esconder-se no meio da multidão, ser mais uma agulha no mundo, nos descobrem sempre.

Confessou que tinha escapado da cidade aonde vivia antes, para não depor contra um homem importante. Que resultou ser solto por falta de provas.

O advogado de acusação o descobriu, estava o chantageando, quando a mulher que morreu, enfrentou o advogado, esse sem querer a matou.   Ela morreu por minha covardia, é natural que eu assuma a culpa.

O inspetor, ficou depois olhando para ele, estás na profissão errada, eres bom no que fazes, devias ir para o FBI ou CIA.

Nem pensar nisso, me usariam, nada disso.  Mas tenha certeza de que quando o senhor tenha alguma dúvida, podemos falar.

O ajudou uma série de vezes.  No jornal, ele escreveu a versão final da história, o que levantou uma série de problemas com os colegas.   Mas tinha aprendido desde criança a ignorar tudo.

Quando o mandaram assistir um debate na ONU, em que falaria um ditador de um dos muitos países da África, escutou toda a verborreia do que o homem dizia, como guiado por um imã o homem olhou na direção, dele, se sentiu incomodo.  Cortou o que estava dizendo.

Ninguém entendeu nada.  

No dia seguinte publicou uma matéria, sobre tudo que ele não tinha falado.

Dois dias depois quando saia do jornal, ele tinha por hábito, talvez como auto defesa, fazer uma coisa que a negra velha o tinha ensinado, encostado na parede de saída, olhou para todos os lados, viu dois homens altos fortes, negros armados, esperando que ele desse mais um passo na calçada, nesse momento se abriu a porta ele voltou a entrar.   Chamou o chefe de segurança, mostrou os homens, avise a polícia.  Eram dois tipos da embaixada do pais em questão, não tinham autorização para usar armas no pais.  Bem como foram liberados e embarcados imediatamente no primeiro avião.

Ele escreveu uma matéria, de um detalhe que tinha visto nos olhos do homem, tinha feito um contato através de um senador, para que um amigo deste explorasse um tipo de mineiro do seu pais, tudo devia ir para uma conta na suíça.

Foi um escândalo em letra maiúscula.

O senador, foi até a edição do jornal, exigindo que ele se retratasse, se sentou comodamente na frente do mesmo, começou a lhe perguntar, como o senhor vai explicar esse dinheiro, disse o valor nas ilhas Caimãs, falou o nome do amigo que ele ia apresentar ao ditador, quem estava no meio da negociação, citando nomes, tudo o mais, o senador, não sabia que estava sendo filmado.  Ficou uma fera, como ele se atrevia a falar dessas coisas secretas, podiam prejudicar o pais.

A contra resposta, foi, ou prejudicar suas negociações em venda de armas para o mesmo ditador.   Pois esse é o trato, o senhor apresenta seu amigo, ele compra armas da empresa que paga pela sua campanha para reeleição.

Ele queria saber quem era sua fonte.   Ele quase disse, os seus olhos.  Mas respondeu firmemente, as minhas fontes são secretas, viu que ele tinha uma amante, soltou muito próxima ao senhor, não devia falar de negócios na frente das putas que Madame fulano, arruma para o senhor.

O homem espumava, foi quando viu a câmera filmando tudo. Avançou para cima dele.

Filho da puta, vou acabar contigo, o mandarei matar.

Depois disso sofreu dois atendados, mas claro com era previdente, nada o atingia.  A um ponto que o FBI passou a segui-lo.

Conversava com o inspetor um dia num café, quando uma carro bomba explodiu justo ao lado, mas ele com seu reflexo, puxou o outro para o chão antes.

Como sabia que ia explodir, teve que confessar que seus olhos o ajudavam, pois conseguia ver movimento melhor que muitas pessoas.

Jefferson ou Jeff, o inspector agradeceu muito o ter salvado, semanas depois teve outro atentado, saia do jornal, nesse dia estava distraído, tinha tido uma proposta do diretor, ao mesmo tempo uma notícia sobre sua mãe.  Teria que ir até para visitar seus pais.

Ia se encontrar com um informante da polícia, para saber sobre um assunto envolvendo a prefeitura da cidade.

Algo o fez parar um segundo, quando viu o que ia acontecer, se jogou por detrás de uma coluna, só teve o tempo de recolher as pernas, a explosão, arrebentou todos os vidros do hall do jornal.   Mesmo assim se levantou, foi ao encontro do informante.  Ao falar com ele, viu que escondia coisas pois estava com medo.

Foi dirigindo as perguntas sutilmente, de tal maneira que o outro acabou contando tudo.

Era como se agora fosse persona no grata na cidade, as pessoas tinham medo de lhe dar entrevista.    Visitou a mãe, que já estava melhor depois de uma operação, ele tinha saído no jornal por causas do atentado.  Depois foi visitar a velha, pela primeira vez notou que ela era cega.  Quando lhe comentou, a resposta o deixou com a boca aberta.

Era cega de nascença explicou, mas conseguia ver através de sua sensibilidade, bem como dos sentimentos, cheiro, tudo que exalava a pessoa que vinha falar com ela.

Lhe disse que devia aceitar a proposta do diretor, mas faça o seguinte.

Mandou que ele visualizasse um mapa de aonde ia, lhe disse todo o roteiro que devia fazer.

Quando propôs ao diretor, mencionando sobre o que poderia escrever, ele adorou a ideia, deu carta branca para ele, mas que tomasse cuidado.

Saiu de NYC, via Paris, aonde assistiu uma reunião dos países membros da Comunidade Europeia, viu que muita coisa não era o que parecia.  Sempre havia interesses por detrás, de quem mantinha mais poder, as influências.  Escreveu um artigo, mandou para NYC.

De lá foi para o Cairo, acompanhou as protestas dos mais jovens, escutou todo mundo, como era moreno, passava bem no meio do pessoal.

Havia muita manipulação, uma coisa que ele não entendia, como os mais jovens se deixavam enganar, por uns poucos. Tinha noção exata que era o que acontecia sempre em âmbito político, os jovens como que tinham necessidade de acreditar em um líder que os levasse por diante.   Mas sempre havia algo por detrás.   Conseguiu entrevistar alguns desses líderes, sua decepção foi imensa, no fundo estavam vendidos a alguma ideia, ou algum partido que precisava que alguém manobrasse por eles.

Foi descendo o Nilo, entrevistando gente do povo, sentido nele ao visitar templos, lugares considerados sagrados, a presença de espíritos, que lhe contavam coisas.

Escreveu um artigo sobre essa sensação.   Numa das cidades, ouviu falar de uma caravana que partia para um oásis, para buscar as melhores datiles do mundo.  Conseguiu se incorporar a caravana, alugando um camelo, se vestindo como os demais.  Quando chegaram ao Oasis, era como estar num mundo a parte, ou dependendo de algum ponto de vista, fora do mundo, ali a vida se regia, fora do relógio, sim pelo sol, quando o dia amanhecia, meio-dia, pôr do sol.

Conversou com os velhos, com os mais jovens pelos seus anseios, a maioria não pensava em deixar a vida que tinha, as crianças, que de uma certa maneira eram ingênuas, como ele pensava, eram crianças.   Um dos velhos, disse que poucos jovens voltavam ao mundo real, com as caravanas, alguns retornavam porque não se encontravam nesse mundo novo.

Voltou o tempo todo meditando sobre isso.  Tinha duvidas de escrever um artigo, que os putos turistas viesse até ali, para o corromper.

Deixou o texto apartado, para quem sabe um dia escrever sobre isso.

Seguiu subindo o Nilo, até chegar a fronteira com o Sudan, conseguiu entrada alegando que ia escrever um artigo sobre as pirâmides do pais.   Mas ao mesmo tempo aproveitava como se vestia igual, ia junto com ele um guia que tinha separado de uns quantos que se apresentaram, quando falou com o homem, conseguiu ver sua alma ferida.    Esse conseguia entrevista com os que governavam o pais, ao mesmo tempo que mostrava sua realidade, a eterna briga entre as duas partes do pais.    As manobras, os enganos, para dizerem que sempre estavam certos, via claramente, os que acompanhavam o mesmos, queria logo depor para alçar-se com o poder.

Essa era a ideia sempre “o poder”.   De lá atravessaram para Etiópia, até a nascente do Nilo, a região norte, do pais que se ia modernizando, graças ao apoio dos Chineses.

Voltou ao Egito, descendo de barco pelo mar roxo, até chegar à altura do Golfo de Agaba, cheia de turistas alemães, o que ele achava interessante, de certa maneira, queriam o sol, pois era inverno na Europa, mas não se interessavam pela cultura, tampouco pela língua, ou história do pais.    Viu que ali, não podia ter o descanso que queria.

Aproveitou só para mandar desde ali, os textos que tinha escrito ao longo do caminho.

Entrou no deserto com seu fiel escudeiro, até o Mosteiro de Santa Catarina, foi bem recebido, ficou dias ali desfrutando da paz.    Teve tempo para meditar sobre sua vida, suas obrigações, conversou muito com o prior, um homem já de muita idade. Olhar para ele, era com ver um oásis dentro de um turbilhão que era o mundo.

Foi ele quem lhe procurou, sentou-se diante dele, falou das visões que ele tinha, que te salvaram até agora, falou inclusive da negra que o tinha orientado pelo mundo.

Os teus poderes ainda não estão totalmente desenvolvido, lhe propôs um lugar para meditar, uma cela, de um ermitão, nos altos do monte de Santa Catarina.  Levou só agua, datiles, viveu ali quase um mês, quando desceu, sua cara estava diferente.

Depois foi descendo por Israel, ao mesmo tempo pela Cisjordânia, ia fazendo um zig-zag, ora numa parte, ora em outra, ia analisando cada lugar, como viviam, as ideias, esperanças.

Foi até Jerusalém, aonde entrevistou, políticos, lideres ultra ortodoxos, com seus disparates todos, alguns estava louco como ele pensava.

Se despediu de sua ajudante, este embarcou para o Cairo, ele para NYC.

Voltar a cidade, ao princípio lhe causou um pouco de confusão, mas esteve fechado em seu apartamento escrevendo, tudo que tinha visto como pensava.

Queria escrever um livro, mas a cidade lhe incomodava.   O jeito foi ir para fora, se encontrou antes com o Inspetor Jeff, que disse que queria ler o livro dele contando suas aventuras, lhe emprestou uma cabana que tinha perto de uma praia.

Lá encontrou a tranquilidade necessária para escrever, o Jeff vinha passar os finais de semana, lia o que ele já tinha escrito.  Conversavam, era talvez a pessoa com quem ele podia se expor sem problemas.

Um dia lhe contou tudo, porque Jeff fez uma pergunta, que ele só podia responder contando tudo.   Era porque ele nunca tinha ninguém, tampouco falava de sexo.

Imagine estar fazendo sexo, ou mesmo antes, saber como é a pessoa, nunca daria certo, sei que tenho uma missão, inclusive me manter casto.

Depois de três livros com sucesso um dia sonhou com a velha, ele tinha ido a pouco tempo ao oculista, pois via crescer em cima de seus olhos, um película branca.  O médico disse que não tinha solução, apesar dos avanços da medicina, no final ele ficaria cego.

Entendeu que tinha chegado ao momento, só avisou ao seu amigo Jeff, que tinha chegado o momento de voltar a sua cidade.

Para seus pais, que já estavam com muita idade, foi um escândalo, que ele fosse morar no barraco da velha, que gradativamente fosse assumindo as funções dela.  Sua mãe, dizia que a maldição tinha sido colocada pela velha.

Ele nunca respondia a isso, tinha tido uma vida como ele tinha imaginado, conhecido o bicho homem para saber como se comportava.

Quando a velha morreu, ninguém sabia na verdade seu nome, para colocar na lápida, mas foi um enterro monstruoso, a quantidade de gente que ela tinha ajudado, a encontrar seu caminho, a curar.

Nos últimos meses ela o tinha ensinado a curar, quais ervas a usar do seu pequeno horto, se orientar entre elas pelo cheiro de cada uma.

Quando seus pais morreram, era um enterro normal, nada a ver com o da velha.

Jeff vinha sempre visita-lo, quando se aposentou, construiu junto ao seu barraco, uma cabana, era o único amigo que tinha.   Podiam passar horas falando, um dia apareceu uma senhora, que vinha de muito longe, trazendo uma garota com o mesmo problema.   Lhe disse que seu marido, não aceitava a filha.  A deixou ali com ele, ajudado pelo Jeff, a foram educando.  Chegou a ser uma grande médica, até o dia que veio substitui-lo.

ALL LOST

                                       

Mesmo depois de tanto tempo de tudo transcorrido, ainda tinha pesadelos sobre o que tinha acontecido.

Tinha sido um dia fatídico em que a soma dos dias, meses, anos anteriores tinha estalado em sua cara como uma bola de gás, o deixando aturdido.  Assim via os dois anos que tinha estado catatônico, até ir para o lugar que estava.  Era um correcional para menores de idade, ele não reclamava, pois em comparação com o que tinha vivido depois dos cinco anos de idade, era como estar num paraíso, um lugar que determinado dias o inferno surgia, mas ele tinha aprendido a aguentar.   Tinha uma casca ou um casulo forte e resistente que tinha construído ao longo desses anos.  Breve teria 18 anos, o colocariam para fora, honestamente isso o aterrava, falava disso muito com o psicólogo do lugar, bem como quando vinha a cada 15 dias o inspetor que tinha levado seu caso, devia muita coisa a ele.   Senão, depois dos dezoito iria para uma prisão, por muitos anos.

Seu único lugar de paz, era a biblioteca, a senhora que cuidava da mesma, o deixava entrar, sentar-se na mesa para ler, reler alguns livros, o tinha inclusive ensinado a escrever na velha máquina que tinha ali.  Assim ele preenchia as folhas que faltavam.

Quando ela contou aos professores o que ele fazia, estes passaram a lhe dar aulas particulares na biblioteca.   Claro depois tinha que aguentar as provocações, mas tinha aprendido a se defender.   O inspetor quanto tinha tempo, lhe ensinava truques, como boxear, lutar pela sua vida.   De vez em quando um dos meninos já sem escapatória nenhuma se suicidava.

Ele tinha pensado muito nisso quando voltou a realidade.  A primeira coisa que pensou, porque estou vivo.  Chorou muito por causa disso, queria estar morto como sua mãe e sua irmã pequena.   Mas estava vigiado 24 horas do dia, o quarto que estava tinha uma câmera de vigilância.

Estava pele e osso, durante esse tempo tinha sido alimentado por via intravenosa, inclusive teve que aprender a andar de novo, a mijar, cagar, pois tudo o fazia na fralda que usava.  Justamente tinha voltado a si, num dia que lhe limpavam.

Meses depois foi a julgamento, durante esse tempo, vinha um advogado contratado pelo inspetor, bem como ele, para ainda proteger alguma lacuna.  Todas as lembranças lhe pareciam distante.   Amava aquele quarto branco, a cama que estava.

Um dia perguntou ao inspetor se não poderia ficar ali naquele quarto para sempre, porque fora tudo lhe parecia uma grande merda.

Nesse momento, ia fazer 14 anos, tudo tinha acontecido dois anos antes, talvez por isso o caso não tinha mais tanto interesse.

Com doze anos tinha matado dois filhos da puta. Mas tudo tinha começado quando tinha cinco anos, viviam bem, sua mãe era uma mulher muito bonita, ele era filho dela com seu chefe, um rico advogado de fusão de empresas.

Viviam num belo apartamento, pelo que ele imaginava, um dia sua mulher, que eram quem tinha mais dinheiro dos dois, descobriu tudo.  Os dois anos seguintes que sua mãe perdeu o emprego, a coisa foi piorando, foram mudando de apartamento em apartamento, até que ela entrou para a droga, a coisa se foi ao traste, o homem que era seu pai desapareceu, algumas vezes mandava dinheiro num envelope, ela basicamente gastava tudo em drogas, depois começou a se prostituir, a coisa foi a pior, viviam num hotel de 15 categoria. Ele ficava no corredor encolhido enquanto ela atendia algum cliente.  Ficou gravida de sua irmã, mas não parou de tomar drogas, a menina nasceu com uma série de problemas, acabaram vivendo num edifício que caia aos pedaços, cheio de ocupas.  Foi quando descobriu que tinha câncer na cabeça, mas claro não tinha dinheiro para se cuidar, tentou conseguir alguma coisa com seu pai, mas esse não estava interessado, tinha medo da mulher.  As vezes lhe telefonava, se encontrava com ele, na estação do metrô, este lhe dava um envelope, lhe dizia mexendo nos seus cabelos, coragem campeão.

Como se isso fosse resolver tudo, com esse dinheiro.    Com dez anos, aprendeu a não deixar na mão dela, fazia compras de comida, ele mesmo preparava alguma coisa, lavava a roupa dele para ir à escola pública ali perto, dava banho na irmã, cuidava de sua mãe, claro já nenhum homem se interessava por aquele trapo de mulher, que no meio do sexo, podia começar a gritar, que a dor de sua cabeça era impressionante.   Saiam correndo, subindo as calças.

Ele sempre guardava dinheiro para comprar seus remédios.  Mas fazia semanas que não tinha dinheiro, de tarde para a noite, limpava dois pequenos mercados do mesmo dono, esse sempre lhe dava as frutas que tinham alguma parte estragadas, com que ele fazia um tipo de purê para sua irmã, comia o que sobrava.  Antes de ir para casa, revistava todas as lixeiras do caminho.

Alguns companheiros da escola viam isso, mas quando fazia alguma brincadeira com ele, só olhava feio.

Para sua idade, estava forte, era alto, talvez tivesse saído nisso ao filho da puta de seu pai.

Nesses dias as dores de sua mãe, pareciam insuportáveis, dormia quando muito, umas duas horas, depois começava a gritar, pior, sua irmã fazia o mesmo.  Se alguém tentava pegar sua irmã no colo para a fazer calar, era pior, se tornava agressiva, para uma criança, ela tinha uma força incrível.   Sua mãe tinha consumido seu remédio, que devia durar um mês, em uma semana.  Não tinha dinheiro, telefonou desesperado atrás do pai, atendeu uma secretária dizendo que ele estava na Europa, forçando “com sua família”.

Telefonou para sua casa, atendeu a mulher que ele sabia que era sua avó.  Mas lhe respondeu o mesmo, frisando que devia deixar seu filho em paz.

Tentou conseguir dinheiro em todos os lugares possíveis, o remédio custava caro, com o pouco que tinha, na farmácia que comprava sempre, o homem ficou surpreso do fato de sua mãe ter consumido tudo já.   Isso pode ser um problema meu filho.   Lhe deu um outro remédio, para a dor, de graça.  Passou a mão na sua cabeça, ele ainda lhe disse que podia limpar a farmácia, faria qualquer coisa para que sua mãe não sentisse dor.

Estava desesperado, quando lhe deu do remédio que este tinha lhe dado grátis, sua mãe tomou tudo de uma vez, mesmo assim, segurava a cabeça com as duas mãos, gritando, que queria alguma coisa que tirasse o que tinha ali dentro.

Limpou sua irmã o melhor que pode, saiu de novo, andou por todo o bairro, foi aonde costumava buscar comida, pois faziam dois dias que não comia nada consistente.  No caminho encontrou dois de uma classe mais adiantada, que estudavam ali, mas chegavam de carro todos os dias, já tinha sido expulsos de todas as escolas possíveis, seus pais tinham dinheiro.

Como última tentativa, lhes pediu dinheiro emprestado.

Concordaram em dar, se ele fosse buscar drogas para eles, foi o que fez, sabia que os dois eram vigiados, por isso não podiam ir. Marcou com eles na frente do edifício que vivia.

Procurou o lugar que os mesmos tinha falado, comprou o que tinham pedido, viu que um homem o seguia.     Quando entregou, os dois entraram no edifício, cheiraram toda a cocaína que lhes tinha trazido, já era quase de noite, correu pelas farmácias, aonde comprava sempre já não tinha o remédio, foi andando por todas as outras, só encontrou na última.

Voltou correndo, viu que o mesmo homem o seguia, pensava que era um ladrão, corria como um condenado.  Quando chegou na porta do edifício, encontrou uma ambulância, bem como três carros da polícia.   Desciam dois sacos desses negros fechados, demorou para entender que eram sua mãe e sua irmã, queria passar, foi quando viu a polícia saindo com os dois cheios de sangue.  Escutou como se alguém falasse ao longe, que tinham entrado aonde viviam para esconder a droga, quando sua mãe, louca de dor os atacou, a mataram, bem como sua irmã.

Alguém tinha chamado a polícia.  Ele ali parado, olhando os dois, sem se dar conta, tirou o revolver do policial que estava ao seu lado, esticou o braço atirou nos dois que lhe roubavam tudo o que tinha na vida.  Acertou na cabeça de cada um, depois abaixou o braço, não viu mais nada. Ficou ali ajoelhada, até que o homem que o tinha perseguido chegou.

Um médico disse que estava catatônico.  Isso ficou sabendo depois, hoje talvez tivesse agradecido aqueles dois drogados, pôr o terem livrado de seu inferno particular.

Mas naquele momento, lhe tiravam tudo o que tinha na vida, apesar de tudo, amava sua mãe, sua irmã.  Alguns poderiam dizer que não tinha futuro, mas era sua irmã.

Quando voltou a si, quase dois anos depois, esteve chorando na cama muito tempo. Pois se despertou, no momento que sua mãe e ela lhe apareceram, não como as vias nos últimos momentos, mas bem, ela com toda sua beleza, sua irmã como uma garota normal.

Sua mãe lhe disse toque sua vida para frente, mereces.

Dois dias depois o homem que o perseguia, se apresentou, era o inspetor Mark Davies, lhe explicou que o tinha seguido o dia inteiro, se eu soubesse naquele momento o que fazia, teria comprado o remédio, só fui entender, depois que falei com todos os vizinhos.

Estou aqui para lhe ajudar.   Ele tinha levantado toda a história, tentou inclusive falar com seu pai, mas esse disse que não ia responder nenhuma pergunta.    Apesar de o ter reconhecido como filho, chamou imediatamente um advogado, nunca fez nada para ajuda-lo, tampouco foi vê-lo nunca no hospital.  Soltou ao inspetor, que ele devia ser louco como sua mãe.

O inspetor reconstruiu toda a história, junto com o fiscal, que lhe tocou.  No fundo ele era uma vítima de tudo.

Quando foi a juízo, o advogado era um contratado pelo inspetor, fez o melhor possível. Quando lhe começaram a interrogar.  Fez uma coisa que ninguém esperava.  Disse ao Juiz, porque o senhor não me faz as perguntas todas, toda essa gente falando me confunde.  Prefiro contar para o senhor minha história, qualquer dúvida o senhor me interrompa.

No final quando o juiz perguntou por que tinha matado os dois rapazes.

Ele olhou ao juiz, talvez tenha sido uma coisa instintiva, me arrebataram as duas únicas pessoas que tinha, minha mãe, minha irmã.   Esta não tinha culpa de nada, nasceu assim, sei que a culpada podia ser minha mãe, porque durante a gravidez toda, tomou drogas, fez sexo com qualquer pessoa, para comprar mais.  Já tinha perdido tudo mesmo, já não tinha força de lutar.

Nunca soube se as dores da cabeça eram por causa dos tumores, ou se já estava num grau de loucura, total.

Contou como tinha sido esse dia, com quem tinha falado, a chamada ao escritório de seu pai, de sua casa, o que tinha respondido a mulher que ele sabia que era sua avô.

O juiz os obrigou a testificar.  Seu pai não estava na Europa, estava ali ao lado de sua nova secretária, amante.   Essa quando descobriu a história caiu fora, testificou também.  O de sua avô foi pior, disse diante do juiz, que não queria nenhum bastardo telefonando para sua casa.

Ele escutou todos os depoimentos de cabeça baixa, não queria olhar aquele homem que era seu pai, por quem tinha agora um ódio mortal.

Quando o juiz perguntou ao seu pai, se ia fazer alguma coisa por ele, as lagrimas começaram a rolar pela sua cara, mas o inspetor, segurou sua mão, o fazendo voltar a realidade.  Depois o agradeceria.

O homem que era seu pai, disse que não ia misturar seus outros filhos, com um assassino.

Lhe condenaram já que ninguém lhe queria, a ir para o reformatório.

O inspetor, lhe contou na sua primeira visita lá, que tinha pensado em pedir sua guarda, mas neste momento sua vida particular, estava desmoronando também, seu filho tinha morrido na guerra do golfo, sua mulher tinha pedido o divórcio, fiz tudo que pude para te ajudar.

Inclusive o dono do lugar que limpava, contou que era um menino correto, os professores disseram que apesar de tudo, era um aluno brilhante.  Com todos os problemas era o único que trazia os deveres prontos.  Como ele fazia, não sabiam.    Imaginavam o mesmo, escutando os gritos das duas, estudando ao mesmo tempo.

Quando o juiz lhe perguntou sobre isso, ele disse, me isolava, estudar era a única coisa que me salvava.

Já aonde estava, basicamente leu todos os livros da biblioteca.  Os outros garotos que estavam ali, não estavam interessados nas poucas aulas que existiam, uma coisa básica, os professores estavam no final de carreira.

Quando a bibliotecária falou com eles, alguns se interessaram, lhe davam aulas a parte, ficavam surpreso com sua inteligência.

O de línguas, quando soube que ele os livros que os outros internos tinha arrancado páginas dos livros, ele lia, relia até encontrar, como o escritor pensava, reescrevia esses pedaços que faltavam como ele imaginava, por isso usava a máquina de escrever, depois inseria no livro o que faltava.   A bibliotecária, depois lia o livro, dizia que tinha logica, como ele conseguia entrar nos personagens.

O inspetor trouxe todos os livros que seu filho tinha, ele pediu a bibliotecária, se os podia guardar ali, pois os outros garotos, o roubariam dele, ou queimariam os mesmo, para lhe aborrecer.   A estas alturas, ele já era seu preferido.  Era educado quando pedia as coisas.

Os maiores que ele, ou mais forte, quando queriam abusar dele, quando depois de lutar, tentar se defender, os deixava fazer o que queriam, sem se mover, escrevendo na sua cabeça uma história maravilhosa, que estava andando em algum parque da cidade, como via as outras pessoas fazendo.   Se levantavam quando eles terminavam, ia ao banheiro se lavava, voltava para sua cama, tentava dormir, não chorava mais, não valia a pena.

Ficava quieto, tentando pensar na sua vida depois dali, o que faria.

Não teria ideia, estudar como, não tinha dinheiro, teria sim que conseguir algum trabalho, mas sabia que seria difícil.

Quando comentou com o inspetor, este lhe disse que antes de sair, uma junta o analisaria, que os professores, a bibliotecária, o próprio diretor iam alabar o fato de ser o mais comportado.

Quando o inspetor sabendo o que acontecia ali, perguntou se algum dos outros tinha abusado dele?

Respondeu, encontrei a solução, me defendo, quando vejo que é impossível, deixo que façam o que querem, mas coloco minha cabeça em outro lugar, imagino que estou passeando por um parque cheio de flores, que minha mãe me segura a mão de um lado, minha irmã do outro, elas sofreram mais do que eu, então consigo aguentar.  Depois me levanto, me tomo um banho de água fria, pois a estas horas, já não tem água quente, volto para a cama, não choro, porque seria dar um prazer a eles, que me venceram, não me sinto vencido.

A cara do inspetor era impressionante o escutando falar assim, sem levantar a voz, sem chorar, nem protestar.   Era o que chocava.

Minha única preocupação senhor Mark, é imaginar o que vou fazer quando sair. Quem vai querer me dar emprego, como farei para estudar.  Tudo é uma grande incógnita.

Com 18 anos, ele seria considerado maior de idade.

Mark Davies, se preocupava que ele caísse nas mãos de algum traficante de drogas, ou de alguém que o explorasse sexualmente. ou que se tornasse um desses garotos que vendem o corpo para sobreviver.

Tomou coragem, falou com o juiz, o levaria para sua casa.  Tentaria o ajudar, ia se aposentar dentro em breve, vivia num apartamento pequeno, mas tinha um quarto que poderia dar a ele.

Tomou coragem, se desfez de tudo que tinha sido de seu filho, guardado em caixas nesse quarto, começou olhando cada coisa, chorando muito.    Mas tomou uma decisão, ficar aqui chorando não resolve nada, chamou uma instituição, pediu que viessem recolher tudo.

Ele mesmo pintou o quarto todo de branco, comprou uma cama, uma mesa de estudos, uma velha máquina de escrever dessas portáteis.

Sentou se com George, fez seu oferecimento, mas antes contou que seu filho tinha morrido na guerra, que sua mulher tinha se divorciado dele, foi tudo ao mesmo tempo que acontecia isso contigo.   Se surpreendeu que George colocasse as mãos sobre as suas, como o consolando.

A única coisa que falou foi, “li num livro, que muita água passa por debaixo da ponte, primeiro como, uma enxurrada, depois tudo volta ao normal”.  

Creio que encontrarei uma maneira de sobreviver.

Só irei para sua casa, se realmente queres, não quero mais ser um intrometido na vida de ninguém, tampouco que sinta vergonha por mim.

Mark sabia que falava do pai.   Isso tinha calado muito fundo nele.   Perguntou se pensava um dia se vingar.

Sabe quando li o “Conde de Monte Cristo”, vi tudo que ele tinha feito para se vingar, por mais que ganhasse no final, fiquei analisando muito, fez mil coisa, mas no fundo isso não o deixou mais feliz, ou mais contente.   Já tinha perdido tudo, recuperar, seu filho, a mulher amada, no fundo saberia que eram já diferentes do que ele tinha conhecido.  Não vale a pena.

Meu pai é um coitado, me pergunto se foi feliz depois do julgamento, quando todo mundo viu quem ele era, mesmo sua mulher que estava ali no tribunal, como a mulher que obrigou a me dizer que estava na Europa.  Nunca mais o respeitariam, não vale a pena, será sempre um homem medíocre. 

Se ele imaginava que seus últimos dias ali seriam fáceis, foi tudo para a casa do caralho, um fim de tarde um bando de quinze da mesma idade deles, alguns mais fortes, o arrastaram para uma lateral do edifício do ginásio, um lugar estreito, que por isso nunca tinha uma câmera de vídeo, o encheram de porrada, abusaram dele, de uma certa maneira não viu nada, porque primeiro para o poderem arrastar, deram em sua cabeça com uma pedra grande, não teve conhecimento do que passou.  Só foram notar sua falta, na hora de dormir, pois sua cama estava vazia.

Levaram mais de 3 horas para encontra-lo.  Primeiro pensaram que tinha fugido, mas saiu dali, como um vencido, na maca de uma ambulância direto para um hospital, já em coma.

O inspetor, estava furioso, mas não havia como saber quem tinha feito isso com ele.  Se culpava, o devia ter retirado de lá, quando me contou a história dos abusos.

Tinha cinco costelas partidas, bem como um desgarro anal de fazer gosto. Além da contusão da cabeça, lhe operaram a parte de maior emergência, para depois resolverem fazer o que fosse possível.

O inspetor, segurava sua mão, não saiu dali.  As vezes rezava, como o tinha feito por seu filho, outras vezes, falava com ele, pedindo que não o deixasse sozinho, pois o queria em sua casa.

Antecipou sua aposentadoria em um mês, ninguém reclamou, sabiam o que se passava.  Levou uma maleta para lá, as enfermeiras, levavam suas roupas para lavar, tomava banho no próprio quarto do hospital, deixou de fumar, ficava horas inteiras ali com ele.   Leu o Conde de Monte Cristo, analisava o que ele lhe tinha falado.  Chegou à conclusão de que Alexandre Dumas, não tinha sido coerente, pois no final, era o famoso, comeram perdizes foram felizes para sempre.

O final nunca era esse na verdade, os escritores mentiam.

Quando saiu do coma, quem encontrou ao seu lado foi o inspetor, tinha um bloquei em sua cabeça que o fazia não se lembrar de nada, tudo que se lembrava, era ter abaixado para pegar um papel que tinham jogado no chão para colocar na lixeira.

De fato, a contusão da sua cabeça estava melhor, depois de todos os exames, os médicos achavam que poderia ocasionar algum problema.

Falou com o juiz, para ele poder usar seu sistema médico, era necessário adota-lo. Conversou com ele.    Primeiro ficou olhando na cara do inspetor, imutável, perguntou se tinha certeza de que queria isso.   O senhor vê como vem junto comigo uma série de problemas.   Talvez fosse melhor eu me jogar na rua, ver o que sai.   Já estou tão insensível com todas as desgraças, que o que venha, eu como até com as mãos.

Eu gostaria muito que fosses viver comigo.  Estou sozinho, tenho poucos amigos, aprendi muitas coisas de ti.  Me deixe pelo menos ajudar-te.

Cheio de dúvidas, mas aceitou.   Passou o seu aniversário ainda no hospital, depois da última operação, para reconstrução do anus.

Os papeis o juiz resolveu rapidamente, tinha pena desse rapaz, pensava o karma dele, é forte.

Mark Davies, deu entrada, dias antes de assinar os papeis de sua aposentadoria, nos documentos que ele tinha direito ao sistema médico como seu filho.

Falou muito com uma psicóloga que atendia os policiais, se ela podia recomendar alguém para ajudar seu novo filho. George Davies.

Este gostou quando lhe propôs trocar de nome.  Um dia o Mark foi ao hospital, viu um papel cheio de seu novo nome, estive treinando como me chamo agora, creio que escreverei uma nova página na minha vida.

Foi busca-lo no hospital, com seu velho jeep, de toda a vida, contou ao George que tinha sido de seu filho, nos dois reconstruímos o motor juntos.

Quando chegou na casa do Mark, viu o quarto que tinha preparado para ele, o resto agora é por tua conta, tem uma série de livros que acabei de ler, para que leias, depois discutimos cada um.

Teve uma professora, que o ajudou a se colocar nas matérias que lhe faltavam aonde estava antes.   Escreveu uma carta a cada professor que o tinha ajudado lá, mas uma em especial a bibliotecária.

Resolveu estudar filosofia, bem com literatura americana.  Foi se destacando, nas aulas, era um bom estudante.  

Mark lhe perguntou um dia se iria escrever sua história?

A resposta demorou, mas acabou verbalizando o que sentia.   Creio que terei que me afastar muito de tudo isso, para daqui alguns anos, com outra perspectiva escrever.

Um professor, disse que havia um concurso de contos, se ele estava interessado, se dedicou de corpo e alma a escrever.   Foi o único que apresentou um trabalho escrito a máquina, os outros entregaram pen drives.

Sem querer foi o primeiro que o professor leu.  Como o tema era livre, cada um podia escrever sobre o que queria.

Ele escreveu sobre uma coisa que debatia muito com o Mark, o final das histórias.   Normalmente os finais era o bom vence o mal, foram felizes para sempre, seguiram a vida mas melhores do que antes.   Ele fazia uma versão, do depois, tinha reanalisado com Mark o final de O Conde de Monte Cristo.   Usou os personagens para criar o conto, como cada um seguia ao final.  Se eram felizes ou não, era como um jornalista entrevistando cada personagem.

O filho por exemplo, depois de anos acreditando que o pai era um, agora se via com um pai diferente que inicialmente o tinha feito sofrer, com se sentia.  

A mulher que ele tinha amado, que pensava que estava morto, o reencontro, como ela tinha sentido isso. Se sentia bem reconstruindo sua vida com ele.

O próprio Conde, se depois da vingança toda, como se sentia, como pensava em levar a vida depois disso.

Não tinha nada a ver com que os outros alunos tinham escrito, todos falavam de futuro, de coisas do momento.   Todos eram otimistas demais.

Cada um foi analisado, depois teriam que se apresentar a banca, conversar sobre o que tinha escrito.   Ele se sentou comodamente, respondeu todas as perguntas que tinham a respeito do assunto.     Contou do tempo que esteve no reformatório, dos livros que faltavam páginas, que ele tinha que imaginar o que o autor tinha pensado a respeito.  Da conversa com o hoje seu pai, sobre sua pergunta sobre a vingança.

Eu lhe disse que não valia a pena, pois o próprio karma da pessoa se encarregaria dela.

Analisei cada frase, cada personagem do Dumas, mesmos os maus, que tinha alcançado seus objetivos, se analisas profundamente, eram ricos, comiam perdizes, mas não eram felizes.

O fato de no livro, a amada, o aceitar sem muitas explicações, ela que sempre tinha acreditado em mentiras, será que aceitaria a verdade dele.  Bem como o filho, que ele não sabia que era dele, a quem basicamente tinha torturado, com o aceitaria como pai.   Então imaginei cada um sendo entrevistado por uma revista dessas que hoje em dia vendem a vida dos famosos.

Por que escreveste a máquina?   Foi uma das perguntas.

Eu escrevia a lápis, mas meus companheiros do reformatório estavam sempre roubando os mesmos, como queria colocar as páginas dentro do livro, pedi a bibliotecária que me ensinasse a usar a máquina de escrever que tinha ali, que ela não usava mais.

Que sabia que todos escreviam com um laptop, depois ou colocavam num pen drive, ou imprimiam, ele não tinha esses recursos.   A máquina velha que tinha resolvia o mesmo.

Ele acabou ganhando o primeiro prémio, que era ser publicado numa revista literária, bem como foi publicado numa revista dessas de domingo de algum jornal.

Mark ficou orgulhoso dele, tinham debatido o texto mil vezes.   Inclusive, Mark tinha feito o papel de cada personagem.

Numa entrevista, tocaram no assunto da máquina de escrever.  Ele repetiu que estava contente de usar uma velha, não lhe incomodava.  Que ainda não tinha um emprego para comprar um Lap top.

Por acaso um jornalista se lembrou dele fez uma matéria do assunto.  Começaram a surgir mil pedidos de entrevista, conversou com Mark a respeito.  Se negou a dar qualquer entrevista.

Se não fosse para falar do texto, nada.

Escreveu um livro, sobre o que já na época pensava de sua irmã, como seu passado devia ser pesado, para vir nessa vida daquela maneira. Não poder se expressar, com todos os problemas que tinha, como pensaria no seu interior.  Porque gritava, se era em protesto, se era de raiva, revolta.

Quando estava mal, pensava nisso, se fosse ela, que não falava, só gritava, como poderia expressar o que sentia.

Mark leu cada capitulo, disse que se sentia como uma dessas solteironas, que reclamam sem cessar da vida, que encaram uma realidade que nunca viveram, com um lenço nas mãos lendo essas páginas.

Pediu se o seu professor preferido podia ler.   Ele o fez, bem como levou para um editor.

Esse se interessou imediatamente, tinha feito parte da banca que tinha analisado o conto, só fez uma pergunta, ele segue usando a velha máquina de escrever?

No dia seguinte, estava em casa escrevendo, recebeu uma encomenda, primeiro pensou que tinha sido o Mark, que não estava em casa nesse momento, um laptop, bem como uma impressora.

Agradeceu ao editor.  Este marcou um almoço com ele, que foi acompanhado do Mark.

Apresentou ao editor, esse é meu pai.

Quando o mesmo disse que tinha lido o livro, que gostaria de publicar. 

Ele escutou tudo, sem dizer uma palavra.    Só disse uma coisa, se negaria falar do seu passado, já estava fazendo através do livro, só responderia perguntas nas entrevista sobre o mesmo.

O livro foi publicado com sucesso, Mark ia sempre com ele as entrevistas, quando o reporte se excedia, ele não respondia.

Quando terminou o curso, os dois foram passar uns dias numa praia, que Mark gostava muito, contou que tinha passado toda sua juventude ali, seus pais ainda eram vivos.  Alugavam essa mesma casa.   Aqui foi o lugar aonde fui feliz.

Conforme ele foi contando as coisas que se lembrava dessa época, ele escutou tudo, depois escrevia, construiu um personagem, que foi feliz primeiro, depois teve que encarar a dura realidade da vida.  Um casamento, um emprego, um filho que amava, que morria muito cedo.

Mark, comentou que quando leu os primeiros capítulos, tinha ficado arrepiado, pois tinha conseguido captar exatamente o que ele sentia, pensava desse época.

Depois escreveu uma história que escutou de um pescador, que nunca tinha saído dali, tinha nascido, crescido, sempre ali, via entrar verão sair verão, as pessoas que vinham passar essa época ali, os sentimentos que tinha, primeiro quando era jovem, inveja, pois podiam ir embora, depois os analisava já maduros, vinham ali, pois queriam recuperar uma época que tinha sido felizes, já velhos, porque era a única felicidade que tinham para recordar, mas ele sempre tinha sido feliz, principalmente quando estava no mar em comunicação com a natureza, com o deus dos mares, que lhe dava o que comer sempre.

Em nenhum momento deixou de escrever, montou um livro de contos sobre isso, a felicidade.

Quando mandou para o editor, esse imediatamente o chamou.  Tiraste meu sonho, li todos os contos até o final, queria que viesses falar comigo.

Tinha mostrado os contos para um produtor de serie de televisão, ele se interessava em montar uma série em que essas histórias de cruzavam no mesmo lugar, se ele era capaz de escrever, mas de qualquer maneira ele editaria o livro.

Conversou com o Mark a respeito, teria que fazer um curso de escritura de roteiros.

Mark tinha alugado a casa para todo o ano.  Lhe deu a chave do apartamento.

Chegou o momento de enfrentares o mundo sozinho.

Ele parecia levar uma vida de ermitão, pois fazia as aulas, aprendeu a manejar os personagens, alguns alunos se aproximaram dele, mas ele tinha medo do relacionamento.

Criou um personagem em cima dele mesmo, que ia para o mesmo lugar aonde estavam os outros, para aprender a se relacionar.

Mandou o primeiro capitulo para o produtor, este pediu um entrevista com ele, junto com o diretor que tinha selecionado.

O Mark tinha lido tudo, foi com ele para analisar o contrato, os valores da oferta.

Negociaram, ele teria que escrever seis capítulos, com finais diferentes.

Com o dinheiro comprou sem o Mark saber a casa que tinham alugado. Lhe deu de presente.

A série bem com o livro foram bem recebidos.  Um dia estava dando autografo, quando um rapaz um pouco mais velho que ele se aproximou, se apresentou, era seu irmão mais velho, filho do seu pai verdadeiro.

O esperou terminar, sentaram-se para conversar.  Em momento algum tocou no nome do pai, só no final soltou que a muito tempo não sabia dele, tinha fugido pelo mundo.

Gostaria de te conhecer, pois somos irmãos.

Ok, lhe deu o número de seu celular, quando venha a cidade, te chamarei.

Assim fizeram cada vez que ele tinha aulas, o chamava, conversavam.  Mas quem mais falava tinha sido o irmão, aos poucos começou a soltar, que isso dos filhos, era uma coisa que seu pai no final tinha vários.   Me fez uma imensa confusão quando era adolescente descobrir tudo isso. Não sabia como me posicionar, em casa, vivia nossa avó, ela chamava todos de bastardos, defendia seu filho como ele fosse um varão escolhido por deus.

Um dia minha mãe se fartou a colocou numa residência de maiores, espero que seu varão escolhido por deus venha resgata-la.   Evidentemente isso nunca aconteceu, morreu amargada, culpando todos os bastardos que tinham roubado seu filho.

Eu tinha um ódio particular por ela, pois me dizia que eu não era suficiente bonito, nem esperto como seu filho.  Um dia a mandei tomar no cu, foi quando minha mãe resolveu tudo.

Levei muito tempo num psicólogo para analisar tudo, a ideia que eu tinha era uma, a que me vendiam era outra.    Meu pai se casou com minha mãe, não porque fosse bonita, mas sim porque tinha uma bela fortuna.  Mas meu avô o obrigou a casar-se com separação de bens, não confiava nessa bela estampa.

Minha avô dizia que ele tinha feito um favor a ela em se casar, pois acabaria sendo uma solteirona.   Minha mãe se casou outra vez, vive feliz com o homem que escolheu, um homem simples, mas trabalhador.

Eu fiquei no meio disso tudo.

Embora fosse uma realidade que não tinha vivido, escreveu a história do irmão, quando lhe entregou para ler.  Chorou, vejo que me entendeste completamente.

Claro de fora é mais fácil observar, escrever, que dentro da história.

Uma vez me perguntaram se eu pensava em me vingar, eu respondi, que tinha aprendido que não valia a pena.  Que a própria vida se encarregaria disso.

Se viam agora uma vez por mês, pois ele só ia a cidade quanto tinha que fazer algum exame médico, que eram periódicos.   Seu irmão lhe contou que o pai tinha-lhe procurado, pois precisava de um doador de medula óssea.  Me encheu o saco, eu a princípio disse que não, mas por desencargo de consciência fiz o exame.   Era compatível, mas depois pensei bem, lhe disse que não, que ele se apanhasse com toda merda que tinha feito, foi de filho em filho pedindo, fiquei sabendo que contando contigo eram onze filhos.

Nenhum outro sequer fez o exame, quando a pessoa se nega, ele faz como a mãe, os chama de bastardo.  Talvez ainda faça contato contigo.

Mas não fez, talvez porque soubesse que era o que mais tinha saído prejudicado em tudo com ele.   Souberam depois que tinha morrido, sem um tostão, que toda a pose que tinha, morreu com ele.  Segundo algumas pessoas, ele acusava sua mãe de ser como era, pois tinha sido criado achando que o mundo vivia em torno ao seu umbigo.   Ele nunca era culpado de nada.

Pensou em escrever um livro sobre isso, mas achou que remover a merda, não ia ser salutar.

Mark sempre cobrava que ele devia ter alguém em sua vida, ele dizia que não, que seus traumas sexuais, era mais poderosos que ele mesmo.

Que gostava da vida que levava. Sentar-se na praia conversar com ele, as noites que debatiam algum livro que tinha lido os dois, ou algum texto que tinha escrito, os dois falavam sobre o mesmo.

Quando Mark morreu, com quase 85 anos, para ele foi duro, era o melhor pai, amigo que podia querer na vida.   Rendeu homenagem a ele na cerimônia que fizeram ali na praia.  Depois de cremado, com o amigo deles o pescador, levaram suas cinzas para alto mar.   Esse era seu sonho.

Agora escrevia mais devagar.

Quando descobriu que tinha câncer, por causa de seu trauma na cabeça, apesar de todos os exames que fazia, resolveu não tratar.

Foi nesse momento que escreveu sua história, tinha tudo guardado numa caixa em sua mente, quando a abriu, foi como abrir a caixa de Pandora, saíram as coisas más, bem como as boas.

Principalmente o que veio depois de tanta desgraças.

Entregou ao editor, lamentando que desta vez, não tinha o Mark para debater tudo. Um dia quando já não aguentava mais de dor, subiu a um pequeno barco que tinha comprado, passou pelas ondas da pequena enseada, deixou depois que o barco, fosse levado por alguma corrente, o encontraram meses depois, já quase Cabo de San Lucas, na Baixa California, já México.  Como tinha todos seus documentos, o devolveram.  Deixou a casa para seu irmão, o dinheiro deixava para várias pessoas, como a bibliotecária que o tinha ajudado, o professor que tinha lhe ensinado o que podia, para o pescador.

Seu irmão foi morar ali, dizia que tinha encontrado a paz que necessitava.

Seu corpo, já então totalmente mumificado pela água do mar, foi cremado, o pescador o levou numa urna até aonde tinha deixado o do Mark.   Assim pai e filho se reuniam.

OUTBREAK

                                          

Depois de anos se submetendo, de silêncio, de aguentar o seu pai, porque era senador, os pressionando, tudo estava preste a explodir.

Os dois irmãos, não se viam a tempos, marcaram de se encontrar num pequeno hotel, perto da universidade, não entendia por que tanto sigilo, mas aceitou.

Não se viam desde a leitura do testamento de sua mãe, aonde cada um recebeu o fideicomisso que ela tinha estipulado.   Seu pai queria vender a mansão familiar, foi quando descobriram que a mesma não pertencia a ele, simplesmente tudo era dela.   Eles teriam direito a tudo quando fizessem 25 anos.

Claro o pai queria meter a mão para mais uma campanha de senador, estava a anos no cargo sem fazer merda nenhuma.  Tanto que depois disso perdeu para outro homem mais jovem.

Os dois tinham horror ao velho, eram filhos relegados a segundo plano, desde a infância, o que lhe importava era somente a política.   Nos primeiros anos em Washington sua mãe o acompanhou, os dois ficaram com seus avôs.   Mas de repente um dia voltou, tinha descoberto que ele tinha amantes.

Para eles começou uma etapa horrorosa, lidar com o alcoolismo dela.   Anos mais tarde quando seus avôs morreram, continuavam a viver na mesma casa, estudavam em colégios públicos, usavam o nome da mãe, para não terem favoritismo, com relação ao pai.  Este só aparecia quando estava de campanha, para tê-los ao seu lado para fotos.

Marc, era mais velho que ele dois anos, estava na universidade, quando teve que trancar matricula, para ajudar a cuidar da mãe, quando pensaram que estava boa, teve uma recaída, o pai só apareceu para o enterro, vestido todo de negro, cercado de televisão, os puxou para perto deles, pela primeira vez se negaram a posar com ele, que deu uma entrevista, com lagrimas nos olhos.    Logo em seguida foi a leitura do testamento.

Quando saíram do lugar, os jornalista os cercaram, Marc, com os braços em cima do irmão Jerry, falou claramente, meu pai não tem direito a nada, foi um mal pai, mal esposo, um bom filho da puta, nunca fez nada por ninguém, não votem nele.

Este ficou uma fera, os queria fora da mansão, mas eles chamaram o advogado de sua mãe, que veio acompanhado do xerife, o canal de televisão filmou ele sendo levado para fora da casa.

Jerry agora ia para a universidade, a casa ficaria fechada.

Marc, desapareceu no dia seguinte, durante dois anos, recebia alguma chamada, quando lhe perguntava aonde estava, ele nunca respondia.

Mas sempre dizia, eu te amo meu irmão.

Ele estava na universidade, por causa do pai, estava estudando direito, vivia numa casa que pertencia geração após geração, a uma irmandade.  Ele odiava isso, com seu dinheiro próprio, alugou um pequeno apartamento, em cima de um restaurante, aonde trabalhava nos finais de semana de garçon.

Jogava basquete com os amigos, quando recebeu a chamada do Marc.

Foi até o hotel, lhe disseram o número do apartamento.  Levou um susto, quando abriram a porta, primeiro pensou que era alguma namorada do Marc, até que falou, então viu que era ele. Este o puxou para dentro.  Mal podia mover-se com o susto, pensou esse agora é travesti.

Marc o fez sentar-se, numa poltrona. Sentou-se na frente dele, sinto muito que tenha que ser assim, mas era uma coisa que tinha que fazer.

Imagina o Marc tinha 1,90 metro de altura, forte, quadris estreito.  Agora tinha peitos, não exagerados, um pouco mais de quadril, o resto era igual, estava sim bem maquilado.

Pensou primeiro que era uma brincadeira.

Sempre me senti uma mulher num corpo de homem, mamãe, foi a única que entendeu, antes de morrer me disse realize teus sonhos, não deixe ninguém interferir.  Sabia que papai, era capaz de me internar num hospício para que não fizesse isso.

Tudo é meu, os cabelos, não coloquei nenhum silicone, é um processo longo, foram necessário dois anos para fazer tudo. 

Ele continuava não acreditando.

Marc entendeu, abriu a blusa lhe mostrou os seios, fez com que a saia caísse, para ele ver que tinha agora outra coisa no meio das pernas.

Pelo susto começou a chorar, porque não me disseste nada.

Porque podias comentar com papai, ele me impediria.

Como apareces agora, crês que vou aceitar tudo isso, assim goela abaixo.

Não, sei que necessitaras de tempo para querer-me outra vez, mas continuo sendo teu irmão.

Eu sei, na mesa, tinha uma garrafa de whisky, com dois copos, um balde de gelo, serviu um ao Jerry.  Ele o tomou de um gole só, fez cara feia, pois não estava acostumado a beber.

Foram dois anos, te procurando, sem saber notícias, a não ser quando chamavas, sabia que era de alguma cabine, pois era impossível localizar.

Passei toda minha vida, com essa incógnita Jerry, como ia solucionar isso, meus anseios eram de uma mulher.   Não imaginas como é o processo de conversão, é duro, doloroso, solitário, o fiz somente com a ajuda de uma associação em San Francisco.

Eu com todo esse tamanho, ficou mais complicado.  Mas superei tudo, o pior é o depois, as dúvidas, se fiz certo ou errado.

Porque estas aqui hoje.

Vim com a associação, participar de uma palestra na universidade, a convite de um grupo LGBT.

Eu se fosse tu não iria, pois as irmandades estão pensando em atacar.

Temos proteção da policia do campus, bem como do FBI.

Não vais me dar um abraço pelo menos?

Jerry se levantou, se aproximou do irmão, chorando, me senti muito só sem ti, papai me dando na cabeça para saber aonde estavas, para vendermos a casa, lhe emprestar dinheiro para sua próxima campanha.   Quer ser senador outra vez.

Tanto fez que conseguiu que um juiz amigo seu, autorizasse entrar na casa, agora vive lá.  Eu num pequeno apartamento fora da universidade.

Vive me dizendo que se você morreu, eu tem direito a tua parte, continua um filho da puta.

Ficaram ali em pé abraçados, era estranho, mas o cheiro do irmão era o mesmo.

Não sabes como sonhei em te encontrar outra vez.

Quando é a palestra?

Hoje à noite.

Sugiro que diga aos organizadores, que uma turba de violentos, planeja atacar vocês.

Como te chamas agora?

Continuo sendo Marc, ainda não troquei de nome.

Passaram o resto do dia junto, Jerry contando sua vida de solitário.

Nem sei por que faço esse curso, odeio tudo isso, queria fazer outra coisa, belas artes, mas não estavas aqui para me defender, como sempre fizeste.

Talvez tenhamos feito errado, te protegendo de tudo, da bebida de mamãe, do filho da puta do nosso pai.

Pediram comida, ficaram ali na varanda, conversando. 

Jerry em determinado momento, soltou, ficas bonito como mulher, até eu me apaixonaria.

Ainda não posso fazer sexo. Na verdade os médicos se espantavam, de alguém que era virgem fazer essa transformação.

A única pessoa nesse tempo todo que amei sempre, foi o Brandon, lembra-se dele, era meu companheiro na universidade, papai quando descobriu que eu compartilhava um quarto com um rapaz negro, fez tudo para que eu ficasse sozinho.  Era apaixonado por ele.  Mas tudo que sei dele, foi que entrou para o FBI, como saída para sua vida.

Nesse meio tempo o chefe de segurança do campus, discutia com os organizadores, não tinham homens suficiente para defender esses viados, como ele dizia.   São como uma praga, não deviam estar aqui.

Mas os organizadores, um deles tinha um parente no FBI local, tinha pedido ajuda.

Em qualquer caso, acionariam a policia de fora do campus.

Ficaram juntos, até a hora de ir para o auditório, Marc seria a segunda pessoa a falar, tinha feito palestra em outros lugares. Mas nunca num auditório.

Quando chegaram a multidão era grande, o auditório, ficou lotado.

Ele se foi sentar na parte de cima, aonde estava uma pessoa, com um sistema de vídeo, iriam gravar tudo.

A primeira pessoa a falar, foi um homem, simpático, tinha sido mulher, falou de todo seu processo, as complicações derivadas, como sempre falou do depois, que também não era fácil, todos seguimos sendo atendidos por psicólogos, para ir superando as barreiras.

Quando Marc começou a falar, era impressionante, era uma mulher interessante, falou de seus anos de criança, das dúvidas, primeiro por falta de informação, pensei que era simplesmente gay, mas não era assim, eu queria vestir-me de cor de rosa, como as outras garotas, na etapa da universidade, a coisa ficou pior.  Mas tive que trancar a matricula, para atender minha mãe, que estava morrendo de câncer.  Foi com ela que falei, durante meses, falávamos no assunto, ela sempre me dizia que eu tinha que realizar meus sonhos, que os outro no interessavam.  Que vivíamos cercado de pessoas egoísta, de uma falsa moral, quando todos faziam de tudo por baixo da mesa.   Quando ela, morreu, voltei a estudar, mas fui para muito longe, para poder dar inicio ao processo da transformação.   Dizem que é como sair de um casulo, só que meu casulo era grande demais, quando me viam numa sala de espera do psicólogo, me olhava, como dizendo como esse vai usar um salto agulha, com todo esse tamanho de pés.

Nunca me importei com isso, nem com quem acabaria fazendo sexo, quando se faz esse processo, não estás pensando nisso, alguns talvez, mas queres é sair desse maldito casulo que te prende, faz sofrer.

 Nesse instante como uma explosão, as porta se abriram de par em par, entrando um grupo imensos de homens com armas improvisadas na mão.

Ele ficou em pé, tinha que descer para proteger o Marc, mas a porta estava fechada por fora, para proteger o pessoal do vídeo.   Ele olhou, não teve conversa, se jogou se pendurando no lustre caindo justo em cima dos dois homens que estavam lutando com o Marc, eles não esperavam que aquela mulher grande soubesse se defender.

O foi ajudando, ao mesmo tempo reconhecendo gente que estudava com ele, normalmente eram maus alunos, filhinhos de papai, que estava ali, para beber, fazer sexo, fumar marijuana, levar uma boa vida.

A porrada estava comendo solta, os policiais do campus desapareceram, tinha ordens do chefe que não deviam entrar em confronto, só ficou um, mais dois tipos, um negro alto, outro um que parecia japonês.  Os de fora, imaginavam que os que assistiam iam soltar gritinhos, sair correndo, mas não era assim.

Viu um que estava atrás de seu irmão com uma arma branca, gritou, as o barulho era imenso, nessas altura Marc estava no chão com dois homens grandes lhe dando porradas, esse o ia matar, jogou o tio que estava dando porradas, para fora do palco, foi defender o irmão.  Sentiu a navalha lhe entrando na carne, que o fazia o reconheceu, seu maricon de merda, soltou, lhe deu mais dois, como tinha caído, o mesmo o encheu de chutes, na cara, nas costelas, foi ficando tudo negro.  O único que viu por último, foi o tal negro alto, jogando o mesmo pelo alto do palco, no chão embaixo.  Ao mesmo tempo que corria para ajudar o Marc.

Depois ficou tudo escuro, se lembrava de umas luzes, que pareciam um disco voador em cima de sua cabeça, estou sendo abduzido, pensava.  Depois tornou a mergulhar na escuridão, procurando pelo Marc, justo agora que o tinha encontrado, acontecia isso.

Quando despertou, sentado numa cadeira de rodas, estava o negro alto, sorriu, sou Brandon, o amigo de Marc.

Ele queria falar, mas estava entubado, calma o médico já vem.  Olhou para a cama ao lado, viu que seu irmão estava como ele entubado.

Quando lhe tiraram o tubo, perguntou como estava o Marc.

Em estado de coma ainda, levou mais porradas que tu, teve um problema na cabeça, tiveram que raspar aqueles cabelos maravilhosos.

Nisso, viu que seu pai, entrava no quarto seguido da televisão, disse ao Brando, não permita isso, ele quer fazer propaganda à custa de nós como sempre fez.

Entraram dois homens do FBI, expulsando todo mundo.

O pai conseguiu entrar, mas nem olhou a cama do Marc, ele disse ao Brandon, tire esse serpente daqui, aonde toca vira merda, não é meu pai, sim um filho da puta.

Seu pai, quando os do FBI entraram outra vez, para retira-lo, soltou o famoso “sabem quem sou”, Jerry gritou, um bom filho da puta.

Viu que a televisão estava gravando, olhou ao Brandon dizendo, esse não aprende nunca, sempre nos usou. Viste que sequer olhou a cama do Marc.

Dois dias depois, quando ele já estava sentado, Marc despertou.

Brandon dormia numa cama ao seu lado, por se acaso ele desperta, estou aqui.

Tinha conversado esses dias.

Eu o procurei como um louco, estava no FBI, mas nunca o encontrei.

Ele usou o sobrenome de nossa avó, assim nem eu o encontrei.

Era o único amigo que tinha no campus, eu o adorava, me apaixonei, mas que futuro tem um negro que se apaixona por um companheiro, nenhum.

Pelo que sei ele também gostava de ti, me contou no dia que vi.  Me contou tudo, primeiro foi um choque, mas quando vi o que lhe faziam, me atirei lá de cima.  Não podia perder meu irmão outra vez.

Te vi voando, pensei, esse sujeito dever amar muito o Marc.  Não sabia que vocês eram irmãos.

Por que entraste para o FBI?

Porque me pareceu a solução mais logica, pelo menos ganharia experiencia.

Mas ver Marc outra vez, primeiro pensei que era um travesti, mas depois quando começou a falar da sua transformação, a saída do casulo.  Me lembrei de nossas largas conversas, ele sempre me dizia que se sentia preso num casulo, que esse o arranhava, que era muito difícil pensar numa saída.    Eu lhe dizia que o acompanharia nessa saída, pois era o único amigo que eu tinha.   Mas quando a mãe de vocês morreu, ele desapareceu.

Acabei o curso, fui fazer a parte do treinamento, me saio bem, nem sei por que me mandaram para cá.

Quantas pessoas mais ficaram feridas?

Muitas, dos dois lados, mas o melhor foi que como gravavam tudo, puderam prender o que os esfaqueou. 

O filho da puta, é meu companheiro de classe, vive na farra, é filho de um deputado, com certeza não lhe acontecera nada.

Está preso, pelo que soube, dois dias seguidos abusaram dele, para ele saber que é viado.

Pelo que levantaram a pouco tempo atrás atacou uma garota, porque não queria fazer sexo com ele.

Agora chovem denuncias contra todos eles. Não creio que o papai o consiga livrar, pois atacou um agente do FBI, meu companheiro, que quase morreu.

Quando Marc despertou, viu o Brandon perto dele, sorriu, os médicos tiraram os tubos, perguntou quantos dias estava ali.

Quase uma semana.

Preciso tomar meus remédios.

Não se preocupe, uma pessoa da tua associação, nos passou, o estamos administrando por via venosa.  Seguimos todo seu protocolo.  Viu que eu estava na outra cama, que te passou Jerry.

Nem falei nada, quem comentou foi o Brando, esse rapaz, simplesmente voou do andar de cima, através da aranha de iluminação para te defender no palco, o mesmo que te atacou, atacou a ele, bem com a mim, feriu também meu amigo.

Este ainda está em coma, pois tem uma ferida muito grave na cabeça, mas por sorte conseguimos chamar o xerife, que entrou na universidade com toda a força policial.

Depois Jerry lhe contou o de seu pai. 

Marc, soltou, filho da puta, não vai mudar nunca.  Mas desta vez, os dois vamos fuder com ele.

Já posso receber toda nossa herança, ele vai se ver mal.

Agora as duas camas estavam juntas, ficava segurando a mão do irmão. Não quero estar longe de ti, se ser assim te faz feliz, a mim também.

Brandon, agora passava uma parte do dia, no quarto do companheiro, tempos depois, se sentavam os quatro nas cadeiras de rodas numa sala.

Viram uma entrevista de seu pai, usando isso para fazer campanha, Brandon disse que conhecia a repórter.

Diga a ela, que venha aqui, que vamos acabar com esse filho da puta, telefonou para o advogado, esse veio com uma conversa mole, Brandon chamou um conhecido seu que era advogado, tinha estudado com eles.

Mandou recolher tudo do outro advogado, bem como pedir uma ordem para expulsar seu pai da mansão da sua mãe, bem como avaliar, colocar tudo a venda.  Que tudo fosse para a conta dos dois.

Na entrevistas, Marc, se maquilou bem, usou uma peruca que uma enfermeira lhe emprestou, estavam os dois lado a lado, a policia tinha descoberto, quem estava por detrás disso tudo, seu pai tinha incentivado, sem saber que era ele, para se apoiar nos direitos dos homens brancos.

Não sabia que quem fazia a palestra, era seu filho transexual.

A entrevista foi uma bomba, de estar por cima nas pesquisas, foi para o último lugar, tentou falar com eles, mas se negaram.

Dois dias depois viram pela televisão, a policia o expulsando da casa, ele reclamando como sempre.

Quando os dois ficaram bem, Jerry disse que ia trancar matricula na universidade, iria com ele para San Francisco, para estudar arte como queria.  Agora os dois tinham posse do dinheiro de sua mãe, bem como da venda da casa.

Descobriram que o velho tinha vendido alguns quadros de valor, entraram com uma ação contra ele.   Mas desapareceu do mapa, por dever dinheiro a muita gente.

Marc dizia que merecia isso, pelo que tinha feito com sua mãe, bem como com eles.

Brandon, disse que não queria perder contato.

Estiveram os dois conversando muitas vezes sozinhos.  Dizia que tinha que se acostumar a isso, saber que o homem que ele amava, agora era uma mulher, embora isso não importava muito. Por duas vezes, os pegou se beijando.

Ele agora tinha amizade com Mitsuo, o outro agente, lhe disse que tinha uma tia em San Francisco professora da escola de belas artes, que ensinava sumi-e.  Se despediu dizendo já nos veremos.

Pela primeira vez, Jerry se sentia atraído por uma pessoa tão diferente, as conversas deles era interessante, nada tinha a ver com seus companheiros de classe.

Marc lhe contou que tinha mudado de curso também, que tinha deixado direito, acabei fazendo psicologia, assim ajudo o pessoal.  Trabalho no consultório da associação.

Bem como atendo numa parte da minha casa.

Podes ficar lá comigo, uso o antigo escritório da mesma como consultório, no andar de cima tem dois quartos, um montei pesando em ti.

No avião, quando embarcaram, muita gente pensou que eram namorados, pois os dois iam sentados de mãos dadas.

Jerry adorou a casa, se instalou.  Foi procurar a professora, tia do Mitsuo, para lhe orientar, como agora era época de férias, começou a fazer aulas particulares com ela.

Pelo menos ainda não precisava de um studio.  Podia alugar, um espaço na casa ao lado que tinha uma extensão, ali tinha sido studio do pai da senhora que vivia ali.

Os cabelos de Marc, já estavam grandes outra vez.

Brandon tinha aparecido duas vezes, estava trabalhando em Los Angeles.

Marc contou para ele depois, o que tinha acontecido, depois de tanto tempo, pensei que tinha me esquecido.

A primeira noite, passamos os dois deitados lado a lado conversando, ele estranha que eu seja uma mulher, mas da segunda vez, eu já posso fazer sexo, então fizemos, foi fantástico.

Ele alucinou, bem como eu. Lhe ensinei como devia fazer para me dar prazer.

Ele tinha aproveitado para perguntar pelo seu amigo, diga a ele, que estou fazendo curso com sua tia, que quando apareça por aqui, venha nos visitar.

Brandon tinha conhecido o pessoal da associação, arrumou um emprego de advogado da mesma, saiu do FBI, agora vivia com eles, Marc era feliz,

Aquela coisa se a pessoa que adoras, é feliz, tu também é.

Já fazia aulas, pintava bem, estava colocando para fora tudo o que tinha guardado dentro de si.  

HERDEIRO

                                      

Era filho bastardo de um Lorde Inglês, mas ao contrário dos outros filhos bastardos, ele tinha sido reconhecido por seu pai desde que nasceu.  Não levava o nome completo dele, mas sim o que ele usava normalmente para fazer negócios.  Era o único da família a ter o mesmo nome do pai. Cyril Baromeu Lancaster, sua mãe era de uma família importante, que perdeu tudo, tinha uma educação boa, foi ser governanta na casa de seu pai.  O ajudou a cuidar de sua mulher sempre doente.   Com ela ele tinha 3 filhos, dois homens, uma mulher.  A diferença de idade entre seu filho menor, comigo, era de 18 anos. 

Minha mãe quando ficou gravida, ele lhe comprou uma casa na cidade próxima, com um belo horto, aonde fui criado.   Ele na verdade passava mais tempo lá, que em sua mansão.

Dizia que ali se sentia em casa.

Fui aos colégios normais na cidade, pois meus irmãos faziam verdadeiro escândalo, o mais velho era professor em Oxford, a sua filha era casada com um duque, o pequeno, George esse me odiava, bem como ao pai.  Era um bom filho da puta.   Me infernizou a vida desde pequeno, me chamando de bastardo em todos os lugares.

Em breve a escola inteira sabia, mas meu pai dizia que não era verdade, que ele tinha era ciúmes, sempre tinha sido um filho complicado, nunca foi bem nos estudos, era viciado em drogas, só pensava em gastar dinheiro, da herança do pai.   Quando a mãe deles morreu, tinha dinheiro, deixou uma herança boa para eles, que gastaram tudo.

Portanto seu pai tinha tomado a decisão de protege-lo.

Saiu de viagem sem dizer a ninguém aonde ia, uma coisa normal nele, nem a minha mãe ele dizia sua situação financeira, ou qualquer outra coisa.

Esteve fora mais de um mês, voltou como se nada.  Seguiu levando sua vida de sempre, tinha uma bela criação de cavalos, que era o que gostava de fazer. Ele o acompanhava em seus passeios a cavalo pela propriedade, amava seu pai acima de todas as coisas.

Sua mãe que tinha vivido na mansão, dizia que os filhos mal falavam com o pai, nunca o ajudaram a cuidar da própria mãe, quando ela morreu, só lhes interessava a herança.

Agora esperam que ele morra, para herdarem o título, bem como ele sabe que venderam seus cavalos rapidamente, liquidaram tudo o que ele construiu.

No passeio do dia, estiveram os dois conversando, seu pai contou que teria uma reunião com os filhos, horas mais tarde.   Lhe perguntou o que ele gostaria de estudar.

Ele era um bom aluno, teria que ir a uma universidade em seguida.  O senhor sabe que amo os cavalos como o senhor, quero estudar veterinária, me dedicar a cuidar dos cavalos.

Ele a anos assistia o veterinário da cidade, que cuidava dos cavalos de seu pai.

O pai, foi franco com ele, pelo menos tenho um filho prático, os outros são uns tontos, teu irmão George nunca terminou a universidade, porque é um vago.  É um problema sério.

Foram para a biblioteca, seu pai disse aonde ele devia ficar para escutar a conversa que ia ter com os filhos.

Se sentou no chão, atrás de um biombo que existia meio encostado a parede, era japonês, uma beleza, pintado em ouro.

Mal chegaram os filhos, nenhum deles, lhe disse bom dia pai, ou perguntou pela sua saúde, simplesmente se sentaram, perguntaram o que ele queria.  O George antes dos outros soltou que sua dotação era pequena, mal dava para viver.

O pai deixou todos falarem todos o que queriam.

Ao final, bateu com a palma da mão na mesa, agora escutem, estou escutando uma serie de merdas, que não me dizem respeito.

Tenho duas propostas, agora dependem de vocês.

A primeira, posso adiantar a vossa parte na herança, desde que fique com as cavalariças, bem como meus cavalos.  Deixarei a mansão, irei viver com Robbie, que era como ele chamava minha mãe.

A primeira pergunta era se não iam ter que dividir o resto da herança, com ele.

Não, tudo isso será de vocês.  Espero que saibam administrar tudo isso. Porém há uma cláusula, que passa de geração em geração, não podem vender a mansão, nem tampouco seu recheio.

O resto as terras, as propriedades, além dela, sim.

Se escutava uma gritaria impressionante.  O que eles queriam era vender a mansão, o pai de novo bateu a mão em cima da mesa.  Isso é impossível, não sou eu quem diz isso, é uma coisa que vem de geração em geração.  Foi instituída por alguém do passado, para preservar as propriedades.

Estendeu um papel a cada um, dizendo o que lhes tocaria.  Eu sugiro que cada um vá para seu quarto, leia com atenção, o legado de cada um, bem como os valores.

Mas aviso, isso está condicionado que vocês me deixem ir viver com a mulher que amo, levar minha vida.   Caso contrário, posso deserdar aos que estejam contra.  Essas últimas palavras pesavam muito.

Menos mal que deixa fora disso o bastardo, soltou George.

Quando a porta se fechou, o pai o chamou, lhe disse baixinho, venha comigo, fez uma coisa que ele nunca tinha visto, apertou algo numa estante da esquina, essa se moveu sem fazer ruido, se via uma escada, ele pegou uma lanterna que estava na parede, disse que passasse, depois acionou alguma coisa que a fez fechar-se outra vez.

A escada dava na parte de baixo da casa.  Essa parte foi isolada durante a guerra, se pode sair daqui, já na estrada, tem um longo túnel.

Viu que ali, tinha uma extensão da biblioteca, com livros só relativos a cavalos, livros que ele tinha lhe emprestado para ler, durante anos, depois debatiam o que ele tinha lido.

Era o único da família que se interessava pelos cavalos, os amava tanto como seu pai.

Esse quando viu a primeira vez, que os cavalos o seguiam sem criar problemas, ria muito, eres meu filho realmente.

Se sentaram em duas poltronas que estavam ali, ele tirou de uma caixa, um envelope largo, ali estava para espanto seu, uma mochila que ele não usava a muito tempo.

Aqui estão documentos, teus, propriedades nos estados unidos, três apartamentos em NYC, bem como uma pequena fazenda perto de Phoenix, aonde existe uma universidade de veterinária, é o mais longe possível de teus irmãos. Num envelope pequeno, em cima tinha um nome.  É do meu advogado lá.  Quando chegues o procure, ele te dará a posse de uma conta num banco, para onde transferi dinheiro, para tua sobrevivência.    Os apartamentos estão alugados, por um bom preço, já estão no teu nome.

Agora entendia, ele antes de viajar, tinha tirado copias de seus documentos.  Inclusive o fez tirar um passaporte.  Tudo isso está no teu nome, eles nunca vão descobrir, pois esse dinheiro fui transferindo a muitos anos por saber como eram, para teu nome numa ilha fiscal.

O advogado te explicará tudo.

Será meu herdeiro no que vai ficar para mim, a cavalariça, bem como os cavalos.  Eu irei viver com tua mãe, na cidade, pois é aonde sou feliz.

Me importa uma merda que falem mal de mim, lá estou bem.  Sentirei tua falta, como nunca senti por esses filhos da puta.

Aqui está um bilhete, quero que estejas fora daqui, antes que eles assinem os papeis.

Irás até tua casa, tua mãe já tem tua maleta pronta, ela te levará até Londres, de lá irás de avião até NYC.   Procure o advogado, tens aqui uma reserva num hotel discreto em Chelsea, depois de resolver as coisas, deves ir para Phoenix, começar a tua vida, primeiro sugiro que te aclimates, tudo lá é diferente daqui. Tua matricula na universidade já está feita. A partir desse momento a vida é tua, só peço que me escrevas, ou chame por telefone a casa de tua mãe, sempre, por favor, não se esqueça de mim.  Abraçou ao pai, o senhor sabe que o adoro, aceito fazer isso, porque sei que o senhor pensou o melhor para mim.  Depois do que escutei, sei que fariam da minha vida aqui um inferno.

Por último o pai lhe deu um envelope que estava um bilhete de avião, em turística, bem com uma certa quantidade de dólares, para teus primeiros dias.

Agora venha, acendeu uma luz, era um túnel imenso, saíras na estrada, está bem camuflado, quando feches a porta não se abrira desde fora, é como se fosse uma casinha, atrás da parada de ônibus.

Vá com Deus meu filho.  Se abraçaram muito, o pai beijou sua testa.

Ele percorreu o caminho, conforme ia andando as luzes se acendiam, em seguida se apagavam atrás.

Quando saiu, olhou para um lado, para o outro, foi quando viu sua mãe, no seu velho carro, do outro lado da estrada, já com o mesmo posicionado, em direção Londres.

Venha, temos que ser rápido, pois senão perdes o avião.

Ela o deixou ruminando, o conhecia bem, estava digerindo tudo.

Pena que a senhora não venha comigo.

Tu sabes que tenho que ficar para cuidar dele, sua saúde é frágil, precisa de mim.  Ele me disse tudo que tinha feito, bem como que iria te orientar.  Vamos ver se esses concordem que venha viver comigo.  Eu sempre o amei, apesar da nossa diferença de idade, o amo muito.

Quando fiquei gravida de ti, pensei que ia pedir que abortasse, mas ao contrário, me acompanhou a todo momento, quando te viu, já te amava, eres o único que tem o nome dele, não levas o título, mas ninguém pode te chamar de bastardo, porque tens nome.

Chegaram a Londres, já era de noite, no aeroporto se despediu de sua mãe, chamarei quando chegue a NYC, ficaram parados ali, num abraço imenso, quando viu que chamava para o embarque.   Ela ficou ali parada, com lagrimas nos olhos, ele se voltou para acenar, no momento que passava o controle.

Só teve tempo necessário para lhe acenar, seguiu caminhando, como quem vai para uma outra vida.

Não tinha menor ideia, do que ia enfrentar pela frente.

No avião, ainda pensou, ele fez tudo para não chamar muita atenção, chegou em NYC logo que o dia amanhecia, tomou um taxi usando os dólares da mochila.

Quando chegou ao hotel, era as seis da manhã, tomou um bom banho, se jogou de novo na cama, despertou as 9 da manhã, telefonou para o advogado, queria saber realmente o que tinha em mãos.

Lhe atendeu uma secretária, disse que o mesmo o esperava as 10 horas, perguntou se tinha gostado do hotel, fui eu que fiz a reserva, o senhor saia pela sua esquerda, caminhe cinco quarteirões, estará na esquina do escritório.

Sua maleta não era muito grande, sua mãe, tinha colocado uma nota, dizendo que ele comprasse roupa nova, mais americanas, para não destoar.

Parou para tomar um café na rua, não estava acostumado a lautos cafés da manhã, que ofereciam o hotel.

Chegou na hora certa ao escritório.  Se apresentou, a secretária era uma senhora de idade, riu para ele, como eres bonito, te pareces ao teu pai.

O escritório era antigo, não tinha nada de moderno, quando entrou, esperava um velho, mas encontrou um homem mais ou menos com uns 40 anos, sorridente.   Depois da apresentação, tirou da mochila a carta de seu pai, o identificando.

Vejo que trazes as escrituras, melhor será quando chegues a cidade que vais viver, que não quero saber, se por acaso teus irmãos descobrem o que teu pai fez.

Iremos em seguida ao banco, para teres acesso a tua conta.  Se quiseres pode guardar lá os documentos.

Foi um susto, porque era bom em matemática, logo fez a comparação, entre dólar e a moeda com que estava acostumado a usar, era muito dinheiro, o que lhe assustou mais, foi o valor, de dinheiro que tinha fora dali.  Esse nunca poderão rastrear, pois sempre estiveram em teu nome.

Depois foi mostrar os prédios aonde ele tinha apartamentos.  São edifícios antigos, mas tem apartamentos maravilhosos, disse o valor que cada mês seria depositado em sua conta, bem como os meses que seriam deduzido os impostos do mesmo.

Voltaram ao escritório, lhe serviu um café, pois estava zonzo.  Trataram de tudo, o advogado prestou conta de todas as coisas.

Tinha um bom pecúlio para começar sua vida.

Agora que já sabia, tinha inclusive um cartão visa em seu nome, bem como um talonário para gastos superiores.

O advogado lhe disse, que ele tinha outra carta para ele.  Tinha achado estranho, o fato de não falar do campo que seu pai tinha mencionado em Phoenix, entendeu tudo, ali teria outro advogado para conversar.

Agradeceu, ia pedir para usar o telefone do escritório, mas resolveu fazer do hotel.

Parou para comer, mas pediu uma coisa leve, pois era muita coisa para digerir.

Viu no restaurante um telefone desses de paredes, perguntou como fazia para usar, para uma chamada internacional.   A empregada lhe ensinou, lhe disse quantas moedas deveria ter, fez o troco para ele.

Chamou sua mãe, que disse que seu pai estava ali.  Falou com os dois em separados.  Seu pai lhe disse que a outra carta que ele não tinha aberto, era sobre o advogado de Phoenix, ele te ajudará.

Perguntou como tinha sido a resolução dos seus irmãos.

Me disseram que iam consultar seu advogado.  Depois falavam comigo.

Em todo caso já me mudei, se eles não querem, o problema será deles.

Nos chame como agora, quando chegar ao teu novo lugar.

Fechou a conta do hotel, pegou um taxi, foi outra vez para o aeroporto.  Perguntou qual era o primeiro voo para Phoenix.

Como tinha aberto a carta, telefonou para o advogado que lhe disse, que avisasse que voo chegaria, pois ia busca-lo.

Assim, fez, no avião, ia ruminando tudo, queria saber como era seu campo, se podia já criar ali algum cavalos, ou cavalos, não tinha ideia de preços.

Depois de cansado dormiu outra vez.

Chegou de noite em Phoenix, ficou esperando encontrar um senhor, mas quem tinha um cartaz com seu nome era um homem diferente.  Parecia um desses índios de filmes de cowboy.

Ele, riu, sempre fazem essa cara quando me veem, teu pai fez.

Venha, o levou para um carro, nem novo, nem velho, mas confortável.

Se quiseres pode ficar na minha casa, meu filho está fora.  Mas aviso, sou viúvo, minha casa é uma bagunça.   Assim podemos ir conversando.

Ele disse que iriam ser vizinhos, amanhã te levo a tua casa, tem um homem que cuida de tudo, um velho amigo meu, como teu pai, louco por cavalos.

A casa do homem era como ele tinha descrito, uma verdadeira bagunça.  O levou até o quarto de seu filho, que era todo ao contrário, tudo organizado, ele estuda medicina em Albuquerque.

Mostrou o banheiro, perguntou se queria comer alguma coisa.

Disse que não, iria tomar um banho, depois conversariam.

Quando foi ao encontro do advogado, esse disse que era descendente de índios, seu nome era Sam, estudei com bolsas de estudos, como faz meu filho agora.

Passou os documentos da propriedade, bem como quanto tinha de terras, não era muito, mas dava para começar como ele dizia.

Terás que comprar um carro de segunda mão, pois a caminhonete do Tom é muito velha.

Depois se quiseres, fazes transferência de tua conta no banco.  Sugiro disse rindo que adapte teu nome para uma coisa mais americana, bem como tuas roupas, são muito inglesas, deves estar morrendo de calor com elas amanhã de manhã.

Depois foi dormir, por causa do fuso horário, despertou de madrugada, ficou com as mãos atrás da cabeça pensando, tinha que começar uma nova vida sozinho, não lhe dava medo, mas iria sentir falta de seus pais.  De uma certa maneira o tinham protegido, ao longo dos anos, dos irmãos, bem como do bullying na escola.

Ele não tinha vergonha como podia se esperar, pois era fruto do amor dos dois, isso de ser bastardo nem pensar, pois levava o nome dele.

Ia ser ver como se podia chamar. Talvez Cy, como dizia sua mãe.  Até nisso na escola fazia cozação, pois ao seu pai lhe chamavam Sir Lancaster.

Tomou um café logo de manhã, com o Sam, era diferente totalmente do café inglês, mas gostou ele sempre tinha gostado de café forte.

Depois, entraram no carro do Sam, eu avisei ao Tom, ele pediu para sua mulher arrumar a cabana para ti.

Era realmente uma cabana como dos filmes, de madeira e adobe, bem estilo da região. Sam explicou que Tom vivia na propriedade a muitos anos, que seu pai tinha querido conserva-lo.

Afinal ele entende de tudo que está aqui.

Espera ver outro velho, mas Tom devia ter uns cinquenta anos, depois descobriria que tinha mais de sessenta.  Não aparentava de maneira nenhuma, chegou montado num Mustang, ele imediatamente ficou louco com o cavalo.

Sam os apresentou, te deixo em boas mãos.  

Tom mostrou a cabana para ele, perguntou como queria que o chamasse.

Olha meu nome é Cyril, mas podes me chamar ou de Cirilo, ou Cy, me dá igual.

A cabana por dentro era perfeita, uma sala com cozinha pequena, um quarto, um banheiro, um outro quarto montado para estudar.  O velho tinha pensado em tudo.

Preciso comprar roupas Tom, assim não posso montar a cavalo.

Isso lá é verdade, venha comigo.

Foi então que entendeu a história do carro.  A caminhonete do Tom era bem velha, mas gostaria de uma igual a sua o motor era como um gato.

Comentou isso com ele.

Riu muito, é meu filho que quando vem faz isso, ele é louco por motos, jeep tudo que tenha motor.  Quem sabe essa semana aparece por aqui.  Outra coisa, minha mulher virá todos os dias cozinhar para ti, depois basta dizer o que gosta de comer.

Não tenho problemas, Tom, como de tudo.

Foram a um armazém imenso que ficava perto da estrada, ali tinha de tudo para o campo, bem como roupas.   Fez como um enxoval, inclusive roupas para o inverno.

Depois disse para o Tom, vou precisar de um carro de segunda mão, para ir à universidade. Este disse que o ia levar a um amigo seu, meu filho quando passa um tempo aqui, arruma motores para ele.

Começaram a falar de cavalos, amei o teu Mustang soltou, saia sempre para montar com meu pai, sabes que ele é um apaixonado, transmitiu a mim esse amor por eles.

Terás depois uma surpresa.

Olharam os carros, ele viu um jeep estilo militar, perguntou se podia experimentar, tinha que tomar cuidado pois estava acostumado a dirigir na Inglaterra.  Era ótimo, o amigo do Tom, soltou, foi o Evan quem o arrumou.

Fico com ele.  Pagou com um cheque, ainda não transferi minha conta, mas se quiser compensa o cheque depois venho buscar o jeep.

Imagina, se eres amigo do Tom, sei aonde caça-lo.

É o meu patrão, o senhor Cy Lancaster.

Depois foi seguindo o Tom até o banco.  Lá pediu a transferência de conta, bem como se tinha uma caixa forte para guardar papeis importantes.

Claro que sim, quando queira.

Depois tornou a ir seguindo o Tom até o rancho.  Lá estava sua mulher preparando comida para ele.  Foi apresentado, era uma índia como ele, uma senhora muito bonita. Apertou sua mão, disse que estava acostumado a comer qualquer tipo de comida.

Disse seu nome na língua deles, mas pode me chamar de Matilde.

Tom ainda comentou que agora seu pagamento seria mais fácil, pois vinha de NYC, a sai da minha conta, o velho pensou em tudo.

Amo meu pai Tom, um homem incrível.

Saiu com ele, subiram no jeep, ele indicou o caminho, para mostrar as terras que tinha, ele já queria compra um casal de animais, para começar seu plantel.

Qual foi uma surpresa, num pasto mais acima, tinha um casal de Mustang.

Ele comprou logo que os viu, o levei a reserva, um parente tem criação, me disse meu filho ficará louco com esses cavalos.

No rancho tinha antigamente um celeiro, para eles passarem as noites de inverno, mas pegou fogo, o antigo proprietário morreu dentro, estava completamente louco, resolveu fazer uma destilaria, ela explodiu com ele junto.

Tens ideia de quanto custaria ter outra.

Não sabia por que, tinha certeza de que iria amar viver para sempre ali.  Desceu do jeep, entrou no lugar que estavam os cavalos.  Tom avisou que não estavam domados ainda.

Ele ficou parado, esperando que os animais sentissem seu cheiro, que se acostumasse, ficou observando a narina deles, quando viu que se acostumavam, começou a chama-los até ele.

Tom estava com a boca aberta, quando chegaram perto, se deixaram acariciar por ele, viu que os casal relinchava como dizendo gosto dele.

A maior surpresa, foi quando ele montou o Mustang, a pelo, primeiro este estranhou, mas se deitou como tinha visto fazer nos filmes de cowboy, ele sempre torcia pelos índios, seu pai se matava de rir.

Ficou ali deitado em cima do cavalo, segurando sua crina, passando a mão pelo seu pescoço.

Depois desmontou, foi em direção ao Tom, com os dois andando atrás dele.

Terei que comprar uma sela para montar.

Na cabana tem.  Seguiram seu caminho até uma montanha que tinha atrás, suas terras vem até aqui, mostrou um pequeno lago.   Meu velho me conhece realmente, contou para o Tom que os dois gostavam de filmes de cowboy, eu sempre torcia para os índios, ele dizia que eu devia ser a reencarnação de algum, pois os cavalos sempre vieram perto de mim.

Quando era pequeno, montei a primeira vez a pelo, ele ficou como louco.

Amanhã gostaria de fazer esse caminho logo cedo, podíamos levar os cavalos mais para perto da cabana.  Assim eu poderia montar um deles.

Acho que ainda é cedo, mostrou aonde morava, era perto da cabana, ali no cercado, tinham mais cavalos, mostrou para ele, um baio maravilhoso, este teu pai comprou para ti, amanhã de manhã, o levo até a cabana, saímos pelo campo.

Ele perguntou ao Tom, aonde poderia ir para chamar seus pais.

Vamos comer, depois iremos até um posto de gasolina, assim abasteces o carro, telefona.

Os dois iam comer fora da casa, ele disse que nem pensar, odiava comer sozinho, já o tinha feito esses dias, vocês me fazem sentir em casa.

Sua mãe sempre fazia questão de rezar antes agradecendo, ele o fez, agradecendo aos dois o que lhe tinham dado de presente.  Nunca seria o suficiente para agradecer.

Quando foram ao posto de gasolina, ele trocou bastante dinheiro por moedas.  Telefonou, os pegou jantando.  Riram com ele, os gritos que dava.   Pai o senhor foi maravilhoso, amei os cavalos, tenho ideias.

O Velho ria, eu imaginei, já estou vivendo definitivamente com tua mãe, eles assinaram os papeis, mas querem saber aonde estás, na verdade nem tua mãe sabe.  Só eu, jamais o direi.

Aproveite tua vida filho, construa algo para ti.

Falou com sua mãe, disse o quanto estava feliz, mas o melhor era se os dois estivessem aqui, a viu preocupada.

Perguntou o que passava.  Falou mais baixo, amanhã me chama, disse a que horas.

Sabia que nessa hora seu pai estaria cavalgando.

Ficou inquieto, mas não adiantava, sabia que ela não falaria na frente dele.

Nessa noite dormiu tranquilo, a roupa de cama cheirava a limpo, jantou sozinho, pensando no que gostaria de fazer.

Mas antes queria ver como era a universidade, se levantou muito cedo, quando viu o Tom com os cavalos, lhe disse que tinha que falar com sua mãe, primeiro, montou no Jeep, foi até o posto de gasolina.  A pegou em casa como ela queria.

Ela contou tudo, tinha sido complicada a negociação.  Eles queriam que teu pai vendesse os cavalos, repartissem o dinheiro com eles.      Mas ele se negou, era a única coisa que ficava para ele.

Pressionaram muito, principalmente o George, ontem me parou fora do supermercado, me perguntou aonde andavas.  Respondi que não sabia, que teu pai tinha te mandado para fora do pais.  Soltei que pelo que ele dizia, acreditava que tinhas ido para a Austrália, soltou uma daquelas risadas de louco, me soltou na cara, assim não precisava matar-te.

Tome cuidado, meu filho, esse louco é capaz de tudo.  Seu pai sabe que ele tem uma dívida monstruosa com o jogo.  Vamos ver como faz com a parte dele.

Voltou para a cabana, foi dar o passeio a cavalo com o Tom, esse o viu preocupado.

Realmente Tom, minha cabeça fica por explodir, contou o da família do seu pai, apesar de me ter dado seu nome, seus filhos me chamam de bastardo.  O menor deles, é um pouco louco, sua vida é gastar do dinheiro da família.  Por isso meu pai me mandou para cá, para que pudesse tranquilamente construir uma vida.

Eles já queriam vender os cavalos que meu pai ama tanto, eles odeiam os cavalos, dizem que seu pai ama mais a eles que seus próprios filhos.

Ele entregou em vida toda a herança que eles tem direito, vamos ver quanto tempo dura.

O único com a cabeça mais assentada, é o mais velho que é professor em Oxford, a filha é uma tonta que se casou com um sujeito muito mais velho do que ela, só porque tem um título, mas não tem dinheiro.   O pequeno, o George, esse me odeia, pois acha que lhe roubei o pai, vive nas drogas, nunca estudou direito, é viciado em jogo.   Já queimaram a herança de sua mãe, agora vão fazer o mesmo pelo do pai.

Por isso meu pai me mandou para longe.    Nunca deixariam que eu tivesse parte na herança deles, mas meu pai é mais inteligente.

O tempo foi passando, já estava fazendo aulas na universidade, os professores contente com ele, pois tinha já uma certa prática.  Principalmente pelos cavalos.

Um dia estava no posto de gasolina falando com seus pais, viu um cachorro abandonado, que estava ali parado olhando para ele.

O pai, lhe contou que apesar de ser proibido, tinha esvaziado a casa, vendido tudo que podiam. Podia denuncia-los, mas isso só iria ser uma coisa mais complicada.

Até a louça da casa venderam.  Despediram todo o pessoal, mas eu já sabia, os indenizei bem.

Por isso não te quero por aqui.

Falava sempre com a mãe, na hora que o velho não estava.  Antecipava seu horário de ir à universidade, para isso.

Quando acabou de falar, o cachorro o seguiu, o fez subir no jeep, passou numa veterinária, para saber se tinha algum chips.

Não tinha nada, perguntou se podia ele mesmo dar-lhe um banho, assim o fez. O Cachorro ficou feliz, comprou um colar, lhe deram vacina, examinou seus dentes para ter certeza mais ou menos da idade dele.  Calculou uns dois anos, passou a chamar o mesmo de Jeep.

Vamos embora Jeep, o veterinário ria, esse encontrou um dono perfeito. Pagou sua conta, foram embora.

Quando chegou em casa com o Jeep, Tom ria muito, já arrumaste um amigo pelo menos.

Na universidade, todo mundo o olhava de lado, que fazia aquele inglês ali.  Prestava atenção quando falava para ir perdendo o sotaque, mas de uma certa maneira, sabia que o olhavam assim como os professores o tratavam.

A maioria dizia o professor, iria para alguma cidade, abriria uma clínica, ele sabiam que iria fazer outra coisa.

Nessa noite, colocou uma mantas velhas que Matilde trouxe, as colocou no lado da cama, para o Jeep dormir.

Agora quando levantava de manhã, colocava ração para ele, tomava o café falando com ele.

Mas na hora de sair, lhe dizia, fique tomando conta da casa.  O cachorro parecia entender, mas quando ele voltava estava super feliz.

Na universidade viu um cartaz de uma feira de animais, comentou com o Tom, achas que vale a pena ir olhar.  Ou pelo menos, para que eu tenha uma ideia.

Vens comigo?

Claro Cy, irei contigo, assim te controlo para não ser enganado, teu pai quando esteve aqui, queria comprar cavalos, todos queriam engana-lo, tive que negociar por ele.

Perfeito, assim me sentirei seguro, isso conversaram no seu passei diário, para ver os Mustang.

Esse quando o viam, corriam com loucos, o Jeep corria com eles.

Observou que a égua estava grávida ficou super feliz, falava com o garanhão, vais ser papai, tinha que conseguir mais umas duas éguas para ele, assim poderia ir aumentando o plantel.

Conversou isso com o Tom.  

Podíamos ir depois da feira, até a reserva, aonde vivem meus parentes, algum pode ter para vender, mas me deixe negociar com eles.

Ele agora estava com os cabelos compridos, eram escuros como de sua mãe, se não fosse seus olhos azuis como de sua mãe, até poderia passar por um índio.

Estava mais relaxado, ele pelo menos notava até na sua maneira de andar.

Avisou a mãe que estaria fora uns dias, falou dos cavalos, telefono na semana que vem.

Disse ao pai, que ia ser avô, mas dos Mustang.

Arrumaram suas bagagens, foram para a feira, o Jeep veio junto, no meio da multidão, ele andava colado a perna do Cy.  Olhavam por tudo, viram vacas, bois de criação, bem como material para o campo, tinha lá um trator velho que funcionava para plantar o pasto.

Ele não queria plantar mais nada que isso, coisas para alimentar os cavalos.

Quando chegaram nessa parte, foi dando uma olhada em tudo, viu os preços que eram de alguns alto, principalmente cavalos de corrida, seu tinha um que tinha sido campeão, que agora servia para montar as éguas.

Ia conversando com o Tom em voz baixa, de repente um homem impressionante parou na frente do Tom o levantou do chão, pai, o que fazes por aqui. 

O apresentou, Evan meu filho.

Este tinha uma altura impressionante, apertou sua mão, ficou de boca aberta o olhando, nunca tinha visto um homem assim tão bonito.

Venham comigo, vou me apresentar em seguida no rodeio.

Filho, precisas deixar essas coisas, quando apareces, é porque tens uma perna quebrado, uma costela, um braço, sabes que tua mãe fica preocupada.

O filho só escutava, no final desse ano, deixo tudo.

Sentados na arquibancada, Tom soltou, sempre foi assim, ama os cavalos, mas o rodeio é a sua paixão, menos mal que não criou família, pois essa ficaria de lado.

Ficou excitado, nunca tinha visto um rodeio, quando o Evan se apresentou, ficou impressionado com o manejo que tinha com os cavalos.  As garotas gritavam o nome dele, mas ele parecia não dar importância, o viram depois, quando ele recebia seu dinheiro.

O pai disse que iriam para a reserva.  Vou com vocês, deixei meu jeep lá, vim com um amigo.

Quando viu o jeep do Cy, ficou rindo, consertei esse motor, é bom.

Quando viu o cachorro montar no jeep, o tem bem domesticado.

Nada, ele foi quem me encontrou. 

Tom soltou, o precisa ver com os cavalos, ele monta a pelo aquele Mustang que seu pai comprou do teu tio.

Ah eres filho do inglês?

Sim sou seu filho, estou estudando veterinária, meu sonho desde garoto.

Chegaram na reserva de noite, ficaram num motel, um pouco antes, daqueles de mala morte, ficaram pai e filho num quarto, ele no outro.

Foram jantar, estava fazendo frio, estavam comendo umas costelas, ele separando os ossos para o Jeep.

Quando Tom foi ao banheiro, o Evan perguntou se ele pretendia ficar muito tempo.

Evan, uma larga história, creio que ficarei para sempre, não creia que volte algum dia para meu pais, uma série de problemas.

No quarto do motel, tinha um tapete ao lado da cama, que Jeep se acomodou.

Dormiu pensando no Evan, tinha um corpo fantástico.  Nunca tinha se apaixonado na vida, afinal ele só tinha 19 anos, mas teve que se controlar, para não fazer como as garotas, que gritavam o nome dele.

No dia seguinte entraram na reserva, ele estava moreno do sol, não chamava tanta atenção, justamente havia um cercado no meio da reserva, cheia de cavalos Mustang, ele ficou como louco.  Os homens estavam todos em volta, Tom e Evan foram falar com os parentes, ele quando viu estava dentro, por um impulso, ficou parado, quieto, escutou o Evan lhe dizendo para sair dali.  Mas ele esperou os cavalos se acostumarem a ele, foi até o centro do cercado, os animais se aproximavam dele.  Um deles, mais negro que branco, tinha a cabeça negra, com uma mancha como um relâmpago, este se aproximou, colocou a cabeça nos seus ombros, ele se virou, começou a passar a mão pela sua crina, pelo pescoço, falando baixinho, relâmpago negro, que maravilha, quando se afastou, viu que o cavalo, tinha alguma coisa na pata, se ajoelhou, para examinar, não se escutava ruido nenhum.  Tirou uma pedra com uma ponta, que estava presa da pata.  O cavalo, passou a língua pela sua cara como se fosse um cachorro.

O levou até o cercado, perguntou se alguém tinha um desinfetante, um garoto, saiu correndo, voltou com um desinfetante desse de ferida, servia.

O dono estava furioso, dizia que agora não o poderia vender como bravio para um rodeio.

Ele balançou a cabeça, dizendo ao Tom que o queria.

Evan ria, não poderias trabalhar num rodeio, ias enfeitiçar os cavalos.

Os homens ficaram pensando que eras um feiticeiro, só o velho faz isso com eles.

Que velho.

Ah meu avô, ele é o chamã aqui da reserva, depois vamos vê-lo.  Começou a rir, tua fama chegou antes, ele vinha com o garoto que tinha visto antes, o levando pela mão.

Esta cego, mas pode se virar sozinho, o garoto é filho de uma prima que desapareceu, vive aqui na reserva porque não tem aonde ir.

Aqui esta o homem avô, lhe disse o garoto, o velho, estendeu as duas mãos, Evan seu sem vergonha nunca vem me ver, tens medo do que eu possa falar.

Quando sua mão tocou a do Cy, ficou quieto, finalmente chegaste meu filho.

Tom correu, mas já era tarde, ele se afastou arrastando o Cy.    Falou com o garoto alguma coisa, este ria muito.

Entraram na sua cabana, esta tinha no meio um parte mais fundo, aonde se colocava lenha.

Tom entrou atrás deles, a meu filho, me trouxeste finalmente esse irmão perdido pelo mundo.

Eu disse que um dia ele ia chegar aqui.

Tom abraçou ao pai, ele é como o senhor um feiticeiro com os cavalos.

Tom disse que tinha comprado o cavalo como ele queria, tive que pagar mais, pois o homem dizia que esse cavalo, nunca permitiu que alguém chegasse perto dele. Vens tu, o fazes, além de cura-lo.   Mas claro, ele tinha uma pedra pontiaguda, presa no casco.

O velho disse ao garoto, as ervas que ele devia trazer, para fazer um curativo no cavalo, porque não vão o trazes aqui para o cercado de casa.

Pegou a mão do Cy, te espero para conversarmos, vocês ficam aqui em casa.

Cy saiu falando com o Tom, por que esse garoto está aqui abandonado?

Sua mãe, sempre foi louca, um dia fugiu, dizem que trabalhava num casino índio, mais ao norte, depois desapareceu, quando voltou estava gravida, ficou na casa do velho, dois dias depois do parto foi embora.   Meu filho é igual, quando viu um rodeio, desapareceu, passou um ano pelo mundo.  Agora vive aqui, mas cada temporada, se embarca num rodeio, diz que não pode controlar isso.  Volta as vezes com um braço, uma perna quebrada para a mãe cuidar.

Quando vejo você falando com teus pais, é muito diferente, fico com inveja.

Foram ao cercado outra vez, o cavalo negro, veio direto até ele, falou no seu ouvido, separa duas éguas para ti.

Os homens ficaram de boca aberta, porque o cavalo realmente separou duas éguas novas, para ele.  Aí tens Tom, negocie essas duas éguas, pergunta aos homens como posso pagar.

Abriu a porta do cercado, o garoto lhe trouxe uma corda, ele colocou em volta da cabeça do cavalo, mas esse o seguiu até um cercado pequeno na cabana do velho.

Quando chegaram o Tom, com o Evan trazendo as éguas, escutou o cavalo relinchando, como dizendo obrigado.

Ele, com o garoto, colocaram a compressa que o velho tinha feito, na pata do cavalo, enrolando com um trapo limpo.   O garoto estava alucinado, o cavalo lhe permitia passar a mão pela sua crina.

Desta vez vocês não vão escapar.  Evan dê um taparabos para o Cy.

Ele nunca tinha colocado um, mas ficou com a boca aberta de ver o Evan literalmente nu.

Depois foram para uma cabana ao lado, aonde no centro estava já a lenha em brasas.  Todos se sentaram no círculo, inclusive o garoto.  Evan ainda soltou como protesto, ele é muito jovem para isso.

Nada disso, tem tudo a ver com a vida dele.

Quando começaram a suar, o velho começo cantar uma cantiga antiga, jogou as primeiras ervas nas brasas, ele se sentiu no ar.  Não demorou muito a perder os sentidos.

Não soube quanto tempo esteve ali, viu várias vidas desfilando dentre de sua cabeça, uma voz dizia, faz muito tempo que te esperamos, mas tinha que vir de outro lado do mundo.

Se viu no deserto cercado de árabes, observando cavalos, como mais um deles.

Viu o garoto, sempre ao seu lado.  Na sua cabeça o velho dizia, foi filho teu em várias vidas.

Mostrou para ele o que ia acontecer, ele queria gritar avisando seus pais, mas o velho disse, já é tarde filho, isso já aconteceu.   O melhor é virar pagina.   Depois viu o seu pai, de mãos dadas com ela, lhe diziam, para isso te preparei, se estivesses aqui, ia acontecer contigo, não podia permitir.

Depois um poço negro, quando voltou a si, ele era o único ali dentro, como se soubesse o velho apareceu, não se preocupe, o Tom foi arrumar um trailer para levar os cavalos.

A quanto tempo estou aqui?

Uma semana, precisava limpar tudo do teu passado, para que possas ir em frente.

Quem matou meus pais?

Não se preocupe, quem faz essas coisas, paga da mesma maneira, logo saberás quem, já está preso, completamente louco.

Entendeu que era o George.

Ele tomou um banho de água fria, depois de tomar muita água que o velho lhe deu.  Disse queria pedir um favor, quero que leves o menino. Ele é como tu, mas necessita de uma família, aqui, fica pelas ruas, precisa de uma escola.  Eu fiz vir sua mãe, assim ela pode assinar documentos se o quiseres levar.

Tom e Evan voltaram, tinha conseguido na cidade um tipo um trailer para levar os cavalos, era velho, olhei o motor, me parece bem, se o trazemos, posso arrumar o motor.

Acertou com o Tom, fez cheques pagando os cavalos, bem como o trailer.

Depois se sentou fora da casa, conversando com o Tom, como ele sabia toda a história, disse que enquanto estava dentro, tinha visto como matavam seus pais, num acidente de carro, cortaram os freios, acho que foi o George, o filho da puta, colocou fogo na cavalariça com todos os cavalos dentro.  Está como um louco, já deve ter gastado todo o dinheiro.

Nunca imaginei que ele chegasse a isso.

Mas como aconteceu a semana passada, já nem vale a pena ir até lá, meu pai realmente sabia o que fazia.

Tocou no assunto do garoto.

O coitado nem nome tem, o chamam de Boy, nada mais, como a mãe sumiu, não sabendo quem é o pai, fica difícil.

Teu pai disse que está trazendo até aqui.

Bom eles com seus poderes, tudo é possível.

Vou colocar o meu nome nele, temos um vinculo muito forte do passado.  Gosto dele.

Tom ficou muito sério, soltou uma coisa, só quero que tenhas cuidado com meu filho, vi como o olhas, ele fascina todo mundo, mas depois vai embora, quando a aventura o chama, não machuque teu coração.

Ficou espantado com isso, porque ele só tinha admirado seu corpo, nunca tinha imaginado ter nada com ele.

Verbalizou isso.

Mas ele percebeu, vai fazer tudo para te conquistar, não deixe que se aproxime muito de ti.

Escutaram ruídos, era ele com o Trailer, vinha com mais dois amigos, se via que tinham fumado maria.    Cy odiava drogas, sabiam o que podiam fazer. O velho saiu da cabana, deu uma bronca fantástica neles.  Depois o culpado é o homem branco, porque engana uns homens idiotas.

Disse olhando em direção ao Evan.  Entre outra vez, para o quarto sagrado seu sem vergonha, acabo de te purificar, tu novamente fazes merdas.

O velho falava na língua deles, ele sem saber por que entendia tudo. 

O velho olhou na sua direção, dizendo, estava adormecido na tua memória.

Ele sempre foi assim Tom?

Eu na verdade não sou filho dele, mas sim sobrinho, meus pais morreram ele me criou, sempre foi assim, agora que esta cego mais.

Evan sempre foi bala perdida, só respeita a ele, eu posso falar mil vezes não escuta.

O garoto, veio do cercado, acho melhor dares uma olhada no cavalo, acho que tem a pata um pouco inchada.    Ele foi até lá, uma parte estava inflamada.  Disse ao garoto o que tinha que fazer, coloque uma coisa bem afiada com corte no fogo, depois me trazes correndo, foi quando se deu conta que falava com ele na língua deles.

O garoto obedeceu rapidamente.

Ele se sentou no chão, com a pata do cavalo no seu colo, ia falando com ele, vou cuidar de ti, meu preciso raio negro.

O garoto veio correndo um com canivete do Tom, este ficou olhando do cercado, falou baixinho para o garoto quais as ervas que devia triturar, colocar aceite, diga ao avô o que estou pedindo.

Com jeito, cortou a parte inflamada, retirando todo o pus, que lhe sujou a roupa, mas a ele isso não importava, pediu ao Tom aguardente, ou álcool.  Este trouxe um pouco de aguardente que tinha no Jeep.   Ele derramou em cima, o cavalo resmungou, mas como sempre lambeu a sua cara.  Já entendi amigo, agora eres meu filho maior, não se preocupe.

O menino se aproximou, lhe deu o que o velho tinha mandado, envolveu de novo num trapo, o garoto o ajudou a se levantar.

É muito bonito, não é verdade?

Ficaram ali os dois, cuidando das éguas, eu acho que ontem à noite ele montou esta, pois a outra está com ciúmes, ficaram os dois rindo.

Perguntou ao garoto como ele se chamava.

Sorriu triste, o nome que queiras, cada um aqui me chama de uma maneira, mas apenas sou neto do velho de longe, ele me cuida, mas nunca vi sequer minha mãe, ela foi embora quando eu tinha dois dias.

Queres ir comigo? Se eu conseguir autorização é claro.

Uau, ia amar viver com vocês, assim ninguém ia me chamar de bastardo.

Isso foi como uma patada no coração do Cyril.  Ele sabia o que era isso.

Dois dias depois apareceu a mãe do garoto.  Estava furiosa com o velho.

Este soltou na cara dela, eu é que devia estar furioso contigo, te deixo ficar na minha casa, para parir, te ajudo, desapareces deixando um garoto com dois dias na minha mão.

Não sei quem é o pai dele.

Não importa, amanhã, vais com teu tio Tom, mas este senhor, vais dar a guarda do garoto para ele, bem como em adoção.   Ela quis negociar com o Tom que queria dinheiro.

Ele ficou espantado quando o Cyril, se levantou, falando a língua deles, furioso, como ela ousava isso, vender seu próprio filho.  Já não basta venderes teu corpo a qualquer fulano para pagar teus vícios, ainda queres vender teu filho.

Ela abaixou a cabeça.  No dia seguinte foi com Tom, com ele, a autoridade ali da reserva, assinou todos os papeis.   O menino olhava aquela mulher horrorizado, estava muito maquilada.

Ele lhe perguntou como gostaria de ser chamado.

Ele sorriu timidamente, Cyril como tu.

Acabaram te chamando de Junior, não preferes um nome só teu?

Não, não me importo chamar Junior, porque é teu nome também.

Registraram o garoto como Cyril Baromeu Lancaster.

Evan depois da bronca, arrumou o trailer, sorria para ele, como uma serpente tentando encantar a sua vítima.

Se despediu do velho, dizendo meu pai, eu voltarei muitas vezes, me espere por favor.

Claro meu filho, ainda sou jovem, nós os curandeiros vivemos muito.

Lhe deu um saco, com ervas secas, para cuidares do cavalo ainda um tempo, sementes para plantares um horto para cuidar dos animais.

Quando chegaram em casa, colocaram os animais, num cercado ao lado da casa, eles soltaram as éguas, mas antes ele examinou o Mustang.  O chamou, relâmpago negro, venha comigo, o cavalo o seguia como um cordeiro.

Levou o Cyril, para dentro da cabana, vamos arrumar uma cama para ti, hoje dormes no sofá ok.

Obrigado disse ele.

Começaram uma nova vida, falou com o advogado, ele iria pesquisar o que tinha acontecido, sem envolve-lo.

Conseguiu liberar dinheiro com o de New York, lhe deu autorização para vender um apartamento, pois queria construir o celeiro antes do inverno, só gastaria uma parte, a outra, investiria para mais tarde comprar um trator novo, para melhorar os pastos.

Tom ria, dizendo tu tens cabeça, quisera que meu filho tivesse também.

Mas Evan já estava outra vez nervoso, por estar muito tempo num lugar.  Um dia lhe disse na cara que queria fazer sexo com ele.

Sinto Evan, mas nunca fiz sexo com outro homem, se o fizer um dia, o quero comigo, não é teu caso, nem experimentar quero, pois já sei como eres, não se esqueça dos dias que estive fechado com o velho, vi como fazes, isso não é para mim, agora tenho um filho que pensar.

Ele não é teu filho.

Claro que é, eu o sinto como, tu já pensaste quantos filhos tens por aí.  Pelo que vi, pelo menos dois.

No dia seguinte, já não estava mais.

Tom lhe perguntou o que tinha falado com o filho, pois ele chegou furioso em casa, dizendo que eres como o avô um homem do outro mundo.

Não tinha vergonha de falar as coisas com o Tom, lhe contou o que tinha acontecido.

Tens razão, talvez queira me encantar, pois não me aproximei dele.

Lhe disse que agora tinha um filho em quem pensar.

Falar nisso, precisamos o preparar para ir à escola, não o quero vadiando pelo campo, sem fazer nada.

Arrumaram uma professora, para o preparar para a escola, de noite se sentava com ele, lhe ensinando o que ele não tinha entendido.    Lhe ensinava como seu pai tinha feito, como devia raciocinar para entender as coisas.  Comentou isso com ele, meu pai me ensinou assim.

Me conta como era meu avô?

Lhe contou que a ele também lhe chamaram de bastardo, por ser filho de um homem mais velho com sua empregada mais jovem.   Mas ele sempre a amou, como a mim também.  Cuidou dos dois, vivia praticamente em casa, mostrou uma foto que tinha dos dois.

O Cyril, passou a mão pela foto, já os tenho na minha cabeça, meus avôs.

Era como se ele estivesse construindo uma família.

Dias depois, foi busca-lo na casa da professora, escutou ele se despedindo, dizendo meu pai já está aqui.   Ficou emocionado.

Foram comprar roupa para ele, pois estava crescendo.  Isso era uma coisa que seu pai fazia com ele, ir de compras, conforme fosse crescendo.

Cyril dizia que não necessitava, mas o tênis estava apertado para ele, as camisas mais justas, depois se matava de rir escolhendo roupas, queria camisas de quadros como seu pai, botas, calças jeans, muitas camisetas.

Tinha aprendido a arrumar a cama, embora, gostasse de ficar no salão nas noites frias, com Cy, em volta da lareira.

Um dia lhe perguntou serio se não tinha namoradas.

Ainda não me apaixonei, quero um amor como tinham meus pais.  Se amaram muito, morreram juntos.

Tinha recebido os informes da morte dos dois, George estava internado num manicômio, ele não devia saber, mas nas cavalariças, havia uma câmera de vídeo, por causa de roubo de cavalos.  Ficou gravado, ele colocando fogo na mesma, os cavalos tentando sair, morreram todos queimados, ele assistindo as gargalhadas.   Seus irmãos declararam que gastou tudo que tinha recebido, em pouco tempo, pois tinha dividas monstruosas com o jogo.

Seu pai tinha se negado em ajudar mais uma vez.  Os irmãos também por estarem fartos disso, havia um novo testamento de seu pai, que deixava a mansão para o estado, que nunca poderia ser vendido, que fosse transformado numa escola, isso arruinou os planos dos filhos.

O desequilíbrio de George era patente por causa das drogas, outras coisas.

Cy jurou nunca mais colocar os pés lá.

Sua vida ia bem, o celeiro estava pronto, os partos dos novos potros ele fez, ajudado por Cyril, nunca o chamava de júnior.   Agora formado, montou uma clínica, perto da estrada, assim podia atender os vizinhos, ele reconhecia com o Tom, que seu ajudante predileto, era o filho.

Um dia apareceu um garoto, trazendo um cachorro, disse que seu pai o tinha maltratado, depois o jogado do carro, que ele tinha descido do mesmo, chamado a polícia, que isso não se fazia, que bastava que o pai, batesse nele, na mãe, mas que o animal não tinha culpa.

Os pais eram alcoólatras, tinham vindo da reserva, quando crianças, nunca se adaptavam nem na cidade, tampouco lá.

Cyril confortou o novo amigo.  A mãe, disse que não queria com ela uma criança que denunciava os pais.  Cy chamou seu advogado, pediu a guarda do garoto.  Até que se resolvesse se alguém da reserva ficava com ele.

Trocou, colocou no seu quarto duas camas, no que era seu escritório, montou uma cama, num dos lados, depois aumentaria a casa mas no momento era o que havia.

Quem veio olhar o garoto, foi um tio dele, que vivia em Sacramento.  Se apresentou ao Cy, preocupado, esse menino nunca me viu, vivo sozinho, sou enfermeiro, não sei como fazer.

Cy ficou encantado com o rapaz, pelo menos era honesto.

Podemos fazer uma coisa, eu preciso de um enfermeiro, na clínica, isso se te atreves a deixar os pacientes humanos, para cuidar dos animais.   A experiencia foi, nesse dia uma das éguas estava de parto, dos complicados, o potro estava ao contrário no útero.

 Mike o ajudou, no final tudo saiu bem, os meninos estava excitados com isso.

Cy, mandou aumentar a casa, pois precisava de mais espaço, a família crescia.

Um dia os dois estavam sentados na varanda, vendo os meninos jogarem com os potros, corriam com os dois cachorros juntos.

Estavam conversando, Mike disse que pelo menos os animais era mais agradecidos, pois que os humanos reclamavam muito.  Colocou a mão nos braços do Cy, dizendo, obrigado por deixar que fiquemos aqui.  Contigo junto é mais fácil pensar em cuidar de uma criança.

Com o tempo começaram um relacionamento, conseguiram a adoção do Jules, agora Cyril tinha um irmão para ir à escola, tinham a mesma idade.

Os pais do menino foram embora da cidade, nunca mais se escutou falar neles.

Quando Evan apareceu muito tempo depois ficou pouco tempo, esteve com os pais, logo desapareceu.

Mike riu dizendo, não quiseste fazes sexo com esse monumento?

Você entendeu, eu sempre quis alguém para amar, formar uma família, o sexo entre nós é ótimo, porque eu iria estragar, tendo uma aventura com ele, se tudo que ele quer é uma aventura.

A criação de cavalos foi aumentando.   Um dia foram chamados por um criador, um cavalo puro sangue árabe, tinha rompido a pata, tinha sido um campeão.

O dono queria sacrifica-lo.   Ele comprou o mesmo, o dono riu, vais comprar algo inútil, pois ninguém mais vai poder monta-lo.  Já retiramos todo o semem que ele podia ter para vender.

Mesmo assim, entre ele, Mike, Cyril cuidaram do cavalo, o mesmo não podia vê-lo que se aproximava para ficar perto dele, como dizendo obrigado.  Cy numa das idas a reserva, viu uma égua Mustang toda branca, a trouxe para ele, dizia que era o consolo de um guerreiro, um dia estava vendo os dois no campo, viu que o mesmo montava a égua.

Meses depois nasceu um potro fantástico.   Com os anos seria um grande campeão.  Mas de seu animal preferido, o relâmpago negro, também nasceu outra égua campeã em corridas de largas distancias.

Ele vendeu os dois apartamentos restantes de NYC, comprou mais terras, era feliz ali.

Os dois irmãos um dia mandaram um advogado, avisando que ele os tinha roubado, tinham descoberto os apartamentos.   Mas não puderam fazer nada, pois seu velho tinha sido esperto, tinha já comprado em nome dele, não era como um testamento a parte.

Muitos anos depois descobriu que tinham já perdido tudo, a mansão hoje em dia era uma escola para alunos especiais.

George nunca saiu do hospital.

Seu pai tinha razão, o único que tinha construído alguma coisa tinha sido ele.  Era feliz com sua família.  Os garotos daqui algum tempo teria que ir a universidade, os dois diziam o mesmo queriam cuidar dos animais, usavam o que dizia o Mike, que esse não reclamava tanto.

Seu velho cavalo relâmpago negro, no final de sua vida, tinha uma nanada incrível, os potros machos, eles separavam no momento.   Ele seguiu fazendo que gostava, entrar no meio deles, para que soubesse que ele jamais lhe faria mal.

Tom e Matilde viveram a vida inteira ali com eles, no final era como avôs dos meninos.

Nunca mais souberam do Evan.

Cyril, tinha uma horta com toda a ervas que usavam para curar os animais.  Sabia para que servia cada uma, tinha aprendido com o velho.

Ele cada vez que se lembrava de seu pai, pensava, realmente foi um pai maravilhoso, pensou em tudo, me salvou de viver uma vida fútil, me deu um futuro.

REVANCHE

                                                   

Tinha um gosto amargo na boca, sempre se dizia que a vingança ou a revanche, era um prato para comer frio, mas a ele, não lhe fazia graça nenhuma, pois sabia que no meio disso tudo, sempre saia alguém perdendo.

Ele na verdade tinha perdido desde o começo, Jean Scalde, ou Jean Boy, já perdia desde o momento que tinha nascido.  Era o segundo filho de sua mãe, o primeiro Trayrone, que todos chamavam Tray, era filho do casamento de sua mãe, com um cabo do exército, morreu em combate, lhe deixando uma pequena pensão, que ela aumentava cozinhando em casa de gente rica.  Era uma cozinheira de mão cheia como se dizia, tinha aprendido primeiro com sua avó, depois tinha trabalhado em muitos restaurantes finos.

Ele ao contrário era filho dela, com um cozinheiro francês, com quem fez um curso, ele só estava de passagem, nunca sequer soube que era pai, tudo que ela sabia dele, era que se chamava Jean.  O patrão a colocou no olho da rua, levou os meninos com ela para viver na casa de sua irmã, que também era viúva.

Tia Mary, era uma mulher daquelas de armas a tomar, cantava no coro da igreja, era batista das ferrenhas.   Na verdade foi ela que o tinha criado, pois sua mãe passava o dia inteiro na casas em que cozinhava.  Só não o fazia aos domingos para poder ir à igreja.

Ele aprendeu a ler, escrever, com sua tia, antes do tempo, ao contrário dos outros garotos, não gostava de estar na frente da televisão, também seria impossível, porque Tray, passava o tempo todo vendo programas de brigas, era louco por tudo que fosse lutas.  Mas estudar não gostava, achava que sabendo lutar, ele chegaria ao topo.

Eram a água e o vinho, um negro totalmente, ele um mulato claro, de olhos azuis, cabelos crespos loiros, a única coisa que o podia identificar como negro era o nariz, que era como de sua mãe.

O irmão, sempre estava disputando com ele a atenção dela, por isso desde pequeno levava surras do irmão.  Mas ao contrário, gostava do irmão.

Quando entrou na escola, era o melhor aluno, principalmente que já sabia ler, escrever, num bairro como esse, eram poucos os alunos que se destacavam.   Portanto sofria bullying, a tordo e a direito.  Mas aprendeu a se defender, usando a inteligência, bem como os punhos.

Sua mãe morreu quando ele tinha uns 12 anos.  Tray nessas alturas, tinha quase 18 anos, resolveu que era ele, quem tinha direito a pensão que recebia sua mãe, conseguiu convencer sua tia que dissesse no banco que sua mãe estava doente, seguiu recebendo a pensão dela, foi viver com uma namorada, muito mais velha que ele, que tinha uma casa pequena.

Ele ficou com a tia, mas o melhor, foi que no dia que foi embora, lhe deu uma porrada tão grande na cara, que quase lhe desloca a mandíbula.     Soltou na sua cara, “vê se me esquece”, eu sou negro, tu branco, não podemos ser irmãos.

Sua tia o consolou, continuou cuidando dele como fosse seu filho.  Na verdade, foi ele quem viu sua mãe morrer.  Durante uma guerra de bandas, com a polícia, era um domingo, tinham voltado da igreja, a mãe estava fazendo o almoço, ele estava sentado na mesa da cozinha estudando.  Dê repente os vidros da janela se estilhaçaram, ela caiu no chão, a tia veio correndo mas não havia nada o que fazer.   Sua tia que era enfermeira, a primeira coisa que fez, foi tomar o pulso, balançou a cabeça, o obrigou a se abaixar, pois o tiroteio continuava firme.

Dois dias depois conseguiram enterra-la.

Ele sentiu muito, pois adorava a mãe, gostava de vê-la cozinhar, a única coisa que lhe sobrou foi justamente seu único tesouro, seu livro de receitas francesas.

Raramente via o irmão, tampouco sua tia sabia dele.

Uma das coisas que sua tia fazia questão, era que ele se levantasse na mesma hora que ela, para tomar um banho antes de ir à escola, o luxo da casa era uma maquina de lavar roupa, ele devia estar sempre com roupa limpa, não tinha muitas, mas estavam sempre limpa.

No dia que recebeu a notícia, que era o único aluno da escola, que por causa de suas notas poderia ter uma bolsa de estudos, foi como um presente de aniversário, tinha acabado de fazer 17 anos.

Voltava da escola, quando viu o irmão debruçado num 4X4, lhe passavam um pacote, ele ficou parado, entendeu rapidamente, o irmão estava traficando com drogas.  Sua mãe odiava isso, os tinha educado, usava uma ladainha para dizer, que nunca chegasse sequer perto das drogas.

Seu irmão estava gordo, ao contrario dele, que tinha 1,80, mas cheio de músculos, pois trabalhava de tarde descarregando caminhões, num armazém ali perto, para guardar dinheiro para ir à universidade.  Ele e sua tia guardavam todo o dinheiro que sobrava, numa caixa, de metal, muito bem escondida, era o grande segredo dos dois.

Foi chamar a atenção do irmão, como ele podia fazer isso, esse estava ainda com o pacote, cheio de outros tantos já distribuídos.

O irmão disse que tinha que sustentar a mulher e o filho.   Nisso apareceu um carro de polícia, ele se distraiu, o irmão, enfiou o que tinha na mão na sua mochila.

Desceram dois policiais do carro, foram diretos até ele, seu irmão se afastou com os braços abertos, com as palmas da mão para cima.

Um dos policiais foi direto a ele, abriu a mochila, perguntou se ele era traficante?

Não senhor, só passava por aqui para ir para casa.

Me explica então isso? Mostrou o que estava na sua mochila.

Ele só soltou um filho da puta, olhando para o irmão.

Simplesmente lhe puseram uma algema, enfiaram no carro, o irmão ficou ali rindo.

Os dois policiais começaram a discutir, um claro era o chefe, disse que ele ficasse calado, que hoje tinham ganho pontos, tinham trincado um distribuidor de drogas.

O outro dizia que tinha visto o gordo colocar o pacote na mochila dele.

Mas o chefe o mandou calar a boca, aqui quem decide tudo sou eu.

Resultado, avisou sua tia, quando o deixaram, o chefe já o tinha enchido de porradas, para confessar, mas ele se negava.

Sua tia escutou sua história foi tomar satisfação com seu irmão, esse mandou um advogado da gang, que lhe disse que assumisse a culpa.  

Se negou redondamente, então lhe tocou um desses de oficio.  Nunca falou com ele, no julgamento, por mais que tivesse conseguido testemunhos de professores, inclusive que tinha ganhado uma bolsa de estudos para à universidade, foi condenado por ser ainda menor de 18 anos, a seis anos de prisão.

No julgamento, só depôs o chefe, dizendo que ele tinha na bolsa uma quantidade suficiente de cocaína para ser condenado.

Tampouco o chamaram para depor.   Estava na verdade apavorado, via seu futuro todo indo para o brejo, por culpa mais uma vez de seu irmão.

Sua tia foi visita-lo, não entendia como seu irmão podia fazer isso com ele.  Fui falar com ele, disse que ele tinha roubado sua mãe, desde que nascera. Que não ia mexer um dedo por esse idiota, afinal, tinha um filho para criar.

Mal entrou no presidio, logo no primeiro dia, abusaram dele, foi direto para a enfermaria.

Sua inocência, era muito grande, não tinha nunca passado esse tipo de apuros.

Um ajudante de enfermeiro, que também era prisioneiro, um senhor de muita idade, que cumpria cadeia perpetua, o ajudou.   Mesmo assim, voltou várias vezes a enfermaria, a última vez, o primeiro que se debruçou sobre ele, lhe disse ao ouvido, seu irmão foi quem mandou fazer isso, agora é o chefe das drogas.

O velho agora dividia cela com ele, era mulçumano, apesar de ser branco, o fez entrar para seu grupo, assim o defendiam.  Talvez ali, o único a falar, ler, escrever em árabe era o velho, lhe contou por que seu pai, segundo ele era árabe negro.  Foi lhe ensinando tudo sobre o corão.

Agora o grupo o defendia, os acompanhava em tudo, uma parte, cuidava da cozinha, dois deles, cozinhavam para o chefe, para os oficiais de mais rango, que comia ali.  Quando um deles morreu num briga, ele assumiu seu lugar, se lembrava das receitas da mãe, de cabeça, começou a fazer essas comidas, que o chefe adora.  Os outros oficiais por isso, passaram a protege-lo.

Quando cumpriu sua pena de seis anos, saiu da prisão, sua tia o esperava, era ela que todos os meses, ia visita-lo.  Mas a essas alturas, ele já tinha perdido o direito a ir a universidade, já seria muito difícil, arrumar um emprego, embora o chefe da prisão, lhe tivesse dado uma carta de recomendação para um amigo seu, que tinha um restaurante.

Se sentia perdido, sua tia, só estava chateada, porque ele tinha se convertido, o primeiro dia livre foi a uma mesquita rezar.  Mas só gostava de ir, quando não tinha ninguém para rezar nada mais.

Tentava não sentir ódio com relação ao irmão.  Se esbarrou um dia ao sair do supermercado, ele com uma mulher diferente, com uma barriga imensa. Riu na cara dele.

Depois de uns quinze dias, passeando pelos lugares que amava antes, se tocou, nada tinha que fazer ali.  Sua tia em breve iria trabalhar numa residência de maiores, lhe disse, tenho várias opções, uma é ir para San Francisco, assim saímos daqui.

Ele aceitou, com a carta do diretor, foi falar com o dono do restaurante. Esse o colocou na cozinha, lhe perguntou se sabia fazer um prato francês.  Disse que sim, na sua cabeça, buscou a receita de sua mãe, a fez como ela fazia, segundo ela para dar mais sabor.

O homem, provou, não o tinha visto fazer, lhe disse acrescentaste mais, foi dizendo todas as espécies a mais que ele tinha colocado, realmente o sabor fica melhor.

O contratou por seis meses.  No final do mês, depositou seu salário, junto com o que tinha dentro da caixa, que eram suas economias, que tinha ficado escondidas, quem sabe um dia, teria dinheiro suficiente para abrir um restaurante.

Saia logo cedo de casa, tomava dois ônibus para chegar ao trabalho, sua tia na verdade, poderia estar vivendo na residência, mas tinham alugado uma casa pequena perto.

Quando lhe fizeram o contrato definitivo, ele basicamente levava a cozinha com o chefe, tinha se adaptado à sua maneira de trabalhar.

Chegava cedo, no dia anterior, tinha deixado a massa de pães, descansando, era o que fazia as seis da manhã, colocar os mesmo para assar.  Brioches, cakes que depois eram servidos com saladas.  Os companheiros tinha ciúmes dele porque era o querido do chefe.

Já estava ali a três anos, quando decidiu finalmente arrumar um quarto perto do restaurante, assim não se cansava tanto. 

Nunca saia para se divertir, os momentos livres que tinha, estudava francês, fazia cursos que lhe recomendava o chefe.

Dois anos depois quando este ficou doente, necessitavam de gente para doar sangue, o seu era um dos poucos compatíveis.  Um dos médicos, mandou fazer um teste de ADN, descobriu que ele era filho do mesmo.

Quando falou com os dois, pois ele ia todos os dias visitar o chefe, ficaram os dois de boca aberta.    Realmente conheci sua mãe, ela era linda, me apaixonei por ela, continuei meus cursos em outras cidade, quando voltei, não descobri nada dela.

O reconheceu como filho, embora tivesse se casado, não tinha filhos, na verdade no momento estava divorciado.

Agora compartiam a cozinha, era pai e filho trabalhando juntos.

Ele mantinha correspondência com o homem que o tinha ensinado a falar árabe, se escrevinham nessa língua, lhe contou que tinha encontrado seu pai, foi através dele que soube que seu irmão estava preso, que agora chefiava dentro da prisão, um dos piores grupos dali.

Mas não vou comentar nada com ele.

Seu pai e ele, procuraram recuperar a falta de vivência que tinham, um dia o convidou para viver com ele.   Muitos pensaram que eram amantes, mas o velho ria dizendo que era seu filho.

Os dois quando estavam juntos, conversavam em francês.

Quando estranhou que ele não tivesse namoradas, ele contou o que tinha acontecido com ele na prisão, a quantidade de abusos, o mal que tinha passado, até o velho enfermeiro lhe ajudar.

Não me sinto a vontade fazendo sexo, quem sabe no futuro, sim.

Quando fez 30 anos, o pai morreu, deixou tudo para ele.  Mas ele achava o restaurante muito grande para levar.  Tinha sonhos por realizar, mais uma vez conversou com sua tia.

Ela lhe deu uma ideia. Que vende-se o local, estava bem situado, colocasse esse dinheiro para render, que fosse para Paris fazer cursos, que voltasse, só quando tivesse vencido por lá.

Foi o que ele fez, nas vésperas de ir embora, foi procurado por uma mulher, com três crianças, era a primeira mulher do seu irmão.  Queria que a ajudasse, pois seu irmão não fazia nada pelos filhos.   A levou para falar com sua tia, que lhe arrumou um emprego na residência, bem como a ajudou com ele, a ter um pequeno apartamento.

Ele foi embora, ficou três anos fora. Tinha trabalhado em vários restaurantes, inclusive tinha uma estrela Michelin como chefe.

Quando sua tia morreu, de um enfarte repentino, voltou para cuidar de suas coisas, a mulher de seu irmão contou que ele tinha saído da prisão, mas tinha mais filhos de outras mulheres.

Ali ela estava bem.  Com o dinheiro que sua tinha deixado de suas economias, fez um fundo para os meninos irem à escola, para terem um futuro.

Recebeu um convite de um homem que tinha conhecido durante um curso em Paris, que tinha um restaurante em NYC, arrumou um apartamento, fazia o mesmo de sempre, chegava cedo, preparava pães, brioches, antes ia ao mercado com um furgão do restaurante, fazia compras, seguia a linha de comida de mercado, a carta era pequena, mas só os melhores pratos era fixos, o resto ele improvisava ao momento.

Os pratos que era aceitos, ele escrevia e fotografava a receita.  Um dos clientes assíduo era um editor de livros, elogiava sempre sua comida.  Uma vez veio para jantar, ficou esperando a pessoa que vinha jantar com ele, que não apareceu.   Quando o restaurante ficou vazio, sentou-se com ele, para tomar um copo de vinho.

George White, lhe perguntou por que não lançava um livro de receitas, ele foi buscar seu caderno, bem como a fotografia das receitas.

Vê seria perfeito, podíamos fazer assim como está, um caderno, com as fotografias, amanhã, vou trazer o rapaz que faz a montagem de livros, para preparar para a edição.  Assim ele dá uma olhada no material.

Depois conversavam sobre as suas vidas.

George lhe perguntou se nunca tinha pensado em fazer uma universidade, foi honesto contou para ele o que lhe tinha acontecido.   Talvez até tenha sido bom, pois descobri minha paixão pela cozinha.

Pelo que ele sabia o irmão estava outra vez na prisão, não era tão inteligente como pensava.

O George, passou a vir várias vezes no final da noite, lhe perguntou se ele não tinha nenhum dia livres.

Ele aos domingos não trabalhava.   O convidou para saírem, foram almoçar em outro lugar, depois saíram andando pelas ruas.  Não tens ninguém, se atreveu a perguntar?

Não, inclusive aquele dia que conversamos pela primeira vez, eu tinha um encontro marcado, mas a pessoa não compareceu, veja eu tenho 45 anos, não gosto de discotecas, de ficar bebendo por beber, gosto de ler, então não encaixo nos padrões de hoje em dia.

E tu?

Lhe contou que apesar dos abusos que tinha sofrido, isso deixou uma amargura em minha vida, fui a muitos psicólogos, mas tenho medo, tentei na época que vivia em Paris, mas não me saio bem na cama, sou como tu, não gosto de nada disse que hoje em dia fazem.

Um dia resolveram experimentar.  George tinha imensa paciência com ele, mas acabaram dando certo.   Quando viu, estavam apaixonados um pelo outro.

O livro fez sucesso, lhe chamaram para fazer um programa de televisão.   Aceitou desde que fosse só um dia da semana.   O vídeo começava com ele no mercado, fazendo compras, mostrando o que comprar, como examinar a mercadoria, coisas que tinha aprendido com seu pai, depois como preparar, como servir, que vinho devia ser servido junto.

O programa fazia sucesso, o queriam contratar, para fazer mais dias da semana, mas ele adorava seu restaurante.

George um dia lhe perguntou se ele, não tinha sentido uma sede de vingança, com relação ao seu irmão?

Olha George se fizesse isso, eu estaria no mesmo barco que ele, caindo.  Minha revanche foi ir em frente, ter o que tenho hoje, ainda ajudo a primeira mulher dele com os garotos, o pequeno é o mais inteligente deles.

Sempre telefonava para saber como iam.  Um dia ela telefonou aos prantos, ele tinha aparecido, tinha levado os dois maiores, que não queriam estudar, para trabalhar com ele.

O pequeno se negou, nunca o tinha visto na vida, pois tinha nascido depois que ele a abandonou.   Disse na cara dela, que o garoto não era dele.

Mas tenho medo.  

Perguntou se ela confiava nele?

Claro você foi a única pessoa que me ajudou, bem como tua tia.

Converse com seu filho, se ele quiser pode vir viver comigo. Lhe darei educação.

Falou com o George, esse sempre quis ser pai.   Mas disse uma coisa.

Como estava só registrado no nome da sua cunhada, que ela o desse em adoção aos dois, assim não teriam problemas.

Tirou uma semana de férias, foram os dois a San Francisco.  Tinha conversado antes com sua cunhada.  O menino era alto, magro, usava uns óculos fundo de garrafa, era estudioso.  O semestre acabava agora, assim era mais fácil.

Ela estava tão apavorada, que concordou, ele quando soube por um dos maiores do fundo que tinhas criado para eles, me obrigou a lhe dar esse dinheiro.  Nesse dia olhou para o outro, soltou, não deves se filho meu, pois é mais claro, como o filho da puta do meu irmão, por isso não te quero, agora resta saber sem dinheiro como iras em frente.

Por isso assinou o documento.   Iremos telefonando toda a semana, para saberes dele.

Inclusive como tinha adotado pelo George, passou a ter o nome dele, Bradford White.

George conseguiu para ele, logo uma escola boa, aonde ele pudesse crescer com boas notas para ir à universidade.  Queria ser médico, no momento que ficou sozinho, ajudava na residência, fazendo curativos, cuidado das pessoas.

Quando anos mais tardes foi para a Universidade, era um dos melhores.

A mãe dele faleceu em estranhas circunstâncias, anos mais tarde saberiam que tinha se negado a dizer aonde estava o outro filho.   Talvez por isso.

Os outros dois mais velhos, mais parecidos com o pai, estavam metidos até as orelhas no que seu irmão fazia.

Eles estavam felizes, Jonny tinha já duas estrelas Michelin, mas não dava muita bola para isso, queria sim manter as coisas como tinha.  O restaurante sempre tinha reservas, por semanas adiantadas.

Seu programa funcionava muito bem, mas os domingos era o dia que os três se sentavam para tomar o café da manhã, colocarem a conversa em dia.

Bradford, um dia quando já fazia práticas em urgências disse que estava apaixonado por uma companheira.    Um sábado a trouxe para jantar no restaurante, depois ficaram sentados conversando.  Ele sem querer olhou o George, já com muitos cabelos brancos nas têmporas, ainda pensou, como tiver sorte de encontrar esse homem. O amava muito.

A garota, era mulata como o Bradford, tinha feito medicina com bolsa de estudos, se queriam era verdade.

Bradford fez especialidade em Paris, num dos hospitais mais famosos, na sua área, ela foi com ele, também para fazerem isso.  Receberam convite para ficar.   Agora eram eles que iam passar as férias lá.

Um dia, recebeu a visita de um dos sobrinhos, queria saber do irmão.

Ele disse que pensava que estava com eles.   Quis saber por quê?

Eu agora tomo conta dos negócios, meu pai precisa de um transplante de medula, pode ser que o senhor ou meu irmão sejam compatíveis.

Ele fez uma coisa que jamais tinha imaginado fazer, fez as provas, era compatível.

Mas no último momento, disse ao irmão, aos sobrinhos, que se negava a ceder sua medula, que o irmão fizesse um exame de consciência por tudo que tinha feito na vida contra ele, que procura-se outra pessoa.

Quando o sobrinho o ameaçou, gravou todas as ameaças, o denunciou, inclusive, o idiota não sabia, falou o que fazia com suas vítimas, como tinha aprendido com o pai.

Claro foi preso, junto com o pai.

George se aposentava, ele também queria outra vida.  Venderam tudo, foram viver em Paris, perto do filho deles, agora fazia papel de babás, dos netos, eram dois, muito inteligentes, já sabiam ler, escrever, porque George adorava ensinar.

Nunca mais voltaram para os Estados Unidos.

TRANS-FORMAÇÃO

                            

Eram três amigas de toda a vida, tinham se conhecido no jardim de infância, sempre tinham compartido tudo.  Principalmente o que queriam de suas vidas, seus sonhos, coisas típicas da idade.   Mas no resto eram diferentes.  Billie era a mais bonita, um rosto perfeito, cabelos maravilhosos, alta, a mais atlética das três, mas com uma vida complicada desde infância.

Sarah, era bonita, simpática, atrativa, já se levantava como dizia a mãe, preparada para uma festa, mas isso tudo para ir ao instituto.

Jessica era a que usava óculos, desengonçada, cabelos sempre encrespados, mal vestida, não tinha gosto nenhum para escolher roupa, tinha saído a sua mãe.

A história gira mais em torno a Billie.  Vivia com seu pai, sua avó, sua mãe tinha desaparecido no mapa, nada sabia por aonde andava.   Tinha sido o grande problema da vida de Billie desde criança.   Seus pais eram companheiros no instituto.  O sonho de sua mãe, que era lindíssima, era ser Miss Estados Unidos.  Era miss da cidade, é do estado.  Nas vésperas de partir para o concurso final, resolveu que tinha que perder a virgindade a qualquer preço.  Seu pai, também era virgem, acreditava que tinha que chegar ao casamento assim.  Ela ao contrário não sonhava em casar-se, queria ser atriz, ser famosa, sair da merda daquela cidade.  Ele era o mais alto da escola, o mais bonito, atlético, capitão da equipe de basquete, de futebol americano.    As garotas ficavam loucas por ele, pois além de tudo era muito educado.   Ele passava, elas suspiravam por ele, mas só tinha os olhos para Beth, que conhecia desde garoto.   Ela voltou no meio do concurso, estava gravida.  Alias a expulsaram do mesmo, pois começaram os vômitos, todos os problemas de uma gravidez.   Voltou para casa furiosa, seus sonhos tinha ido a merda.

Se casaram, não entendiam tinham usado camisinha.  Ele reconheceu que esta estava a tanto tempo na sua carteira que devia estar velha, tinha visto vazar por baixo, mas não se preocupou.

Para ela começava a desgraça, uma gravidez extremamente complicada, ir viver com os sogros, que não gostavam dela.   Sua avô tinha visto seu sonho do filho ir a universidade, frustrado, tudo por culpa desta tonta. 

Seu pai teve que ir trabalhar na loja de ferragens do seu avô, desde casa sua avô fazia a parte de contabilidade.  Nos finais de semana trabalhava com eles, pois era o dia de mais movimento.

Richard, viu seus sonhos irem por água abaixo, mas não reclamou, todos seus companheiros foram a universidade, ele ficou para trás.   Continuava jogando basquete no time da cidade, era bom nisso.  Mas suas possibilidades de irem em frente eram nulas.

Billie quando nasceu, era uma boneca de tão bonita,  sua mãe, primeiro a rejeitou, mas depois encontrou um brinquedo. Vivia fazendo roupas cheias de fitas, tudo sempre cor de rosa. 

Marie sua avó dizia que quando fosse maior teria horror a essa cor, nisso não ia errar.

Seu avô ao contrário, desde o momento que estava em casa, ela era sua. Sempre se lembraria dele, pelo seu cheiro a cigarros, sua loção de barba, o contato daquela pele dura.

Sua mãe quando ela ficou maior, a metia em todos os concursos de crianças bonitas, ela sempre ganhava.   Odiava isso, mas sua mãe a convencia.  Seu sonho, era que ela realizasse os seus que tinha sido frustrados.   Desde que ela entrava em casa, até a hora de ir dormir, sua mãe estava martelando na sua cabeça a mesma coisa.    Não lhe estava permitido jogar com suas amigas, sentar-se no chão, subir em arvores, todas as brincadeiras que as outras faziam.  Era o brinquedo de sua mãe, até suas bonecas se vestiam iguais a ela.  Ela odiava bonecas, adoraria jogar bola com os meninos. 

A única que a defendia era sua avó que reclamava que não a deixava ser uma criança normal.

Mas quando chegava na escola, colocava seu uniforme de ginastica, não havia quem conseguisse que tirasse, só colocava o vestido na hora que sua mãe, vinha toda maquilada, com um vestido feito por ela mesma, justo que não deixava imaginação de homem nenhum tranquila.

Billie, ao contrário morria de vergonha.  Mas ao mesmo tempo aguentava, pois seu pai a convencia, afinal era a única saída do dia, que fazia sua mãe.  Na verdade, estava todo santo o dia assim, maquilada, vestida como se fosse ir a uma festa.

Comia pouquíssimo, pois dizia que a comida da velha, como chamava sua avó, a faria engordar, perder sua cintura.

Quando tinha 12 anos, estava farta, estavam estudando na escola as partes femininas, numa classe de orientação sexual.  Quando se falou em útero,  ela se virou para as amigas, dizendo, tirem-me do útero de minha mãe, não aguento mais.

Sarah, riu, dizendo, vamos trocar de mães, pois a minha só me compra roupas feias, a da Jessica é pior.   Foi da escola direta a loja aonde sabia que a estas horas, só estaria seu pai.  Falou com ele, não queria participar de nenhum concurso.  Seu pai sempre tinha falado com ela, como se fosse uma pessoa adulta, não a tratava como sua mãe, como uma boneca.   Não aguento mais pai, quero jogar bola, basquete o que me dê vontade, ela não permite, me enfiou nessas aulas de ballet que odeio.  Essas roupas que ela faz, morro de vergonha de usar.  Todo mundo ri de mim, menos minhas amigas.  Um dia vou explodir.

Ah, filha, isso me temo que vai realmente acontecer.   Um dia eu também vou explodir, estou cansado de tudo isso, pior, cansado de que está noite tenho dor de cabeça, hoje me doí o estomago, nunca fazemos nada. Aquele quarto com tantas cortinas de babados, colchas cor de rosa, tudo isso me dá ânsia de vomito.  As vezes prefiro dormir no sofá da sala, para não me encherem o saco.

Billie, tomou uma resolução, enquanto voltava para casa, na caminhonete ao lado de seu pai, ali ia tranquila, pois sabia que sua mãe, não entrava nela, com seu perfume fedorento.

Depois do almoço, sua mãe, começou com a historia de uma roupa nova para o concurso.  Ela disse que estava com dor de cabeça, que tinha que estudar para uma prova.

Pegou o vestido novo, que sua mãe insistia que ela provasse.   Se olhou no espelho, parecia uma puta.   Sua mãe, saiu para comprar alguma coisa para colocar no vestido, o retirou, pegou a tesoura, picotou o vestido inteiro, tirou todas as roupas do armário, fez o mesmo, abriu as gavetas do seu quarto, picotou todas as calcinhas, as meias, fitas de cabelo, tudo que fosse cor de rosa, virou confete.  Sapatos para combinar, não sobrou nada de sua raiva.    Depois se colocou na frente de um espelho, com a tesoura cortou todo seu cabelo, quase pegado ao couro cabeludo.  Tudo mal cortado.   Quando sua mãe chegou, estava tranquilamente deitada na cama, estudando. 

Esta teve um ataque, telefonou ao seu pai, gritando que tinha acontecido uma desgraça, totalmente histérica.   Quando ele chegou acompanhado de Marie.  Ele ficou de boca aberta, Marie desatou a rir.  Billie continuava estudando como se não fosse com ela.

Seu pai tentou acalma-la. Mas sua mãe, não queria entender de maneira nenhuma, que naquela casa, nem sua filha a respeitava.

Vou dormir hoje na casa de meus pais.

No dia seguinte tinha desaparecido.  Limpou as economias de toda vida de seus pais, desapareceu no mapa.

Ela foi a escola com a roupa de fazer ginastica, as amigas não a reconheceram, ela parecia um garoto.

Riram com ela até não poder mais.

Nessa noite, houve uma reunião familiar.  Sua avó dizia ao filho, ela fez o que deveria ter feito a tanto tempo. Ir embora.   Não era feliz aqui mesmo.

Dois dias depois, aconteceu outra tragédia, seu pai saiu para buscar uma encomenda numa companhia de petróleo, sua avó tinha sido encarregada de levar o dinheiro do dia anterior ao banco, saiu pela porta detrás pois tinha deixado o carro ali.  Justo nesse momento, pela porta da frente entravam dois sujeitos para roubar.   Seu avô, resolveu se defender, pois não passavam de dois garotos.   Um deles lhe deu um tiro direto ao coração.

Sua avó quando escutou o tiro, entrou de novo, pegando no escritório um revolver, atirou em um dos garotos, o outro conseguiu escapar.

Quando a polícia chegou, tinha dois mortos para sua contabilidade, numa cidade que nunca acontecia nada.   Encontraram sua avó sentada no chão, com a cabeça de seu avô nos seus braços, tentando limpar o sangue que tinha na camisa.  O outro não lhe interessava nem saber quem era.  Quando meu pai entrou, se lembrou do dinheiro que estava no carro.  Lhe deu a ordem para ir ao banco depositar, antes de fechasse.

A partir desse dia, ela passou a trabalhar na loja, com um macacão, justo igual ao de seu pai.

Ia mais cedo para casa.  O enterro foi uma coisa normal, nada demais, uma cerimônia simples, nada de reunião familiar em casa.  Ela simplesmente avisou os pais de seu marido, que viviam em San Francisco, do que tinha acontecido.  Lá eles tinham uma loja igual, com o outro filho.

Sequer vieram ao enterro.  Tudo tão, mas tão simples, que ninguém falou muito no assunto.

No dia seguinte ela, subiu a camionete com Billie, foram a um grande supermercado que havia na estrada na entrada da cidade.  Deu o carrinho para sua neta, querida, compre roupa para ti, tudo como queira.  Claro o carrinho, só tinha camisetas, tênis, um uniforme para jogar basquete, calcinhas normais, mas nada cor de rosa, comprou tudo na seção de meninos.  Sua avó não disse nada, pois estava fazendo a mesma coisa.   Depois foram as duas ao barbeiro, cortaram o cabelo.  Sua avó disse, quero os cabelos como da minha neta.  Aproveite corte o seu bem pequeno pois está mal cortado.   Saíram dali idênticas.

Isso sim foi comentário, a garota que um dia andava de cor de rosa, agora parecia um garoto.

Tudo lhe estava permitido, ia jogar com os garotos, os que lhe enchiam o saco lhes dava um bom murro. Subia em todas as árvores, corria atrás das amigas, só não as acompanhava nas brincadeiras com bonecas.   Ia aos jogos que lhe estavam proibida antes, com seu pai, estavam sempre os dois juntos.

Nos finais de semana, agora ajudava na loja, ninguém se atrevia a nenhuma piada, pois conheciam a língua de sua avó, que podia soltar prontamente um filha da puta, como dizer graças a deus.

Um dia conversando com o pai, soltou, finalmente sou feliz, sei que o senhor gostava da mamãe, mas ela era infeliz aqui, nos fazia infeliz com ela.

Agora posso enfim sonhar que sou na verdade um garoto, nunca quis ser uma menina.

Seu pai ficou impressionado com isso. Resolveu leva-la a um médico, mas em Sacramento, que era uma cidade maior.  Este lhe recomendou um psicólogo infantil.

Este a entendeu perfeitamente, todas as análises davam igual, se sentia um homem preso num corpo de mulher.   Conversou com seu pai.  O pior será quando comece a sentir o sistema feminino, as regras, o peito a crescer.  Teremos que pensar nisso tudo.  Aconselho que o senhor fale com sua esposa.

Impossível, desapareceu no mapa.

O psicólogo sorriu tristemente, entendo, o mesmo se passou comigo.  Um casamento errado, sempre é assim.

Agora ia a cada quinze dias conversar com o psicólogo, este tinha se informado bem a respeito, para poder orientar aos dois.   Ao mesmo tempo que sempre tinha tempo para conversar com Rick, como chamava seu pai, os dois se entendiam.

Sua avó, ao contrário lhe deu toda força.  Suas duas amigas, lhe apoiaram, fizeram as três um juramento, que nunca iam criticar qualquer coisa que fizesse.

Já no instituto, as três andavam sempre juntas, ela apresentava as amigas aos seus companheiros de equipe, jogava com os garotos.  As amigas tinham namorados por causa dela, mas o mais bonito, o capitão, era louco por ela.  Cada vez que tentava se aproximar para a convidar para sair.  Ela lhe cortava, dizendo, prefiro estar com minhas amigas.

Uma vez, tentou beija-la, lhe deu um murro quebrando o tabique do nariz.  Isso o deixou mais apaixonado.

Nunca lhe dava importância.  Quando chegou a época da cerimônia de graduação, seu pai foi chamado por um advogado.  Seu tio que levava a loja dos avôs em San Francisco, tinha morrido de Aids, então ele era o herdeiro de tudo.

Fizeram uma reunião os três.  Sua avô comentou que um chinês estava interessado na loja, era na verdade o principal fornecedor deles.   Ela teria que seguir um tratamento, se realmente queria se transformar em homem.  Faculdade etc.  Tu poderias finalmente ir a universidade, realizar teus sonhos.

Seu pai todo tempo que estava livre estava escrevendo.  Uma vez deixou um dos cadernos que usava, abandonado.   Billie, sentou-se, começou a ler.  Ficou impressionada, ele falava da solidão, do medo de nunca ser entendido.   Da atração que sentia pelo psicólogo, enfim falava que tinha errado se escondendo no armário, atrás de uma mulher belíssima, que não tinha sabido satisfazer.

Ficou impressionada com isso, quando depois de um partido, voltavam os dois na caminhonete, mandou que ele parasse na beira da estrada, falou francamente com ele.  Perguntou se era por isso que algumas tardes ele desaparecia.

Pai, já estamos numa época que não precisas mais te esconder.  Eu não me escondo, porque tu, minha avó, me apoiam.  Um dia serei um garoto, serei feliz.  Quero que o senhor também seja.

Isso o levou a decidir o que dizia sua mãe.  Embora achasse que já não tinha idade para ir a faculdade, pelo menos poderia fazer um curso de escritura, nem que fosse para satisfazer seu ego.

Herdavam também a casa dos avôs, não teriam problema.  Foram até San Francisco, para ver a casa.  Era velha, mas numa zona muito boa.  Tinham inclusive uma parque em frente.  Mas claro precisava de reformas.   Depois foram ver a loja, que continuava funcionando. Conversaram com o gerente. 

Esse era um homem divertido, disse que na verdade seu tio mal aparecia na loja, eu a levo a anos.  Quando os velhos morreram, passei a leva-la em definitivo.  Mas creio que será um prazer continuar trabalhando com os senhores.  

Minha avó foi direta, eu levarei a contabilidade como sempre fiz, me dará tempo de fazer outras coisas, tu, faças o que querias, estudar ou esse curso que vives falando.  Conversaram com o homem que precisavam reformar a casa.  Ele disse não se preocupe, vamos lá me dizem o que querem fazer, em seguida eu arrumo gente que faça. 

O homem apesar de estar desde garoto nos Estados Unidos, tinha coisas de seu pais de origem, México, meu nome é Godofredo Ortega, mas pode me chamar como queiram, teu tio me chamava de Ortega, isso me basta.

Atrás da casa, havia uma casinha de ferramentas, meu pai perguntou se não podia ser ampliada, para ele poder ter um lugar para ler, escrever.

Ortega o que fez, foi arrumar uma equipe de homens que conhecia, a maioria imigrantes, ele mesmo cuidou de tudo.  Quando ficou tudo pronto, foram embora.   O mais interessante, foi que sua avó resolveu não levar nada da casa velha, a não ser as fotos que sempre estiveram no salão.    Billie, só tinha uma maleta, nada demais.  Seu pai, livros que colocou em caixas, seus cadernos de escritura.  Pouca roupa. 

Chamaram uma associação beneficente, lhes entregaram o resto da casa.  A própria venderam ao chinês que comprou a loja.   Assim estavam livre de tudo. 

Ortega que os esperava, ficou preocupado, pois não havia lugar para dormirem nas primeiras noites, pois não tinham chegado as camas, colchões, eletrodomésticos nada como tinham prometido.

O jeito foi irem para um hotel, perto da loja.  Nessa noite saíram para comer com o Ortega, esse vivia nos fundos da loja.   Vivo aí, desde que teus avôs, me deram trabalho.  Nunca me casei, na verdade fui o primeiro homem de teu tio.   Depois me abandonou por alguém, caiu na vida como eu digo.  Mas sempre fomos amigos.  Espero que isso não seja um problema.

Minha avó que estava ao seu lado, colocou a mão em cima da sua, nem pense nisso, então eres parte de nossa família.   Porque não vens morar conosco.  Na casa há lugar para todos.

Ele ficou olhando para ela.    Na verdade, pensei que me deixariam alguma coisa, pelos anos que trabalhei na loja.  Depois pensei que o louco do teu tio, ia reconhecer, que afinal sem mim a loja tinha ido ao brejo, pois a ele nada disso lhe interessava.  Tampouco pensou em mim, agora vem a senhora, me faz essa proposta sem sequer me conhecer.

Homem, viver no fundo de uma loja tantos anos, essa solidão, não está bem.  Nossa família o senhor vê somos nós três.   Porque não compartir, estamos os três começando uma vida nova, venha recomece a tua também.   Depois mais tarde conversando, perguntou ao filho, o que achas de damos uma porcentagem no negócio para ele.  Se vais estudar, precisaras de tempo livre, nada mais justo.   Já lhe exploraram muitos anos.  Acho que lhe é de direito.  Daqui alguns nós não poderei ajudar muito, você precisa de alguém em quem confiar.

Rick concordou, no dia seguinte, pegaram o Ortega de calças curtas, com a proposta, ele ria, chorava ao mesmo tempo.  Dizia vamos nos dar bem.

Oficializaram nos papeis tudo isso.  Assim, não era só conversa de palavras ao vento.

Ele era uma ótima companhia, na casa nova, sempre havia partidas de poker, com Marie que adorava jogar.

Billie, começou as consultas com os médicos, dizia ao pai, que primeiro tinha que encontrar um que sentisse confiança.  Até que entrou numa clínica, viu outros garotos da sua idade ali. Só havia um homem mais velho, o resto todos eram da sua idade.

Sentou-se ao lado de um garoto, que estava com seu pai. Começaram a conversar, ela se sentia homem, ele se sentia mulher.  Rick, se relaxou, começo a conversar com o pai do mesmo.

Ufa, foi a resposta do outro, pela primeira vez, não fico extremamente nervoso, pois na consulta que íamos, eram sempre muitos adultos.

Minha ex-mulher não suportou nada disso, nos divorciamos, consegui a guarda do meu filho, pois o entendo, já é difícil ser quem somos, pior é quando não nos aceitam.

Receberam formulários para preencher, antes da consulta, trocaram número de celulares, embora tivessem descoberto que viviam muito próximos um do outro.   Inclusive comentou, vi os homens trabalhando na reforma.  Aqui é uma coisa complicada, mas estes homens trabalhavam firmes.  Pedi para falar com o encarregado, me disse para falar com um tal de Ortega.

Sim esse é meu sócio na loja que temos, claro se precisas de reforma te ajudamos.

Já tinham conhecidos novos para conversarem.   O garoto, marcou com Billie de se encontrarem para que lhe mostrasse a cidade.

A consulta foi bem, tinham passado por um psicólogo, lhe entregaram todo o processo que Billie já vinha fazendo a anos.   Depois com o médico a coisa foi hiper bem, fizeram um calendário, de procedimentos.   Ele mesmo era um, transgénero, era uma pessoa aberta, contou para a Billie, como tinha sido seu processo.  Bom começaremos com a terapia com Testosterona, deves ter um lugar, para ir anotando todas as reações que te provoca.  Seja mau humor, ou qualquer coisa que te preocupe.  Terás a princípio que vir todas as semanas para isso.  Examinou seus seios, não tinham se desenvolvido, seria fácil de tirar quando chegasse o momento.

Quando iam sair, lhes apertou a mão, já chutamos a primeira bola, agora é acompanhar todo o processo tranquilamente.   Fico contente que teu pai te apoie, pois eu fiz tudo sem apoio, confesso que é mais complicado.

Billie estava eufórica, conversou com as amigas.  Cada uma esperava o começo das aulas, já te decidiste o que vais fazer?

Sim, vou fazer engenharia mecânica.

Não podia ser de outra maneira, disseram as duas, pois nos dois últimos anos, Billie tinha passado as férias trabalhando numa oficina mecânica, destrinchando carro como dizia, para poder entende-los.

Em casa quem consertava tudo era ela.

Bom, agora como passaremos a te chamar, Billie ou Bill?

Calma, falta muito ainda, estou no princípio dos procedimentos, terei todas as semanas aplicações de testosterona, psicólogo, exames médicos, mas isso tiro de letra.

Já estavam bem instalados, Rick, tinha encontrado um curso de escritura na universidade, como queria, tinha já assistido uma aula.  Billie, ia começar as suas na universidade.  Seu pai lhe comprou um carro.  Escolhido por ela é claro, um velho jeep que estava fuçando as entranhas como dizia. Assim se poderia mover mais rapidamente da universidade, a clínica médica.

 Ortega fez uma brincadeira com seu pai, se ele não pensava em se desfazer de sua velha caminhoneta.

Nem pensar Ortega, a tenho desde os 16 anos, foi presente do meu pai.  Billie, vive remexendo o motor, diz que melhor impossível.   Para que trocar.

No primeiro dia de aula, Billie, chegou atrasada 10 minutos, primeiro por ser difícil estacionar, segundo porque não sabia aonde era a classe.

Quando entrou o professor lhe olhou feio, lhe indicou os fundos da classe se sentou, ficou quieta examinando tudo.  Escutou atentamente, fazendo anotação de tudo que ele falava, motores de combustão.   Era um assunto que lhe interessava muito, tinha lido a respeito, de vários autores, enquanto seu pai comprava romances, ela comprava livros sobre motores, então sabia do assunto, a primeira pergunta caiu nela, ele frisou porque tinha chegado atrasada.   Claro era o que tinha falado no começo da aula, se surpreendeu, porque ela imaginou o que ele tinha falado nos primeiros dez minutos, tinha feito uma anotação a margem do caderno.  Imagino que falou isso.   Não deu outra coisa.  Respondeu a pergunta tranquilamente. 

Se você chegou atrasada, como sabe do assunto?

Quando me matriculei especialmente nessa matéria, estudei a fundo tudo que existe de publicações, inclusive o livro escrito pelo senhor.  Portanto imaginei por aonde tinha começado.

A resposta esta certa, mas se eu mudasse de conceito, imagina que estivesse falando ao contrário, fez uma outra pergunta, que tinha dito que futuramente se centrariam nesse tema mais profundamente.   

Ela respondeu à pergunta, embora discorde do senhor em certo ponto, porque imaginemos que um motor das característica que o senhor mencione, estivesse em pleno espaço, a situação seria outra. A partir do texto fiz uma experiencia não muito fácil, destruí um motor inteiro para construir outro, fica um problema sério pois se está no espaço, existiria uma propulsão defeituosa.  Isso poderia estragar toda a experiência.

Vou ter que aceitar que serás a melhor aluna que vou ter esse ano, nos falamos para a aula seguinte.   Deixou um exercício para a fazerem depois, mas à medida que ele escrevia o problema, ela avançava já a resposta, acompanhando tudo o que ele fazia.

Escutou uma voz ao seu lado que era conhecida.

Besteira fazer esse exercício, porque ela já resolveu.

O professor foi até aonde estava sentada, olhou todos os cálculos que ela tinha feito, escreveu em cima. Nota dez.   Tens certeza de que queres fazer essa aula, vais estar sempre adiantada aos outros.

Não professor, tenho coisas para aprender com o senhor.

Ele se afastou, ela olhou justo para o companheiro que estava sentado ao seu lado, não tinha prestado atenção nele.

Era seu velho conhecido da escola, o que sempre estava atrás dela, dizendo-se apaixonado.

Contínuas brilhante garota.  Sempre admirei tua cabeça.  Adorei encontrar alguma cara conhecida, quando entraste, pensei, aí vem minha heroína.

Nunca imaginei que te interessasse mecânica?

Pois sim, embora tenhas me frustrado em algumas coisas.

Que coisas?

No ano que passaste a fazer práticas na oficina mecânica, eu tinha chamado, me disseram para passar, quando te vi pendurada em cima de um motor de caminhão, pensei, aqui ninguém vai me dar atenção, pois todos estavam de boca aberta, o que fazia aquela mulher linda, em cima de um motor.  Te viraste, levantando uma peça defeituosa, como quem levanta o Oscar.  Tinhas encontrado o defeito em menos de um minuto segundo um companheiro teu.  Eles estavam examinando o caminhão a dois dias.

Soube nesse momento que ali não tinha chance nenhuma, além de ser um perdedor nato.  Me apaixonei por ti, levei cano.   Cada vez que disputava uma bola jogando Basquete, a tiravas da minha mão sem sequer olhar na minha cara. A lista é imensa, venha vamos tomar um café, assim me contas as novidades das tuas amigas.

Desta vez aceitou, não conhecia ninguém.

Contou que tinha vindo com seu pai, sua avô, que estavam todos bem, que Sarah estava fazendo universidade em Oxford,  Jessica estava no MIT, dizem que fui modesta, porque poderia ter escolhido qualquer coisa, mas escolhi fazer engenharia mecânica.  Meus sonhos são outros.

Mas tu, não imaginava essa ideia.  Estava sempre jogando, pensei que ias te transformar em um jogador da NBA.

Nunca pensei nisso, usava o basquete para me relaxar, muitos problemas em casa, precisava de algo que me fizesse centrar, como conseguir passar uma bola por ti, fazer uma canastra na tua frente, para me olhares.

Antes que siga por esse caminho, tens que saber de uma coisa.  Estou em processo de resignação de sexo.   Sempre me senti um homem, venho fazendo terapia a anos, a semanas comecei os tratamentos com testosterona.   Portanto não vá por aí, daqui um tempo serei um homem, a não ser que queiras ser meu escravo sexual.

Aceito, digo sem pensar.

Ela ficou olhando para ele.

Como podes dizer isso’

Olha, me apaixonei por ti, no dia que rompeste com o útero de tua mãe, apareceste na escola com os cabelos mal cortados, de calças jeans pela primeira vez, camiseta, tênis, soube nesse instante que te amava.  Uma garota que rompe com tudo o que tem, que os outros acham bonito, para ser ela mesma. Me serviu de exemplo, um dia te conto minha história, saberás por quê.

Enquanto todo mundo dizia que eras uma lesbiana, eu sabia que não era.  Era outra coisa mais profunda.  Agora me contas isso, só posso aplaudir, contínuas rompendo moldes.  Creio que podemos ser amigos.

Nunca nos apresentaram, tampouco apesar de jogarmos juntos, nos falamos pelo nome.

James Hunter, a teus pés, desbravadora do mundo.  O teu eu já sei, foi a primeira coisa que procurei saber.

Assistiram outra aula, de cálculo de estruturas mecânicas.  Enquanto todo mundo fazia com computador, ou calculadora, ela fazia na ponta do lápis.   É mais rápido que o próprio professor.

Isso ela sempre tinha tido que manejar, os professores não gostam que os alunos saibam mais do que eles.  Atrasou-se de propósito para que a solução final dissesse um outro aluno.

James lhe perguntou baixinho, mas tu foste mais rápida, por que ficaste quieta?

Ninguém gosta de competir com mulheres, no meu caso por enquanto, segundo os professores não gostam que saibas mais do que eles.  Eu fiz esse exercício mil vezes, até conseguir raciocinar com precisão.

Tens que me ensinar a fazer ou melhor pensar assim.

Saiam da aula com camaradagem.  Ela lhe perguntou aonde estava vivendo?

Numa pensão em que as baratas te dizem bom dia, boa noite, perguntam que sanduiches traz para comeres. Essas coisas.

Venha comigo. 

Ele quando viu o Jeep, ficou como louco. 

Ainda estou mexendo no motor, para fazer com que renda mais, pensei em trocar umas peças, tenho que procurar um ferro velho, para ver se encontro peças, para substituir.

Adoraria, mexer nesse jeep contigo. Estava sério, creio que posso aprender muito de ti.

Quando chegaram em casa, o apresentou a sua avó.    James foi companheiro na escola aonde vivíamos.  Disputei muitas bolas nos jogos com ele.

Senhora ela está mentindo.  Me tirava todas as bolas, justo quando ia fazer algum ponto, sempre foi melhor do que eu jogando.

Essa é minha neta.

Agora estamos estudando a mesma coisa, mas já vi que vai numa dianteira muito mais avançada do que podia esperar.

Bom, o caso que ele está vivendo numa espelunca, podíamos ceder aquele quarto do sótão, para ele, o que a senhora acha?

Por mim, estupendo, assim tens companhia para estudar.

Venha vou te mostrar o sótão.   Ele subiu imaginando um lugar cheio de tralhas, estava vazio, só tinha uma cama, uma mesa de estudos.

Caramba, imaginei ao contrário.  Que estava cheio de tralhas como o da casa dos meus pais.  Eu usava as tralhas para fazer um fortim para que não me encontrassem.

Estaria estupendo viver aqui, mas achas que teu pai vai consentir.  Depois preciso encontrar um trabalho pela tarde, pois minha bolsa de estudos não dá para muito.

Isso falamos depois.  Vamos falar com a baratas, para saber se permitem que saias de lá.

Ele foi perguntando como funcionavam as injeções de testosterona, se doíam muito, como funcionavam.

Ela lhe foi explicando mais ou menos o processo.    O duro e que as vezes meu pai tem curso justo no dia que me escalam para tomar os medicamentos, ou tenho que falar com o psicólogo. Nos dias do medicamento, tenho que ficar um tempo depois por la, esperando passar os efeitos mais imediatos.  Nesse dia não devo conduzir.

Não seja por isso, posso te acompanhar.

Porque estas aceitando tudo com normalidade.

Gostar de ti, sempre gostei.  Mas quando me disseste não, entendi que havia alguma coisa que eu não sabia.  Podia até ser que tivesses algum romance com alguma das tuas amigas, ou fosse alguma coisa completamente diferente.   Um dos meus companheiros, um dia disse que tinhas alma de homem.  Agora vejo que tinha razão.   Nesse dia fiquei furioso com ele, se os outros não nos separam tinha metido a mão nele.  Se é isso que sentes, tenho que respeitar, não me toca outra coisa.   Serei teu amigo, já me contento com isso.

Sempre tive companheiros, nunca tive amigos.  Primeiro porque erámos de outra cidade, depois em casa sempre faltava tudo.  Trabalhei muito tempo fazendo entregas para o supermercado, depois das aulas.  No último ano, trabalhei direto na oficina mecânica que me aceitaram.  Estudava como um louco para poder ganhar uma bolsa de estudos.  Queria seguir em frente, não ser um nômade como meu pai.  Ficamos na cidade, porque minha mãe já estava muito doente, não queria mais ir de um lugar para outro.  Meus três irmãos, nesse momento cada um está num lugar diferente.  Dois seguiram a vida com meu pai.  Eu sou o último, a primeira coisa que fiz, foi ir estudar.  Minha irmã mais velha do que eu, um belo dia conheceu um tipo, tinha 17 anos, desapareceu.  Depois morreu minha mãe, fiquei sozinho, para acabar o último ano.  Dormia nos fundos da oficina, mas ia as aulas todos os dias.   Quando pedi a bolsa de estudos, me disseram que tocava a ti, mas que não tinhas pedido. O que foi um milagre, sempre estiveste presente na minha vida.

Essa foi minha vida.   Me admirava da tua coragem, enfrentavas todos aqueles companheiros, não existia uma equipe feminina, mas enfrentaste o técnico, ele se desesperava, uma mulher na sua equipe, até que viu que eras melhor que os outros.   Com os cabelos curtos, sempre enganavas, ele te chamava de Bill, as escondidas, jogava na cara da gente que não tínhamos vergonha de ter uma companheira melhor.

Os outros as vezes te odiavam, mas aprenderam a te respeitar.  Na minha frente diziam, que não estava permitido falar mal de ti, porque eu perdia a paciência muito fácil.

Realmente era uma pensão horrível.  Ele só tinha um saco velho militar, com suas coisas.

Quando chegaram em casa, todo estavam esperando para jantar.  Ele viu que ninguém rezava, o fez sozinho, sem cobrar dos outros.

Seu pai lhe fez milhões de perguntas.  Ele educadamente respondeu a todas. 

Agora só preciso arrumar um emprego para ter um dinheiro além do da bolsa de estudos, Billie viu a espelunca que estava.  Isso aqui me parece um palácio.

Ortega lhe perguntou seus horários livres?

Depois das aulas estou livre, estudarei de noite. Posso trabalhar inclusive sábados e domingos se fizer falta.

Quem soltou a solução foi sua avó.   Ele poderia levar os livros, preparar referencias de mercadorias, ajudar a descarregar caminhões, pois o vejo forte para isso.

Obrigado, a senhora está sendo gentil demais.  Eu nunca renego nenhum trabalho.  Trabalho a muitos anos, para sustentar minha mãe.  Quando ela morreu, fiquei morando nos fundos da oficina que trabalhava.   Não era tão boa como aonde Billie fazia seus trabalhos.  Mas se fosse ficar lá, viveria na sombra dela.  É boa demais.

Nem se atreva a ficar contanto papos sobre mim James, de dou uns cascudos que veras.

Seu pai ficou olhando os dois, soltou de repente, já sei quem eres.   Um dia Billie veio me contar que um companheiro da equipe de basquete a tinha convidado para sair, tipo namorados, que ela o tinha mandado as favas.  Esse eras tu.

Ele riu, pronto meus segredos todos amanhã estarão nos jornais.  Sim era eu.  Não me arrependo em nenhum momento.   Como hoje ela me contou o que está fazendo, a admiro suficiente para respeitar suas vontades.  

Admitido na família, aqui não precisas pagar nada, terás comida, cama grátis, iras ajudar o Ortega todos os dias pela tarde.  Ele é nosso sócio na loja.

Ortega ria, sabes que cada vez que me a presentas alguém eu fico rindo como um bobo, porque sou teu sócio.  Fazes questão disso.

Ora Ortega, mantiveste a loja, como poderias a ter esvaziado completamente, nos deixando arruinados.  Mas ao contrário, tudo seguiu igual.   Não reconheceram teus méritos, por isso agora faço questão disso.  Aliás queria que pensasses numa coisa.   Porque não montamos um serviço de assistência aos clientes com os homens que arrumas sempre para as obras, os melhores poderíamos ter diretamente ligados a loja.  Assim quando vem alguém comprar podemos oferecer o serviço técnico.  Faríamos um cartaz falando sobre isso.

O cartaz posso fazer, soltou o James, sempre fiz para os lugares aonde trabalhava.

Estude isso Ortega, já tens um novo ajudante de como organizar isso. 

A cara do Ortega era curiosa.   Sabes quantas vezes falei isso para o teu tio?   Nunca me escutou, eu dizia que perdíamos uma chance de ganhar dinheiro.  Mas isso não era com ele.  Queria estar na farra. 

Bom agora somos outros teus sócios, vamos tocar isso para frente. 

Minha mãe, está ficando cansada para se locomover todos os dias a loja, passe esse trabalho para o James.

Pai, ele se ofereceu para ir me buscar nos dias que o senhor não pode, lá na clínica.  Seria coisa rápida, lhe aviso, vai me buscar, me traz para casa.

Só te aconselho uma coisa filho.  Não coloque música no Jeep, nem fale nada, ela vem com um humor de cachorro.  É capaz de morder todo mundo.  

Eu aguento, já levei muita porrada na vida seu Rick, sou capaz de aguentar muita coisa.

Agora iam as aulas juntos, de noite se sentavam no sótão estudando, até a hora do sono bater.

O que ele não tinha entendido da aula, ela lhe explicava.   Debatiam as ideias até ficarem com sono.

Algum comentários na faculdade, se estavam namorando, ou coisa similar.  Ele descartou rápido as perguntas, dizendo que eram grandes amigos de infância.

Os professores estavam contentes com os dois.   Nos sábados, saiam procurando peças para montar um motor que tinha realizado em classe.   Usavam a garagem que ficava embaixo da casa para isso.

O jeep, agora parecia um carro zero quilômetros, já não fazia o ruído de antes.

A primeira vez que ele foi busca-la, entendeu o que passava.  Estava sentido dores, tinha tido uma reação não esperada a injeção.  Quando ele chegou estava deitada num dos quartos da clínica.   Ele ficou ali quieto até ela melhorar.  Depois a ajudou a subir no jeep.

Na vez seguinte, que tinha psicólogo, comentou com ele o encontro dos dois.  Imagina, eu pensava naquela época que os garotos se contentavam me chamar lesbiana.  Ele vem se declara para mim.  Evidentemente tirei o corpo fora.  Agora, estudamos juntos, ontem veio me buscar na clínica.  Diz que me aceita.   Não sei o que pensar.  Embora seja no momento o único amigo que tenho.  Estudamos juntos conversamos.

Gostas dele para viver a vida inteira com ele?

Nem pensar. Quero ser um homem. Como sempre sonhei.

Bom nesse caso, não vejo problemas de convivência.

Dias depois notou o crescimento do seu clitóris, anotou no caderno isso, viu que seu bigode começava a surgir do nada.  Uma leve penugem perto das orelhas.

Dias depois levantou com dor de garganta, antes de ir à universidade, James a levou a clínica. O médico a examinou, disse que era efeitos colaterais do tratamento.  Ainda brincou que dentro de um tempo teria bigodes tão grandes como os mariachis.   Seu corpo todo estava se transformando.

Anotava, mas os outros também.  Um dia estava falando com o James de um exercício que estavam fazendo, quando notou que sua voz mudava de tom.  Ficava mais rouca, aveludada, mais masculina.

James ainda brincou, pois tinha percebido sua própria reação.  Se me falas com esse tom no ouvido, te deixarei me penetrar com suavidade.

Ela lhe deu um tapa na cabeça.   Só pensas nisso?

Na verdade, não.  Tenho pensado que enfocamos errado o propulsor do motor, creio que devíamos experimentar outro tipo de material.

Por curiosidade insistiu.  Nunca pensas em sexo?

Sim, como todo ser humano, principalmente na nossa idade.  Mas sempre me contive com relação as mulheres.   Vou ser honesto, sempre tive medo dos relacionamentos, via a vida dos meus pais.  Eles não encaixavam.  Ele não podia estar quieto em nenhum lugar, tinha que estar sempre em movimento.  Ela acabou se cansando, usou como desculpas que eu, minha irmã precisávamos ir à escola.  Disse que depois o seguiria.  Mas nunca mais moveu um dedo para procura-lo.    Nunca mais soubemos dele, nem dos meus irmãos.   Depois escutava meus colegas falando dos pais, escutava os famosos choque de gerações.  Bom histórias que não nos falta, como mal exemplo.    Sou jovem, tenho um outro problema, nunca pensei em ter filhos.

Uma vez na escola, já no último ano, numas entrevistas que nos faziam, me perguntaram meus objetivos.  Eu respondi que era estudar, até finalmente me sentir realizado com o que fazia.  Meus companheiros de equipe, sempre saiam de festas, me convidavam, mas sempre tinha desculpas.   Não encaixava no modo de vida deles, eram superficiais, com mamãe, papai soltando a pasta, vida fácil.   Eu não tinha isso, tampouco invejava.  Pois sempre gostei de trabalhar, me sentia útil.  A única lastima que tenho, foi de não ter percebido que minha irmã, era totalmente oposta a mim.   Não gostava de estudar, queria boa vida.  Seus companheiros de escola, eram sempre maus elementos.  Não adiantava falar, me dizia que era mais velha do que eu, tinha mais experiência.    Mas creio que não.

Você foi a única pessoa que me atraiu.  Hoje fico pensando, que talvez te seguia como exemplo, as vezes te via como um homem.  Muitas vezes me perguntei se tu fosses homem, se ia me interessar por ti.   A resposta hoje seria sim.  Creio que estou é precisando falar com um psicólogo.

Na próxima vez que eu for, marco hora para ti. Ok.

Justo nessa noite por ter pensado tanto no assunto.  Em seus sonhos, a viu como homem, se desnudando, ele admirando seu sexo. Sua voz por detrás dele gemendo de prazer, que teve um orgasmo.  Acordou assustado. Ficou andando pelo quarto, pensando nisso.

Quando foi falar com o psicólogo, contou o sonho.   Nunca me senti atraído por nenhum companheiro.   Isso que tinham corpos bonitos, mas quando abriam a boca, só se escutava asneiras.    O mesmo pensava quando escutava uma mulher de voz estridente, ficava imaginando a mesma na cama com o marido.  Como ele podia suportar escutar aquela voz.

O sexo nunca esteve muito presente em meus pensamentos, pois minha necessidade real era sair de aonde estava, conseguir entrar para a universidade.   Poder estudar.  Tive a sorte de encontrar a Billie, que me ajudou a encontrar um lugar para viver, aliás mais claramente, uma família, como eu nunca tive.

Contou todas as coisas que se lembrava da juventude deles, nunca tinha pensado nada de mal a respeito dela.   Seus amigos ficavam furiosos porque ela roubava a bola na cara deles, sem prestar atenção quem eram.  Eu admirava sua maneira de se comportar.  Ficava furioso quando diziam que era lesbiana.   Pensava comigo mesmo, se ela é, isso é parte de sua vida.

Quando me contou o tratamento, fiquei surpreso, mas logo entendi uma série de coisas, agora as coisas se encaixavam.    De brincadeira lhe disse que a deixaria me penetrar para usar seu novo piru.   Mas no fundo era verdade, agora tenho consciência disso, se escuto sua voz como esta agora, meio rouca, falando no meu ouvido, sou capaz de deixar que faça comigo o que quiser.

Nunca te sentiste atraído por nenhum outro homem?

Como comentei, creio que a cabeça das pessoas, influi muito na possível atração que sinta, numa equipe de basquete, as vezes fica difícil.  Principalmente se são jovens.  Não pelos companheiros nunca senti atração nenhuma.   Outro dia, pela primeira vez me interessei por alguém, um professor.  Sua cabeça é brilhante em termos de física.   Mas depois ao escutar um comentário que fez com relação a uma professora, fiquei decepcionado.  Tem um físico bonito, mas tirando a inteligência, quando fala as coisas, tudo toma um cariz vulgar.

Mas a verdade, é que sou virgem, nunca tive experiencias sexuais.  Tampouco sobrava tempo. Me masturbava é claro, mas nunca usei imagens, revistas, vídeos, essas coisas.  Estava sempre interessado em explorar meu próprio corpo.

Descobri meus pontos sensíveis sozinho.   Uma vez escutei uma garota comentando, ela fazia sexo com o capitão do time de futebol americano.  Um tipo imenso, mas ao comentar com a amiga dizia que acabaria casando com ele, porque sua família tinha um bom patrimônio, que seria político ou coisa que o valha.  Mas que na cama, ele só estava interessado em seu próprio prazer, nunca tinha se preocupado com o dela.   Para meu prazer prefiro me explorar com meus dedos, ganho mais.

Marcaram de seguir conversando.

Quando ele saiu, agradeceu a ela ter conseguido marcar a entrevista.

Estou me sentindo melhor, creio que coloquei para fora muitas coisas, agora começo a ver com claridade uns certos detalhes que passei por alto, ao só me preocupar em estudar.

Um dia ao sair de classe, notou que ela ria.  Perdi alguma coisa, para estares rindo?

Sim, tem alguém interessado em ti.  Quando respondia a pergunta do professor, te olhava com adoração.

Quem?

Aquele aluno moreno, outro dia na lanchonete, vinha com a bandeja, em nossa direção, mas deve ter pensado bem, voltou atrás.   Tu não viste por que estavas de costa.

Se me interesso por ele, ficaras com ciúmes?

Não tenho por que ficar com ciúmes, é a tua vida.  Só não quero perder essa amizade entre nós dois, isso sim me faria mal.

Na semana seguinte, ela foi ao médico de manhã muito cedo, teria uma revisão, com muitos exames para fazer.

Ele foi sozinho a universidade.   Estava sentado no claustro da universidade pensando, olhando para o celular se tinha algum recado dela.  Quando o rapaz se aproximou. 

Hoje não estas com tua namorada?

Não tenho namorada, Billie é minha melhor amiga, nada mais.

Ah, sentando-se ao seu lado, soltou, então tenho esperanças. 

Começaram a conversar, disse que tinha inveja, pois os companheiros que lhe tocavam para fazer projetos tudo sempre recaia para ele.   Alguns não fazem o mínimo esforço para compartilharem.  Pior que acabas fazendo, eles ganhando nota a tuas custas.  Não gosto muito disso.

Tenho até inveja do projeto de vocês, quando apresentam alguma coisa, se vê de debateram muito, estudaram as razões etc.

Podemos sair uma noite dessas para tomar umas cervejas.

James foi claro, não bebo, nem socialmente, perdão, mas tenho falta de tempo, ou estou trabalhando, ou estudando.

O outro colocou mão em cima da sua, não tens que pedir perdão, eu entendo.

Ficou com vontade de lhe dar um beijo, ali mesmo, se sentia atraído agora pelo rapaz.

Merda soltou.

O outro se assustou, que foi que eu disse errado.

Ele acostumado a verbalizar com a Billie, disse que sentia vontade de lhe dar um beijo, que agora não poderia se levantar da mesa, pois estava excitado.

O rapaz riu, pois gostaria das duas coisas.  queres vir ao meu apartamento?

Gostaria, mas pode ser que tenha que sair correndo, pois tenho que ir buscar a Billie no médico.

Estavam nas preliminares, quando está lhe mandou uma mensagem que iria demorar mais uma hora. Que já lhe avisava.

Teve sua primeira relação sexual com um homem. Gostava do cheiro do corpo do outro, seu toque, seus beijos.  Mas teria que descobrir até que ponto isso era importante para ele.

Quando foi buscar a Billie não lhe contou nada, pois estava com um humor horroroso, reclamou que ele tinha se atrasado.  De maus modos perguntou pelas aulas.   Ele foi falando o temário, ela o mandou calar a boca, pois sua voz estava lhe dando dor de cabeça.

Ficou quieto até chegarem em casa, sem dizer nada ela desceu do jeep, subiu, se fechou em seu quarto.

Um daqueles dias comentou sua avó.   Esse processo é doloroso.  Está deixando de ter a menstruação, se sente confusa, irritada, devem doer os peitos, uma serie de reações aos medicamentos.

Não a viu até o dia seguinte.   De noite foi dormir com seu novo amigo.

Quando ela o encontrou estava com ele, lhe apresentou, Peter, um novo amigo.

Ela sorriu, eu não te disse.  Está apaixonado por ti.   Depois ele comentou que tinham dormido juntos, que se sentia bem.

A mesma conversa teve com o psicólogo.  Este sorria, pois tinha atendido a Billie antes, esta tinha comentado o assunto.  Lhe perguntou se tinha ciúmes.

Claro é o único amigo que tenho, se o outro me rouba esse amigo estou ferrada.  Mas claro é um direito dele.  Tem sua necessidade de alguém.  Eu imagino que daqui um tempo também terei.

Ele ao conversar, contou a experiencia. Creio que cheguei tarde ao mercado do sexo.  Claro que Peter tem mais experiencia do que tenho.   Mas creio que me sai bem.  Gosto de seu contato.  Mas lhe avisei que a amizade da Billie é muito importante para mim.    Ele entendeu.

Terei que lidar com isso, das necessidades dela, das minhas, das do Peter.  Creio que será complicado, pois estarei no meio do fogo cruzado.

Peter o convidou para sair com alguns amigos dele.  Voltou decepcionado.

Quando Billie perguntou por quê?

Quando está com os amigos, não sei por que pensam que sendo gays, as conversas têm que ser tontas.  Quem dorme com quem, tamanho do piru, coisas do gênero.  Isso me é irritante.  Acabei bancando o idiota, me levantei para ir ao banheiro, desapareci.   Ele me chamou várias vezes, mas não respondi.

Acho que as pessoas têm essa tendência.   Ninguém quer conversar serias.  Outro dia na consulta aconteceu o mesmo.  Um rapaz que se está transformando em mulher, sua preocupação era se o futuro namorado que espera ter, se tiver o piru grande como vai ser.  Na hora não entendi.  Devo ter ficado de boca aberta pensando, pois riu dizendo, vais pedir um piru de quantos centímetros.   Juro não sabia o que responder.

Ou sou imatura demais, ou como nunca me preocupei com o assunto, me verei falando do mesmo.

Isso foi conversa dos dois com o psicólogo.  Creio que é natural isso, as garotas quando se encontram também comentam essas coisas, pode ser uma coisa de idade.   As mulheres solteiras, também fazem esse tipo de comentário, imaginem os homens, que contam entre si todas as relações que têm, para se ufanar.   Creio realmente que tudo isso começa nessa idade. Pode ser que te sintas deslocado, por isso.

Mesmo comigo, chegaste aqui, disseste que tinha dormido com Peter, que ele tinha mais experiencia que tu, mas não entraste em detalhes.   Alguns clientes, são capazes de quererem contar todos os detalhes, lhes dá morbo.

Creio que comigo, é por uma falta de hábito, estive sempre preocupado com me sair bem, para conseguir uma bolsa de estudos.

Quanto a Billie, ele recomendou que ela fosse a uma reunião em grupos de transexual, pois tinham todos os mesmos problemas, escutasse, se quisesse falar.  Lhe comentou que tinha um grupo que ele dirigia, lhe deu o endereço.

Quando ela comentou com o James, lhe perguntou se não se incomodava em ir com ela, nem que fosse só a primeira vez.

Ok, vou contigo.   Chegaram justo quando começava a reunião, ela se sentou na roda, ele mais atrás, mas o psicólogo, o chamou para a roda.  Avisou o James, não está em fase nenhuma, pois está contente com o que tem.

Ele ficou ali escutando cada pessoa, as dúvidas, as vezes de um, esclarecia as dos outros que estavam ali.  Como seria a operação, se depois preocupava todo mundo.  Por mais que os médicos explicassem, eram muitas informações, estás já surgiam quando a pessoa estava já no processo. 

Ele explicou que dependia de cada um, conhecia casos de pessoas que já estavam operadas a tempos, mas que não tinham tido nenhuma relação, estavam aproveitando o momento da liberação, se conhecendo, para saber quem finalmente eram.

Um deles perguntou se alguém se arrependia?

Claro que sim, por isso o processo é lento, mas mesmo assim, isso é possível de acontecer.

Tu por exemplo estás no processo final.  De que tem medo?

De muitas coisas, nunca falei nada disso a minha família.  Levei esperando essa oportunidade a muito tempo.   Não creio que eles aceitassem, pois, são ultra religiosos.   Creio que tudo isso iria contra suas crenças.

No final, Billie falou, disse que em vista do que tinha escutado, ela era agraciada, pois sua família sabia desde o princípio.    Que seu pai, sua avô, a apoiavam desde o princípio, meu amigo, sabe, por isso me acompanha.

Quando o psicólogo perguntou ao James o que lhe tinha parecido a reunião a resposta foi sincera.   É tudo muito complicado, pois não só os problemas pessoais, incluem o futuro problema de aceitação.   Talvez o medo de frustração, a pergunta no fundo é vai funcionar?

Porque não ficam, agora, tenho um grupo de pessoas que já fizeram a transição, escutaram coisas boas outras nem tanto.

Ao parecer, eram pessoas já mais maduras.   Uma das mulheres, que começou primeiro, disse que seu filho, mesmo depois de dois anos de ter-se transformado em mulher, não aceitava.  Mas acreditava que tudo era devido as frustrações de sua mãe, que sentia ter sido usada por ele, durante anos.

Quando chegou a vez de um homem lindo que estava ali, este comentou que tinha sido promovido no exército.    Mas creio mesmo que fizeram isso, para me colocar num escritório, para que os outros não tenham tanto contato comigo.   O que estou fazendo agora, é me preparar, para voltar a universidade.  Tenho que encontrar alguma outra profissão em que possa sobreviver como estou agora.

James, estava louco, pois não conseguia tirar os olhos do outro.  Se sentia atraído pela sua beleza, a maneira clara como falava.   O psicólogo tinha se esquecido de dizer que o James acompanhava sua amiga, que não estava no processo.

Quando ia falar isso, James, se virou para o outro rapaz, lhe perguntou, te sentes agora mais atraído por homens ou por mulheres?

Isso as vezes me confunde.  Estou te vendo me olhar, imediatamente me senti atraído por ti, mas nunca tive nenhuma relação com ninguém.  Estive após a operação, lambendo minhas feridas, tentando ser aceito pela minha família que é imensa.  Alguns aceitaram bem, outros nem tanto.

Na última reunião de família, as perguntas dos mais jovens era como me deviam chamar agora, eu não mudei meu nome porque tanto pode ser masculino como feminino.  Mas sinto que eles tem mais problemas do que eu, para encararem com normalidade.

Um único irmão que me apoiou desde o princípio é gay, talvez por isso me aceitou, me acompanhou na operação.  Com ele posso me abrir, mas com os outros não.    Funciona como, não te pergunto, tu não me explicas.

O que era mais velho do grupo, disse que tinha demorado demais tomar a decisão, ao mesmo tempo estive tanto tempo escondido num armário escuro. Que todo o processo o fiz, só para mim.  Ninguém me acompanhou, mas quando tudo terminou, que voltei a trabalhar, a princípio foi um escândalo, alguns pensavam que fazia isso para provocar.  Que só me vestia de mulher, se não fosse competente no que trabalho, basicamente teria perdido meu emprego.

A princípio queriam que eu ensinasse alguém a trabalhar, mas me neguei, agora tudo funciona mais ou menos 80%, alguns ainda me olha de esquerda.  As mulheres quando me veem entrar no banheiro feminino, são as que menos me aceitam.

Se sentiam melhor com esse grupo mais maduro.  Billie, comentou todas suas dúvidas, esclareceu que não podia, nem queria se preocupar com o depois, pois queria ter a cabeça totalmente voltada para isso.

Disso ao psicólogo que se sentia melhor nesse grupo, apesar de ser a única que não tinha ainda feito todo o processo.  Mas era mais maduros.  Havia ansiedade, mas no outro grupo a ansiedade era impressionante, lhe deixava nervosa.

Venham quando queriam.

Se encontraram na saída com o rapaz bonito.  Começaram a conversar, foram tomar um café, este riu quando James disse que se sentia atraído por ele, que tinha saído do armário a pouco tempo, mas tinha curiosidade. 

Eu trabalho num bar gay, tomo conta do local, ajudo na barra, por que não aparecem?

Os dois riram, nunca fomos a um lugar desses, somos virgens nessa história.

Mas ficaram de ir, Billie, comentou que levaria seu pai, além do tio Ortega.

Mas vai levar teu pai por quê?

Ele saiu do armário depois que viemos para cá, até então se dedicou ao negócio de família, a me cria, coisas do gênero.

No sábado foram todos, nenhum dos dois queria ir, mas acabaram aceitando.

Eles, olharam tudo de boca aberta.  Rusty, como se chamava o rapaz do grupo, veio falar com eles, o melhor lugar é perto de aonde eu fico, na barra, junto ao caixa, ali, vocês podem observar tudo, dançar.

Ortega a princípio estava meio incomodo, disse ao Rick que vinha antes a esses lugares com seu tio.  Que depois ele começou a tomar drogas, queria fazer sexo com todos.

Rick olhou tudo, examinou, virou-se para o Ortega, disse que se tivesse que escolher, ficaria com ele.

São muitos jovens para mim, os que regulam com minha idade, querem estar com esses jovens como se fossem recuperar a juventude.   Eu ao contrário sei que minha juventude, ficou para trás, que mesmo que queira recuperar não será possível.

Estavam os dois bebendo tranquilamente, quando o Rusty que estava basicamente ao lado deles, mas dentro do balcão, perguntou se os dois tinham uma relação.  Fazem um belo par.

Disse que concordava com o Rick, pois era isso mesmo.   Ele mesmo tinha pensando muito a respeito, quando comecei a me transformar, as pessoas me olhavam diferente, eu não encaixava em nenhum tipo.  Trabalhei de tudo que foi possível, para ter dinheiro para virar um homem.  Até em obras trabalhei. Por isso fiquei com esse físico.   Mas tive que aquentar todos os tipos de maldades, brincadeiras de mau gosto.   A maioria pensava que eu era um lesbiana.  Mas realmente me sentia um homem.   Mas não pensei que depois me sentiria atraído por outro homem.  Mas não sei se é pelo ambiente fica mais difícil.    Estou procurando emprego, para deixar de estar aqui.    Se souberem de algo me digam.  Faço a contabilidade daqui, as compras, uma série de coisas.  

Ortega lhe deu um cartão da loja, disse que passasse por lá para conversar.

Rusty, riu, ok, irei, mas vocês dois, deviam experimentar estarem juntos.

Rick olhou Ortega nos olhos, ele bem vestido, era muito bonito, moreno, atrativo.  Agora já não usava a barba de quando o tinha conhecido, estava mais cuidado. Ficaram ali, um ao lado do outro, os mais jovens não paravam de dançar.    Nunca tinham se divertido tanto, Rusty da barra comentou, hoje me interessei por esse garoto, mas me contou que não tem experiencia, eu por princípio tento não machucar ninguém.   São jovens, olha como se diverte os dois.

Ele foi apaixonado pela minha filha, contou que a atração que sentia, era porque ela parecia um menino.   Os dois sempre viveram para estudar.  Agora dá gosto ver os dois estudando, criando coisas juntos.   Estão trabalhando num motor para alta competição, dá gosto de ver.  Adoram mecânica.

Estavam ele, Ortega, olhando para o Rusty, quando se viraram, estavam frente a frente um do outro, daí para um beijo, foi só um passo.

Quando chamaram os meninos para irem embora, pois Rick ficava preocupado com sua mãe, sozinha em casa.   Os dois estava super suados.  Se despediram do Rusty, todos lhe beijando, o Ortega disse que passasse pela loja.

Quando chegaram em casa, cada um foi para seu quarto, Rick, resolveu tomar um copo de leite, quando chegou a cozinha, encontrou o Ortega sentado na mesa, com os cotovelos apoiado a mesma, com a cara apoiada nas mãos.

Em que estas pensando?

Em ti, em como eres diferente do teu tio.  Claro nos d